ARTIGO 3
O SACRAMENTO DA EUCARISTIA
1322. A sagrada Eucaristia completa a iniciação cristã.
Aqueles que foram elevados à dignidade do sacerdócio
real pelo Batismo e configurados mais profundamente com
Cristo pela Confirmação, esses, por meio da Eucaristia,
participam, com toda a comunidade, no próprio sacrifício
do Senhor.
1323. «O nosso Salvador instituiu na última ceia, na
noite em que foi entregue, o sacrifício eucarístico do
seu corpo e sangue, para perpetuar pelo decorrer dos
séculos, até voltar, o sacrifício da cruz, confiando à
Igreja, sua esposa amada, o memorial da sua morte e
ressurreição: sacramento de piedade, sinal de unidade,
vínculo de caridade, banquete pascal em que se recebe
Cristo, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor
da glória futura»
(II Concílio do Vaticano, Sacrosactum concilium,
47: .AAS 56 (1964) 113)
I. A Eucaristia - fonte e cume da vida eclesial
1324. A Eucaristia é «fonte e cume de toda a vida
cristã»
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15).
«Os restantes sacramentos, assim como todos os
ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão
vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam.
Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o
tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo,
nossa Páscoa»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 5: AAS 58 (1966) 997).
1325. «A comunhão de vida com Deus e a unidade do
povo de Deus, pelas quais a Igreja é o que é, são
significados e realizados pela Eucaristia. Nela se
encontra o cume, ao mesmo tempo, da ação pela qual Deus,
em Cristo, santifica o mundo, e do culto que no Espírito
Santo os homens prestam a Cristo e, por Ele, ao Pai»
(Sagrada Congregação dos Ritos, Instr.
Eucharisticum mysterium, 6: AAS 59 (1967) 545).
1326. Enfim, pela celebração eucarística, unimo-nos
desde já à Liturgia do céu e antecipamos a vida eterna,
quando «Deus for tudo em todos» (1ª Cor. 15, 18).
1327. Em síntese, a Eucaristia é o resumo e a súmula da
nossa fé: «a nossa maneira de pensar está de acordo
com a Eucaristia: e, por sua vez, a Eucaristia confirma
a nossa maneira de pensar»
(Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4, 18,
5: SC 100, 610 (Pg. 7, 1028)).
II. Como se chama este sacramento?
1328. A riqueza inesgotável deste sacramento exprime-se
nos diferentes nomes que lhe são dados. Cada um destes
nomes evoca alguns dos seus aspectos. Chama-se:
Eucaristia, porque é ação de graças a Deus. As
palavras
«eucharistein» (Lc. 22, 19; 1ª Cor. 11,
24) e «eulogein» (Mt. 26, 26; Mc. 14, 22) lembram
as bênçãos judaicas que proclamam - sobretudo durante a
refeição - as obras de Deus: a criação, a redenção e a
santificação.
1329. Ceia do Senhor
(Cf. 1ª Cor. 11, 20),
porque se trata da ceia que o Senhor comeu com os
discípulos na véspera da sua paixão e da antecipação do
banquete nupcial do Cordeiro
(Cf.
Ap. 19, 9)
na Jerusalém celeste.
- Fracção do Pão,
porque este rito, próprio da refeição dos judeus, foi
utilizado por Jesus quando abençoava e distribuía o pão
como chefe de família
(Cf. Mt. 14, 19; 15, 36; Mc. 8, 6.19),
sobretudo aquando da última ceia
(Cf. Mt. 26, 26: 1ª Cor. 11, 24).
É por este gesto que os discípulos O reconhecerão depois
da sua ressurreição
(Cf. Lc. 24, 13-35)
e é com esta expressão que os primeiros cristãos
designarão as suas assembleias eucarísticas
(Cf. At. 2, 42.46: 20, 7.11).
Querem com isso significar que todos os que comem do
único pão partido, Cristo, entram em comunhão com Ele e
formam um só corpo n'Ele
(Cf. 1ª Cor. 10, 16-17).
- Assembleia eucarística («sýnaxis»),
porque a Eucaristia é celebrada em
assembleia de fiéis, expressão visível da Igreja
(Cf. 1ª Cor. 11, 17-34).
1330. Memorial da paixão e ressurreição do
Senhor.
Santo Sacrifício, porque atualiza o único
sacrifício de Cristo Salvador e inclui a oferenda da
Igreja; ou ainda santo Sacrifício da Missa,
«Sacrifício de louvor» (Heb. 13, 15)
(Cf. Sl. 116, 13.17), Sacrifício espiritual
(Cf. 1ª Pe. 2, 5)
Sacrifício puro
(Cf. Ml. 1, 11)
e santo,
pois completa e ultrapassa todos os sacrifícios da
Antiga Aliança.
Santa e divina Liturgia,
porque toda a liturgia da Igreja encontra o seu centro e
a sua expressão mais densa na celebração deste
sacramento; no mesmo sentido se lhe chama também
celebração dos Santos Mistérios. Fala-se
igualmente do Santíssimo Sacramento, porque é o
sacramento dos sacramentos. E, com este nome, se
designam as espécies eucarísticas guardadas no Sacrário.
1331. Comunhão, pois é por este sacramento que
nos unimos a Cristo, o qual nos torna participantes do
seu corpo e do seu sangue, para formarmos um só corpo
(Cf. 1ª Cor, 10, 16-17);
chama-se ainda
as coisas santas («tà hágia»; «sancta»)
(Cf. Constitutiones apostolicae 8, 13, 12: SC:
336, 208 (Funk, Didascalia et Constitutiones
Apostolorum 1, 516); Didaké 9,5: SC 248, 178
(Funk, Patres apostolici 1, 22); Ibid. 10,
6: SC 248. 180 (Funk, Patres apostolici 1, 24))
- é o sentido primário da «comunhão dos santos»
de que fala o Símbolo dos Apóstolos - pão dos anjos,
pão do céu, remédio da imortalidade
(Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Ephesios
20, 2: SC 10 bis, 76 (Funk 1, 230)),
viático...
1332. Santa Missa, porque a liturgia em que se
realiza o mistério da salvação termina com o envio dos
fiéis («missio»), para que vão cumprir a vontade
de Deus na sua vida quotidiana.
III. A Eucaristia na economia da salvação
OS SINAIS DO PÃO E DO VINHO
1333. No centro da celebração da Eucaristia temos o pão
e o vinho que, pelas palavras de Cristo e pela invocação
do Espírito Santo, se tornam o Corpo e o Sangue do mesmo
Cristo. Fiel à ordem do Senhor, a Igreja continua a
fazer, em memória d'Ele e até à sua vinda gloriosa, o
que Ele fez na véspera da sua paixão: «tomou o
pão...», «tomou o cálice com vinho...».
Tornando-se misteriosamente o Corpo e o Sangue de
Cristo, os sinais do pão e do vinho continuam a
significar também a bondade da criação. Por isso, no
ofertório [apresentação das oferendas], nós damos graças
ao Criador pelo pão e pelo vinho
(Cf. Sl. 104, 13-15), fruto «do trabalho do homem», mas
primeiramente «fruto da terra» e «da videira»,
dons do Criador. A Igreja vê no gesto de Melquisedec,
rei e sacerdote, que «ofereceu pão e vinho» (Gn.
14, 18), uma prefiguração da sua própria oferenda
(Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 95:
Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanis 1970). p. 453 [Missal Romano, Gráfica
de Coimbra 1992. 521]).
1334. Na Antiga Aliança, o pão e o vinho são oferecidos
em sacrifício entre as primícias da terra, em sinal de
reconhecimento ao Criador. Mas também recebem uma nova
significação no contexto do Êxodo: os pães ázimos que
Israel come todos os anos na Páscoa, comemoram a pressa
da partida libertadora do Egito; a lembrança do maná do
deserto recordará sempre a Israel que é do pão da
Palavra de Deus que ele vive
(Cf. Dt. 8, 3).
Finalmente, o pão de cada dia é o fruto da terra
prometida, penhor da fidelidade de Deus às suas
promessas. O «cálice de bênção»
(1ª Cor. 10, 16),
no fim da ceia pascal dos judeus, acrescenta à alegria
festiva do vinho uma dimensão escatológica - a da
expectativa messiânica do restabelecimento de Jerusalém.
Jesus instituiu a sua Eucaristia dando um sentido novo e
definitivo à bênção do pão e do cálice.
1335. Os milagres da multiplicação dos pães, quando o
Senhor disse a bênção, partiu e distribuiu os pães pelos
seus discípulos para alimentar a multidão, prefiguram a
superabundância deste pão único da sua Eucaristia
(Cf. Mt. 14, 13-21; 15, 32-39).
O sinal da água transformada em vinho em Caná
(Cf. Jo. 2, 11)
já anuncia a «Hora» da glorificação de Jesus. E
manifesta o cumprimento do banquete das núpcias no Reino
do Pai, onde os fiéis beberão do vinho novo
(Cf. Mc. 14, 25)
tornado sangue de Cristo.
1336. O primeiro anúncio da Eucaristia dividiu os
discípulos, tal como o anúncio da paixão os
escandalizou: «estas palavras são insuportáveis! Quem
as pode escutar»? (Jo. 6, 60). A Eucaristia e a cruz
são pedras de tropeço. É o mesmo mistério e não cessa de
ser ocasião de divisão. «Também vos quereis ir
embora»? (Jo. 6, 67): esta pergunta do Senhor ecoa
através dos tempos, como convite do seu amor a descobrir
que só Ele tem «palavras de vida eterna» (Jo. 6,
68) e que acolher na fé o dom da sua Eucaristia é
acolhê-lo a Ele próprio.
A INSTITUIÇÃO DA EUCARISTIA
1337. Tendo amado os seus, o Senhor amou-os até ao fim.
Sabendo que era chegada a hora de partir deste mundo
para regressar ao Pai, no decorrer duma refeição,
lavou-lhes os pés e deu-lhes o mandamento do amor
(Cf. Jo. 13, 1-17). Para lhes deixar uma garantia deste amor,
para jamais se afastar dos seus e para os tornar
participantes da sua Páscoa, instituiu a Eucaristia como
memorial da sua morte e da sua ressurreição, e ordenou
aos seus Apóstolos que a celebrassem até ao seu
regresso, «constituindo-os, então, sacerdotes do Novo
Testamento»
(Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss.
Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740).
1338. Os três evangelhos sinópticos e São Paulo
transmitiram-nos a narração da instituição da
Eucaristia. Por seu lado, São João refere as palavras de
Jesus na sinagoga de Cafarnaum, palavras que preparam
a instituição da Eucaristia: Cristo designa-se a si
próprio como o pão da vida, descido do céu
(Cf. Jo. 6, 13).
1339. Jesus escolheu a altura da Páscoa para cumprir o
que tinha anunciado em Cafarnaum: dar aos seus
discípulos o seu corpo e o seu sangue:
- «veio o dia dos Ázimos, em que devia imolar-se a
Páscoa. [Jesus] enviou então a Pedro e a João, dizendo:
"ide preparar-nos a Páscoa, para que a possamos comer"
[...]. Partiram, pois, [...] e prepararam a Páscoa. Ao
chegar a hora, Jesus tomou lugar à mesa, e os Apóstolos
com Ele. Disse-lhes então: "tenho desejado ardentemente
comer convosco esta Páscoa, antes de padecer. Pois vos
digo que não voltarei a comê-la, até que ela se realize
plenamente no Reino de Deus". [...] Depois, tomou o pão
e, dando graças, partiu-o, deu-lhe e disse-lhes: "isto é
o Meu Corpo, que vai ser entregue por vós. Fazei isto em
memória de mim". No fim da ceia, fez o mesmo com o
cálice e disse: "este cálice é a Nova Aliança no meu
Sangue, que vai ser derramado por vós"»
(Lc. 22, 7-20)
(Cf. Mt 26, 17-29; Mc 14, 12-25; 1 Cor 11,
23-25).
1340. Celebrando a última ceia com os seus Apóstolos, no
decorrer do banquete pascal, Jesus deu o seu sentido
definitivo à Páscoa judaica. Com efeito, a passagem de
Jesus para o seu Pai, pela sua morte e ressurreição - a
Páscoa nova - é antecipada na ceia e celebrada na
Eucaristia, que dá cumprimento a Páscoa judaica e
antecipa a Páscoa final da Igreja na glória do Reino.
«FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE MIM»
1341. Ao ordenar que repetissem os seus gestos e
palavras, «até que Ele venha» (1ª Cor. 11, 26),
Jesus não pede somente que se lembrem d'Ele e do que Ele
fez. Tem em vista a celebração litúrgica, pelos
apóstolos e seus sucessores, do memorial de
Cristo, da sua vida, morte, ressurreição e da sua
intercessão junto do Pai.
1342. Desde o princípio, a Igreja foi fiel à ordem do
Senhor. Da Igreja de Jerusalém está escrito:
- «eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união
fraterna, à fração do pão e às orações. [...] Todos os
dias frequentavam o templo, como se tivessem uma só
alma, e partiam o pão em suas casas; tomavam o alimento
com alegria e simplicidade de coração»
(At. 2, 42.46).
1343. Era sobretudo «no primeiro dia da semana»,
isto é, no dia de domingo, dia da ressurreição de Jesus,
que os cristãos se reuniam «para partir o pão»
(At. 20, 7). Desde esses tempos até aos nossos dias, a
celebração da Eucaristia perpetuou-se, de maneira que
hoje a encontramos em toda a parte na Igreja com a mesma
estrutura fundamental. Ela continua a ser o centro da
vida da Igreja.
1344. Assim, de celebração em celebração, anunciando o
mistério pascal de Jesus «até que Ele venha»
(1ª Cor. 11, 26),
o Povo de Deus em peregrinação «avança pela porta
estreita da cruz»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes,
1: AAS 58 (1966) 947)
para o banquete celeste, em que todos os eleitos se
sentarão à mesa do Reino.
IV. A celebração litúrgica da Eucaristia
A MISSA DE TODOS OS SÉCULOS
1345. Desde o século II, temos o testemunho de São
Justino, mártir, sobre as grandes linhas do desenrolar
da celebração eucarística. Permaneceram as mesmas até
aos nossos dias, em todas as grandes famílias
litúrgicas. Eis o que ele escreve, cerca do ano 155,
para explicar ao imperador pagão Antonino Pio (138-161)
o que fazem os cristãos:
- «no dia que chamam Dia do Sol, realiza-se a reunião
num mesmo lugar de todos os que habitam a cidade ou o
campo.
- Leem-se as memórias dos Apóstolos e os escritos dos
Profetas, tanto quanto o tempo o permite.
Quando o leitor acabou, aquele que preside toma a
palavra para incitar e exortar à imitação dessas belas
coisas.
- Em seguida, levantamo-nos todos juntamente e fazemos
orações»
(São Justino, Apologia, 1. 67: CA 1. 184-186 (PG
6. 429))
«por nós mesmos [...] e por todos os outros, [...]
onde quer que estejam, para que sejamos encontrados
justos por nossa vida e ações, e fiéis aos mandamentos,
e assim obtenhamos a salvação eterna.
- Terminadas as orações, damo-nos um ósculo uns aos
outros.
- Depois, apresenta-se àquele que preside aos irmãos pão
e uma taça de água e vinho misturados.
Ele toma-os e faz subir louvor e glória ao Pai do
universo, pelo nome do Filho e do Espírito Santo, e dá
graças (em grego: eucharistian) longamente, por termos
sido julgados dignos destes dons.
- Quando ele termina as orações e ações de graças, todo
o povo presente aclama: Amém.
- [...] Depois de aquele que preside ter feito a ação de
graças e de o povo ter respondido, aqueles a que entre
nós chamamos diáconos distribuem a todos os que estão
presentes pão, vinho e água "eucaristizados" e também os
levam aos ausentes»
(São Justino, Apologia, 1. 65: CA 1, 176-180 (PG
6. 428)).
1346. A liturgia eucarística processa-se em
conformidade com uma estrutura fundamental, que se tem
conservado através dos séculos até aos nossos dias.
Desdobra-se em dois grandes momentos, que formam
basicamente uma unidade:
- a reunião, a liturgia da Palavra, com as
leituras, a homilia e a oração universal;
- a liturgia eucarística, com a apresentação do
pão e do vinho, a ação de graças consecratória e a
comunhão.
- Liturgia da Palavra e liturgia eucarística constituem
juntas "um só e mesmo ato de culto"
(II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 56: AAS 56 (1964) 115).
Com efeito, a mesa posta para nós na Eucaristia é, ao
mesmo tempo, a da Palavra de Deus e a do corpo do Senhor
(Cf. III Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Dei Verbum, 21: AAS 58 (1966) 827).
1347. Não é esse também o dinamismo da refeição pascal
de Jesus Ressuscitado com os seus discípulos? Enquanto
caminhavam, Ele explicava-lhes as Escrituras; depois,
pondo-se à mesa com eles, «tomou o pão, proferiu a
bênção, partiu-o e deu-lhe»
(Cf. Lc. 24, 13-35).
O DESENROLAR DA CELEBRAÇÃO
1348. Todos se reúnem. Os cristãos acorrem a um
mesmo lugar para a assembleia eucarística. A sua cabeça
está o próprio Cristo, que é o ator principal da
Eucaristia. Ele é o Sumo-Sacerdote da Nova Aliança. É
Ele próprio que preside invisivelmente a toda a
celebração eucarística. E é em representação d'Ele
(agindo «in persona Christi capitis - na pessoa de
Cristo-Cabeça»), que o Bispo ou o presbítero preside
à assembleia, toma a palavra depois das leituras, recebe
as oferendas e diz a oração eucarística. Todos
têm a sua parte ativa na celebração, cada qual a seu
modo: os leitores, os que trazem as oferendas, os que
distribuem a comunhão e todo o povo cujo Amém
manifesta a participação.
1349. A liturgia da Palavra comporta «os
escritos dos Profetas», quer dizer, o Antigo
Testamento, e «as Memórias dos Apóstolos», ou
seja, as suas epístolas e os evangelhos. Depois da
homilia, que é uma exortação a acolher esta Palavra como
o que ela é na realidade, Palavra de Deus
(Cf. 1ª Ts. 2, 13),
e a pô-la em prática, vêm as intercessões por todos os
homens, segundo a palavra do Apóstolo: «recomendo,
antes de tudo, que se façam preces, orações, súplicas e
ações de graças, por todos os homens, pelos reis e por
todos os que exercem autoridade» (1ª Tm. 2, 1-2).
1350. A apresentação das oferendas (ofertório):
traz-se então para o altar, por vezes processionalmente,
o pão e o vinho que vão ser oferecidos pelo sacerdote em
nome de Cristo no sacrifício eucarístico, no qual se
tornarão o seu Corpo e o seu Sangue. É precisamente o
mesmo gesto que Cristo fez na última ceia, «tomando o
pão e o cálice». «Só a Igreja oferece esta
oblação pura ao Criador, oferecendo-Lhe em ação de
graças o que provém da sua criação»
(Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4. 18,
4: SC 100, 606 (PG 7, 1027): cf. Mt 1. 11).
A apresentação das oferendas no altar assume o gesto de
Melquisedec e põe os dons do Criador nas mãos de Cristo.
É Ele que, no seu sacrifício, leva à perfeição todas as
tentativas humanas de oferecer sacrifícios.
1351. Desde o princípio, com o pão e o vinho para a
Eucaristia, os cristãos trazem as suas ofertas para a
partilha com os necessitados. Este costume, sempre
atual, da coleta
(Cf. 1ª Cor. 16, 1)
inspira-se no exemplo de Cristo, que Se fez pobre para
nos enriquecer
(Cf. 2ª Cor. 8, 9):
- «os que são ricos e querem, dão, cada um conforme o
que a si mesmo se impôs; o que se recolhe é entregue
àquele que preside e ele, por seu turno, presta
assistência aos órfãos, às viúvas, àqueles que a doença
ou qualquer outra causa priva de recursos, aos
prisioneiros, aos imigrantes, numa palavra, a todos os
que sofrem necessidade»
(São Justino, Apologia, 1. 67, 6: CA 1, 186-188
(PG 6, 429)).
1352. A anáfora: com a oração eucarística, oração
de ação de graças e de consagração, chegamos ao coração
e cume da celebração:
- no prefácio, a Igreja dá graças ao Pai, por
Cristo, no Espírito Santo, por todas as suas obras: pela
criação, redenção e santificação. Toda a comunidade une,
então, as suas vozes àquele louvor incessante que a
Igreja celeste - os anjos e todos os santos - cantam ao
Deus três vezes Santo:
1353. na epiclese, pede ao Pai que envie o seu
Espírito Santo (ou o poder da sua bênção)
(Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 90:
Missale Romarum, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanis 1970). p.451 [Missal Romano, Gráfica de
Coimbra 1992, 518])
sobre o pão e o vinho, para que se tornem, pelo seu
poder, o corpo e o sangue de Jesus Cristo, e para que os
que participam na Eucaristia sejam um só corpo e um só
espírito. (Algumas tradições litúrgicas colocam a
epiclese depois da anamnese); na narração da
instituição, a força das palavras e da ação de
Cristo e o poder do Espírito Santo tomam
sacramentalmente presentes, sob as espécies do pão e do
vinho, o corpo e o sangue do mesmo Cristo, o seu
sacrifício oferecido na cruz de uma vez por todas;
1354. na anamnese que se segue, a Igreja faz
memória da paixão, ressurreição e regresso glorioso de
Cristo Jesus: e apresenta ao Pai a oferenda do seu
Filho, que nos reconcilia com Ele:
- nas intercessões, a Igreja manifesta que a
Eucaristia é celebrada em comunhão com toda a Igreja do
céu e da terra, dos vivos e dos defuntos, e na comunhão
com os pastores da Igreja: o Papa, o Bispo da Diocese, o
seu Presbitério e os seus Diáconos, e todos os Bispos do
mundo inteiro com as suas Igrejas.
1355. Na comunhão, precedida da Oração do Senhor
e da fracção do pão, os fiéis recebem «o pão do céu» e
«o cálice da salvação», o Corpo e o Sangue de
Cristo, que se entregou «para a vida do mundo»
(Jo. 6, 51):
- porque este pão e este vinho foram, segundo a
expressão antiga, «eucaristizados»
(São Justino, Apologia, 1, 65: CA 1, 180 (PG. 6,
428)),
«chamamos a este alimento Eucaristia; e ninguém pode
tomar parte nela se não acreditar na verdade do que
entre nós se ensina, se não recebeu o banho para a
remissão dos pecados e o novo nascimento e se não viver
segundo os preceitos de Cristo»
(São Justino, Apologia, 1, 66, 1-2: CA 1. 180 (PG.
6, 428)).
V. O sacrifício sacramental: ação de graças, memorial,
presença
1356. Se os cristãos celebram a Eucaristia desde as
origens e sob uma forma que, na sua substância não mudou
através da grande diversidade dos tempos e das
liturgias, é porque sabem que estão ligados pela ordem
do Senhor, dada na véspera da sua paixão: «fazei isto
em memória de Mim» (1ª Cor. 11, 24-25).
1357. Esta ordem do Senhor, cumprimo-la celebrando o
memorial do seu sacrifício. E fazendo-o, oferecemos
ao Pai o que Ele próprio nos deu: os dons da sua
criação, o pão e o vinho, transformados, pelo poder do
Espírito Santo e pelas palavras de Cristo, no corpo e no
sangue do mesmo Cristo: assim Cristo torna-se real e
misteriosamente presente.
1358. Temos, pois, de considerar a Eucaristia
- como ação de graças e louvor ao Pai,
- como memorial sacrificial de Cristo e do
Seu corpo,
- como presença de Cristo pelo poder da sua Palavra e do
seu Espírito.
A AÇÃO DE GRAÇAS E O LOUVOR AO PAI
1359. A Eucaristia, sacramento da nossa salvação
realizada por Cristo na cruz, é também um sacrifício de
louvor em ação de graças pela obra da criação. No
sacrifício eucarístico, toda a criação, amada por Deus,
é apresentada ao Pai, através da morte e ressurreição de
Cristo. Por Cristo, a Igreja pode oferecer o sacrifício
de louvor em ação de graças por tudo o que Deus fez de
bom, belo e justo, na criação e na humanidade.
1360. A Eucaristia é um sacrifício de ação de graças ao
Pai, uma bênção pela qual a Igreja exprime o seu
reconhecimento a Deus por todos os seus benefícios, por
tudo o que Ele fez mediante a criação, a redenção e a
santificação. Eucaristia significa, antes de mais,
«ação de graças».
1361. A Eucaristia é também o sacrifício de louvor, pelo
qual a Igreja canta a glória de Deus em nome de toda a
criação. Este sacrifício de louvor só é possível através
de Cristo: Ele une os fiéis à sua pessoa, ao seu louvor
e à sua intercessão, de maneira que o sacrifício de
louvor ao Pai ë oferecido por Cristo e com
Cristo, para ser aceite em Cristo.
O MEMORIAL SACRIFICIAL DE CRISTO E DO SEU CORPO, A
IGREJA
1362. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, a
actualização e a oferenda sacramental do seu único
sacrifício, na liturgia da Igreja que é o seu corpo. Em
todas as orações eucarísticas encontramos, depois das
palavras da instituição, uma oração chamada anamnese
ou memorial.
1363. No sentido que lhe dá a Sagrada Escritura, o
memorial não é somente a lembrança dos
acontecimentos do passado, mas a proclamação das
maravilhas que Deus fez pelos homens
(Cf. Ex. 13. 3).
Na celebração litúrgica destes acontecimentos, eles
tomam-se de certo modo presentes e atuais. É assim que
Israel entende a sua libertação do Egito: sempre que se
celebrar a Páscoa, os acontecimentos do Êxodo tornam-se
presentes à memória dos crentes, para que conformem com
eles a sua vida.
1364. O memorial recebe um sentido novo no Novo
Testamento. Quando a Igreja celebra a Eucaristia, faz
memória da Páscoa de Cristo, e esta torna-se presente: o
sacrifício que Cristo ofereceu na cruz uma vez por
todas, continua sempre atual
(Cf. Heb. 7, 25-27):
«todas as vezes que no altar se celebra o sacrifício
da cruz, no qual "Cristo, nossa Páscoa, foi imolado",
realiza-se a obra da nossa redenção»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6).
1365. Porque é o memorial da Páscoa de Cristo, a
Eucaristia é também um sacrifício. O caráter
sacrificial da Eucaristia manifesta-se nas próprias
palavras da instituição: «isto é o meu Corpo, que vai
ser entregue por vós» e «este cálice é a Nova Aliança no
meu Sangue, que vai ser derramado por vós» (Lc. 22,
19-20). Na Eucaristia, Cristo dá aquele mesmo Corpo que
entregou por nós na cruz, aquele mesmo Sangue que
«derramou por muitos em remissão dos pecados» (Mt.
26, 28).
1366. A Eucaristia é, pois, um sacrifício, porque
representa (torna presente) o sacrifício da cruz,
porque é dele o memorial e porque aplica o
seu fruto:
- Cristo «nosso Deus e Senhor [...], ofereceu-se a Si
mesmo a Deus Pai uma vez por todas, morrendo como
intercessor sobre o altar da cruz, para realizar em
favor deles [homens] uma redenção eterna. No entanto,
porque após a sua morte não se devia extinguir o seu
sacerdócio (Heb. 7, 24-27), na última ceia, "na
noite em que foi entregue" (1ª Cor. 11, 13).
[...] Ele [quis deixar] à Igreja, sua esposa bem-amada,
um sacrifício visível (como o exige a natureza humana),
em que fosse representado o sacrifício cruento que ia
realizar uma vez por todas na cruz, perpetuando a sua
memória até ao fim dos séculos e aplicando a sua
eficácia salvífica à remissão dos pecados que nós
cometemos cada dia»
(Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss.
Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740).
1367. O sacrifício de Cristo e o sacrifício da
Eucaristia são um único sacrifício: «é uma só e mesma
vítima e Aquele que agora Se oferece pelo ministério dos
sacerdotes é o mesmo que outrora se ofereceu a Si mesmo
na cruz; só a maneira de oferecer é que é diferente»
(Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss.
Missae Sacrificio, c. 2: DS 1743).
E porque «neste divino sacrifício, que se realiza na
missa, aquele mesmo Cristo, que a Si mesmo Se ofereceu
outrora de modo cruento sobre o altar da cruz, agora
está contido e é imolado de modo incruento [...], este
sacrifício é verdadeiramente propiciatório» (Ibid).
1368. A Eucaristia é igualmente o sacrifício da
Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo, participa
na oblação da sua Cabeça. Com Ele, ela própria é
oferecida integralmente. Ela une-se à sua intercessão
junto do Pai em favor de todos os homens. Na Eucaristia,
o sacrifício de Cristo torna-se também o sacrifício dos
membros do seu corpo. A vida dos fiéis, o seu louvor, o
seu sofrimento, a sua oração, o seu trabalho unem-se aos
de Cristo e à sua oblação total, adquirindo assim um
novo valor. O sacrifício de Cristo presente sobre o
altar proporciona a todas as gerações de cristãos a
possibilidade de se unirem à sua oblação.
Nas catacumbas, a Igreja é frequentemente representada
como uma mulher em oração, de braços estendidos em
atitude orante. Como Cristo, que estendeu os braços na
cruz, assim, por Ele, com Ele e n'Ele, a Igreja
oferece-se e intercede por todos os homens.
1369. Toda a Igreja está unida à oblação e
intercessão de Cristo. Encarregado do ministério de
Pedro na Igreja, o Papa está associado a toda e
qualquer celebração da Eucaristia, na qual é nomeado
como sinal e servidor da unidade da Igreja universal. O
Bispo do lugar é sempre responsável pela
Eucaristia, mesmo quando presidida por um Presbítero;
o seu nome é citado nela para significar a sua
presidência da Igreja particular, no meio do presbitério
e com a assistência dos Diáconos. A comunidade
intercede também por todos os ministros que, por ela e
com ela, oferecem o sacrifício eucarístico:
- «seja tida como legítima somente aquela Eucaristia
que é presidida pelo Bispo ou por quem ele encarregou»
(Santo Inácio de Antioquia, Epistula Ad Smyrnaeos
8, 1: SC 10bis. 138 (Funk 1, 282)).
- «É pelo ministério dos Presbíteros que o sacrifício
espiritual dos fiéis se consuma em união com o
sacrifício de Cristo. Mediador único, que é oferecido na
Eucaristia de modo incruento e sacramental, pelas mãos
deles, em nome de toda a Igreja, até quando o mesmo
Senhor voltar»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 2: AAS 58 (1966) 993).
1370. À oblação de Cristo unem-se não só os membros que
estão ainda neste mundo, mas também os que já estão
na glória do céu: é em comunhão com a santíssima
Virgem Maria e fazendo memória d'Ela, assim como de
todos os santos e de todas as santas, que a Igreja
oferece o sacrifício eucarístico. Na Eucaristia, a
Igreja, com Maria, está como que ao pé da cruz, unida à
oblação e à intercessão de Cristo.
1371. O sacrifício eucarístico é também oferecido
pelos fiéis defuntos, «que morreram em Cristo e não
estão ainda de todo purificados»
(Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae
Sacrificio, c. 2: DS 1743),
para que possam entrar na luz e na paz de Cristo:
- «Enterrai este corpo não importa onde! Não vos dê isso
qualquer cuidado! Tudo o que vos peço é que vos lembreis
de mim diante do altar do Senhor, onde quer que
estejais»
(Santo Agostinho, Confissões 9, II, 27: CCL
27, 149 (PL 32, 775): palavras de Santa Mônica,
antes de morrer, a Santo Agostinho e ao seu irmão).
- «Depois [na anáfora], nós rezamos pelos santos Padres
e Bispos falecidos, e em geral por todos aqueles que
morreram antes de nós, certos de que isso será de grande
proveito para as almas em favor das quais tal súplica se
faz, enquanto está presente a vítima santa e temível
[...]. Apresentando a Deus as nossas súplicas pelos que
morreram, tenham embora sido pecadores, nós [...]
apresentamos Cristo imolado pelos nossos pecados,
tornando assim propício, para eles e para nós, o Deus
que é amigo dos homens»
(São Cirilo de Jerusalém, Catecheses mystagogicae 5,
9-10: SC 126, 158-160 (PG. 30, 1116-1117)).
1372. Santo Agostinho resumiu admiravelmente esta
doutrina que nos incita a uma participação cada vez mais
perfeita no sacrifício do nosso Redentor que celebramos
na Eucaristia:
- «toda esta cidade resgatada, ou seja, a assembleia
e sociedade dos santos, é oferecida a Deus como um
sacrifício universal pelo Sumo-Sacerdote que, sob a
forma de servo, foi ao ponto de se oferecer por nós na
sua paixão, para fazer de nós corpo duma tal Cabeça
[...] Tal é o sacrifício dos cristãos: "nós que somos
muitos, formamos em Cristo um só corpo" (Rm. 12, 5).
E este sacrifício, a Igreja não cessa de o renovar no
sacramento do altar bem conhecido dos fiéis, em que lhe
é mostrado que ela própria é oferecida naquilo que
oferece»
(Santo Agostinho, De Civitate Dei 10, 6: CSEL
40/1, 456 (PL 41, 284)).
A PRESENÇA DE CRISTO PELO PODER DA SUA PALAVRA E DO
ESPÍRITO SANTO
1373. «Jesus Cristo, que morreu, que ressuscitou, que
está à direita de Deus, que intercede por nós» (Rm.
8, 34), está presente na sua Igreja de múltiplos modos
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 53):
na sua Palavra, na oração da sua Igreja, «onde dois
ou três estão reunidos em Meu nome» (Mt. 18, 20),
nos pobres, nos doentes, nos prisioneiros
(Cf. Mt. 25, 31-46), nos seus sacramentos, dos quais é o
autor, no sacrifício da missa e na pessoa do ministro.
Mas está presente «sobretudo sob as espécies
eucarísticas»
(II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 7: AAS 56 (1964) 100-101).
1374. O modo da presença de Cristo sob as espécies
eucarísticas é único. Ele eleva a Eucaristia acima de
todos os sacramentos e faz dela «como que a perfeição
da vida espiritual e o fim para que tendem todos os
sacramentos»
(São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 73,
a. 3, c: Ed. Leon. 12, 140).
No santíssimo sacramento da Eucaristia estão
«contidos, verdadeira, real e substancialmente, o corpo
e o sangue, conjuntamente com a alma e a divindade de
nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, Cristo
completo»
(Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de s.s.
Eucharistia, can. 1: Ds 1651).
«Esta presença chama-se "real", não a título
exclusivo como se as outras presenças não fossem
"reais", mas por excelência, porque é substancial, e
porque por ela se torna presente Cristo completo, Deus e
homem»
(Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965)
764).
1375. É pela conversão do pão e do vinho no Corpo
e no Sangue de Cristo que Ele se torna presente neste
sacramento. Os Padres da Igreja proclamaram com firmeza
a fé da mesma Igreja na eficácia da Palavra de Cristo e
da ação do Espírito Santo, para operar esta conversão.
Assim, São João Crisóstomo declara:
- «não é o homem que faz com que as coisas oferecidas se
tomem Corpo e Sangue de Cristo, mas o próprio Cristo,
que foi crucificado por nós. O sacerdote, figura de
Cristo, pronuncia estas palavras, mas a sua eficácia e a
graça são de Deus. Isto é o Meu Corpo, diz ele. Esta
palavra transforma as coisas oferecidas»
(São João Crisóstomo, De proditione Iudae homilia
1, 6: PG 49, 380).
- E Santo Ambrósio diz a respeito da mesma conversão:
- estejamos bem convencidos de que «isto não é o que
a natureza formou, ruas o que a bênção consagrou, e de
que a força da bênção ultrapassa a da natureza, porque
pela bênção a própria natureza é mudada»
(Santo Ambrósio, De mysteriis 9, 50: CSEL 73, 110
(PL 16, 405)).
«A Palavra de Cristo, que pôde fazer do nada o que
não existia, não havia de poder mudar coisas existentes
no que elas ainda não eram? Porque não é menos dar às
coisas a sua natureza original do que mudá-la»
(Ibid. 9, 52: CSEL 73, 112 (PL 16, 407)).
1376. O Concílio de Trento resume a fé católica
declarando: «porque Cristo, nosso Redentor, disse que
o que Ele oferecia sob a espécie do pão era
verdadeiramente o seu Corpo, sempre na Igreja se teve
esta convicção que o sagrado Concílio de novo declara:
pela consagração do pão e do vinho opera-se a conversão
de toda a substância do pão na substância do Corpo de
Cristo nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na
substância do seu Sangue; a esta mudança, a Igreja
católica chama, de modo conveniente e apropriado,
transubstanciação»
(Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss.
Eucharista, c. 4: DS 1642).
1377. A presença eucarística de Cristo começa no momento
da consagração e dura enquanto as espécies eucarísticas
subsistirem. Cristo está presente todo em cada uma das
espécies e todo em cada uma das suas partes, de maneira
que a fração do pão não divide Cristo
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss.
Eucharista. c. 3: DS 1641).
1378. O culto da Eucaristia. Na liturgia da
Missa, nós exprimimos a nossa fé na presença real de
Cristo sob as espécies do pão e do vinho, entre outras
maneiras, ajoelhando ou inclinando-nos profundamente em
sinal de adoração do Senhor. «A Igreja Católica
sempre prestou e continua a prestar este culto de
adoração que é devido ao sacramento da Eucaristia, não
só durante a missa, mas também fora da sua celebração:
conservando com o maior cuidado as Hóstias Consagradas,
apresentando-as aos fiéis para que solenemente as
venerem, e levando-as em procissão»
(Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965)
769).
1379. A sagrada Reserva (Sacrário) era, ao princípio,
destinada a guardar, de maneira digna, a Eucaristia,
para poder ser levada aos doentes e ausentes, fora da
missa. Pelo aprofundamento da fé na presença real de
Cristo na sua Eucaristia, a Igreja tomou consciência do
sentido da adoração silenciosa do Senhor, presente sob
as espécies eucarísticas, por isso que o sacrário deve
ser colocado num lugar particularmente digno da igreja;
deve ser construído de tal modo que sublinhe e manifeste
a verdade da presença real de Cristo no Santíssimo
Sacramento.
1380. É de suma conveniência que Cristo tenha querido
ficar presente à sua Igreja deste modo único. Uma vez
que estava para deixar os seus sob forma visível, Cristo
quis dar-nos a sua presença sacramental; e visto que ia
sofrer na cruz para nos salvar, quis que tivéssemos o
memorial do amor com que nos amou «até ao fim»
(Jo. 13, 1), até ao dom da própria vida. Com efeito, na
sua presença eucarística, Ele fica misteriosamente no
meio de nós, como Aquele que nos amou e se entregou por
nós
(Cf. Gl. 2, 20),
e permanece sob os sinais que exprimem e comunicam este
amor:
- «a Igreja e o mundo têm grande necessidade do culto
eucarístico. Jesus espera-nos neste sacramento do amor.
Não regateemos o tempo para estar com Ele na adoração,
na contemplação cheia de fé e disposta a reparar as
faltas graves e os pecados do mundo. Que a nossa
adoração não cesse jamais»
(João Paulo II, Ep. Dominicae Cenae, 3: AAS 72
(1980) 119; cf. Enchiridion Vaticanum 7, 177).
1381. «A presença do verdadeiro corpo e do verdadeiro
sangue de Cristo neste sacramento, "não a apreendemos
pelos sentidos, diz São Tomás, mas só pela fé, que se
apoia na autoridade de Deus". É por isso que, comentando
o texto de São Lucas 22, 19 "isto é o Meu Corpo que será
entregue por vós", São Cirilo de Alexandria declara:
"não vás agora perguntar-te se isso é verdade; mas
acolhe com fé as palavras do Senhor, porque Ele, que é a
verdade, não mente"»
(Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965)
757; cf. São Tomás de Aquino, Summa theologiae,
3. q. 75, a. 1. c: Ed. Leon. 12, 156; São Cirilo de
Alexandria, Commentarius in Lucam 22, 19: PG 72,
912):
«Adoro te devote, latens Deitas,
Quae sub his figuris vere latitas:
Tibi se cor meum totem subjicit,
Quica, Te contemplans, totem deficit. |
Adoro-te com devoção, ó Deus que te
escondes,
Que sob estas figuras de verdade te ocultas:
A ti meu coração se submete inteiramente
Porque, ao contemplar-te, desfalece por
completo. |
Visus, tactus, gustus in Te fallitur
Sed auditu solo tutu creditur:
Credo quidquid dixit Dei Filius:
Nil hoc Veritatis verbo verius»
(AHMA 50, 589). |
Visão, tato e paladar em ti falham,
Apenas ouvindo se crê com segurança:
Creio em tudo o que disse o Filho de Deus:
Nada mais verdadeiro que esta palavra da
Verdade. |
VI. O banquete pascal
1382. A Missa é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o
memorial sacrificial em que se perpetua o sacrifício da
cruz e o banquete sagrado da comunhão do Corpo e Sangue
do Senhor. Mas a celebração do sacrifício eucarístico
está toda orientada para a união íntima dos fiéis com
Cristo pela comunhão. Comungar é receber o próprio
Cristo, que se ofereceu por nós.
1383. O altar, à volta do qual a Igreja se reúne
na celebração da Eucaristia, representa os dois aspectos
dum mesmo mistério: o altar do sacrifício e a mesa do
Senhor, e isto tanto mais que o altar cristão é o
símbolo do próprio Cristo, presente no meio da
assembleia dos seus fiéis, ao mesmo tempo como vítima
oferecida para a nossa reconciliação e como alimento
celeste que se nos dá. «Com efeito, o que é o altar
de Cristo senão a imagem do corpo de Cristo»? -
Pergunta Santo Ambrósio
(Santo Ambrósio, De Sacramentis, 5, 7:
CSEL 73, 61 (PL 16, 447));
e noutro passo: «o altar representa o corpo [de
Cristo], e o corpo de Cristo está sobre o altar»
(Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4, 7: CSEL73. 49
(PL 16. 437)).
A liturgia exprime esta unidade do sacrifício e da
comunhão em numerosas orações. Assim, a Igreja de Roma
reza na sua anáfora:
- «humildemente Vos suplicamos, Deus todo-poderoso,
que está nossa oferenda seja apresentada pelo vosso
santo Anjo no altar celeste, diante da vossa divina
majestade, para que todos nós, participando deste altar
pela comunhão do santíssimo corpo e sangue do vosso
Filho, alcancemos a plenitude das bênçãos e graças do
céu»»
(Oração Eucarística I ou Cânone Romano, 96:
Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanas 1970). p.453 [Missal Romano, Gráfica de
Coimbra 1992. 521])
«TOMAI TODOS E COMEI»:
A COMUNHÃO
1384. O Senhor dirige-nos um convite insistente a que O
recebamos no sacramento da Eucaristia: «em verdade,
em verdade vos digo: se não comerdes a Carne do Filho do
Homem e não beberdes o seu Sangue, não tereis a vida em
vós» (Jo. 6, 53).
1385. Para responder a este convite, devemos
preparar-nos para este momento tão grande e santo.
São Paulo exorta a um exame de consciência: «quem
comer o pão ou beber do cálice do Senhor indignamente
será réu do Corpo e do Sangue do Senhor. Examine-se,
pois, cada qual a si mesmo e então coma desse pão e beba
deste cálice; pois quem come e bebe, sem discernir o
corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação»
(1ª Cor 11, 27-29). Aquele que tiver consciência
dum pecado grave deve receber o sacramento da
Reconciliação antes de se aproximar da Comunhão.
1386. Perante a grandeza deste sacramento, o fiel só
pode retomar humildemente e com ardente fé a palavra do
centurião
(Cf. Mt 8, 8)
: «domine, non sum dignus, ut intres sub tectum meum,
sed tantum dic verbum, et sanabitur anima mea – Senhor,
eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas
dizei uma [só] palavra e serei salvo»
(Rito da Comunhão. 133: Missale Romanum,
editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.474
[Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992, 546)). E na divina liturgia de São João
Crisóstomo, os fiéis oram no mesmo Espírito:
- «faz-me comungar hoje, ó Filho de Deus, na tua ceia
mística. Porque eu não revelarei o segredo aos teus
inimigos, nem te darei o beijo de Judas. Mas, como o
ladrão, eu te suplico: lembra-Te de mim, Senhor, no teu
Reino»
(Liturgia Bizantina. Anáfora de São João Crisóstomo,
Prece antes da Comunhão: F. E. Brightman,
Liturgies Eastern and Western (Oxford 1896) p. 394
(PG 63, 920)).
1387. Para se prepararem convenientemente para receber
este sacramento, os fiéis devem observar o jejum
prescrito na sua Igreja
(Cf. CIC can. 919).
A atitude corporal (gestos, traje) deve traduzir o
respeito, a solenidade, a alegria deste momento em que
Cristo Se torna nosso hóspede.
1388. É conforme ao próprio sentido da Eucaristia que os
fiéis, se tiverem as disposições requeridas
(Cf. CIC can. 916-917: AAS 75 (1983 II),
pp. 165-166),
recebam a Comunhão quando participam na missa
(Os fiéis, no mesmo dia. só podem receber a ss.
Eucaristia uma segunda vez. Comissão Pontifícia para a
Interpretação Autêntica do Código de Direito Canónico,
Responsa ad proposita dubia, 1: AAS 76 (1984)
746):
«recomenda-se vivamente aquela mais perfeita
participação na missa em que os fiéis, depois da
comunhão do sacerdote, recebem, do mesmo sacrifício, o
corpo do Senhor»
(II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 55: AAS 56 (1964) 115).
1389. A Igreja impõe aos fiéis a obrigação de
«participar na divina liturgia nos domingos e dias de
festa»
(Cf. Decr. Ecclesiarum Orientalium, 15: AAS 57
(1965) 81) e de receber a Eucaristia ao menos uma vez
em cada ano, se possível no tempo pascal
(Cf. CIC can. 920) preparados pelo sacramento da
Reconciliação. Mas recomenda-lhes vivamente que recebam
a santa Eucaristia aos domingos e dias de festa, ou
ainda mais vezes, mesmo todos os dias.
1390. Graças à presença sacramental de Cristo sob cada
uma das espécies, a comunhão apenas sob a espécie de pão
permite receber todo o fruto de graça da Eucaristia. Por
razões pastorais, esta maneira de comungar
estabeleceu-se legitimamente como a mais habitual no
rito latino. «A sagrada Comunhão tem uma forma mais
plena, enquanto sinal, quando é feita sob as duas
espécies. Com efeito, nesta forma manifesta-se mais
perfeitamente o sinal do banquete eucarístico»
(Instrução geral do Missal Romano, 240:
Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanis 1970), p.68 [Missal Romano, Gráfica de
Coimbra 1992, 51]).
É a forma habitual de comungar, nos ritos orientais.
OS FRUTOS DA COMUNHÃO
1391. A Comunhão aumenta a nossa união com Cristo.
Receber a Eucaristia na comunhão traz consigo, como
fruto principal, a união íntima com Cristo Jesus. De
fato, o Senhor diz: «quem come a minha Carne e bebe o
meu Sangue permanece em Mim e Eu nele» (Jo. 6, 56).
A vida em Cristo tem o seu fundamento no banquete
eucarístico: «assim como o Pai, que vive, Me enviou,
e Eu vivo pelo Pai, também o que Me come viverá por Mim»
(Jo. 6, 57):
- «quando, nas festas do Senhor, os fiéis recebem o
Corpo do Filho, proclamam uns aos outros a boa-nova de
que lhes foram dadas as arras da vida, como quando o
anjo disse a Maria de Magdala: "Cristo ressuscitou!".
Eis que também agora a vida e a ressurreição são
conferidas àquele que recebe Cristo»
(Fanqîth. Breviarium iuxta ritum Ecclesiae
Antiochenae Syrorum, v. 1 (Mossul 1886) p.
237 a-b).
1392. O que o alimento material produz na nossa vida
corporal, realiza-o a Comunhão, de modo admirável, na
nossa vida espiritual. A comunhão da carne de Cristo
Ressuscitado, «vivificada pelo Espírito Santo e
vivificante»
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr.
Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966)997),
conserva, aumenta e renova a vida da graça recebida no
Batismo. Este crescimento da vida cristã precisa de ser
alimentado pela Comunhão eucarística, pão da nossa
peregrinação, até à hora da morte, em que nos será dado
como viático.
1393. A Comunhão afasta-nos do pecado. O
corpo de Cristo que recebemos na Comunhão é «entregue
por nós» e o sangue que nós bebemos é «derramado
pela multidão, para remissão dos pecados». É por
isso que a Eucaristia não pode unir-nos a Cristo sem nos
purificar, ao mesmo tempo, dos pecados cometidos, e nos
preservar dos pecados futuros:
- «sempre que O recebemos, anunciamos a morte do
Senhor
(Cf. 1ª Cor. 11, 26).
Se nós anunciamos a morte do Senhor, anunciamos a
remissão dos pecados. Se, de cada vez que o seu Sangue é
derramado, é derramado para remissão dos pecados, eu
devo recebê-lo sempre, para que sempre Ele perdoe os
meus pecados. Eu que peco sempre, devo ter sempre um
remédio»
(Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4. 28: CSEL 73,
57-58 (PL 16, 446)).
1394. Tal como o alimento corporal serve para restaurar
as forças perdidas, assim também a Eucaristia fortifica
a caridade que, na vida quotidiana, tende a
enfraquecer-se; e esta caridade vivificada apaga os
pecados veniais
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª. Decretum de ss.
Eucharista, c. 2: DS 1638).
Dando-se a nós, Cristo reaviva o nosso amor e
torna-nos capazes de quebrar as ligações desordenadas às
criaturas e de nos radicarmos n'Ele.
«Uma vez que Cristo morreu por nós por amor, quando nós
fazemos memória da sua morte no momento do sacrifício,
pedimos que esse amor nos seja dado pela vinda do
Espírito Santo; suplicamos humildemente que, em virtude
desse amor pelo qual Cristo quis morrer por nós, também
nós, recebendo a graça do Espírito Santo, possamos
considerar o mundo como crucificado para nós e sermos
nós próprios crucificados para o mundo; [...] tendo
recebido o dom do amor, morramos para o pecado e vivamos
para Deus»
(São Fulgêncio de Ruspas, Contra gesta Fabiani 28,
17: CCL 91A, 813-814 (PL 65, 789)).
1395. Pela mesma caridade que acende em nós, a
Eucaristia preserva-nos dos pecados mortais
futuros. Quanto mais participarmos na vida de Cristo e
progredirmos na sua amizade, mais difícil nos será
romper com Ele pelo pecado mortal. A Eucaristia não está
ordenada ao perdão dos pecados mortais. Isso é próprio
do sacramento da Reconciliação. O que é próprio da
Eucaristia é ser o sacramento daqueles que estão na
plena comunhão da Igreja.
1396. A unidade do corpo Místico: a Eucaristia faz a
Igreja. Os que recebem a Eucaristia ficam mais
estreitamente unidos a Cristo. Por isso mesmo, Cristo
une todos os fiéis num só corpo: a Igreja. A Comunhão
renova, fortalece e aprofunda esta incorporação na
Igreja já realizada pelo Batismo. No Batismo fomos
chamados a formar um só corpo
(Cf. 1ª Cor. 12, 13).
A Eucaristia realiza esta vocação: «o cálice da
bênção que abençoamos, não é comunhão com o Sangue de
Cristo? O pão que partimos não é comunhão com o Corpo de
Cristo? Uma vez que há um único pão, nós, embora muitos,
somos um só corpo, porque participamos desse único pão»
(1ª Cor. 10, 16-17):
- «se sois o corpo de Cristo e seus membros, é o vosso
sacramento que está colocado sobre a mesa do Senhor, é o
vosso sacramento que recebeis. Vós respondeis ”Amém”
[“Sim, é verdade”!] àquilo que recebeis e, ao
responder, o subscreveis. Tu ouves esta palavra:
«o Corpo de Cristo»; e respondes: “Amém”, Então,
sê um membro de Cristo, para que o teu “Amém” seja
verdadeiro»
(Santo Agostinho, Sermão 272: PL 38, 1247).
1397. A Eucaristia compromete-nos com os pobres:
para receber, na verdade, o Corpo e o Sangue de Cristo
entregue por nós, temos de reconhecer Cristo nos mais
pobres, seus irmãos
(Cf. Mt. 25, 40):
- «saboreaste o Sangue do Senhor e não reconheces
sequer o teu irmão. Desonras esta mesa, se não julgas
digno de partilhar o teu alimento aquele que foi julgado
digno de tomar parte nesta mesa. Deus libertou-te de
todos os teus pecados e chamou-te para ela; e tu nem
então te tornaste mais misericordioso»
(São João Crisóstomo, In epistulam I ad Corinthios,
homilia 27. 5: PG 61, 230).
1398. A Eucaristia e a unidade dos cristãos.
Perante a grandeza deste mistério, Santo Agostinho
exclama: «o sacramentum pietatis! O signum unitatis!
O vinculum caritatis!
(Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus
26, 13: CCL 36. 266 (PL 35, 1613): cf. II Concílio
do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium,
47: AAS 56 (1964) 113)
- Ó sacramento da piedade, ó sinal da unidade, ó vínculo
da caridade»!
Quanto mais dolorosas se fazem sentir as divisões da
Igreja que rompem a comum participação na mesa do
Senhor, tanto mais prementes são as orações que fazemos
ao Senhor para que voltem os dias da unidade completa de
todos os que creem n' Ele.
1399. As Igrejas orientais que não estão em comunhão
plena com a Igreja Católica celebram a Eucaristia com um
grande amor. «essas Igrejas, embora separadas, têm
verdadeiros sacramentos; e principalmente, em virtude da
sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, por
meio dos quais continuam unidos a nós por vínculos
estreitíssimos»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102). Portanto, «uma certa comunhão in
sacris é não só possível, mas até aconselhável em
circunstâncias oportunas e com aprovação da autoridade
eclesiástica»
(II Concílio do Vaticano, Decr, Unitatis
redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102: ef. CIC
can.844, § 3).
1400. As comunidades eclesiais saídas da Reforma,
separadas da Igreja Católica, «não [conservaram] a
genuína e íntegra substância do mistério eucarístico,
sobretudo por causa da falta do sacramento da Ordem»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106). É por esse motivo que a intercomunhão
eucarística com estas comunidades não é possível para a
Igreja Católica. No entanto, estas comunidades
eclesiais, «quando na santa ceia fazem memória da
morte e ressurreição do Senhor, professam que a vida é
significada na comunhão com Cristo e esperam a sua vinda
gloriosa»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106).
1401. Se urgir uma grave necessidade, segundo o juízo do
Ordinário os ministros católicos podem ministrar os
sacramentos (Eucaristia, Penitência, Unção dos Enfermos)
aos outros cristãos que não estão em plena comunhão com
a Igreja Católica, mas que os pedem por sua livre
vontade: requer-se, nesse caso, que manifestem a fé
católica em relação a estes sacramentos e que se
encontrem nas devidas disposições
(Cf. CIC can. 844. § 4).
VII. A Eucaristia - «Penhor da futura glória»
1402. Numa antiga oração, a Igreja aclama assim o
mistério da Eucaristia: «o sacrum convivium in quo
Christus sumitur: recolitur memoria passionis eius; mens
impletur gratia et futurae gloriae nobis pignus datur –
Ó sagrado banquete, em que se recebe Cristo e se
comemora a sua paixão, em que a alma se enche de graça e
nos é dado o penhor da futura glória»
(Na solenidade do santíssimo corpo e sangue de
Cristo, Antífona do «Magnificat» das Vésperas II:
Liturgia Horarum, editio typica, v. 3 (Typis
Polyglottis Vaticanis 1973) p. 502 [Liturgia das
Horas. v. 3 (Gráfica de Coimbra 1983) p. 621]).
Se a Eucaristia é o memorial da Páscoa da Senhor, se
pela nossa comunhão no altar somos cumulados da
«plenitude das bênçãos se graças do céu»
(Oração Eucarística I ou Cânone Romano. 96:
Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanis 1970), p.453 [Missal Romano. Gráfica de
Coimbra 1992, 521]),
a Eucaristia é também a antecipação da glória celeste.
1403. Na última ceia, o próprio Senhor chamou a atenção
dos seus discípulos para a consumação da Páscoa no Reino
de Deus: «Eu vos digo que não voltarei a beber deste
fruto da videira, até o dia em que beberei convosco o
vinho novo no Reino do meu Pai» (Mt. 26, 29)
(247. Cf. Lc 22, 18: Mc 14. 25).
Sempre que a Igreja celebra a Eucaristia, lembra-se
desta promessa, e o seu olhar volta-se para «Aquele
que vem» (Ap. 1, 4). Na sua oração, ela clama pela
sua vinda: «Marana tha» (1ª Cor. 16, 22),
«Vem, Senhor Jesus»! (Ap. 22, 20), «que a Tua
graça venha e que este mundo passe»!
(Didaké 10, 6: SC 248, 180 (Funk, Patres
apostolici 1, 24)).
1404. A Igreja sabe que, desde já, o Senhor vem na sua
Eucaristia e que está ali, no meio de nós. Mas esta
presença é velada. E é por isso que nós celebramos a
Eucaristia «expectantes beatam spem et adventum
Salvatoris nostri Jesu Christi - enquanto aguardamos a
feliz esperança e a vinda de Jesus Cristo nosso
Salvador»
(Rito de Comunhão, 126 [Embolismo depois do
Pai Nosso]: Missale Romanum, editio typica
(Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.472 [a tradução
oficial portuguesa difere um pouco: «enquanto esperamos
a vinda gloriosa de Jesus Cristo nosso Salvador»:
Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 5451: cf.
Tt 2, 13),
pedindo a graça de ser acolhidos «com bondade no
vosso Reino, onde também nós esperamos ser recebidos,
para vivermos [...] eternamente na vossa glória, quando
enxugardes todas as lágrimas dos nossos olhos; e,
vendo-Vos tal como sois, Senhor nosso Deus, seremos para
sempre semelhantes a Vós e cantaremos sem fim os vossos
louvores, por Jesus Cristo nosso Senhor»
(Oração Eucarística III, 116: Missale Romanum,
editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970),
p. 465 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992,
535]).
1405. Desta grande confiança - dos novos céus e
da nova terra, onde habitará a justiça
(Cf. 2ª Pe. 3, 13)
- não temos garantia mais segura nem sinal mais
manifesto do que a Eucaristia. Com efeito, cada vez que
se celebra este mistério, «realiza-se a obra da nossa
redenção»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6)
e nós «partimos o mesmo pão, que é remédio de
imortalidade, antídoto para não morrer, mas viver em
Jesus Cristo para sempre»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6).
Resumindo:
1406. Jesus diz: «Eu sou o pão vivo descido do céu.
Quem comer deste pão viverá eternamente [...] Quem come
a minha Carne e bebe o meu Sangue tem a vida eterna
[...], permanece em Mim, e Eu nele» (Jo. 6,
51.54.56).
1407. A Eucaristia é o coração e o cume da vida da
Igreja, porque nela Cristo associa a sua Igreja e todos
os seus membros ao seu sacrifício de louvor e de ação de
graças, oferecido ao Pai uma vez por todas na cruz; por
este sacrifício, Ele derrama as graças da salvação sobre
o seu corpo, que é a Igreja.
1408. A celebração eucarística inclui sempre: a
proclamação da Palavra de Deus, a ação de graças a Deus
Pai por todos os seus benefícios, sobretudo pelo dom do
seu Filho, a consagração do pão e do vinho e a
participação no banquete litúrgico pela recepção do
corpo e do sangue do Senhor Estes elementos constituem
um só e mesmo ato de culto.
1409. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo,
isto é, da obra da salvação realizada pela vida, morte e
ressurreição de Cristo, obra tornada presente pela ação
litúrgica.
1410. É o próprio Cristo, sumo e eterno sacerdote da
Nova Aliança, que, agindo pelo ministério dos
sacerdotes, oferece o sacrifício eucarístico. E é
ainda o mesmo Cristo, realmente presente sob as espécies
do pão e do vinho, que é a oferenda do sacrifício
eucarístico.
1411. Só os Sacerdotes validamente ordenados podem
presidir à Eucaristia e consagrar o pão e o vinho, para
que se tornem o Corpo e o Sangue do Senhor:
1412. Os sinais essenciais do sacramento eucarístico
são o pão de trigo e o vinho da videira, sobre os
quais é invocada a bênção do Espírito Santo, e o
sacerdote pronuncia as palavras da consagração ditas por
Jesus durante a última ceia: «isto é o meu Corpo, que
será entregue por vós... Este é o cálice do meu
Sangue...».
1413. Pela consagração, opera-se a transubstanciação
do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Cristo. Sob as
espécies consagradas do pão e do vinho, o próprio
Cristo, vivo e glorioso, está presente de modo
verdadeiro, real e substancial, com o seu Corpo e o seu
Sangue, com a sua alma e a sua divindade
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss.
Eucharistae. c. 3: DS 1640; Ibid., can.
1: DS 1651).
1414. Enquanto sacrifício, a Eucaristia é oferecida
também em reparação dos pecados dos vivos e dos defuntos
e para obter de Deus benefícios espirituais ou
temporais.
1415. Aquele que quiser receber Cristo na Comunhão
eucarística deve encontrar-se em estado de graça. Se
alguém tiver consciência de ter pecado mortalmente, não
deve aproximar-se da Eucaristia sem primeiro ter
recebido a absolvição no sacramento da Penitência.
1416. A sagrada Comunhão do Corpo e Sangue de Cristo
aumenta a união do comungante com o Senhor perdoa-lhe os
pecados veniais e preserva-o dos pecados graves.
E uma vez que os laços da caridade entre o comungante e
Cristo são reforçados, a recepção deste sacramento
reforça a unidade da Igreja, corpo Místico de Cristo.
1417. A Igreja recomenda vivamente aos fiéis que
recebam a sagrada Comunhão quando participam na
celebração da Eucaristia; e impõe-lhes a obrigação de o
fazerem ao menos uma vez por ano.
1418. Uma vez que Cristo em pessoa está presente no
Sacramento do Altar; devemos honrá-Lo com culto de
adoração. «A visita ao Santíssimo Sacramento é
uma prova de gratidão, um sinal de amor e um dever de
adoração para com Cristo nosso Senhor»
(Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965)
771).
1419. Tendo passado deste mundo para o Pai, Cristo
deixou-nos na Eucaristia o penhor da glória junto d'Ele:
a participação no santo sacrifício identifica-nos com o
seu coração, sustenta as nossas forças ao longo da
peregrinação desta vida, faz-nos desejar a vida eterna e
desde já nos une à Igreja do céu, à Santíssima Virgem e
a todos os santos.
OS SACRAMENTOS DE CURA
1420. Pelos sacramentos da iniciação cristã, o homem
recebe a vida nova de Cristo. Ora, esta vida, nós
trazemo-la «em vasos de barro». Por enquanto, ela
está ainda «oculta com Cristo em Deus» (Cl. 3,
3). Vivemos ainda na «nossa morada terrena»
(Cf. 2ª Cor. 5, 1),
sujeita ao sofrimento à doença e à morte. A vida nova de
filhos de Deus pode ser enfraquecida e até perdida pelo
pecado.
1421. O Senhor Jesus Cristo, médico das nossas almas e
dos nossos corpos, que perdoou os pecados ao paralítico
e lhe restituiu a saúde do corpo
(Cf. Mc. 2, 1-12)
quis que a sua Igreja continuasse, com a força do
Espírito Santo, a sua obra de cura e de salvação, mesmo
para com os seus próprios membros. É esta a finalidade
dos dois sacramentos de cura: o sacramente da Penitência
e o da Unção dos enfermos.
ARTIGO 4
O SACRAMENTO DA PENITÊNCIA
E DA RECONCILIAÇÃO
1422. «Aqueles que se aproximam do sacramento da
Penitência obtêm da misericórdia de Deus o perdão da
ofensa a Ele feita e, ao mesmo tempo, são reconciliados
com a Igreja, que tinham ferido com o seu pecado, a
qual, pela caridade, exemplo e oração, trabalha pela sua
conversão»
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 11 : AAS 57 (1965)
15).
I. Como se chama este sacramento?
1423. É chamado sacramento da conversão, porque
realiza sacramentalmente o apelo de Jesus à conversão
(Cf. Mc. 1, 15)
e o esforço de regressar à casa do Pai
(Cf. Lc. 15, 18)
da qual o pecador se afastou pelo pecado.
- É chamado sacramento da Penitência, porque
consagra uma caminhada pessoal e eclesial de conversão,
de arrependimento e de satisfação por parte do cristão
pecador.
1424. É chamado sacramento da confissão, porque o
reconhecimento, a confissão dos pecados perante o
Sacerdote é um elemento essencial deste sacramento. Num
sentido profundo, este sacramento é também uma
«confissão», reconhecimento e louvor da santidade de
Deus e da sua misericórdia para com o homem pecador.
- E chamado sacramento do perdão, porque, pela
absolvição sacramental do sacerdote. Deus concede ao
penitente «o perdão e a paz» (Ordo
Paenitentiae.
46.55 (TypisPolyglottis Vaticanis 1974) p. 27. 37 [Celebração
da Penitência, 46.55 (Coimbra. Gráfica de Coimbra —
Conferência Episcopal Portuguesa, 1997) p. 47. 65]).
- E chamado sacramento da Reconciliação, porque
dá ao pecador o amor de Deus que reconcilia:
«deixai-vos reconciliar com Deus» (2ª Cor. 5,
20). Aquele que vive do amor misericordioso de Deus está
pronto para responder ao apelo do Senhor: «vai
primeiro reconciliar-te com teu irmão» (Mt. 5,
24).
II. Porquê, um sacramento de Reconciliação depois do
Batismo?
1425. «Vós fostes lavados, fostes santificados,
fostes justificados pelo nome do Senhor Jesus Cristo e
pelo Espírito do nosso Deus» (1ª Cor. 6,
11). Precisamos de tomar consciência da grandeza do
dom de Deus que nos foi concedido nos sacramentos da
iniciação cristã, para nos apercebermos de até que ponto
o pecado é algo de inadmissível para aquele que foi
revestido de Cristo
(Cf. Gl. 3, 27).
Mas o apóstolo São João diz também: «se dissermos que
não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade
não está em nós» (1ª Jo. 1, 8). E o próprio
Senhor nos ensinou a rezar: «perdoai-nos as nossas
ofensas» (Lc, 11, 4), relacionando o perdão mútuo
das nossas ofensas com o perdão que Deus concederá aos
nossos pecados.
1426. A conversão a Cristo, o novo nascimento do
Batismo, o dom do Espírito Santo, o corpo e sangue de
Cristo recebidos em alimento, tornaram-nos «santos e
imaculados na sua presença» (Ef. 1, 4), tal
como a própria Igreja, esposa de Cristo, é «santa e
imaculada na sua presença» (Ef. 5, 27). No
entanto, a vida nova recebida na iniciação cristã não
suprimiu a fragilidade e a fraqueza da natureza humana,
nem a inclinação para o pecado, a que a tradição chama
concupiscência, a qual persiste nos batizados, a
fim de que prestem as suas provas no combate da vida
cristã, ajudados pela graça de Cristo
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 5ª, Decretum de
peccato originali, can. 5: DS 1515).
Este combate é o da conversão, em vista da
santidade e da vida eterna, a que o Senhor não se cansa
de nos chamar
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de
iustificatione, c. 16: DS 1545; II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 40: AAS 57
(1965) 44-45).
III. A conversão dos batizados
1427. Jesus chama à conversão. Tal apelo é parte
essencial do anúncio do Reino: «o tempo chegou ao seu
termo, o Reino de Deus está próximo: convertei-vos e
acreditai na boa-nova» (Mc. 1, 15). Na pregação da
Igreja, este apelo dirige-se, em primeiro lugar, àqueles
que ainda não conhecem Cristo e o seu Evangelho. Por
isso, o Batismo é o momento principal da primeira e
fundamental conversão. É pela fé na boa-nova e pelo
Batismo
(Cf. At. 2, 38)
que se renuncia ao mal e se adquire a salvação, isto é,
a remissão de todos os pecados e o dom da vida nova.
1428. Ora, o apelo de Cristo à conversão continua a
fazer-se ouvir na vida dos cristãos. Esta segunda
conversão é uma tarefa ininterrupta para toda a
Igreja, que «contém pecadores no seu seio» e que
é, «ao mesmo tempo, santa e necessitada de
purificação, prosseguindo constantemente no seu esforço
de penitência e de renovação»
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 8: AAS 57 (1965) 12).
Este esforço de conversão não é somente obra humana. É o
movimento do «coração contrito»
(Cf. Sl. 51, 19)
atraído e movido pela graça
(Cf. Jo. 6, 44: 12, 32)
para responder ao amor misericordioso de Deus, que nos
amou primeiro
(Cf. 1ª Jo. 4, 10).
1429. Testemunho disto mesmo, é a conversão de Pedro,
depois de três vezes ter negado o seu mestre. O olhar
infinitamente misericordioso de Jesus provoca-lhe
lágrimas de arrependimento
(Cf. Lc. 22, 61-62)
e, depois da ressurreição do Senhor, a tríplice
afirmação do seu amor para com Ele
(Cf. Jo. 21, 15-17).
A segunda conversão tem, também, uma dimensão
comunitária. Isto aparece no apelo dirigido pelo
Senhor a uma Igreja inteira: «arrepende-te»! (Ap.
2, 5-16).
Santo Ambrósio diz, a respeito das duas conversões que,
na Igreja, «existem a água e as lágrimas: a água do
Batismo e as lágrimas da Penitência»
IV. A penitência interior
1430. Como já acontecia com os profetas, o apelo de
Jesus à conversão e à penitência não visa primariamente
as obras exteriores, «o saco e a cinza»,
(Santo Ambrósio, Epistula extra collection 1
[41], 12: CSEL 82/3, 152 (PL 16, 1116)
os jejuns e as mortificações, mas a conversão do
coração, a penitência interior: sem ela, as obras de
penitência são estéreis e enganadoras; pelo contrário, a
conversão interior impele à expressão dessa atitude cm
sinais visíveis, gestos e obras de penitência
(Cf. Jl. 2, 12-13: Is. 1,16-17: Mt. 6, 1-8.16-18).
1431. A penitência interior é uma reorientação radical
de toda a vida, um regresso, uma conversão a Deus de
todo o nosso coração, uma rotura com o pecado, uma
aversão ao mal, com repugnância pelas más ações que
cometemos. Ao mesmo tempo, implica o desejo e o
propósito de mudar de vida, com a esperança da
misericórdia divina e a confiança na ajuda da sua graça.
Esta conversão do coração é acompanhada por uma dor e
uma tristeza salutares, a que os Santos Padres chamaram
animi cruciatus (aflição do espírito),
compunctio cordis (compunção do coração)
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1676-1678; Id.
Sess, 14ª, Canones de Paenitentiae, can. 5:
DS1705: Cat Rom. 2, 5, 4, p. 289).
1432. O coração do homem é pesado e endurecido. É
necessário que Deus dê ao homem um coração novo
(Cf. Ez. 36, 26-27).
A conversão é, antes de mais, obra da graça de Deus, a
qual faz com que os nossos corações se voltem para Ele:
«convertei-nos, Senhor, e seremos convertidos»
(Lm, 5, 21). Deus é quem nos dá a coragem de
começar de novo. É ao descobrir a grandeza do amor de
Deus que o nosso coração é abalado pelo horror e pelo
peso do pecado, e começa a ter receio de ofender a Deus
pelo pecado e de estar separado d'Ele. O coração humano
converte-se, ao olhar para Aquele a quem os nossos
pecados trespassaram
(Cf. Jo. 19, 37: Zc. 12, 10).
- «Tenhamos os olhos fixos no Sangue de Cristo e
compreendamos quanto Ele é precioso para o seu Pai, pois
que, derramado para nossa salvação, proporcionou ao
mundo inteiro a graça do arrependimento»
(São Clemente de Roma, Epistula ad Corinthios 7,
4: SC 167, 110 (Funk 1, 108)).
1433. Depois da Páscoa, é o Espírito Santo que
«confunde o mundo no tocante ao pecado», isto é, faz
ver ao mundo o pecado de não ter acreditado n'Aquele que
o Pai enviou
(Cf. Jo. 16, 8-9).
Mas este mesmo Espírito, que desmascara o pecado, é o
Consolador
(Cf. Jo. 15, 26) que dá ao coração do homem a graça do
arrependimento e da conversão
(Cf. At. 2, 36-38: João Paulo II, Enc. Dominum et
vivificantem, 27-48: AAS 78 (1986) 837-868).
V. As múltiplas formas da penitência na vida cristã
1434. A penitência interior do cristão pode ter
expressões muito variadas. A Escritura e os Padres
insistem sobretudo em três formas: o jejum, a oração
e a esmola que exprimem a conversão, em relação a si
mesmo, a Deus e aos outros. A par da purificação radical
operada pelo Batismo ou pelo martírio, citam, como meios
de obter o perdão dos pecados,
(Cf. Tb. 12, 8; Mt. 6, 1-8)
os esforços realizados para se reconciliar com o
próximo, as lágrimas de penitência, a preocupação com a
salvação do próximo
(Cf. Tg. 5, 20),
a intercessão dos santos e a prática da caridade «que
cobre uma multidão de pecados» (1ª Pe. 4, 8).
1435. A conversão realiza-se na vida quotidiana por
gestos de reconciliação, pelo cuidado dos pobres, o
exercício e a defesa da justiça e do direito
(Cf. Am. 5, 24; Is. 1, 17),
pela confissão das próprias faltas aos irmãos, pela
correção fraterna, a revisão de vida, o exame de
consciência, a direção espiritual, a aceitação dos
sofrimentos, a coragem de suportar a perseguição por
amor da justiça. Tomar a sua cruz todos os dias e seguir
Jesus é o caminho mais seguro da penitência
(Cf. Lc. 9, 23).
1436. Eucaristia e Penitência. A conversão e a
penitência quotidianas têm a sua fonte e alimento na
Eucaristia: porque na Eucaristia torna-se presente o
sacrifício de Cristo, que nos reconciliou com Deus: pela
Eucaristia nutrem-se e fortificam-se os que vivem a vida
de Cristo: «ela é o antídoto que nos livra das faltas
quotidianas e nos preserva dos pecados mortais»
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum
de ss. Eucharitia, c. 2: DS 1638).
1437. A leitura da Sagrada Escritura, a oração da
Liturgia das Horas e do Pai Nosso, todo o ato sincero de
culto ou de piedade reavivam em nós o espírito de
conversão e de penitência e contribuem para o perdão dos
nossos pecados.
1438. Os tempos e os dias de penitência no
decorrer do Ano Litúrgico (tempo da Quaresma, cada
sexta-feira em memória da morte do Senhor) são momentos
fortes da prática penitencial da Igreja
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 109-110: AAS 56 (1964) 127; CIC can.
1249-1253: CCEO can. 880-883).
Estes tempos são particularmente apropriados para os
exercícios espirituais, as liturgias penitenciais, as
peregrinações em sinal de penitência, as privações
voluntárias como o jejum e a esmola, a partilha fraterna
(obras caritativas e missionárias).
1439 O dinamismo da conversão e da penitência foi
maravilhosamente descrito por Jesus na parábola do
«filho pródigo», cujo centro é «o pai
misericordioso»
(Cf. Lc, 15, 11-24):
o deslumbramento duma liberdade ilusória e o abandono da
casa paterna: a miséria extrema em que o filho se
encontra depois de delapidada a fortuna: a humilhação
profunda de se ver obrigado a guardar porcos e, pior
ainda, de desejar alimentar-se das bolotas que os porcos
comiam: a reflexão sobre os bens perdidos: o
arrependimento e a decisão de se declarar culpado diante
do pai: o caminho do regresso: o acolhimento generoso
por parte do pai: a alegria do pai: eis alguns dos
aspectos próprios do processo de conversão. O fato novo,
o anel e o banquete festivo são símbolos desta vida
nova, pura, digna, cheia de alegria, que é a vida do
homem que volta para Deus e para o seio da família que é
a Igreja. Só o coração de Cristo, que conhece a
profundidade do amor do seu Pai, pôde revelar-nos o
abismo da sua misericórdia, de um modo tão cheio de
simplicidade e beleza.
VI. O sacramento da Penitência e da Reconciliação
1440. O pecado é, antes de mais, ofensa a Deus, ruptura
da comunhão com Ele. Ao mesmo tempo, é um atentado
contra a comunhão com a Igreja. É por isso que a
conversão traz consigo, ao mesmo tempo, o perdão de Deus
e a reconciliação com a Igreja, o que é expresso e
realizado liturgicamente pelo sacramento da Penitência e
Reconciliação
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15).
SÓ DEUS PERDOA O PECADO
1441. Só Deus perdoa os pecados
(Cf. Mc. 2, 7).
Jesus, porque é Filho de Deus, diz de Si próprio: «o
Filho do Homem tem na terra o poder de perdoar os
pecados» (Mc. 2, 10) e exerce este poder divino:
«os teus pecados são-te perdoados»! (Mc. 2, 5)
(Cf. Lc. 7, 48).
Mais ainda: em virtude da sua autoridade divina, concede
este poder aos homens para que o exerçam em seu nome.
1442. Cristo quis que a sua Igreja fosse, toda ela, na
sua oração, na sua vida e na sua atividade, sinal e
instrumento do perdão e da reconciliação que Ele nos
adquiriu pelo preço do seu sangue. Entretanto, confiou o
exercício do poder de absolvição ao ministério
apostólico. É este que está encarregado do
«ministério da reconciliação» (2ª Cor. 5,
18). O apóstolo é enviado «em nome de Cristo» e
«é o próprio Deus» que, através dele, exorta e
suplica: «deixai-vos reconciliar com Deus» (2ª
Cor. 5, 20).
RECONCILIAÇÃO COM A IGREJA
1443. Durante a sua vida pública. Jesus não somente
perdoou os pecados, como também manifestou o efeito
desse perdão: reintegrou os pecadores perdoados na
comunidade do povo de Deus, da qual o pecado os tinha
afastado ou mesmo excluído.
(Cf. Jo 20, 21-23)
Sinal bem claro disso é o facto de Jesus admitir os
pecadores à sua mesa, e mais ainda: de se sentar à mesa
deles, gesto que exprime ao mesmo tempo, de modo
desconcertante, o perdão de Deus
(Cf. Lc 15),
e o regresso ao seio do povo de Deus
(Cf. Lc. 19, 9).
1444. Ao tornar os Apóstolos participantes do seu
próprio poder de perdoar os pecados, o Senhor dá-lhes
também autoridade para reconciliar os pecadores com a
Igreja. Esta dimensão eclesial do seu ministério
exprime-se, nomeadamente, na palavra solene de Cristo a
Simão Pedro: «dar-te-ei as chaves do Reino dos céus;
tudo o que ligares na terra ficará ligado nos céus, e
tudo o que desligares na terra ficará desligado nos
céus» (Mt. 16, 19). «Este mesmo encargo de ligar
e desligar, conferido a Pedro, foi também atribuído ao
colégio dos Apóstolos unidos à sua cabeça» (Mt
18,18; 28, 16-20)
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 22: AAS 57 (1965) 26).
1445. As palavras ligar e desligar significam:
aquele que vós excluirdes da vossa comunhão, ficará
também excluído da comunhão com Deus; aquele que de novo
receberdes na vossa comunhão, também Deus o acolherá na
sua. A reconciliação com a Igreja é inseparável da
reconciliação com Deus.
O SACRAMENTO DO PERDÃO
1446. Cristo instituiu o sacramento da Penitência para
todos os membros pecadores da sua Igreja, antes de mais
para aqueles que, depois do Batismo, caíram em pecado
grave e assim perderam a graça batismal e feriram a
comunhão eclesial. É a eles que o sacramento da
Penitência oferece uma nova possibilidade de se
converterem e de reencontrarem a graça da justificação.
Os Padres da Igreja apresentam este sacramento como
«a segunda tábua (de salvação), depois do naufrágio que
é a perda da graça»
(Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de
iustificatione, c. 14: DS 1542; cf.
Tertuliano, De Paenitentia 4, 2: CCL 1, 326 (PL
1, 1343)).
1447. No decorrer dos séculos, a forma concreta segundo
a qual a Igreja exerceu este poder recebido do Senhor
variou muito. Durante os primeiros séculos, a
reconciliação dos cristãos que tinham cometido pecados
particularmente graves depois do Batismo (por exemplo: a
idolatria, o homicídio ou o adultério) estava ligada a
uma disciplina muito rigorosa, segundo a qual os
penitentes tinham de fazer penitência pública pelos seus
pecados, muitas vezes durante longos anos, antes de
receberem a reconciliação. A esta «ordem dos
penitentes» (que apenas dizia respeito a certos
pecados graves) só raramente se era admitido e, em
certas regiões, apenas uma vez na vida. Durante século
VII, inspirados pela tradição monástica do Oriente, os
missionários irlandeses trouxeram para a Europa
continental a prática «privada» da penitência que
não exigia a realização pública e prolongada de obras de
penitência, antes de receber a reconciliação com a
Igreja. O sacramento processa-se, a partir de então, dum
modo mais secreto, entre o penitente e o sacerdote. Esta
nova prática previa a possibilidade da repetição e abria
assim o caminho a uma frequência regular deste
sacramento. Permitia integrar, numa só celebração
sacramental, o perdão dos pecados graves e dos pecados
veniais. Nas suas grandes linhas, é esta forma de
penitência que a Igreja tem praticado até aos nossos
dias.
1448. Através das mudanças que a disciplina e a
celebração deste sacramento têm conhecido no decorrer
dos séculos, distingue-se a mesma estrutura fundamental.
Esta inclui dois elementos igualmente essenciais: por um
lado, os atos do homem que se converte sob a ação do
Espírito Santo, a saber, a contrição, a confissão e a
satisfação: por outro, a ação de Deus pela intervenção
da Igreja. A Igreja que, por meio do Bispo e seus
Presbíteros, concede, em nome de Jesus Cristo, o perdão
dos pecados e fixa o modo da satisfação, também reza
pelo pecador e faz penitência com ele. Assim, o pecador
á curado e restabelecido na comunhão eclesial.
1449. A fórmula de absolvição, em uso na Igreja latina,
exprime os elementos essenciais deste sacramento: o Pai
das misericórdias é a fonte de todo o perdão. Ele
realiza a reconciliação dos pecadores pela Páscoa do seu
Filho e pelo dom do seu Espírito, através da oração e do
ministério da Igreja:
- «Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e
ressurreição de seu Filho, reconciliou o mundo consigo e
enviou o Espírito Santo para a remissão dos pecados, te
conceda, pelo ministério da Igreja, o perdão e a paz. E
Eu te absolvo dos teus pecados em nome do Pai, e do
Filho e do Espírito Santo»
(Cf. Ordo Paenitentiae, 46.55 (Typis Polyglottis
Vaticanis 1974) p. 27.37 [Celebração da Penitência,
46.55 (Coimbra- Gráfica de Coimbra - Conferência
Episcopal Portuguesa, 1997) p. 47.65]).
VII. Os atos do penitente
1450. «Poenitentia cogit peccatorem omnia libenter
sufferre; in corde eius contritio, in ore confessio, in
opere tota humilitas vel fructifera satisfactio - A
penitência leva o pecador a tudo suportar de bom grado:
no coração, a contrição; na boca, a confissão; nas
obras, toda a humildade e frutuosa satisfação» (Cat
Rom 2, 5, 21, p. 299: cf. Concílio de Trento, Sess.14ª,
Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 3: DS
1673).
A CONTRIÇÃO
1451. Entre os atos do penitente, a contrição ocupa o
primeiro lugar. Ela é «uma dor da alma e uma
detestação do pecado cometido, com o propósito de não
mais pecar no futuro»
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1676).
1452. Quando procedente do amor de Deus, amado sobre
todas as coisas, a contrição é dita «perfeita»
(contrição de caridade). Uma tal contrição perdoa as
faltas veniais: obtém igualmente o perdão dos pecados
mortais, se incluir o propósito firme de recorrer, logo
que possível, à confissão sacramental
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1677).
1453. A contrição dita «imperfeita» (ou
«atrição») é, também ela, um dom de Deus, um impulso
do Espírito Santo. Nasce da consideração da fealdade do
pecado ou do temor da condenação eterna e das outras
penas de que o pecador está ameaçado (contrição por
temor). Um tal abalo da consciência pode dar início a
uma evolução interior, que será levada a bom termo sob a
ação da graça, pela absolvição sacramental. No entanto,
por si mesma, a contrição imperfeita não obtém o perdão
dos pecados graves, mas dispõe para obtê-lo no
sacramento da Penitência
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª. Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1678: ID., Sess.
14ª, Canones de sacramento Paenitentiae, can.
5: DS 1705).
1454. É conveniente que a recepção deste sacramento seja
preparada por um exame de consciência, feito à
luz da Palavra de Deus. Os textos mais adaptados para
este efeito devem procurar-se no Decálogo e na catequese
moral dos evangelhos e das cartas dos Apóstolos: sermão
da montanha e ensinamentos apostólicos
(Cf. Rm. 12-15: Cor. 12-13: Gl 5: Ef.
4-6).
A CONFISSÃO DOS PECADOS
1455. A confissão (a acusação) dos pecados, mesmo de um
ponto de vista simplesmente humano, liberta-nos e
facilita a nossa reconciliação com os outros. Pela
confissão, o homem encara de frente os pecados de que se
tornou culpado; assume a sua responsabilidade e, desse
modo, abre-se de novo a Deus e à comunhão da Igreja,
para tornar possível um futuro diferente.
1456. A confissão ao sacerdote constitui uma parte
essencial do sacramento da Penitência: «os penitentes
devem, na confissão, enumerar todos os pecados mortais
de que têm consciência, após se terem seriamente
examinado, mesmo que tais pecados sejam secretíssimos e
tenham sido cometidos apenas contra os dois últimos
preceitos do Decálogo
(Cf. Ex. 20, 17; Mt. 5, 28);
porque, por vezes, estes pecados ferem mais gravemente a
alma e são mais perigosos que os cometidos à vista de
todos»
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680):
- «quando os fiéis se esforçam por confessar todos os
pecados de que se lembram, não se pode duvidar de que os
apresentam todos ao perdão da misericórdia divina. Os
que procedem de modo diverso, e conscientemente ocultam
alguns, esses não apresentam à bondade divina nada que
ela possa perdoar por intermédio do sacerdote. Porque,
"se o doente tem vergonha de descobrir a sua ferida ao
médico, a medicina não pode curar o que ignora"»
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680; São
Jerónimo, Commentarius in Ecclesiasten, 10,
11: CCL 72, 338 (PL 23, 1096)).
1457. Segundo o mandamento da Igreja, «todo o fiel
que tenha atingido a idade da discrição, está obrigado a
confessar fielmente os pecados graves, ao menos uma vez
ao ano»
(CIC can. 989: cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª,
Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS
1683 ID., Sess. 14°, Canones de sacramento
Paenitentiae, can. 8: DS 1708).
Aquele que tem consciência de haver cometido um pecado
mortal, não deve receber a sagrada Comunhão, mesmo que
tenha uma grande contrição, sem ter previamente recebido
a absolvição sacramental
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss.
Eucharistia, c. 7: DS 1647: Ibid., can. 11:
DS 1661);
a não ser que tenha um motivo grave para comungar e não
lhe seja possível encontrar-se com um confessor
(Cf. CIC can. 916; CCEO can. 711).
As crianças devem aceder ao sacramento da Penitência
antes de receberem pela primeira vez a Sagrada Comunhão
(Cf. CIC can. 914).
1458. Sem ser estritamente necessária, a confissão das
faltas quotidianas (pecados veniais) é, contudo,
vivamente recomendada pela Igreja.
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina
de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680;
CIC can. 988. § 2)
Com efeito, a confissão regular dos nossos pecados
veniais ajuda-nos a formar a nossa consciência, a lutar
contra as más inclinações, a deixarmo-nos curar por
Cristo, a progredir na vida do Espírito. Recebendo com
maior frequência, neste sacramento, o dom da
misericórdia do Pai, somos levados a ser misericordiosos
como Ele
(Cf. Lc. 6, 36):
- «aquele que confessa os seus pecados e os acusa, já
está de acordo com Deus. Deus acusa os teus pecados; se
tu também os acusas, juntas-te a Deus. O homem e o
pecador são, por assim dizer, duas realidades distintas.
Quando ouves falar do homem, foi Deus que o criou:
quando ouves falar do pecador, foi o próprio homem quem
o fez. Destrói o que fizeste, para que Deus salve o que
fez. [...] Quando começas a detestar o que fizeste, é
então que começam as tuas boas obras, porque acusas as
tuas obras más. O princípio das obras boas é a confissão
das más. Praticaste a verdade e vens à luz»
(Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus,
12, 13: CCL 36, 128 (PL 35, 1491)).
A SATISFAÇÃO
1459. Muitos pecados prejudicam o próximo. Há que fazer
o possível por reparar esse dano (por exemplo: restituir
as coisas roubadas, restabelecer a boa reputação daquele
que foi caluniado, indemnizar por ferimentos). A simples
justiça o exige. Mas, além disso, o pecado fere e
enfraquece o próprio pecador, assim como as suas
relações com Deus e com o próximo. A absolvição tira o
pecado, mas não remedeia todas as desordens causadas
pelo pecado
(Cf. Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento
Paenitentiae, can. 12: DS 1712).
Aliviado do pecado, o pecador deve ainda recuperar a
perfeita saúde espiritual. Ele deve, pois, fazer mais
alguma coisa para reparar os seus pecados:
«satisfazer» de modo apropriado ou «expiar»
os seus pecados. A esta satisfação também se chama
«penitência».
1460. A penitência que o confessor impõe deve ter
em conta a situação pessoal do penitente e procurar o
seu bem espiritual. Deve corresponder, quanto possível,
à gravidade e natureza dos pecados cometidos. Pode
consistir na oração, num donativo, nas obras de
misericórdia, no serviço do próximo, em privações
voluntárias, sacrifícios e, sobretudo, na aceitação
paciente da cruz que temos de levar. Tais penitências
ajudam-nos a configurar-nos com Cristo, que, por Si só,
expiou os nossos pecados
(Cf. Rm. 3, 25: 1 Jo. 2, 1-2)
uma vez por todas. Tais penitências fazem que nos
tornemos co-herdeiros de Cristo Ressuscitado, «uma
vez que também sofremos com Ele» (Rm. 8, 17)
(Cf. Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento
Paenitentiae, c. 8: DS 1690):
- «mas esta satisfação, que realizamos pelos nossos
pecados, não é possível senão por Jesus Cristo: nós que,
por nós próprios, nada podemos, com a ajuda "d'Aquele
que nos conforta, podemos tudo"
(Cf. Fl. 4, 13).
Assim, o homem não tem nada de que se gloriar. Toda a
nossa “glória” está em Cristo [...] em quem nós
satisfazemos, “produzindo dignos frutos de penitência"
(Cf. Lc. 3, 8),
os quais vão haurir n'Ele toda a sua força, por Ele são
oferecidos ao Pai, e graças a Ele são aceites pelo Pai»
(Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento
Paenitentiae, c. 8: DS 1691).
VIII. O ministro deste sacramento
1461. Uma vez que Cristo confiou aos Apóstolos o
ministério da reconciliação
(Cf. Jo. 20, 23: 2ª Cor. 5, 18)
os Bispos, seus sucessores, e os Presbíteros,
colaboradores dos Bispos, continuam a exercer tal
ministério. Com efeito, os Bispos e os Presbíteros é que
têm, em virtude do sacramento da Ordem, o poder de
perdoar todos os pecados, «em nome do Pai e do Filho
e do Espírito Santo».
1462. O perdão dos pecados reconcilia com Deus, mas
também com a Igreja. O Bispo, chefe visível da Igreja
particular, é justamente considerado, desde os tempos
antigos, como o principal detentor do poder e ministério
da reconciliação: é o moderador da disciplina
penitencial (Cf.
II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 26: AAS 57 (1965) 32).
Os Presbíteros, seus colaboradores, exercem-no na medida
em que receberam o respectivo encargo, quer do seu Bispo
(ou dum superior religioso), quer do Papa, através do
direito da Igreja
(Cf. CIC can. 844. 967-969: CCEO can. 722. §§ 3-4).
1463. Certos pecados particularmente graves são punidos
pela excomunhão, a pena eclesiástica mais severa, que
impede a recepção dos sacramentos e o exercício de
certos atos eclesiásticos
(Cf. CIC can. 1331: CCEO can. 1431.1434)
e cuja absolvição, por conseguinte, só pode ser dada,
segundo o direito da Igreja, pelo Papa, pelo Bispo do
lugar ou por Sacerdotes por eles autorizados
(Cf. CIC can. 1354-1357: CCEO can. 1420).
Em caso de perigo de morte, qualquer Sacerdote, mesmo
que careça da faculdade de ouvir confissões, pode
absolver de qualquer pecado e de toda a excomunhão
(Cf. CIC can. 976: em relação à absolvição dos pecados,
CCEO can. 725).
1464. Os sacerdotes devem exortar os fiéis a
aproximarem-se do sacramento da Penitência; e devem
mostrar-se disponíveis para a celebração deste
sacramento, sempre que os cristãos o peçam de modo
razoável
(Cf. CIC can. 986: CCEO can. 735: II Concílio do
Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 13: AAS 58
(1966) 1012).
1465. Ao celebrar o sacramento da Penitência, o
sacerdote exerce o ministério do bom Pastor que procura
a ovelha perdida: do bom Samaritano que cura as feridas;
do Pai que espera pelo filho pródigo e o acolhe no seu
regresso; do justo juiz que não faz acepção de pessoas e
cujo juízo é, ao mesmo tempo, justo e misericordioso. Em
resumo, o sacerdote é sinal e instrumento do amor
misericordioso de Deus para com o pecador.
1466. O confessor não é dono, mas servidor do perdão de
Deus. O ministro deste sacramento deve unir-se à
intenção e à caridade de Cristo
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 13: AAS 58 (1966) 1012).
Deve ter um conhecimento comprovado do comportamento
cristão, experiência das coisas humanas, respeito e
delicadeza para com aquele que caiu; deve amar a
verdade, ser fiel ao Magistério da Igreja, e conduzir o
penitente com paciência para a cura e a maturidade
plena. Deve rezar e fazer penitência por ele,
confiando-o à misericórdia do Senhor.
1467. Dada a delicadeza e a grandeza deste ministério e
o respeito devido às pessoas, a igreja declara que todo
o sacerdote que ouve confissões está obrigado a guardar
segredo absoluto sobre os pecados que os seus penitentes
lhe confessaram, sob penas severíssimas
(Cf. CIC can. 983-984. 1388. § 1: CCEC can. 1456).
Tão pouco pode servir-se dos conhecimentos que a
confissão lhe proporciona sobre a vida dos penitentes.
Este segredo, que não admite excepções, é chamado
«sigilo sacramental», porque aquilo que o penitente
manifestou ao Sacerdote fica «selado» pelo
sacramento.
IX. Os efeitos deste sacramento
1468. «Toda a eficácia da Penitência consiste em nos
restituir à graça de Deus e em unir-nos a Ele numa
amizade perfeita»
(Poenitentiae itaque omnis in eo vis est, ut nos in Dei
gratiam restituat, cum Eoque summa amicitia coniungat»:
Cat Rom 2, 5, 18, p. 297).
O fim e o efeito deste sacramento são, pois, a
reconciliação com Deus. Naqueles que recebem o
sacramento da Penitência com coração contrito e
disposição religiosa, seguem-se lhe «a paz e a
tranquilidade da consciência, acompanhadas duma grande
consolação espiritual»
(Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento
Paenitentiae, c. 3: DS 1674).
Com efeito, o sacramento da reconciliação com Deus leva
a uma verdadeira «ressurreição espiritual», à
restituição da dignidade e dos bens próprios da vida dos
filhos de Deus, o mais precioso dos quais é a amizade do
mesmo Deus
(Cf. Lc 15, 32).
1469. Este sacramento reconcilia-nos com a Igreja.
O pecado abala ou rompe a comunhão fraterna. O
sacramento da Penitência repara-a ou restaura-a. Nesse
sentido, não se limita apenas a curar aquele que é
restabelecido na comunhão eclesial, mas também exerce um
efeito vivificante sobre a vida da Igreja que sofreu com
o pecado de um dos seus membros
(Cf. 1ª Cor. 12, 26). Restabelecido ou confirmado na comunhão
dos santos, o pecador é fortalecido pela permuta
de bens espirituais entre todos os membros vivos do
corpo de Cristo, quer vivam ainda em estado de
peregrinos, quer já tenham atingido a pátria celeste
(Cf. II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 48-50: AAS 57 (1965)
53-57):
- «é de lembrar que a reconciliação com Deus tem como
consequência, por assim dizer, outras reconciliações,
que trarão remédio a outras rupturas produzidas pelo
pecado: o penitente perdoado reconcilia-se consigo mesmo
no mais profundo do seu ser, onde recupera a própria
verdade interior: reconcilia-se com os irmãos, que de
algum modo ofendeu e magoou: reconcilia-se com a Igreja;
reconcilia-se com toda a criação»
(João Paulo II, Ex. ap. Reconciliatio et paenitentia
31, § V: AAS 77 (1985) 265).
1470. Neste sacramento, o pecador, remetendo-se ao juízo
misericordioso de Deus, de certo modo antecipa o
julgamento a que será submetido no fim desta vida
terrena. É aqui e agora, nesta vida, que nos é oferecida
a opção entre a vida e a morte. Só pelo caminho da
conversão é que podemos entrar no Reino de onde o pecado
grave nos exclui?
(Cf. 1ª Cor. 5, 11: Gl. 5, 19-21; Ap. 22, 15).
Convertendo-se a Cristo pela penitência e pela fé, o
pecador passa da morte à vida «e não é sujeito a
julgamento» (Jo. 5, 24).
X. As indulgências
1471. A doutrina e a prática das indulgências na Igreja
estão estreitamente ligadas aos efeitos do sacramento da
Penitência.
O QUE É A INDULGÊNCIA?
«A indulgência é a remissão, perante Deus, da pena
temporal devida aos pecados cuja culpa já foi apagada;
remissão que o fiel devidamente disposto obtém em certas
e determinadas condições, pela ação da Igreja, a qual,
enquanto dispensadora da redenção, distribui e aplica
por sua autoridade o tesouro das satisfações de Cristo e
dos santos»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina,
Normae. I: AAS 59 (1967) 21). «A indulgência é parcial ou plenária,
consoante liberta parcialmente ou na totalidade da pena
temporal devida ao pecado»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina,
Normae. 2: AAS 59 (1967) 21). «O fiel pode lucrar para si mesmo as
indulgências [...], ou aplicá-las aos defuntos»
(CIC can. 994).
AS PENAS DO PECADO
1472. Para compreender esta doutrina e esta prática da
Igreja, deve ter-se presente que o pecado tem uma
dupla consequência. O pecado grave priva-nos da
comunhão com Deus e, portanto, torna-nos incapazes da
vida eterna, cuja privação se chama «pena eterna»
do pecado. Por outro lado, todo o pecado, mesmo venial,
traz consigo um apego desordenado às criaturas, o qual
precisa de ser purificado, quer nesta vida quer depois
da morte, no estado que se chama Purgatório. Esta
purificação liberta do que se chama «pena temporal»
do pecado. Estas duas penas não devem ser consideradas
como uma espécie de vingança, infligida por Deus, do
exterior, mas como algo decorrente da própria natureza
do pecado. Uma conversão procedente duma caridade
fervorosa pode chegar à total purificação do pecador, de
modo que nenhuma pena subsista
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Canones de
sacramento Paenitentiae. can. 12-13: DS 1712-1713;
Id., Sess. 25ª, Decretum de purgatorio: DS 1820).
1473. O perdão do pecado e o restabelecimento da
comunhão com Deus trazem consigo a abolição das penas
eternas do pecado. Mas subsistem as penas temporais. O
cristão deve esforçar-se por aceitar, como uma graça,
estas penas temporais do pecado, suportando
pacientemente os sofrimentos e as provações de toda a
espécie e, chegada a hora, enfrentando serenamente a
morte: deve aplicar-se, através de obras de misericórdia
e de caridade, bem como pela oração e pelas diferentes
práticas da penitência, a despojar-se completamente do
«homem velho» e a revestir-se do «homem novo»
(Cf. Ef, 4, 24).
NA COMUNHÃO DOS SANTOS
1474. O cristão que procura purificar-se do seu pecado e
santificar-se com a ajuda da graça de Deus, não se
encontra só. «A vida de cada um dos filhos de Deus
está ligada de modo admirável, em Cristo e por Cristo, à
vida de todos os outros irmãos cristãos, na unidade
sobrenatural do corpo Místico de Cristo, como que numa
pessoa mística»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5:
AAS 59 (1967) 11).
1475. Na comunhão dos santos, «existe, portanto,
entre os fiéis - os que já estão na pátria celeste, os
que foram admitidos à expiação do Purgatório, e os que
vivem ainda peregrinos na terra - um constante laço de
amor e uma abundante permuta de todos os bens»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5:
AAS 59 (1967) 12).
Nesta admirável permuta, a santidade de um aproveita aos
demais, muito para além do dano que o pecado de um tenha
podido causar aos outros. Assim, o recurso à comunhão
dos santos permite ao pecador contrito ser purificado
mais depressa e mais eficazmente das penas do pecado.
1476. A estes bens espirituais da comunhão dos santos,
também lhes chamamos o tesouro da Igreja, «que não é
um somatório de bens, como quando se trata das riquezas
materiais acumuladas no decurso dos séculos, mas sim o
preço infinito e inesgotável que têm junto de Deus as
expiações e méritos de Cristo, nosso Senhor, oferecidos
para que a humanidade seja liberta do pecado e chegue à
comunhão com o Pai. É em Cristo, nosso Redentor, que se
encontram em abundância as satisfações e os méritos da
sua redenção»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5:
AAS 59 (1967) 11).
1477. «Pertencem igualmente a este tesouro o preço
verdadeiramente imenso, incomensurável e sempre novo que
têm junto de Deus as orações e boas obras da
bem‑aventurada Virgem Maria e de todos os santos, que se
santificaram pela graça de Cristo, seguindo as suas
pegadas, e que realizaram uma obra agradável ao Pai; de
modo que, trabalhando pela sua própria salvação,
igualmente cooperaram na salvação dos seus irmãos na
unidade do corpo Místico»
(Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5:
AAS 59 (1967) 11-12).
OBTER A INDULGÊNCIA DE DEUS MEDIANTE A IGREJA
1478. «A indulgência obtém-se mediante a Igreja que,
em virtude do poder de ligar e desligar que lhe foi
concedido por Jesus Cristo, intervém a favor dum cristão
e lhe abre o tesouro dos méritos de Cristo e dos santos,
para obter do Pai das misericórdias o perdão das penas
temporais devidas pelos seus pecados. É assim que a
Igreja não quer somente vir em ajuda deste cristão, mas
também incitá-lo a obras de piedade, penitência e
caridade»
(Cf. Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina,
8: AAS 59 (1967) 16-17; Concílio de Trento, Sess. 25ª,
Decretum de Indulgentiis: DS 1835).
1479. Uma vez que os fiéis defuntos, em vias de
purificação, também são membros da mesma comunhão dos
santos, nós podemos ajudá-los, entre outros modos,
obtendo para eles indulgências, de modo que sejam
libertos das penas temporais devidas pelos seus pecados.
XI. A celebração do sacramento da Penitência
1480. Tal como todos os sacramentos, a Penitência é uma
ação litúrgica. Ordinariamente, os elementos da sua
celebração são os seguintes: saudação e bênção do
sacerdote, leitura da Palavra de Deus para iluminar a
consciência e suscitar a contrição e exortação ao
arrependimento: a confissão que reconhece os pecados e
os manifesta ao sacerdote; a imposição e aceitação da
penitência; a absolvição do sacerdote; o louvor de ação
de graças e a despedida com a bênção do sacerdote.
1481. A liturgia bizantina tem várias fórmulas de
absolvição, em forma deprecativa, que exprimem
admiravelmente o mistério do perdão: «Deus, que pelo
profeta Natan perdoou a David, quando ele confessou os
seus próprios pecados, a Pedro depois de ele ter chorado
amargamente, à pecadora depois de ela ter derramado
lágrimas a seus pés, ao publicano e ao pródigo, este
mesmo Deus vos perdoe, por intermédio de mim pecador,
nesta vida e na outra, e vos faça comparecer, sem vos
condenar no seu temível tribunal: Ele que é bendito
pelos séculos dos séculos. Amém»
(Euchológion tò méga (Atenas 1992) p. 222).
1482. O sacramento da Penitência pode também ter lugar
no âmbito duma celebração comunitária, na qual se
faz uma preparação conjunta para a confissão e
conjuntamente se dão graças pelo perdão recebido. Neste
caso, a confissão pessoal dos pecados e a absolvição
individual são inseridas numa liturgia da Palavra de
Deus, com leituras e homilia, exame de consciência feito
em comum, pedido comunitário de perdão, oração do Pai
Nosso e ação de graças em comum. Esta celebração
comunitária exprime mais claramente o carácter eclesial
da penitência. No entanto, seja qual for a forma da sua
celebração, o sacramento da Penitência é sempre, por sua
própria natureza, uma ação litúrgica, portanto eclesial
e pública
(Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium,
26-27 AAS 56 (1964) 107).
1483. Em casos de grave necessidade, pode-se recorrer
à celebração comunitária da reconciliação, com confissão
geral e absolvição geral. Tal necessidade grave pode
ocorrer quando há perigo iminente de morte, sem que o
Sacerdote ou os Sacerdotes tenham tempo suficiente para
ouvir a confissão de cada penitente. A necessidade grave
pode existir também quando, tendo em conta o número dos
penitentes, não há confessores bastantes para ouvir
devidamente as confissões individuais num tempo
razoável, de modo que os penitentes, sem culpa sua, se
vejam privados, durante muito tempo, da graça
sacramental ou da sagrada Comunhão. Neste caso, para a
validade da absolvição, os fiéis devem ter o propósito
de confessar individualmente os seus pecados graves em
tempo oportuno
(Cf. CIC can. 962. § 1).
Pertence ao Bispo diocesano julgar se as condições
requeridas para a absolvição geral existem
(Cf. CIC can. 962. § 2).
Uma grande afluência de fiéis, por ocasião de grandes
festas ou de peregrinações, não constitui um desses
casos de grave necessidade
(Cf. CIC can. 962. § 1, 2).
1484. «A confissão individual e íntegra e a
absolvição constituem o único modo ordinário pelo qual o
fiel, consciente de pecado grave, se reconcilia com Deus
e com a Igreja: somente a impossibilidade física ou
moral o escusa desta forma de confissão»
(Ordo Paenitentiae, Praenotanda 31 (Typis
Polyglottis Vaticanis1974) p. 21 [Celebração da
Penitência, 31 (Coimbra, Gráfica de Coimbra -
Conferência Episcopal Portuguesa.1997) p. 29]).
Há razões profundas para que assim seja. Cristo age em
cada um dos sacramentos. Ele dirige-se pessoalmente a
cada um dos pecadores: «meu filho, os teus pecados
são-te perdoados» (Mc. 2, 5); Ele é o médico que se
inclina sobre cada um dos doentes com necessidade d'Ele
(Cf. Mc. 2, 17)
«para os curar: alivia-os e reintegra-os na comunhão
fraterna. A confissão pessoal é, pois, a forma mais
significativa da reconciliação com Deus e com a Igreja».
Resumindo:
1485. «Na tarde da Páscoa, o Senhor Jesus apareceu
aos seus Apóstolos e disse-lhes: "recebei o Espírito
Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão
perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão
retidos"» (Jo. 20, 22-23).
1486. 0 perdão dos pecados cometidos depois do
Batismo é concedido por meio dum sacramento próprio,
chamado sacramento da Conversão, da Confissão, da
Penitência ou da Reconciliação.
1487. Quem peca, ofende a honra de Deus e o seu amor,
a sua própria dignidade de homem chamado a ser filho de
Deus, e o bem-estar espiritual da Igreja, da qual cada
fiel deve ser pedra viva.
1488. Aos olhos da fé, não existe mal mais grave do
que o pecado; nada tem piores consequências para os
próprios pecadores, para a Igreja e para todo o mundo.
1489. Voltar à comunhão com Deus, depois de a ter
perdido pelo pecado, é um movimento nascido da graça do
mesmo Deus misericordioso e cheio de interesse pela
salvação dos homens. Deve pedir-se esta graça preciosa,
tanto para si mesmo como para os outros.
1490. O movimento de regresso a Deus, pela conversão
e arrependimento, implica dor e aversão em relação aos
pecados cometidos, e o propósito firme de não tornar a
pecar no futuro. Portanto, a conversão refere-se ao
passado e ao futuro: alimenta-se da confiança na
misericórdia divina.
1491. O sacramento da Penitência é constituído pelo
conjunto de três atos realizados pelo penitente e pela
absolvição do Sacerdote. Os atos do penitente são: o
arrependimento, a confissão ou manifestação dos pecados
ao Sacerdote e o propósito de cumprir a reparação e as
obras de reparação.
1492. O arrependimento (também chamado contrição)
deve inspirar-se em motivações que brotam da fé. Se for
motivado pelo amor de caridade para com Deus, diz-se
«perfeito»; se fundado em outros motivos, diz-se
«imperfeito».
1493. Aquele que quer obter a reconciliação com Deus
e com a Igreja, deve confessar ao Sacerdote todos os
pecados graves que ainda não tiver confessado e de que
se lembre depois de ter examinado cuidadosamente a sua
consciência. A confissão das faltas veniais, sem ser em
si necessária, é, todavia, vivamente recomendada pela
Igreja.
1494. O confessor propõe ao penitente o cumprimento
de certos atos de «satisfação» ou «penitência», com o
fim de reparar o mal causado pelo pecado e restabelecer
os hábitos próprios dum discípulo de Cristo.
1495. Só os Sacerdotes que receberam da autoridade da
Igreja a faculdade de absolver; podem perdoar os pecados
em nome de Cristo.
1496. Os efeitos espirituais do sacramento da
Penitência são:
- a reconciliação com Deus, pela qual o penitente
recupera a graça;
- a reconciliação com a Igreja;
- a remissão da pena eterna, em que incorreu
pelos pecados mortais;
- a remissão, ao menos em parte, das penas
temporais, consequência do pecado;
- a paz e a serenidade da consciência e a
consolação espiritual;
- o acréscimo das forças espirituais para o
combate cristão.
1497. A confissão individual e integral dos pecados
graves, seguida da absolvição, continua a ser o único
meio ordinário para a reconciliação com Deus e com a
Igreja.
1495. Por meio das indulgências, os fiéis podem obter
para si próprios, e também para as almas do Purgatório,
a remissão das penas temporais, consequência do pecado.
ARTIGO 5
-
A UNÇÃO DOS ENFERMOS
1499. «Pela santa Unção dos Enfermos e pela oração
dos presbíteros, toda a Igreja encomenda os doentes ao
Senhor, sofredor e glorificado, para que os alivie e os
salve: mais ainda, exorta-os a que, associando-se
livremente à paixão e morte de Cristo, concorram para o
bem do povo de Deus»
(Cf. Mc. 2, 17).
I. Os seus fundamentos na economia da salvação
A DOENÇA NA VIDA HUMANA
1500. A doença e o sofrimento estiveram sempre entre os
problemas mais graves que afligem a vida humana. Na
doença, o homem experimenta a sua incapacidade, os seus
limites, a sua finitude. Qualquer enfermidade pode
fazer-nos entrever a morte.
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15)
1501. A doença pode levar à angústia, ao fechar-se em si
mesmo e até, por vezes, ao desespero e à revolta contra
Deus. Mas também pode tornar uma pessoa mais
amadurecida, ajudá-la a discernir, na sua vida, o que
não é essencial para se voltar para o que o é. Muitas
vezes, a doença leva à busca de Deus, a um regresso a
Ele.
O DOENTE PERANTE DEUS
1502. O homem do Antigo Testamento vive a doença à face
de Deus. É diante de Deus que desafoga o seu lamento
pela doença que lhe sobreveio
(Cf. Sl. 38)
e é d'Ele. Senhor da vida e da morte, que implora a cura
(Cf. Sl. 6, 3: Is. 38).
A doença torna-se caminho de conversão
(Cf. Sl. 38, 5: 39, 9.12)
e o perdão de Deus dá início à cura
(Cf. Sl 32, 5: 107. 20; Mc 2, 5-12).
Israel faz a experiência de que a doença está, de modo
misterioso, ligada ao pecado e ao mal, e de que a
fidelidade a Deus em conformidade com a sua Lei restitui
a vida: «porque Eu, o Senhor, é que sou o teu médico»
(Ex. 15, 26).
O profeta entrevê que o sofrimento pode ter também um
sentido redentor pelos pecados dos outros
(Cf. Is. 53, 11).
Finalmente, Isaías anuncia que Deus fará vir para Sião
um tempo em que perdoará todas as faltas e curará todas
as doenças
(Cf. Is. 33, 24).
CRISTO-MÉDICO
1503. A compaixão de Cristo para com os doentes e as
suas numerosas curas de enfermos de toda a espécie
(Cf. Mt. 4, 24)
são um sinal claro de que «Deus visitou o seu povo»
(Cf. Lc. 7, 16)
e de que o Reino de Deus está próximo. Jesus tem poder
não somente para curar, mas também para perdoar os
pecados
(Cf. Mc. 2, 5-12): veio curar o homem na sua totalidade,
alma e corpo: é o médico de que os doentes precisam
(Cf. Mc. 2, 17).
A sua compaixão para com todos os que sofrem vai ao
ponto de identificar-Se com eles: «estive doente e
visitastes-Me» (Mt. 25, 36). O seu amor de
predileção para com os enfermos não cessou, ao longo dos
séculos, de despertar a atenção particular dos cristãos
para aqueles que sofrem no corpo ou na alma. Ele está na
origem de incansáveis esforços para os aliviar.
1504. Frequentemente, Jesus pede aos doentes que
acreditem
(Cf. Mc. 5, 34.36: 9. 23).
Serve-se de sinais para curar: saliva e imposição das
mãos
(Cf. Mc. 7. 32-36; 8, 22-25),
lodo e lavagem
(Cf. Jo. 9, 6-15).
Por seu lado, os doentes procuram tocar-Lhe
(Cf. Mc. 3, 10: 6. 56),
«porque saía d'Ele uma força que a todos curava»
(Lc. 6, 19). Por isso, nos sacramentos, Cristo continua
a «tocar-nos» para nos curar.
1505. Comovido por tanto sofrimento, Cristo não só se
deixa tocar pelos doentes, como também faz suas
as misérias deles: «tomou sobre Si as nossas
enfermidades e carregou com as nossas doenças» (Mt.
8, 17)
(Cf. Is. 53, 4).
Ele não curou todos os doentes. As curas que fazia eram
sinais da vinda do Reino de Deus. Anunciavam uma cura
mais radical: a vitória sobre o pecado e sobre a morte,
mediante a sua Páscoa. Na cruz, Cristo tomou sobre Si
todo o peso do mal
(Cf. Is. 53, 4-6)
e tirou «o pecado do mundo» (Jo. 1, 29), do qual
a doença não é mais que uma consequência. Pela sua
paixão e morte na cruz. Cristo deu novo sentido ao
sofrimento: desde então este pode configurar-nos com Ele
e unir-nos à sua paixão redentora.
«CURAI OS ENFERMOS...»
1506. Cristo convida os discípulos a seguirem-no,
tomando a sua cruz
(Cf. Mt. 10, 38).
Seguindo-O, eles adquirem uma nova visão da doença e dos
doentes. Jesus associa-os à sua vida pobre e servidora.
Fá-los participar no seu ministério de compaixão e de
cura: E eles «partiram e pregaram que era preciso
cada um arrepender-se. Expulsavam muitos demónios,
ungiam com óleo numerosos doentes, e curavam-nos»
(Mc. 6, 12-13).
1507. O Senhor ressuscitado renova esta missão («em
Meu nome... hão de impor as mãos aos doentes, e estes
ficarão curados»: Mc. 16, 1 7-18) e
confirma-a por meio dos sinais que a Igreja realiza
invocando o seu nome
(Cf. At. 9, 34: 14, 3).
Estes sinais manifestam de modo especial, que Jesus é
verdadeiramente «Deus que salva»
(Cf. Mt. 1, 21: At. 4, 12).
1508. O Espírito Santo confere a alguns o carisma
especial de poderem curar
(Cf. 1ª Cor. 12, 9. 28. 30)
para manifestar a força da graça do Ressuscitado.
Todavia, nem as orações mais fervorosas obtêm sempre a
cura de todas as doenças. Assim, São Paulo deve aprender
do Senhor que «a minha graça te basta: pois na
fraqueza é que a minha força atua plenamente»
(2ª Cor. 12, 9),
e que os sofrimentos a suportar podem ter como sentido
que «eu complete na minha carne o que falta à paixão
de Cristo, em benefício do seu corpo, que é a Igreja»
(Cl. 1, 24).
1509. «Curai os enfermos»! (Mt. 10, 8). A
Igreja recebeu este encargo do Senhor e procura
cumpri-lo, tanto pelos cuidados que dispensa aos
doentes, como pela oração de intercessão com que os
acompanha. Ela "crê na presença vivificante de
Cristo, médico das almas e dos corpos, presença
que age particularmente através dos sacramentos e de
modo muito especial da Eucaristia, pão que dá a vida
eterna”
(Cf. Jo. 6, 54.58) e cuja ligação com a saúde corporal é
insinuada por São Paulo
(Cf. 1ª Cor. 11, 30).
1510. Entretanto, a Igreja dos Apóstolos conhece um rito
próprio em favor dos enfermos, atestado por São Tiago:
«alguém de vós está doente? Chame os Presbíteros da
Igreja para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo em
nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o
Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados,
ser-lhe-ão perdoados» (Ts. 5, 14-15). A Tradição
reconheceu neste rito um dos sete sacramentos da Igreja
(Cf. Santo Inocêncio, Epistula Si instituta
ecclesiastica: DS 216; Concílio de Florença,
Decretum pro Armenis: DS 1324-1325: Concílio de
Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae
Unctionis, c. 1-2: DS 1695-1696; Id., Sess. 14ª,
canones de extrema Unctione, can. 1-2: DS 1716-1717).
UM SACRAMENTO DOS ENFERMOS
1511. A Igreja crê e confessa que, entre os sete
sacramentos, há um, especialmente destinado a
reconfortar os que se encontram sob a provação da
doença: a Unção dos enfermos:
«Esta santa unção dos enfermos foi instituída por Cristo
nosso Senhor como sacramento do Novo Testamento,
verdadeira e propriamente dito, insinuado por São Marco
(Cf. Mc. 6, 13),
mas recomendado aos fiéis e promulgado por São Tiago,
apóstolo e irmão do Senhor»
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento extremae Unctionis, c. 1: DS
1695; Cf. Tg 5, 14-15).
1512. Na tradição litúrgica, tanto no Oriente como no
Ocidente, temos, desde os tempos antigos, testemunhos de
unções de doentes praticadas com óleo benzido. No
decorrer dos séculos, a Unção dos enfermos começou a ser
conferida cada vez mais exclusivamente aos que estavam
prestes a morrer. Por causa disso, fora-lhe dado o nome
de «Extrema-Unção».
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento extremae Unctionis, Sess. 14ª, c.
2: DS 1696)
Porém, apesar dessa evolução, a liturgia nunca deixou de
pedir ao Senhor pelo doente, para que recuperasse a
saúde, se tal fosse conveniente para a sua salvação
1513. A Constituição Apostólica «Sacram Unctionem
Infirmorum», de 30 de novembro de 1972, na sequência
do II Concílio do Vaticano
(Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium,
73: AAS 56 (1964) 118-119),
estabeleceu que, a partir de então, se observasse o
seguinte no rito romano:
- «o sacramento da Unção dos Enfermos é conferido aos
que se encontram enfermos com a vida em perigo,
ungindo-os na fronte e nas mãos com óleo de oliveira ou,
segundo as circunstância, com outro óleo de origem
vegetal, devidamente benzido, proferindo uma só vez, as
palavras: "por esta santa unção e pela sua infinita
misericórdia o Senhor venha em teu auxílio com a graça
do Espírito Santo, para que, liberto dos teus pecados,
Ele te salve e, na sua bondade, alivie os teus
sofrimentos"»
(Paulo VI. Const. ap. Sacram Unctionem infirmorum:
AAS 65 (1973) 8. Cf. CIC 847, § 1).
II. Quem recebe e quem administra este sacramento?
EM CASO DE GRAVE ENFERMIDADE...
1514. A Unção dos Enfermos «não é sacramento só dos
que estão prestes a morrer. Por isso, o tempo oportuno
para a receber é certamente quando o fiel começa, por
doença ou por velhice, a estar em perigo de morte»
(II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium,
73: AAS 56 (1964) 118-119: cf. CIC can. 1004. § I.
1005.1007: CCEO can. 738).
1515. Se um doente que recebeu a Unção recupera a saúde,
pode, em caso de nova enfermidade grave, receber outra
vez este sacramento. No decurso da mesma doença, este
sacramento pode ser repetido se o mal se agrava. É
conveniente receber a Unção dos Enfermos antes duma
operação cirúrgica importante. E o mesmo se diga a
respeito das pessoas de idade, cuja fragilidade se
acentua.
«... CHAME OS PRESBÍTEROS DA IGREJA»
1516. Só os Sacerdotes (Bispos e Presbíteros) são
ministros da Unção dos Enfermos
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª. Doctrina
de sacramento extremae Unctionis, c. 3: DS 1697:
Id., Sess. 14ª, Canones de extrema Unctione, can.
4: DS 1719).
É dever dos pastores instruir os fiéis acerca dos
benefícios deste sacramento. Que os fiéis animem os
enfermos chamarem o Sacerdote para receberem este
sacramento. E que os doentes se preparem para o receber
com boas disposições, com a ajuda do seu pastor e de
toda a comunidade eclesial, convidada a rodear, de um
modo muito especial, os doentes, com as suas orações e
atenções fraternas.
III. Como se celebra este sacramento?
1517. Como todos os sacramentos, a Unção dos Enfermos é
uma celebração litúrgica e comunitária
(II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium,
27: AAS 56 (1964) 107) quer tenha lugar no seio da família, quer
no hospital ou na igreja, para um só doente ou para um
grupo deles. É muito conveniente que seja celebrada
durante a Eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor. Se
as circunstâncias a tal convidarem, a celebração do
sacramento pode ser precedida pelo sacramento da
Penitência e seguida pelo da Eucaristia. Enquanto
sacramento da Páscoa de Cristo, a Eucaristia deveria ser
sempre o último sacramento da peregrinação terrestre, o
«viático» da «passagem» para a vida
eterna.
1518. Palavra e sacramento formam um todo inseparável. A
liturgia da Palavra, precedida dum ato penitenciai, abre
a celebração. As palavras de Cristo e o testemunho dos
Apóstolos despertam a fé do doente e da comunidade, para
pedir ao Senhor a força do seu Espírito.
1519. A celebração do sacramento compreende
principalmente os seguintes elementos: «os
Presbíteros da Igreja»
(Cf. Tg. 5, 14)
impõem em silêncio - as mãos sobre os enfermos; rezam
por eles na fé da Igreja
(Cf. Tg. 5, 15);
é a epiclese própria deste sacramento; então, conferem a
unção com óleo, benzido, se possível, pelo Bispo.
Estes atos litúrgicos indicam a graça que este
sacramento confere aos doentes.
IV. Os efeitos da celebração deste sacramento
1520. Um dom particular do Espírito Santo. A
primeira graça deste sacramento é uma graça de
reconforto, de paz e de coragem para vencer as
dificuldades próprias do estado de doença grave ou da
fragilidade da velhice. Esta graça é um dom do Espírito
Santo, que renova a confiança e a fé em Deus, e dá força
contra as tentações do Maligno, especialmente a tentação
do desânimo e da angústia da morte
(Cf. Heb. 2, 15).
Esta assistência do Senhor pela força do seu Espírito
visa levar o doente à cura da alma, mas também à do
corpo, se tal for a vontade de Deus
(Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS
1325).
Além disso, «se ele cometeu pecados, ser-lhe-ão
perdoados» (Tg. 5, 15)
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, canones de
extrema Unctione, can. 2: DS 1717).
1521. A união à paixão de Cristo. Pela graça
deste sacramento, o enfermo recebe a força e o dom de se
unir mais intimamente à paixão de Cristo: ele é, de
certo modo, consagrado para produzir frutos pela
configuração com a paixão redentora do Salvador. O
sofrimento, sequela do pecado original, recebe um
sentido novo: transforma-se em participação na obra
salvífica de Jesus.
1522. Uma graça eclesial. Os doentes que recebem
este sacramento, «associando-se livremente à paixão e
morte de Cristo, concorrem para o bem do povo de Deus»
(II Concílio
do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15).
Ao celebrar este sacramento, a Igreja, na comunhão dos
santos, intercede pelo bem do doente. E o doente, por
seu lado, pela graça deste sacramento, contribui para a
santificação da Igreja e para o bem de todos os homens,
pelos quais a Igreja sofre e se oferece, por Cristo, a
Deus Pai.
1523. Uma preparação para a última passagem. Se o
sacramento da Unção dos Enfermos é concedido a todos os
que sofrem de doenças e enfermidades graves, com mais
forte razão o é aos que estão prestes a deixar esta vida
(«in exitu vitae constituti)
(Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento extremae Unctionis, c. 3: DS 1698):
de modo que também foi chamado «sacramentum exeuntium
– sacramento dos que partem»
(Ibid).
A Unção dos Enfermos completa a nossa conformação com a
morte e ressurreição de Cristo, tal como o Batismo a
tinha começado. Leva à perfeição as unções santas que
marcam toda a vida cristã: a do Batismo selara em nós a
vida nova: a da Confirmação robustecera-nos para o
combate desta vida; esta última unção mune o fim da
nossa vida terrena como que de um sólido escudo em vista
das últimas batalhas, antes da entrada na Casa do Pai
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de
sacramento extremae Unctionis, Prooemium: DS 1694).
V. O Viático, último sacramento do cristão
1524. Àqueles que vão deixar esta vida, a Igreja
oferece-lhes, além da Unção dos Enfermos, a Eucaristia
como viático. Recebida neste momento de passagem para o
Pai, a comunhão do corpo, e sangue de Cristo tem um
significado e uma importância particulares. É semente de
vida eterna e força de ressurreição, segundo as palavras
do Senhor: «quem come a minha carne e bebe o meu
sangue tem a vida eterna: e Eu ressuscitá-lo‑ei no
último dia» (Jo 6, 54). Sacramento de Cristo
morto e ressuscitado, a Eucaristia é aqui sacramento da
passagem da morte para a vida, deste mundo para o Pai
(Cf. Jo. 13, 1).
1525. Assim, do mesmo modo que os sacramentos do
Batismo, da Confirmação e da Eucaristia constituem uma
unidade chamada «os sacramentos da iniciação cristã»,
também pode dizer-se que a Penitência, a Santa Unção e a
Eucaristia, como viático, constituem, quando a vida do
cristão chega ao seu termo, «os sacramentos que
preparam a entrada na Pátria» ou os sacramentos com
que termina a peregrinação.
Resumindo:
1526. «Algum de vós está doente? Chame os Presbíteros
da Igreja, para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo
em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o
Senhor o aliviará. E, se tiver cometido pecados,
ser-lhe-ão perdoados» (Tg. 5, 14-15).
1527. 0 sacramento da Unção dos Enfermos tem por
finalidade conferir uma graça especial ao cristão que
enfrenta as dificuldades inerentes ao estado de doença
grave ou de velhice.
1528. 0 tempo oportuno para receber a Santa Unção
chegou certamente quando o fiel começa a encontrar-se em
perigo de morte, devido a doença ou a velhice.
1529. Todas as vezes que um cristão cai gravemente
enfermo, pode receber a Santa Unção; e também quando,
mesmo depois de a ter recebido, a doença se agrava.
1530. Só os Sacerdotes (Presbíteros e Bispos) podem
ministrar o sacramento da Unção dos Enfermos; para isso,
empregarão óleo benzido pelo Bispo ou, em caso de
necessidade, pelo próprio Presbítero celebrante.
1531. 0 essencial da celebração deste sacramento
consiste na unção na fronte e nas mãos do doente (no
rito romano) ou sobre outras partes do corpo (no
Oriente), unção acompanhada da oração litúrgica do
Sacerdote celebrante que pede a graça especial deste
sacramento.
1532. A graça especial do sacramento da Unção dos
Enfermos tem como efeitos:
- a união do doente à paixão de Cristo, para o seu
bem e para o de toda a Igreja;
- o conforto, a paz e a coragem para suportar
cristãmente os sofrimentos da doença ou da velhice;
- o perdão dos pecados, se o doente não pôde
obtê-lo pelo sacramento da Penitência;
- o restabelecimento da saúde, se tal for
conveniente para a salvação espiritual;
- a preparação para a passagem para vida eterna.
SEGUNDA SECÇÃO
OS SETE SACRAMENTOS DA IGREJA
CAPÍTULO TERCEIRO
OS SACRAMENTOS AO SERVIÇO DA COMUNHÃO
1533. O Batismo, a Confirmação e a Eucaristia são os
sacramentos da iniciação cristã. São o fundamento da
vocação comum de todos os discípulos de Cristo - vocação
à santidade e à missão de evangelizar o mundo. E
conferem as graças necessárias para a vida segundo o
Espírito, nesta existência de peregrinos em marcha para
a Pátria.
1534. Dois outros sacramentos, a Ordem e o Matrimónio,
são ordenados para a salvação de outrem. Se contribuem
também para a salvação pessoal, é através do serviço aos
outros que o fazem. Conferem uma missão particular na
Igreja, e servem a edificação do povo de Deus.
1535. Nestes sacramentos, aqueles que já foram
consagrados pelo Batismo e pela Confirmação
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14)
para o sacerdócio comum de todos os fiéis, podem receber
consagrações particulares. Os que recebem o
sacramento da Ordem são consagrados para serem,
em nome de Cristo, «com a palavra e a graça de Deus,
os pastores da igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 [1965} 15).
Por seu lado, «os esposos cristãos são fortalecidos e
como que consagrados por meio de um sacramento especial
em ordem ao digno cumprimento dos deveres do seu estado»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).
ARTIGO 6
O SACRAMENTO DA ORDEM
1536. A Ordem é o sacramento graças ao qual a missão
confiada por Cristo aos Apóstolos continua a ser
exercida na Igreja, até ao fim dos tempos: é, portanto,
o sacramento do ministério apostólico. E compreende três
graus: o Episcopado, o Presbiterado e o Diaconado.
- [Sobre a instituição e a missão do ministério
apostólico por Cristo ver os números 874-896. Aqui
apenas se trata da via sacramental pela qual se
transmite este ministério].
I. Por que este nome de sacramento da Ordem?
1537. A palavra Ordem, na antiguidade romana,
designava corpos constituídos no sentido civil,
sobretudo o corpo dos que governavam, Ordinatio
designa a integração num ordo. Na Igreja existem
corpos constituídos, que a Tradição, não sem fundamento
na Sagrada Escritura
(Cf. Heb. 5, 6; 7, 11: Sl. 110, 4),
designa, desde tempos antigos, com o nome de táxeis
(em grego), ordines (em latim): a liturgia
fala assim do ordo episcoporum - ordem dos Bispos
-, do ordo presbyterorum - ordem dos Presbíteros
- e do ordo diaconorum - ordem dos Diáconos. Há
outros grupos que também recebem este nome de ordo:
os catecúmenos, as virgens, os esposos, as viúvas...
1538. A integração num destes corpos da Igreja fazia-se
através dum rito chamado ordinatio, ato religioso
e litúrgico que era uma consagração, uma bênção ou um
sacramento. Hoje, a palavra ordinatio é reservada
ao ato sacramental que integra na ordem dos Bispos, dos
Presbíteros e dos Diáconos, e que ultrapassa a simples
eleição, designação, delegação ou instituição
pela comunidade, pois confere um dom do Espírito Santo
que permite o exercício dum «poder sagrado»
(sacra potestas)
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 10: AAS 57 11965) 14)
que só pode vir do próprio Cristo, pela sua Igreja. A
ordenação também é chamada consecratio
consagração -, porque é um pôr à parte e uma investidura
feita pelo próprio Cristo para a sua Igreja. A
imposição das mãos do Bispo, com a oração
consecratória, constituem o sinal visível desta
consagração.
II. O sacramento da Ordem na economia da salvação
O SACERDÓCIO DA ANTIGA ALIANÇA
1539. O povo eleito foi constituído por Deus como «um
reino de Sacerdotes e uma nação consagrada» (Ex. 19,
6)
(Cf. Is. 61, 6).
Mas, dentro do povo de Israel, Deus escolheu uma das
doze tribos, a de Levi, segregada para o serviço
litúrgico
(Cf. Nm. 1, 48-53)
o próprio Deus é a sua parte na herança
(Cf. Js. 13, 33).
Um rito próprio consagrou as origens do sacerdócio da
Antiga Aliança
(Cf. Ex. 29, 1-30; Lv. 8).
Nela, os Sacerdotes são «constituídos em favor dos
homens, nas coisas respeitantes a Deus, para oferecer
dons e sacrifícios pelos pecados»
(Cf. Heb. 5, 1).
1540. Instituído para anunciar a Palavra de Deus
(Cf. Ml. 2, 7-9) e para restabelecer a comunhão com Deus
pelos sacrifícios e a oração, aquele sacerdócio é, no
entanto, impotente para operar a salvação, precisando de
repetir sem cessar os sacrifícios, sem poder alcançar
uma santificação definitiva
(Cf. Heb. 5, 3; 7, 27; 10, 1-4) a
qual só o sacrifício de Cristo havia de conseguir.
1541. Apesar disso, no sacerdócio de Aarão e no serviço
dos levitas, assim como na instituição dos setenta
«Anciãos»
(Cr. Nm. 11, 24-25),
a liturgia da Igreja vê prefigurações do ministério
ordenado da Nova Aliança. Assim, no rito latino, a
Igreja pede, na oração consecratória da ordenação dos
Bispos:
- «Senhor Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo [...]
por vossa palavra e vosso dom instituístes a Igreja com
as suas normas fundamentais, eternamente predestinastes
a geração dos justos que havia de nascer de Abraão,
estabelecestes príncipes e sacerdotes, e não deixastes
sem ministério o vosso santuário...»
(Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi,
presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione
Episcopi. Prex ordinationis, 47, editio typica altera
(Typis Polyglottis Vaticanis1990) p.24 [Ordenação
do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos. Oração de
ordenação do Bispo, 47 (Coimbra, Gráfica de Coimbra –
Conferência Episcopal Portuguesa.1992) 40]).
1542. Na ordenação dos Presbíteros, a Igreja reza:
- «Senhor, Pai santo, [...] já na Antiga Aliança se
desenvolveram funções sagradas que eram sinais do
sacramento novo. A Moisés e a Aarão, que pusestes à
frente do povo para o conduzirem e santificarem,
associastes como seus colaboradores outros homens também
escolhidos por Vós. No deserto, comunicastes o espírito
de Moisés a setenta homens prudentes, com o auxílio dos
quais ele governou mais facilmente o vosso povo. Do
mesmo modo, as graças abundantes concedidas a Aarão. Vós
as transmitistes a seus filhos, a fim de não faltarem
sacerdotes, segundo a Lei, para oferecer os sacrifícios
do templo, sombra dos bens futuros...»
(Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi,
presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione
presbyterorum. Prex ordinationis, 159, editio typica
altera (Typis Polyglottis Vaticanis1990) p. 91-92
[Ordenação do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos.
Oração de ordenação dos presbíteros, 159 (Coimbra,
Gráfica de Coimbra Conferência Episcopal Portuguesa,
1992) p. 104]).
1543. E na oração consecratória para a ordenação dos
Diáconos, a Igreja confessa:
«Senhor, Pai santo, [...] é o novo templo que se edifica
quando estabeleceis os três graus dos ministros sagrados
para servirem ao vosso nome, como já na primeira Aliança
escolhestes os filhos de Levi, para o serviço do templo
antigo»
(Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi,
presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione
diaconorum. Prex ordinationis, 207, editio typica altera
(Typis Polyglottis Vaticanis1990) p. 121 [Ordenação
do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos. Oração de
ordenação dos diáconos, 207 (Coimbra, Gráfica de Coimbra
Conferência Episcopal Portuguesa, 1992) p. 179]).
O SACERDÓCIO ÚNICO DE CRISTO
1544. Todas as prefigurações do sacerdócio da Antiga
Aliança encontram a sua realização em Jesus Cristo,
«único mediador entre Deus e os homens» (1ª Tm. 2,
5). Melquisedec, «sacerdote do Deus Altíssimo»
(Gn. 14, 18), é considerado pela Tradição cristã como
uma prefiguração do sacerdócio de Cristo, único
«Sumo-Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec»
(Heb. 5, l0; 6, 20), «santo, inocente, sem
mancha» (Heb. 7, 26), que «com uma única oblação,
tornou perfeitos para sempre os que foram santificados»
(Heb. 10, 14), isto é, pelo único sacrifício da sua
cruz.
1545. O sacrifício redentor de Cristo é único, realizado
uma vez por todas. E, no entanto, é tornado presente no
sacrifício eucarístico da Igreja. O mesmo se diga do
sacerdócio único de Cristo, que é tornado presente pelo
sacerdócio ministerial, sem diminuição da unicidade do
sacerdócio de Cristo: «e por isso, só Cristo é
verdadeiro sacerdote, sendo os outros seus ministros»
(«Et ideo solus Christus est verus sacerdos, alii autem
ministri eius»:
S. Tomás de Aquino, Commentarium in epistolam ad
Hebraeos, c. 7. lect. 4: Opera ommnia, v. 21
(Parisiis 1876) p. 647).
DUAS PARTICIPAÇÕES NO SACERDÓCIO ÚNICO DE CRISTO
1546. Cristo, sumo Sacerdote e único mediador, fez da
Igreja «um reino de Sacerdotes para Deus seu Pai»
(Cf. Ap. 1, 6; 5, 9-10; 1ª Pe. 2, 5.9).
Toda a comunidade dos crentes, como tal, é uma
comunidade sacerdotal. Os fiéis exercem o seu sacerdócio
batismal através da participação, cada qual segundo a
sua vocação própria, na missão de Cristo, sacerdote,
profeta e rei. É pelos sacramentos do Batismo e da
Confirmação que os fiéis são «consagrados para serem
[...] um sacerdócio santo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
10: AAS 57 (1965) 14).
1547. O sacerdócio ministerial ou hierárquico dos Bispos
e dos Presbíteros e o sacerdócio comum de todos os fiéis
- embora «um e outro, cada qual segundo o seu modo
próprio, participem do único sacerdócio de Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
10: AAS 57 (1965) 14)
- são, no entanto, essencialmente diferentes ainda que
sendo «ordenados um para o outro»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
10: AAS 57 (1965) 14).
Em que sentido? Enquanto o sacerdócio comum dos fiéis se
realiza no desenvolvimento da vida batismal - vida de
fé, confiança e caridade, vida segundo o Espírito - o
sacerdócio ministerial está ao serviço do sacerdócio
comum, ordena-se ao desenvolvimento da graça batismal de
todos os cristãos. É um dos meios pelos quais
Cristo não cessa de construir e guiar a sua igreja. E é
por isso que é transmitido por um sacramento próprio,
que é o sacramento da Ordem.
NA PESSOA DE CRISTO CABEÇA...
1548. No serviço eclesial do ministro ordenado, é o
próprio Cristo que está presente à sua Igreja, como
Cabeça do seu corpo, Pastor do seu rebanho,
Sumo-Sacerdote do sacrifício redentor, mestre da
verdade. É o que a Igreja exprime quando diz que o
padre, em virtude do sacramento da Ordem, age in
persona Christi Capitis - na pessoa de Cristo Cabeça
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14: Ibid., 28 AAS
57 (1965) 34: Id., Const. Sacrosanctum Concilium,
33 AAS 56 ( 1964) 108: In.. Decr. Christus Dominus,
11 AAS 58 (1966) 677: Id. Decr. Presbyterorum
ordinis, 2. AAS 58 (1966) 992: Ibid. 6: AAS
58 (1966) 999):
- «É o mesmo Sacerdote, Jesus Cristo, de quem realmente
o ministro faz as vezes. Se realmente o ministro é
assimilado ao Sumo-Sacerdote, em virtude da consagração
sacerdotal que recebeu, goza do direito de agir pelo
poder do próprio Cristo que representa 'virtute ac
persona ipsius Christi'»
(Pio XII. Enc. Mediator Dei: AAS 39 (1947) 548).
- «Cristo é a fonte de todo o sacerdócio: pois o
sacerdócio da [antiga] lei era figura d'Ele, ao passo
que o sacerdote da nova lei age na pessoa d'Ele»
(«Christus est fons totius sacerdotii: nam sacerdos
legalis erat figura ipsius, sacerdos autem novae leis in
persona ipsius operatur»:
São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3, q. 22,
a. 4. e: Ed. Leon. 11, 260).
1549. Pelo ministério ordenado, especialmente dos Bispos
e Padres, a presença de Cristo como cabeça da Igreja
torna-se visível no meio da comunidade dos crentes
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 24).
Segundo a bela expressão de Santo Inácio de Antioquia, o
Bispo é týpos toû Patrós, como que a imagem viva
de Deus Pai
(Cf. Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad
Trallianos 3, 1: SC 10bis, 96 (Funk 1, 244) Id.,
Epistula ad Magnesios 6, 1: SC 10bis, 84 (Funk 1,
234)).
1550. Esta presença de Cristo no seu ministro não deve
ser entendida como se este estivesse premunido contra
todas as fraquezas humanas, contra o afã de domínio,
contra os erros, isto é, contra o pecado. A força do
Espírito Santo não garante do mesmo modo todos os atos
do ministro. Enquanto que nos sacramentos esta garantia
é dada, de maneira que nem mesmo o pecado do ministro
pode impedir o fruto da graça, há muitos outros atos em
que a condição humana do ministro deixa vestígios, que
nem sempre são sinal de fidelidade ao Evangelho e podem,
por conseguinte, prejudicar a fecundidade apostólica da
Igreja.
1551. Este sacerdócio é ministerial. «O encargo que o
Senhor confiou aos pastores do seu Povo é um verdadeiro
serviço»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
24: AAS 57 (1965) 29).
Refere-se inteiramente a Cristo e aos homens. Depende
inteiramente de Cristo e do seu sacerdócio único, e foi
instituído em favor dos homens e da comunidade da
Igreja. O sacramento da Ordem comunica «um poder
sagrado», que não é senão o de Cristo. O exercício
desta autoridade deve, pois, regular-se pelo modelo de
Cristo, que por amor Se fez o último e servo de todos
(Cf. Mc. 10, 43-45; 1ª Pe. 5,3).
«O Senhor disse claramente que o cuidado dispensado
ao seu rebanho seria uma prova de amor para com Ele»
(São João Crisóstomo, De sacerdotio 2, 4: SC 272,
118 (PG 48, 635); cf. Jo 21, 15-17).
...«EM NOME DE TODA A IGREJA»
1552. O sacerdócio ministerial não tem somente o encargo
de representar Cristo. cabeça da Igreja, perante a
assembleia dos fiéis; age também em nome de toda a
Igreja, quando apresenta a Deus a oração da mesma Igreja
(Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium,
33: AAS 56 (1964) 108)
e, sobretudo, quando oferece o sacrifício eucarístico
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14).
1553. «Em nome de toda a Igreja» não quer dizer
que os Sacerdotes sejam os delegados da comunidade. A
oração e a oferenda da Igreja são inseparáveis da oração
e da oferenda de Cristo, sua cabeça. É sempre o culto de
Cristo na e pela sua Igreja. É toda a Igreja, corpo de
Cristo, que ora e se oferece, «por Cristo, com
Cristo, em Cristo», na unidade do Espírito Santo, a
Deus Pai. Todo o corpo, caput et memora - cabeça
e membros -, ora e oferece-se; e, por isso, aqueles que,
no corpo, são de modo especial os ministros, chamam-se
ministros não apenas de Cristo, mas também da Igreja. É
porque representa Cristo, que o sacerdócio ministerial
pode representar a Igreja.
III. Os três graus do sacramento da Ordem
1554. «O ministério eclesiástico, instituído por
Deus, é exercido em ordens diversas por aqueles que,
desde a antiguidade, são chamados Bispos, Presbíteros e
Diáconos»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
28: AAS 57 (1965) 33-34).
A doutrina católica, expressa na liturgia, no Magistério
e na prática constante da Igreja, reconhece que existem
dois graus de participação ministerial no sacerdócio de
Cristo: o episcopado e o presbiterado. O diaconado
destina-se a ajudá-los e a servi-los. Por isso, o termo
«sacerdos» designa, no uso atual, os Bispos e os
Presbíteros, mas não os Diáconos. Todavia, a doutrina
católica ensina que os graus de participação sacerdotal
(episcopado e presbiterado) e o grau de serviço
(diaconado), todos três são conferidos por um ato
sacramental chamado «ordenação», ou seja, pelo
sacramento da Ordem.
- «Reverenciem todos os diáconos como a Jesus Cristo e
de igual modo o Bispo que é a imagem do Pai, e os
Presbíteros como o senado de Deus e como a assembleia
dos Apóstolos: sem eles, não se pode falar de Igreja»
(Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Trallianos
3, 1: SC 10bis, 96 (Funk1, 244)).
A ORDENAÇÃO EPISCOPAL - PLENITUDE DO SACRAMENTO DA ORDEM
1555. «Entre os vários ministérios, que na Igreja se
exercem desde os primeiros tempos, consta da Tradição
que o principal é o daqueles que, constituídos no
episcopado através de uma sucessão que remonta às
origens, são os transmissores da semente apostólica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
20: AAS 57 (1965) 23).
1556. Para desempenhar a sua sublime missão, «os
Apóstolos foram enriquecidos por Cristo com uma efusão
especial do Espírito Santo, que sobre eles desceu: e
pela imposição das mãos eles próprios transmitiram aos
seus colaboradores este dom espiritual que foi
transmitido até aos nossos dias através da consagração
episcopal»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
21 : AAS 57 (1965) 24).
1557. O II Concílio do Vaticano «ensina que, pela
consagração episcopal, se confere a plenitude do
sacramento do Ordens, à qual o costume litúrgico da
Igreja e a voz dos santos Padres chamam sumo sacerdócio
e vértice ["summa"] do sagrado ministério»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
21: AAS 57 (1965) 25).
1558. «A consagração episcopal, juntamente com a
função de santificar, confere também as funções de
ensinar e governar [...] De fato, pela imposição das
mãos e pelas palavras da consagração, a graça do
Espírito Santo é dada e é impresso o carácter sagrado,
de tal modo que os Bispos fazem as vezes, de uma forma
eminente e visível, do próprio Cristo, Mestre, Pastor e
Pontífice, e atuam em vez d'Ele [«in Eius persona
agant»]»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
21 : AAS 57 (1965) 25).
Por isso, pelo Espírito Santo que lhes foi dado, os
Bispos foram constituídos verdadeiros e autênticos
mestres da fé, pontífices e pastores
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus,
2: AAS 58 (1966) 674).
1559. «É em virtude da consagração episcopal e pela
comunhão hierárquica com a cabeça e os membros do
colégio que alguém é constituído membro do corpo
episcopal»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26).O
caráter e a natureza colegial da ordem episcopal
manifestam-se, entre outros modos, na antiga prática da
Igreja que exige, para a consagração dum novo Bispo, a
participação de vários Bispos
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 22: AAS 57 (1965) 26).
Para a ordenação legítima dum Bispo requer-se, hoje, uma
intervenção especial do Bispo de Roma, em virtude da sua
qualidade de supremo vínculo visível da comunhão das
Igrejas particulares na Igreja una, e de garante da sua
liberdade.
1560. Cada Bispo tem, como vigário de Cristo, o encargo
pastoral da Igreja particular que lhe foi confiada. Mas,
ao mesmo tempo, partilha colegialmente com todos os seus
irmãos no episcopado a solicitude por todas as
Igrejas: «se cada Bispo é pastor próprio apenas da
porção do rebanho que foi confiada aos seus cuidados, a
sua qualidade de legítimo sucessor dos Apóstolos, por
instituição divina, torna-o solidariamente responsável
pela missão apostólica da Igreja»
(Pio XII. Enc. Fidei donum: AAS 49 (1957) 237:
ct. II Concílio do Vaticano, Cons. Dogm. Lumen
Gentium, 23: AAS 57 (1965) 27-28: In. Decr.
Christus Dominus, 4: AAS 58 (1966) 674-675:
Ibid., 36: AAS 58 (1966) 692: Ibid., 37 AAS
58 (1966) 693; Id. Decr. Ad gentes, 5: AAS 58
(1966) 951-952; Ibid., 6: AAS 58 (1966) 952-953:
Ibid., 38: AAS 58 (1966) 984-986).
1561. Tudo o que acaba de ser dito explica porque é que
a Eucaristia celebrada pelo Bispo tem uma significação
muito especial como expressão da Igreja reunida em torno
do altar sob a presidência daquele que representa
visivelmente Cristo, bom Pastor e Cabeça da sua Igreja
(Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium,
41: AAS 56 (1964) 111; Id., Cons. Dogm. Lumen
Gentium, 26: AAS 57 (1965) 31-32).
A ORDENAÇÃO DOS PRESBÍTEROS - COOPERADORES DOS BISPOS
1562. «Cristo, a Quem o Pai santificou e enviou ao
mundo, por meio dos seus Apóstolos tornou os Bispos, que
são sucessores deles, participantes da sua consagração e
missão; e estes, por sua vez, transmitem legitimamente o
múnus do seu ministério em grau diverso e a diversos
sujeitos na Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
28: AAS 57 (1965) 33).
O seu cargo ministerial foi transmitido em grau
subordinado aos Presbíteros, para que, constituídos na
Ordem do presbiterado, fossem cooperadores da Ordem
episcopal para o desempenho perfeito da missão
apostólica confiada por Cristo
(II Concílio do Vaticano, Decr. Prebyterorum ordinis,
2: AAS 58 (1966) 992).
1563. «O ofício dos Presbíteros, enquanto unido à
Ordem episcopal, participa da autoridade com que o
próprio Cristo edifica, santifica e governa o seu corpo.
Por isso, o sacerdócio dos Presbíteros, embora
pressuponha os sacramentos da iniciação cristã, é
conferido mediante um sacramento especial, em virtude do
qual os Presbíteros, mediante a unção do Espírito Santo,
ficam assinalados com um carácter particular e, dessa
maneira, configurados a Cristo-Sacerdote, de tal modo
que possam agir em nome e na pessoa de Cristo Cabeça»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Prebyterorum ordinis,
2: AAS 58 (1966) 992).
1564. «Os Presbíteros, embora não possuam o
pontificado supremo e dependam dos Bispos no exercício
do próprio poder, todavia estão-lhes unidos na honra do
sacerdócio; e, por virtude do sacramento da Ordem, são
consagrados, à imagem de Cristo, sumo e eterno sacerdote
(Cf. Heb. 5, 1-10: 7, 24; 9, 11-28),
para pregar o Evangelho, ser pastores dos fiéis e
celebrar o culto divino como verdadeiros sacerdotes do
Novo Testamento
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
28: AAS 57 (1965) 3447).
1565.
Em virtude do sacramento da Ordem, os sacerdotes
participam das dimensões universais da missão confiada
por Cristo aos Apóstolos. O dom espiritual que receberam
na ordenação prepara-os, não para uma missão limitada e
restrita, «mas sim para uma missão de salvação de
amplitude universal, "até aos confins da terra"»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 10: AAS 58 (1966) 1007), «dispostos, no seu coração, a pregar o
Evangelho em toda a parte»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Optatam totius,
20: AAS 58 (1966) 726).
1566. «É no culto ou sinaxe eucarística que, por
excelência exercem o seu múnus sagrado: nela, agindo na
pessoa de Cristo e proclamando o seu mistério, unem as
preces dos fiéis ao sacrifício da cabeça e, no
sacrifício da Missa, tornam presente e aplicam, até à
vinda do Senhor, o único sacrifício do Novo Testamento,
o de Cristo, o qual de uma vez por todas se ofereceu ao
Pai, como hóstia imaculada»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
28: AAS 57 (1965) 34).
É deste sacrifício único que todo o seu ministério
sacerdotal tira a própria força
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 2: AAS 58 (1966) 993).
1567. «Cooperadores esclarecidos da Ordem episcopal,
sua ajuda e instrumento, chamados para o serviço do povo
de Deus, os Presbíteros constituem com o seu Bispo um
único presbyterium com diversas funções. Onde quer que
se encontre uma comunidade de fiéis, eles tornam de
certo modo, presente o Bispo, ao qual estão associados,
de ânimo fiel e generoso, e cujos encargos e solicitude
assumem, segundo a própria medida, traduzindo-os na
prática do cuidado quotidiano dos fiéis»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
28: AAS 57 (1965) 35).
Os Presbíteros só podem exercer o seu ministério na
dependência do Bispo e em comunhão com ele. A promessa
de obediência, que fazem ao Bispo no momento da
ordenação, e o ósculo da paz dado pelo Bispo no final da
liturgia de ordenação, significam que o Bispo os
considera seus colaboradores, filhos, irmãos e amigos e
que, em contrapartida, eles lhe devem amor e obediência.
1568. «Os Presbíteros, elevados pela ordenação à
Ordem do presbiterado, estão unidos entre si numa íntima
fraternidade sacramental. Especialmente na diocese, a
cujo serviço, sob o Bispo respectivo, estão consagrados,
formam um só presbitério»
(II Concílio do Vaticano, Dec. Presbyterorum ordinis,
8: AAS 58 (1966) 1003).
A unidade do presbitério tem uma expressão litúrgica no
costume segundo o qual, durante o rito da ordenação
presbiterial, os presbíteros impõem também eles as mãos,
depois do Bispo.
A ORDENAÇÃO DO DIÁCONOS - «EM VISTA DO SERVIÇO»
1569. «No grau inferior da hierarquia estão os
Diáconos, aos quais foram impostas as mãos, "não em
vista do sacerdócio, mas do serviço"»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
29 AAS 57 (1965) 36; cf. Id. Decr. Christus
Dominus, 15: AAS 58 (1966) 679).
Para a ordenação no diaconado, só o Bispo é que impõe as
mãos, significando com isso que o Diácono está
especialmente ligado ao Bispo nos encargos próprios da
sua «diaconia»
(Cf. Santo Hipólito de Roma, Traditio apostolica,
8: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) P 22-24).
1570. Os Diáconos participam de modo especial na missão
e na graça de Cristo
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 41: AAS 57 (1965) 46: Id. Decr Ad gentes
16: AAS 58 (1966) 967).
O sacramento da Ordem marca-os com um selo («carácter»)
que ninguém pode fazer desaparecer e que os configura
com Cristo, que se fez «Diácono», isto é, o servo
de todos
(Cf. Mc 10, 45: Lc 22, 27: São Policarpo
de Esmirna, Epistula ad Philippenses 5, 2: SC
10bis. 182 (Funk 1, 300)).
Entre outros serviços, pertence aos Diáconos assistir o
Bispo e os sacerdotes na celebração dos divinos
mistérios, sobretudo da Eucaristia, distribuí-la,
assistir ao Matrimónio e abençoá-lo, proclamar o
Evangelho e pregar, presidir aos funerais e consagrar-se
aos diversos serviços da caridade
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 29: AAS 57 (1965) 36; Id.. Cons.
Sacrosanctum Concilium, 35, 4: AAS 56 (1964) 109:
Id., Decr. Ad gentes, 16: AAS 58 (1966) 967).
1571. A partir do II Concílio do Vaticano, a Igreja
latina restabeleceu o diaconado «como grau próprio e
permanente da hierarquia»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
29: AAS 57 (1965) 36),
enquanto as Igrejas do Oriente o tinham sempre mantido.
Este diaconado permanente, que pode ser conferido
a homens casados, constitui um enriquecimento importante
para a missão da Igreja. Com efeito, é apropriado e útil
que homens, cumprindo na Igreja um ministério
verdadeiramente diaconal, quer na vida litúrgica e
pastoral, quer nas obras sociais e caritativas,
«sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitida
desde os Apóstolos, e mais estreitamente ligados ao
altar, para que cumpram o seu ministério mais
eficazmente por meio da graça sacramental do diaconado»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 16:
AAS 58 (1966) 967).
IV. A celebração deste sacramento
1572. A celebração da ordenação dum Bispo, de
Presbíteros ou de Diáconos, dada a sua importância na
vida duma Igreja particular, requer o concurso do maior
número possível de fiéis. Terá lugar, de preferência, ao
domingo e na Sé catedral, com solenidade adequada à
circunstância. As três ordenações - do Bispo, do
Presbítero e do Diácono - seguem o mesmo esquema. O
lugar próprio de sua celebração é dentro da liturgia
eucarística.
1573. O rito essencial do sacramento da Ordem é
constituído, para os três graus, pela imposição das
mãos, por parte do Bispo, sobre a cabeça do ordinando,
bem como pela oração consecratória específica, que pede
a Deus a efusão do Espírito Santo e dos seus dons
apropriados ao ministério para que é ordenado o
candidato
(Cf. Pio XII. Const. ap. Sacramentum ordinis, DS
3858).
1574. Como em todos os sacramentos, ritos anexos
envolvem a celebração. Variando muito nas diversas
tradições litúrgicas, tem todos um traço comum: exprimem
os múltiplos aspectos da graça sacramental. Assim, os
ritos iniciais, no rito latino - a apresentação e a
eleição do ordinando, a alocução do Bispo, o
interrogatório do ordinando, as ladainhas dos Santos -
atestam que a escolha do candidato se fez em
conformidade com o costume da Igreja e preparam o ato
solene da consagração depois da qual vários ritos vêm
exprimir e completar, de modo simbólico, o mistério
realizado: para o Bispo e para o \Sacerdote, a unção com
o santo crisma, sinal da unção especial do Espírito
Santo, que torna fecundo o seu ministério; entrega do
livro dos Evangelhos do anel, da mitra e do báculo ao
Bispo, em sinal da sua missão apostólica de anunciar a
Palavra de Deus, da sua fidelidade à Igreja, esposa de
Cristo, do seu múnus de pastor do rebanho do Senhor:
para o presbítero, entrega da patena e do cálice, «a
oferenda do povo santo»
(Cf. Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi,
presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione
presbyterorum. Traditio panis et vini. 163, editio
tipica altera (Typis PolyglottisVaticanis 1990) p. 95 [Ordenação
do Bispo, dos presbíteros e diáconos, Entrega do pão
e do vinho,163 (Coimbra, Gráfica de Coimbra –
Conferência Episcopal Portuguesa.1992) p. 107])
que ele é chamado a apresentar a Deus; para o Diácono,
entrega do livro dos Evangelhos, pois acaba de receber a
missão de anunciar o Evangelho de Cristo.
V. Quem pode conferir este sacramento?
1575. Foi Cristo quem escolheu os Apóstolos e lhes deu
parte na sua missão e autoridade. Depois de ter subido à
direita do Pai, Cristo não abandona o seu rebanho, antes
continuamente o guarda por meio dos Apóstolos com a sua
proteção e continua a dirigi-lo através destes mesmos
pastores que hoje prosseguem a sua obra
(Cf. Prefácio dos Apóstolos I: Missale Romanum,
editio typica(Typis Polyglottis Vaticanis1970). p. 426 [Missal
Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 493]). É, pois, Cristo «quem dá», a uns
serem apóstolos, a outros serem pastores
(Cf. Ef. 4, 11).
E continua agindo por meio dos Bispos
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 21: AAS 57 (1965) 24).
1576. Uma vez que o sacramento da Ordem é o sacramento
do ministério apostólico, pertence aos Bispos, enquanto
sucessores dos Apóstolos, transmitir «o dom
espiritual»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
21: AAS 57 (1965) 24),
«a semente apostólica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
20: AAS 57 (1965) 23).
Os Bispos validamente ordenados, isto é, que estão na
linha da sucessão apostólica, conferem validamente os
três graus do sacramento da Ordem
(Cf. Inocêncio III, Professio fidei Waldensibus
praescripta: DS 794; IV Concílio de Latrão, Cap. 1,
De fide catholica: DS 802; CIC can. 1012; CCEO
can. 744,747).
VI. Quem pode receber este sacramento?
1577. «Só o varão (vir) batizado pode receber
validamente a sagrada ordenação»
(CIC can. 1024).
O Senhor Jesus escolheu homens (viri) para formar
o colégio dos Doze Apóstolos
(Cf. Mc. 3, 14-19; Lc. 6, 12-16),
e o mesmo fizeram os Apóstolos quando escolheram os seus
colaboradores
(Cf. 1ª Tm. 3, 1-13; 2ª Tm. 1, 6: Tt. 1, 5-9)
para lhes sucederem no desempenho do seu ministério
(Cf. São Clemente de Roma, Epistula ad Corinthios,
42, 4: SC 167, 168-170 (Funk I. 152);
Ibid., 44. 3: SC 167, 172 (Funk 1, 156)).
O Colégio dos Bispos, a que os Presbíteros estão unidos
no sacerdócio, torna presente e atualiza, até que Cristo
volte, o Colégio dos Doze. A Igreja reconhece-se
vinculada por essa escolha feita pelo Senhor em pessoa.
É por isso que a ordenação das mulheres não é possível (Cf
João Paulo II, Ep. Ap. Mulieris dignitatem,
26-27: AAS 80 (1988) 1715-1720. Id.. Ep. Ap.
Ordinatio sacerdotalis: AAS 86 (1994) 545-548;
Sagrada Congregação da Doutrina da Fé, Decl.
Inter insigniores: AAS 69 (1977) 98-116; Id.,
Responsum ad dubium circa doctrinam in Epist. Ap.
"Ordinatio Sacerdotalis" traditam: AAS 87 (1995)
1114).
1578. Ninguém tem direito a receber o sacramento
da Ordem. Com efeito, ninguém pode arrogar-se tal
encargo. É-se chamado a ele por Deus
(Cf. Heb. 5, 4).
Aquele que julga reconhecer em si sinais do chamamento
divino ao ministério ordenado, deve submeter
humildemente o seu desejo à autoridade da Igreja, à qual
incumbe a responsabilidade e o direito de chamar alguém
para receber as Ordens. Como toda e qualquer graça, este
sacramento só pode ser recebido como um dom
imerecido.
1579. Todos os ministros ordenados da Igreja latina, à
excepção dos Diáconos permanentes, são normalmente
escolhidos entre homens crentes que vivem celibatários e
têm vontade de guardar o celibato «por amor do Reino
dos céus» (Mt. 19, 12). Chamados a consagrarem-se
totalmente ao Senhor e às «suas coisas»
(Cf. 1ª Cor. 7, 32)
dão-se por inteiro a Deus e aos homens. O celibato é um
sinal desta vida nova, para cujo serviço o ministro da
Igreja é consagrado: aceite de coração alegre, anuncia
de modo radioso o Reino de Deus
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum
ordinis, 16: AAS 58 (1966) 1915-1016).
1580. Nas Igrejas orientais vigora, desde há séculos,
uma disciplina diferente: enquanto os Bispos são
escolhidos unicamente entre os celibatários, homens
casados podem ser ordenados Diáconos e Presbíteros. Esta
prática é, desde há muito tempo, considerada legítima:
estes Sacerdotes exercem um ministério frutuoso nas suas
comunidades
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr Presbyterorum
ordinis, 16: AAS 58 (1966) 1015).
Mas, por outro lado, o celibato dos Sacerdotes é tido em
muita honra nas Igrejas orientais e são numerosos
aqueles que livremente optam por ele, por amor do Reino
de Deus. Tanto no Oriente como no Ocidente, aquele que
recebeu o sacramento da Ordem já não pode casar-se.
VII. Os efeitos do sacramento da Ordem
O CARÁCTER INDELÉVEL
1581. Este sacramento configura o ordinando com Cristo
por uma graça especial do Espírito Santo, a fim de
servir de instrumento de Cristo em favor da sua Igreja.
Pela ordenação, recebe-se a capacidade de agir como
representante de Cristo, cabeça da Igreja. na sua
tríplice função de sacerdote, profeta e rei.
1582. Tal como no caso do Batismo e da Confirmação, esta
participação na função de Cristo é dada uma vez por
todas. O sacramento da Ordem confere, também ele, um
carácter espiritual indelével, e não pode ser
repetido nem conferido para um tempo limitado
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 23ª, Canones de
sacramento Ordinis, c. 4: DS 1767: II Concílio do
Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57
(1965) 25: Ibid., 28 AAS 57 (1965) 34:
Ibid., 29: AAS 57 (1965) 36: Id., Decr.
Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 992.).
1583. Uma pessoa validamente ordenada pode, é certo, por
graves motivos, ser dispensada das obrigações e funções
decorrentes da ordenação, ou ser proibido de as exercer
(CIC can 290-293. 1336. § 1, 3 e 5. 1338. § 2):
mas já não pode voltar a ser leigo, no sentido estrito
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 23ª, Canones de
sacramento Ordinis, can. 4: DS 1774),
porque o carácter impresso pela ordenação fica para
sempre. A vocação e a missão recebidas no dia da
ordenação marcam-no de modo permanente.
1584. Uma vez que é Cristo, afinal, quem age e opera a
salvação através do ministro ordenado, a indignidade
deste não impede Cristo de agir
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 7ª, Canones de
sacramentis in genere, can. 12: DS 1612: Concílio de
Constança, Errores Iohannis Wyclif, 4: DS 1154).
Santo Agostinho di-lo numa linguagem vigorosa:
- «quanto ao ministro orgulhoso, deve ser contado
juntamente com o diabo. E nem por isso se contamina o
dom de Cristo: o que através de tal ministro se
comunica, conserva a sua pureza: o que passa por ele
mantém-se límpido e chega até à terra fértil. [...] De
fato, a virtude espiritual do sacramento é semelhante à
luz: os que devem ser iluminados recebem-na na sua
pureza, e ela, embora atravesse seres manchados, não se
suja»
(Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus,
5, 15: CCL 36, 50 (PL 35, 1422)).
A GRAÇA DO ESPÍRITO SANTO
1585. A graça do Espírito Santo própria deste sacramento
consiste numa configuração com Cristo, Sacerdote, Mestre
e Pastor, de quem o ordenado é constituído ministro.
1586. Para o Bispo, é, em primeiro lugar, uma graça de
fortaleza («Spiritum principalem - Espírito soberano»,
isto é, Espírito que faz chefes, pede a oração de
consagração do Bispo, no rito
latino (Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi,
presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione
Episcopi. Prex ordinationis, 47, editio typica altera
(Typis Polyglottis Vaticanis1990) p.24 [Ordenação
do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos, Oração de
ordenação do Bispo, 47 (Coimbra, Gráfica de Coimbra –
Conferência Episcopal Portuguesa.1992) 40])):
a graça de guiar e defender, com força e prudência, a
sua Igreja, como pai e pastor, com amor desinteressado
para com todos e uma predileção pelos pobres, os
enfermos e os necessitados
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus,
13: AAS 58 (1966) 678-679: Ibid., 16: AAS 58 (1966)
680-681).
Esta graça impele-o a anunciar o Evangelho a todos, a
ser o modelo do seu rebanho, a ir adiante dele no
caminho da santificação, identificando-se na Eucaristia
com Cristo sacerdote e vítima, sem recear dar a vida
pelas suas ovelhas:
- «ó Pai, que conheceis os corações, concedei ao
vosso servo, que escolhestes para o episcopado, a graça
de apascentar o vosso santo rebanho e de exercer de modo
irrepreensível, diante de Vós, o supremo sacerdócio,
servindo-Vos noite e dia: que ele torne propício o vosso
rosto e ofereça os dons da vossa santa Igreja: tenha, em
virtude do Espírito do supremo sacerdócio, o poder de
perdoar os pecados segundo o vosso mandamento, distribua
os cargos segundo a vossa ordem e desligue de todo o
vínculo pelo poder que Vós destes aos Apóstolos: que ele
Vos agrade pela sua doçura e coração puro,
oferecendo-Vos um perfume agradável, por vosso Filho
Jesus Cristo...»
(São Hipólito de Roma, Traditio apostolica, 3:
ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 8-10).
1587. O dom espiritual, conferido pela ordenação
presbiterial, está expresso nesta oração própria do rito
bizantino. O bispo, impondo as mãos, diz, entre outras
coisas:
«Senhor, enchei do dom do Espírito Santo aquele que Vos
dignastes elevar ao grau de presbítero, para que seja
digno de se manter irrepreensível diante do vosso altar,
de anunciar o Evangelho do vosso Reino, de desempenhar o
ministério da vossa Palavra de verdade, de Vos oferecer
dons e sacrifícios espirituais, de renovar o vosso povo
pelo banho da regeneração; de modo que, ele próprio, vá
ao encontro do nosso grande Deus e Salvador Jesus
Cristo, vosso Unigénito, no dia da sua segunda vinda, e
receba da vossa imensa bondade a recompensa dum fiel
desempenho do seu ministério»
(Liturgia Bizantina, 2ª oração da imposição das mãos
presbiteral: Euchológion tò méga (Roma 1873) p.
136).
1588. Quanto aos diáconos, «fortalecidos pela graça
sacramental, servem o povo de Deus na "diaconia" da
liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão com o
Bispo e o seu Presbitério»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
29 AAS 57 (1965) 36).
1589. Perante a grandeza da graça e do múnus
sacerdotais, os santos doutores sentiram o apelo urgente
à conversão, a fim de corresponderem, por toda a sua
vida, Àquele de Quem o sacramento os constituiu
ministros. É assim que São Gregário de Nazianzo, ainda
jovem presbítero. exclama:
- «Temos de começar por nos purificar, antes de
purificarmos os outros: temos de ser instruídos, para
podermos instruir: temos de nos tornar luz para alumiar,
de nos aproximar de Deus para podermos aproximar d'Ele
os outros, ser santificados para santificar, conduzir
pela mão e aconselhar com inteligência»
(São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 71: SC 247,
184 (PG 35, 480)). «Eu sei de Quem somos ministros, a que
nível nos encontramos e para onde nos dirigimos. Conheço
as alturas de Deus e a fraqueza do homem, mas também a
sua força»
(São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 74: SC 247,
186 (PG 35, 481)). [Quem é, pois, o Sacerdote? Ele é «o
defensor da verdade, eleva-se com os anjos glorifica com
os Arcanjos, faz subir ao altar do Alto as vítimas dos
sacrifícios, participa no sacerdócio de Cristo, remodela
a criatura, restaura [nela] a imagem [de Deus], recria-a
para o mundo do Alto e, para dizer o que há de mais
sublime, é divinizado e diviniza»
(São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 73: SC 247,
186 (PG 35, 481).
- E diz o santo Cura d'Ars: «é o Sacerdote quem
continua a obra da redenção na terra»... «Se bem
se compreendesse o que o sacerdote é na terra,
morrer-se-ia, não de medo, mas de amor». [...] «O
sacerdócio é o amor do Coração de Jesus»
(B. Nodet, Le Cure d'Ars. Sa pensée-son coeur (Le
Puy 1966) p. 98).
Resumindo:
1590. São Paulo ao seu discípulo Timóteo: «exorto-te
a que reavives o dom que Deus depositou em ti, pela
imposição das minhas mãos» (2ª Tm. 1, 6), e
«aquele que aspira ao lugar de Bispo, aspira a uma nobre
função» (1ª Tm. 3, 1). A Tito, o mesmo Apóstolo
dizia: «se te deixei em Creta, foi para acabares de
organizar o que faltava e estabelecer anciãos em cada
cidade, como te havia ordenado» (Tt. 1, 5).
1591. A Igreja é, na sua totalidade, um povo
sacerdotal. Graças ao Batismo, todos os fiéis participam
no sacerdócio de Cristo. Esta participação chama-se
«sacerdócio comum dos fiéis». Na base deste sacerdócio e
ao seu serviço, existe uma outra participação na missão
de Cristo: a do ministério conferido pelo sacramento da
Ordem, cuja missão é servir em nome e na pessoa de
Cristo-Cabeça no meio da comunidade.
1592. O sacerdócio ministerial difere essencialmente
do sacerdócio comum dos fiéis, porque confere um poder
sagrado para o serviço dos mesmos fiéis. Os ministros
ordenados exercem o seu serviço junto do povo de Deus
pelo ensino (munus docendi), pelo culto divino (munus
liturgicum) e pelo governo pastoral (munus
regendi).
1593. Desde as origens, o ministério ordenado fui
conferido e exercido em três graus: o dos Bispos, o dos
Presbíteros e o dos Diáconos. Os ministérios conferidos
pela ordenação são insubstituíveis na estrutura orgânica
da Igreja: sem Bispo, Presbíteros e Diáconos, não pode
falar-se de Igreja
(Cf. Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad
Trallianos 3, 1: SC 10bis. 96 (Funk 1, 244)).
1594. O Bispo recebe a plenitude do sacramento da
Ordem que o insere no colégio episcopal e faz dele o
chefe visível da Igreja particular que lhe é confiada.
Os Bispos, enquanto sucessores dos Apóstolos e membros
do Colégio, têm parte na responsabilidade apostólica e
na missão de toda a Igreja, sob a autoridade do Papa,
sucessor de São Pedro.
1595. Os presbíteros estão unidos aos Bispos na
dignidade sacerdotal e, ao mesmo tempo, dependem deles
no exercício das suas funções pastorais; são chamados a
ser os cooperadores providentes dos Bispos; formam, em
volta do seu Bispo, o presbitério, que assume com
ele a responsabilidade da Igreja particular: Os
Presbíteros recebem do Bispo o encargo duma comunidade
paroquial ou duma função eclesial determinada.
1596. Os Diáconos são ministros ordenados para as
tarefas de serviço da Igreja; não recebem o sacerdócio
ministerial, mas a ordenação confere-lhes funções
importantes no ministério da Palavra, culto divino,
governo pastoral e serviço da caridade, encargos que
eles devem desempenhar sob a autoridade pastoral do seu
Bispo.
1597. O sacramento da Ordem é conferido pela
imposição das mãos, seguida duma solene oração
consecratória, que pede a Deus para o ordinando as
graças do Espírito Santo, requeridas para o seu
ministério. A ordenação imprime um carácter sacramental
indelével.
1598. A Igreja confere o sacramento da Ordem somente
a homens (viris) batizados, cujas aptidões para o
exercício do ministério tenham sido devidamente
reconhecidas. Compete à autoridade da Igreja a
responsabilidade e o direito de chamar alguém para
receber a Ordem.
1599. Na Igreja latina, o sacramento da Ordem para o
presbiterado, normalmente, apenas é conferido a
candidatos decididos a abraçar livremente o celibato e
que manifestem publicamente a sua vontade de o guardar
por amor do Reino de Deus e do serviço dos homens.
1600. Pertence aos bispos o direito de conferir o
sacramento da Ordem nos seus três graus.
ARTIGO 7
O SACRAMENTO DO MATRIMÔNIO
1601. «O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a
mulher constituem entre si a comunhão íntima de toda a
vida, ordenado por sua índole natural ao bem dos
cônjuges e à procriação e educação da prole, entre os
batizados foi elevado por Cristo Senhor à dignidade de
sacramento»
(CIC can. 1055. § 1).
I. O matrimónio no desígnio de Deus
1602. A Sagrada Escritura começa pela criação do homem e
da mulher, à imagem e semelhança de Deus
(Cf. Gn. 1, 26-27),
e termina com a visão das «núpcias do Cordeiro»
(Ap 19, 9)
(Cf. Ap. 19, 7).
Do princípio ao fim, a Escritura fala do matrimónio e do
seu «mistério», da sua instituição e do sentido
que Deus lhe deu, da sua origem e da sua finalidade, das
suas diversas realizações ao longo da história da
salvação, das suas dificuldades nascidas do pecado e da
sua renovação «no Senhor» (1ª Cor. 7, 39),
na Nova Aliança de Cristo e da Igreja
(Cf. Ef. 5, 32-32).
O MATRIMÓNIO NA ORDEM DA CRIAÇÃO
1603. «A íntima comunidade da vida e do amor conjugal
foi fundada pelo Criador e dotada de leis próprias
[...]. O próprio Deus é o autor do matrimónio»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1067).
A vocação para o matrimónio está inscrita na própria
natureza do homem e da mulher, tais como saíram das mãos
do Criador. O matrimónio não é uma instituição puramente
humana, apesar das numerosas variações a que esteve
sujeito no decorrer dos séculos, nas diferentes
culturas, estruturas sociais e atitudes espirituais.
Tais diversidades não devem fazer esquecer os traços
comuns e permanentes. Muito embora a dignidade desta
instituição nem sempre e nem por toda a parte
transpareça com a mesma clareza
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 47: AAS 58 11966) 1067), existe, no entanto, em todas as culturas,
um certo sentido da grandeza da união matrimonial.
Porque «a saúde da pessoa e da sociedade está
estreitamente ligada a uma situação feliz da comunidade
conjugal e familiar»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 47: AAS 58 (1966) 1067).
1604. Deus, que criou o homem por amor, também o chamou
ao amor, vocação fundamental e inata de todo o ser
humano. Porque o homem foi criado à imagem e semelhança
de Deus
(Cf. Gn. 1, 27)
que é amor (1ª Jo. 4, 8.16). Tendo-os Deus criado homem
e mulher, o amor mútuo dos dois torna-se imagem do amor
absoluto e indefectível com que Deus ama o homem. É bom,
muito bom, aos olhos do Criador
(Cf Gn. 1, 31).
E este amor, que Deus abençoa, está destinado a ser
fecundo e a realizar-se na obra comum do cuidado da
criação: «Deus abençoou-os e disse-lhes: "sede
fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra e
submetei-a"» (Gn. 1, 28).
1605. Que o homem e a mulher tenham sido criados um para
o outro, afirma-o a Sagrada Escritura: «não é bom que
o homem esteja só» (Gn. 2, 18). A mulher, «carne
da sua carne»
(Cf. Gn. 2, 23),
isto é, sua igual, a criatura mais parecidos com ele,
é-lhe dada por Deus como uma auxiliar
(Cf Gn. 2, 18),
representando assim aquele «Deus que é o nosso
auxílio»
(Cf. Sl. 121, 2). «Por esse motivo, o homem deixará o
pai e a mãe, para se unir à sua mulher: e os dois serão
uma só carne» (Gn. 2, 24). Que isto significa
uma unidade indefectível das duas vidas, o próprio
Senhor o mostra, ao lembrar qual foi, «no princípio»,
o desígnio do Criador
(Cf. Mt. 19, 4):
«portanto, já não são dois, mas uma só carne»
(Mt. 19, 6).
O MATRIMÓNIO SOB O REGIME DO PECADO
1606. Todo o homem faz a experiência do mal, à sua volta
e em si mesmo. Esta experiência faz-se também sentir nas
relações entre o homem e a mulher. Desde sempre, a união
de ambos foi ameaçada pela discórdia, o espírito de
domínio, a infidelidade, o ciúme e conflitos capazes de
ir até ao ódio e à ruptura. Esta desordem pode
manifestar-se de um modo mais ou menos agudo e ser mais
ou menos ultrapassada, conforme as culturas, as épocas,
os indivíduos. Mas parece, sem dúvida, ter um carácter
universal.
1607. Segundo a fé, esta desordem, que dolorosamente
comprovamos, não procede da natureza do homem e
da mulher, nem da natureza das suas relações, mas do
pecado. Ruptura com Deus, o primeiro pecado teve
como primeira consequência a ruptura da comunhão
original do homem e da mulher. As suas relações são
distorcidas por acusações recíprocas
(Cf. Gn. 3, 12);
a atracção mútua, dom próprio do Criador
(Cf. Gn. 2, 22),
converte-se em relação de domínio e de cupidez
(Cf. Gn. 3, 16):
a esplêndida vocação do homem e da mulher para serem
fecundos, multiplicarem-se e submeterem a terra
(Cf. Gn. 1, 28)
fica sujeita às dores do parto e do ganha-pão
(Cf. Gn. 3, 16-19).
1608. No entanto, a ordem da criação subsiste, apesar de
gravemente perturbada. Para curar as feridas do pecado,
o homem e a mulher precisam da ajuda da graça que Deus,
na sua misericórdia infinita, nunca lhes recusou
(Cf. Gn. 3, 21).
Sem esta ajuda, o homem e a mulher não podem chegar a
realizar a união das suas vidas para a qual Deus os
criou «no princípio».
O MATRIMÓNIO SOB A PEDAGOGIA DA LEI
1609. Na sua misericórdia, Deus não abandonou o homem
pecador. As penas que se seguiram ao pecado, «as
dores do parto»
(Cf. Gn. 3, 16),
o trabalho «com o suor do rosto» (Gn. 3, 19),
constituem também remédios que reduzem os malefícios do
pecado. Depois da queda, o matrimónio ajuda a superar o
auto isolamento, o egoísmo, a busca do próprio prazer, e
a abrir-se ao outro, à mútua ajuda, ao dom de si.
1610. A consciência moral relativamente à unidade e
indissolubilidade do matrimónio desenvolveu-se sob a
pedagogia da antiga Lei. A poligamia dos patriarcas e
dos reis ainda não é explicitamente rejeitada. No
entanto, a Lei dada a Moisés visa proteger a mulher
contra um domínio arbitrário por parte do homem, ainda
que a mesma Lei comporte também, segundo a palavra do
Senhor, vestígios da «dureza do coração» do
homem, em razão da qual Moisés permitiu o repúdio da
mulher
(Cf. Mt. 19, 8: Dt. 24, 1).
1611. Ao verem a Aliança de Deus com Israel sob a imagem
dum amor conjugal, exclusivo e fiel
(Cf. Os. 1-3: Is. 54; 62; Jr. 2-3; 31; Ez. 16; 23),
os profetas prepararam a consciência do povo eleito para
uma inteligência aprofundada da unicidade e
indissolubilidade do matrimónio
(Cf. Ml. 2, 13-17).
Os livros de Rute e de Tobias dão testemunhos comoventes
do elevado sentido do matrimónio, da fidelidade e da
ternura dos esposos. E a Tradição viu sempre no Cântico
dos Cânticos uma expressão única do amor humano,
enquanto reflexo do amor de Deus, amor «forte como a
morte», que «nem as águas caudalosas conseguem
apagar» (Ct. 8, 6-7).
O MATRIMÓNIO NO SENHOR
1612. A aliança nupcial entre Deus e o seu povo Israel
tinha preparado a Aliança nova e eterna, pela qual o
Filho de Deus, encarnando e dando a sua vida, uniu a Si,
de certo modo, toda a humanidade por Ele salva
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 22: AAS 58 (1966) 1042),
preparando assim as «núpcias do Cordeiro»
(Cf. Ap. 19, 7. 9).
1613. No umbral da sua vida pública, Jesus realiza o seu
primeiro sinal - a pedido da sua Mãe - por ocasião duma
festa de casamento
(Cf. Jo. 2, 1-11). A Igreja atribui uma grande importância à
presença de Jesus nas bodas de Caná. Ela vê nesse fato a
confirmação da bondade do matrimónio e o anúncio de que,
doravante, o matrimónio seria um sinal eficaz da
presença de Cristo.
1614. Na sua pregação, Jesus ensinou sem equívocos o
sentido original da união do homem e da mulher, tal como
o Criador a quis no princípio: a permissão de repudiar a
sua mulher, dada por Moisés, era uma concessão à dureza
do coração
(Cf. Mt. 19, 8):
a união matrimonial do homem e da mulher é indissolúvel:
foi o próprio Deus que a estabeleceu: «não separe,
pois, o homem o que Deus uniu» (Mt. 19, 6).
1615. Esta insistência inequívoca na indissolubilidade
do vínculo matrimonial pôde criar perplexidade e
aparecer como uma exigência impraticável
(Cf. Mt. 19, 10).
No entanto, Jesus não impôs aos esposos um fardo
impossível de levar e pesado demais
(Cf. Mt. 11, 29-30),
mais pesado que a Lei de Moisés. Tendo vindo
restabelecer a ordem original da criação, perturbada
pelo pecado, Ele próprio dá a força e a graça de viver o
matrimónio na dimensão nova do Reino de Deus. É seguindo
a Cristo, na renúncia a si próprios e tornando a sua
cruz
(Cf. Mc. 8, 34),
que os esposos poderão «compreender»
(Cf. Mt. 19, 11)
o sentido original do matrimónio e vivê-lo com a ajuda
de Cristo. Esta graça do Matrimónio cristão é fruto da
cruz de Cristo, fonte de toda a vida cristã.
1616. É o que o Apóstolo Paulo nos dá a entender, quando
diz: «maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo
amou a Igreja e Se entregou por ela, a fim de a
santificar» (Ef. 5, 25-26): e acrescenta
imediatamente: «"por isso o homem deixará o pai e a
mãe para se unir à sua mulher e serão os dois uma só
carne". É grande este mistério, digo-o em relação a
Cristo e à Igreja» (Ef. 5, 31-32).
1617. Toda a vida cristã tem a marca do amor esponsal
entre Cristo e a Igreja. Já o Batismo, entrada no povo
de Deus, é um mistério nupcial: é, por assim dizer, o
banho de núpcias
(Cf. Ef. 5, 26-27)
que precede o banquete das bodas, a Eucaristia. O
Matrimónio cristão, por sua vez, torna-se sinal eficaz,
sacramento da aliança de Cristo com a Igreja. E uma vez
que significa e comunica a graça desta aliança, o
Matrimónio entre batizados é um verdadeiro sacramento da
Nova Aliança
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª. Doctrina de
sacramento Matrimonii: DS 1800; CIC can. 1055, § I).
A VIRGINDADE POR AMOR DO REINO
1618. Cristo é o centro de toda a vida cristã. A união
com Ele prevalece sobre todas as outras, quer se trate
de laços familiares, quer sociais
(Cf. Lc. 14, 26; Mc. 10, 28-31).
Desde o princípio da Igreja, houve homens e mulheres que
renunciaram ao grande bem do matrimónio, para seguirem o
Cordeiro aonde quer que Ele vá
(Cf. Ap. 14, 4),
para cuidarem das coisas do Senhor, para procurarem
agradar-Lhe para saírem ao encontro do Esposo que vem
(Cf. 1ª Cor. 7, 32).
O próprio Cristo convidou alguns a seguirem-no neste
modo de vida, de que Ele é o modelo:
- «há eunucos que nasceram assim do seio materno; há os
que foram feitos eunucos pelos homens; e há os que a si
mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus.
Quem puder entender, entenda»! (Mt. 19, 12).
1619. A virgindade por amor do Reino dos céus é um
desenvolvimento da graça batismal, um sinal poderoso da
preeminência da união com Cristo e da espera fervorosa
do seu regresso
(Cf. Mt 25, 6),
um sinal que lembra também que o matrimónio é uma
realidade do tempo presente, que é passageiro
(Cf. Mc. 12, 25: 1ª Cor. 7, 31).
1620. Quer, o sacramento do Matrimónio, quer a
virgindade por amor do Reino de Deus, vêm do próprio
Senhor. É Ele que lhes dá sentido e concede a graça
indispensável para serem vividos em conformidade com a
sua vontade
(Cf. Mt. 19, 3-12).
A estima pela virgindade por amor do Reino
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
42: AAS 57 (1965) 48: Id., Decr. Perfectae caritatis, 12
AAS 58 (1966) 707: In., Decr. Optatam totius, 10:
AAS 58 (1966) 720-721)
e o sentido cristão do matrimónio são inseparáveis e
favorecem-se mutuamente:
- «denegrir o Matrimónio é, ao mesmo tempo, diminuir a
glória da virgindade: enaltecê-lo é realçar a admiração
devida à virgindade [...] Porque, no fim de contas, o
que só em comparação com um mal parece bom, não pode ser
um verdadeiro bem: mas o que ainda é melhor do que bens
incontestados, esse é que é o bem por excelência»
(São João Crisóstomo, De Virginitate 10, 1: SC 125, 122
(PG 48, 540): cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiares
consortio, 16: AAS 74 (1982) 98).
II. A celebração do Matrimónio
1621. No rito latino, a celebração do Matrimónio entre
dois fiéis católicos tem lugar normalmente no decorrer
da santa Missa, em virtude da ligação de todos os
sacramentos com o mistério pascal de Cristo
(Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium,
61:AAS 56 (1964) 116-117).
Na Eucaristia realiza-se o memorial da Nova Aliança,
pela qual Cristo se uniu para sempre à Igreja, sua
esposa bem-amada, por quem se entregou
(Cl. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 6: AAS 57 (1965) 9).
Por isso, é conveniente que os esposos selem o seu
consentimento à doação recíproca pela oferenda das
próprias vidas, unindo-a à oblação de Cristo pela sua
Igreja, tornada presente no sacrifício eucarístico, e
recebendo a Eucaristia, para que, comungando o mesmo
corpo e o mesmo sangue de Cristo, «formem um só
corpo» em Cristo
(Cf. 1ª Cor. 10, 17).
1622. «Enquanto ação sacramental de santificação, a
celebração litúrgica do Matrimónio [...] deve ser por si
mesma válida, digna e frutuosa»
(João Paulo II, Ex. ap. Familiares consortio, 67:
AAS 74 (1982) 162). Por isso, é conveniente que os futuros
esposos se preparem para a celebração do seu Matrimónio,
recebendo o sacramento da Penitência.
1623. Segundo a tradição latina, são os esposos quem,
como ministros da graça de Cristo, mutuamente se
conferem o sacramento do Matrimónio, ao exprimirem,
perante a Igreja, o seu consentimento. Nas tradições das
Igrejas orientais, os Sacerdotes que oficiam - Bispos ou
Presbíteros - são testemunhas do mútuo consentimento
manifestado pelos esposos
(Cf. CCEO can. 817), mas a sua bênção também é necessária para
a validade do sacramento
(CCEO can. 828).
1624. As diversas liturgias são ricas em orações de
bênção e de epiclese, pedindo a Deus a sua graça e
invocando a sua bênção sobre o novo casal, especialmente
sobre a esposa. Na epiclese deste sacramento, os esposos
recebem o Espírito Santo como comunhão do amor de Cristo
e da Igreja
(Cf. Ef. 5, 32).
É Ele o selo da aliança de ambos, a nascente sempre
oferecida do seu amor, a força pela qual se renovará a
sua fidelidade.
III. O consentimento matrimonial
1625. Os protagonistas da aliança matrimonial são um
homem e uma mulher batizados, livres para contrair
Matrimónio e que livremente exprimem o seu
consentimento. «Ser livre» quer dizer:
- não ser constrangido;
- não estar impedido por nenhuma lei natural nem
eclesiástica.
1626. A Igreja considera a permuta dos consentimentos
entre os esposos como o elemento indispensável «que
constitui o Matrimónios
(CIC can. 1057. § 1).
Se faltar o consentimento, não há Matrimónio».
1627. O consentimento consiste num «ato humano pelo
qual os esposos se dão e se recebem mutuamente»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1067; CIC can. 1057, § 2):
«eu recebo-te por minha esposa. Eu recebo-te por meu
esposo»
(Ordo celebrandi Matrimonium, 62, Editio typica
altera (Typis Polyglottis Vaticanas 1991) p. 17 [Celebração
do Matrimónio, 62, segunda edição típica (Coimbra,
Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa
1993) p.31]).
Este consentimento, que une os esposos entre si, tem a
sua consumação no fato de os dois «se tornarem uma só
carne»
(Cf. Gn. 2, 24; Mc. 10, 8: Ef. 5, 31).
1628. O consentimento deve ser um ato da vontade de cada
um dos contraentes, livre de violência ou de grave temor
externo
(Cf. CIC can. 1103).
Nenhum poder humano pode substituir-se a este
consentimento
(Cf. CIC can. 1057, § 1).
Faltando esta liberdade, o matrimónio é inválido.
1629. Por este motivo (ou por outras razões, que tornem
nulo ou não realizado o casamento)
(Cf. CIC can. 1083-1108), a
Igreja pode, depois de examinada a situação pelo
tribunal eclesiástico competente, declarar «a
nulidade do Matrimónio», ou seja, que o Matrimónio
nunca existiu. Em tal caso, os contraentes ficam livres
para se casarem, salvaguardadas as obrigações naturais
resultantes da união anterior
(Cf. CIC can. 1071, § 1, 3).
1630. O Sacerdote (ou o Diácono), que assiste à
celebração do Matrimónio, recebe o consentimento dos
esposos em nome da Igreja e dá a bênção da Igreja. A
presença do ministro da Igreja (bem como das
testemunhas) exprime visivelmente que o Matrimónio é uma
realidade eclesial.
1631. É por esse motivo que, normalmente, a Igreja exige
para os seus fiéis a forma eclesiástica da
celebração do Matrimónio
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª, Decretum "Tametsi
": DS 1813-1816: CIC can. 1108).
Muitas razões concorrem para explicar esta determinação:
- o Matrimónio sacramental é um ato litúrgico.
Portanto, é conveniente que seja celebrado na liturgia
pública da Igreja;
- o Matrimónio introduz num ordo eclesial, cria
direitos e deveres na Igreja, entre os esposos e para
com os filhos;
- uma vez que o Matrimónio é um estado de vida na
Igreja, é necessário que haja a certeza a respeito dele
(daí a obrigação de haver testemunhas);
- o carácter público do consentimento protege o
«sim» uma vez dado e ajuda a permanecer-lhe fiel.
1632. Para que o «sim» dos esposos seja um ato
livre e responsável, e para que a aliança matrimonial
tenha bases humanas e cristãs sólidas e duradoiras, é de
primordial importância a preparação para o
matrimónio:
o exemplo e o ensino dados pelos pais e pelas famílias
continuam a ser o caminho privilegiado desta preparação.
O papel dos pastores e da comunidade cristã, como
«família de Deus», é indispensável para a
transmissão dos valores humanos e cristãos do Matrimónio
e da família
(Cf. CIC can. 1063),
e isto tanto mais quanto é certo que, nos nossos dias,
muitos jovens conhecem a experiência de lares desfeitos,
que já não garantem suficientemente aquela iniciação:
- «os jovens devem ser conveniente e oportunamente
instruídos, sobretudo no seio da própria família, acerca
da dignidade, missão e exercício do amor conjugal. Deste
modo, educados na estima pela castidade, poderão passar,
chegada à idade conveniente, de um noivado honesto para
o matrimónio»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 49: AAS 58 (1966) 1070).
CASAMENTOS MISTOS E DISPARIDADE DE CULTOS
1633. Em muitos países, a situação do matrimónio
misto (entre um católico e um batizado não católico)
apresenta-se de modo bastante frequente. Tal situação
pede uma atenção particular dos cônjuges e dos pastores.
O caso dos casamentos com disparidade de culto
(entre um católico e um não-batizado) exige uma atenção
ainda maior.
1634. A diferença de confissão religiosa entre os
cônjuges não constitui um obstáculo insuperável para o
Matrimónio, quando eles conseguem pôr em comum o que
cada um recebeu na sua comunidade e aprender um do outro
o modo como cada um vive a sua fidelidade a Cristo. Mas
as dificuldades dos matrimónios mistos nem por isso
devem ser subestimadas. São devidas ao fato de a
separação dos cristãos ainda não ter sido superada. Os
esposos arriscam-se a vir a ressentir-se do drama da
desunião dos cristãos no seio do próprio lar. A
disparidade de culto pode agravar ainda mais estas
dificuldades. As divergências em relação à fé, o próprio
conceito do Matrimónio e ainda as diferentes
mentalidades religiosas podem constituir uma fonte de
tensões no Matrimónio, principalmente por causa da
educação dos filhos. Pode então surgir uma tentação: a
indiferença religiosa.
1635. Segundo o direito em vigor na Igreja latina, um
Matrimónio misto precisa da permissão expressa da
autoridade eclesiástica
(Cf. CIC can. 1124) para a respectiva liceidade. Em caso de
disparidade de culto, é requerida uma dispensa
expressa do impedimento para a validade do
Matrimónio
(Cf. CIC can. 1086).
Tanto a permissão como a dispensa supõem que as duas
partes conhecem e não rejeitam os fins e propriedades
essenciais do Matrimónio: e também que a parte católica
confirma os seus compromissos, dados também a conhecer
expressamente à parte não católica, de conservar a sua
fé e de assegurar o Batismo e a educação dos filhos na
Igreja Católica
(Cf. C1C can. 1125).
1636. Em muitas regiões, graças ao diálogo ecuménico, as
respectivas comunidades cristãs puderam organizar uma
pastoral comum para os casamentos mistos. O seu
papel consiste em ajudar os casais a viver a sua
situação particular à luz da fé. Ela deve também
ajudá-los a superar as tensões entre as obrigações dos
cônjuges um para com o outro e para com as respectivas
comunidades eclesiais. Deve estimular o desenvolvimento
do que lhes é comum na fé e o respeito pelo que os
divide.
1637. Nos casamentos com disparidade de culto, o cônjuge
católico tem uma tarefa particular a cumprir, «porque
o marido não-crente é santificado pela sua mulher e a
mulher não-crente é santificada pelo marido crente»
(1ª Cor. 7, 14).
Será uma grande alegria para o cônjuge cristão e para a
Igreja, se está «santificação» levar à conversão
livre do outro à fé cristã»
(Cf. 1ª Cor. 7, 16). O amor conjugal sincero, a prática
humilde e paciente das virtudes familiares e a oração
perseverante, podem preparar o cônjuge não-crente para
receber a graça da conversão.
IV. Os efeitos do sacramento do Matrimónio
1638. «Do Matrimónio válido origina-se entre os
cônjuges um vínculo de sua natureza perpétuo e
exclusivo: no matrimónio cristão, além disso, são os
cônjuges robustecidos e como que consagrados por um
sacramento peculiar para os deveres e dignidade do seu
estado»
(CIC can.1134).
O VÍNCULO MATRIMONIAL
1639. O consentimento, pelo qual os esposos mutuamente
se dão e se recebem, é selado pelo próprio Deus
(Cf. Mc. 10, 9).
Da sua aliança «nasce uma instituição, também à face
da sociedade, tornada firme e estável pela lei divina»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1067).
A aliança dos esposos é integrada na aliança de Deus com
os homens: «o autêntico amor conjugal é assumido no
amor divino»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).
1640. O vínculo matrimonial é, portanto,
estabelecido pelo próprio Deus, de maneira que o
matrimónio ratificado e consumado entre batizados não
pode jamais ser dissolvido. Este vínculo, resultante do
ato humano livre dos esposos e da consumação do
matrimónio, é, a partir de então, uma realidade
irrevogável e dá origem a uma aliança garantida pela
fidelidade de Deus. A Igreja não tem poder para se
pronunciar contra esta disposição da sabedoria divina (Cf.
CIC can. 1141).
A GRAÇA DO SACRAMENTO DO MATRIMÓNIO
1641. Os esposos cristãos, «no seu estado de vida e
na sua ordem, têm, no povo de Deus, os seus dons
próprios»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 (1965) 16).
Esta graça própria do sacramento do Matrimónio
destina-se a aperfeiçoar o amor dos cônjuges e a
fortalecer a sua unidade indissolúvel. Por meio desta
graça, «eles auxiliam-se mutuamente para chegarem à
santidade pela vida conjugal e pela procriação e
educação dos filhos»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 (1965) 15-16: cf. Ibid., 41. AAS
57 (1965) 47).
1632. Cristo é a fonte desta graça. «Assim como
outrora Deus veio ao encontro do seu povo com unia
aliança de amor e fidelidade, assim agora o Salvador dos
homens e Esposo da Igreja vem ao encontro dos esposos
cristãos com o sacramento do Matrimónio»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).
Fica com eles, dá-lhes a coragem de O seguirem tomando
sobre si a sua cruz, de se levantarem depois das quedas,
de se perdoarem mutuamente, de levarem o fardo um do
outro
(Cf. Gl. 6, 2),
de serem «submissos um ao outro no temor de Cristo»
(Ef. 5, 21) e de se amarem com um amor sobrenatural,
delicado e fecundo. Nas alegrias do seu amor e da sua
vida familiar, Ele dá-lhes, já neste mundo, um antegosto
do festim das núpcias do Cordeiro:
- «onde irei buscar forças para descrever, de modo
satisfatório, a felicidade do Matrimónio que a Igreja
une, que a oblação eucarística confirma e a bênção sela?
Os Anjos proclamam-no, o Pai Celeste ratifica-o [...].
Que jugo o de dois cristãos, unidos por uma só
esperança, um único desejo, uma única disciplina, um
mesmo serviço! Ambos filhos do mesmo Pai, servos do
mesmo Senhor; nada os separa, nem no espírito nem na
carne; pelo contrário, eles são verdadeiramente dois
numa só carne. Ora, onde a carne á só uma, também um só
é o espírito»
(Tertuliano, Ad Uxorem 2, 8. 6-7: CCL 1, 393 (PL
1, 1415-1416): cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris
consortio, 13: AAS 74 (1982) 94).
V. Os bens e as exigências do amor conjugal
1643. «O amor conjugal comporta um todo em que entram
todas as componentes da pessoa - apelo do corpo e do
instinto, força do sentimento e da afetividade,
aspiração do espírito e da vontade -; visa uma unidade
profundamente pessoal - aquela que, para além da união
numa só carne, conduz à formação dum só coração e duma
só alma -; exige a indissolubilidade e a fidelidade na
doação recíproca definitiva; e abre-se à fecundidade.
Trata-se, é claro, das características normais de todo o
amor conjugal natural, mas com um significado novo que
não só as purifica e consolida, mas as eleva ao ponto de
fazer delas a expressão de valores especificamente
cristãos»
(João Paulo II, Ex. ap. Familiares consortio,
13: AAS 74 (1982) 96).
A UNIDADE E A INDISSOLUBILIDADE DO
MATRIMÔNIO
1644. Pela sua própria natureza, o amor dos esposos
exige a unidade e a indissolubilidade da sua comunidade
de pessoas, a qual engloba toda a sua vida: «assim,
já não são dois, mas uma só carne» (Mt. 19, 6)
(Cf. Gn. 2, 24).
«Eles são chamados a crescer sem cessar na sua
comunhão, através da fidelidade quotidiana à promessa da
mútua doação total que o Matrimónio implica»
(João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 19:
AAS 74 (1982) 101). Esta comunhão humana é confirmada,
purificada e aperfeiçoada pela comunhão em Jesus Cristo,
conferida pelo sacramento do Matrimónio; e aprofunda-se
pela vida da fé comum e pela Eucaristia recebida em
comum.
1645. «A igual dignidade pessoal, que se deve
reconhecer à mulher e ao homem no amor pleno que têm um
pelo outro, manifesta claramente a unidade do
Matrimónio, confirmada pelo Senhor»
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 49: AAS 58 (1966) 1070).
A poligamia é contrária a esta igual dignidade e
ao amor conjugal, que é único e exclusivo
(João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 19:
AAS 74 (1982) 102).
A FIDELIDADE DO AMOR CONJUGAL
1646. Pela sua própria natureza, o amor conjugal exige
dos esposos uma fidelidade inviolável. Esta é uma
consequência da doação de si mesmos que os esposos fazem
um ao outro. O amor quer ser definitivo. Não pode ser
«até nova ordem». «Esta união íntima, enquanto
doação recíproca de duas pessoas, tal como o bem dos
filhos, exigem a inteira fidelidade dos cônjuges e
reclamam a sua união indissolúvel»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).
1647. O motivo mais profundo encontra-se na fidelidade
de Deus à sua aliança, de Cristo à sua Igreja. Pelo
sacramento do Matrimónio, os esposos ficam habilitados a
representar esta fidelidade e a dar testemunho dela.
Pelo sacramento, a indissolubilidade do Matrimónio
adquire um sentido novo e mais profundo.
1648. Pode parecer difícil, e até impossível, ligar-se
por toda a vida a um ser humano. Por isso mesmo, é da
maior importância anunciar a boa-nova de que Deus nos
ama com um amor definitivo e irrevogável, de que os
esposos participam neste amor que os conduz e sustém e
de que, pela sua fidelidade, podem ser testemunhas do
amor fiel de Deus. Os esposos que, com a graça de Deus,
dão este testemunho, muitas vezes em condições bem
difíceis, merecem a gratidão e o amparo da comunidade
eclesial
(João Paulo II. Ex. ap. Familiaris consortio, 20:
AAS 74 (1982) 104).
1649. No entanto, há situações em que a coabitação
matrimonial se torna praticamente impossível pelas mais
diversas razões. Em tais casos, a Igreja admite a
separação física dos esposos e o fim da coabitação.
Mas os esposos não deixam de ser marido e mulher perante
Deus: não são livres de contrair nova união. Nesta
situação difícil, a melhor solução seria, se possível, a
reconciliação. A comunidade cristã é chamada a ajudar
estas pessoas a viverem cristãmente a sua situação, na
fidelidade ao vínculo do seu Matrimónio, que continua
indissolúvel
(Cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio,
83: AAS 74 (1982) 184; CIC can. 1151-1155).
1650. Hoje em dia e em muitos países, são numerosos os
católicos que recorrem ao divórcio, em
conformidade com as leis civis, e que contraem
civilmente uma nova união. A Igreja mantém, por
fidelidade à palavra de Jesus Cristo («quem repudia a
sua mulher e casa com outra comete adultério em relação
à primeira; e se uma mulher repudia o seu marido e casa
com outro, comete adultério») (Mc 10, 11-12),
que não pode reconhecer como válida uma nova união, se o
primeiro Matrimónio foi válido. Se os divorciados se
casam civilmente, ficam numa situação objetivamente
contrária à lei de Deus. Por isso, não podem
aproximar-se da comunhão eucarística, enquanto persistir
tal situação. Pelo mesmo motivo, ficam impedidos de
exercer certas responsabilidades eclesiais. A
reconciliação, por meio do sacramento da Penitência, só
pode ser dada àqueles que se arrependerem de ter violado
o sinal da Aliança e da fidelidade a Cristo e se
comprometerem a viver em continência completa.
1651. Com respeito a cristãos que vivem nesta situação e
que muitas vezes conservam a fé e desejam educar
cristãmente os seus filhos, os sacerdotes e toda a
comunidade devem dar provas duma solicitude atenta, para
que eles não se sintam separados da Igreja, em cuja vida
podem e devem participar como batizados que são:
- «serão convidados a ouvir a Palavra de Deus, a
assistir ao sacrifício da Missa, a perseverar na oração,
a prestar o seu contributo às obras de caridade e às
iniciativas da comunidade em prol da justiça, a educar
os seus filhos na fé cristã, a cultivar o espírito de
penitência e a cumprir os atos respectivos, a fim de
implorarem, dia após dia, a graça de Deus»
(João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio,
84: AAS 74 (1982) 185).
A ABERTURA À FECUNDIDADE
1652. «Pela sua própria natureza, a instituição
matrimonial e o amor conjugal estão ordenados à
procriação e à educação dos filhos, que constituem o
ponto alto da sua missão e a sua coroa».
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).
«Os filhos são, sem dúvida, o mais excelente dom do
Matrimónio e contribuem muitíssimo para o bem dos
próprios pais. O mesmo Deus que disse: "não é bom que o
homem esteja só"
(Gn. 2, 18) e que "desde o princípio fez o homem
varão e mulher" (Mt. 19, 4), querendo
comunicar-lhe uma participação especial na sua obra
criadora, abençoou o homem e a mulher dizendo: "sede
fecundos e multiplicai-vos" (Gn. 1, 28). Por
isso, o culto autêntico do amor conjugal e toda a vida
familiar que dele nasce, sem pôr de lado os outros fins
do Matrimónio, tendem a que os esposos, com fortaleza de
ânimo, estejam dispostos a colaborar com o amor do
Criador e do Salvador, que, por meio deles, aumenta
continuamente e enriquece a sua família»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 50: AAS 58 (1966) 1070-1071).
1653 A fecundidade do amor conjugal estende-se aos
frutos da vida moral, espiritual e sobrenatural que os
pais transmitem aos filhos pela educação. Os pais são os
principais e primeiros educadores dos seus filhos
(II Concílio do Vaticano, Decl. Gravissimum
educationis, 3: AAS 58 (1966) 731).
Neste sentido, a missão fundamental do Matrimónio e da
família é estar ao serviço da vida
(Cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio,
28: AAS 74(1982) 114).
1654. Os esposos a quem Deus não concedeu a graça de ter
filhos podem, no entanto, ter uma vida conjugal cheia de
sentido, humana e cristãmente falando. O seu Matrimónio
irradiar uma fecundidade de caridade, de acolhimento e
de sacrifício.
VI. A Igreja doméstica
1655. Cristo quis nascer e crescer no seio da Sagrada
Família de José e de Maria. A Igreja outra coisa não é
senão a «família de Deus». Desde as suas origens,
o núcleo aglutinante da Igreja era, muitas vezes,
constituído por aqueles que, «com toda a sua casa, se
tinham tornado crentes»
(Cf
At. 18, 8).
Quando se convertiam, desejavam que também «toda a
sua casa» fosse salva
(Cf. At. 16, 31; 11, 14).
Estas famílias, que passaram a ser crentes, eram
pequenas ilhas de vida cristã no meio dum mundo
descrente.
1656. Nos nossos dias, num mundo muitas vezes estranho e
até hostil à fé, as famílias crentes são de primordial
importância, como focos de fé viva e irradiante. É por
isso que o II Concílio do Vaticano chama à família,
segundo uma antiga expressão, «Ecclesia doméstica -
Igreja doméstica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 (1965) 16; cf. João Paulo II, Ex. ap.
Familiaris consortio, 21: AAS 74 (1982) 105).
É no seio da família que os pais são, «pela palavra e
pelo exemplo [...], os primeiros arautos da fé para os
seus filhos, ao serviço da vocação própria de cada um e
muito especialmente da vocação consagrada»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 (1965) 16).
1657. É aqui que se exerce, de modo privilegiado, o
sacerdócio batismal do pai de família, da mãe, dos
filhos, de todos os membros da família, «na recepção
dos sacramentos, na oração e ação de graças, no
testemunho da santidade de vida, na abnegação e na
caridade efetiva»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,10:
AAS 57 (1965) 15).
O lar é, assim, a primeira escola de vida cristã e
«uma escola de enriquecimento humano»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 52: AAS 58 (1966) 1073).
É aqui que se aprende a tenacidade e a alegria no
trabalho, o amor fraterno, o perdão generoso e sempre
renovado, e, sobretudo, o culto divino, pela oração e
pelo oferecimento da própria vida.
1658. Não podem esquecer-se, também, certas pessoas que
estão, em virtude das condições concretas em que têm de
viver, muitas vezes sem assim o terem querido,
particularmente próximas do coração de Cristo, e que
merecem, portanto, a estima e a solicitude atenta da
Igreja, particularmente dos pastores: o grande número de
pessoas celibatárias. Muitas delas ficam sem
família humana, frequentemente devido a condições de
pobreza. Algumas vivem a sua situação no espírito das
bem-aventuranças, servindo a Deus e ao próximo de modo
exemplar. Mas a todas é necessário abrir as portas dos
lares, «igrejas domésticas», e da grande família
que é a Igreja. «Ninguém se sinta privado de família
neste mundo: a Igreja é casa e família para todos,
especialmente para quantos estão "cansados e oprimidos"»
(Mt. 11, 28)
(João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 85:
AAS 74 (1982) 187).
Resumindo:
1659. São Paulo diz: «maridos, amai as vossas
mulheres, como Cristo amou a Igreja [...] É grande este
mistério, que eu refiro a Cristo e à Igreja» (Ef. 5,
25.32).
1660. A aliança matrimonial, pela qual um homem e uma
mulher constituem entre si uma comunidade íntima de vida
e de amor; foi fundada e dotada das suas leis próprias
pelo Criador: Pela sua natureza, ordena-se ao bem dos
cônjuges, bem como à procriação e educação dos filhos.
Entre os batizados, foi elevada por Cristo Senhor à
dignidade de sacramento
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 48: AAS 58 (1966) 1067-1068; CIC can. 1055, §
1).
1661. O sacramento do Matrimónio significa a união de
Cristo com a Igreja. Confere aos esposos a graça de se
amarem com o amor com que Cristo amou a sua Igreja; a
graça do sacramento aperfeiçoa assim o amor humano dos
esposos, dá firmeza à sua unidade indissolúvel e
santifica-os no caminho da vida eterna
(Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª. Doctrina de
sacramento Matrimonii: DS 1799).
1662. O Matrimónio assenta no consentimento dos
contraentes, quer dizer; na vontade de se darem mútua e
definitivamente, com o fim de viverem uma aliança de
amor fiel e fecundo.
1663. Uma vez que o Matrimónio estabelece os cônjuges
num estado público de vida na Igreja, é conveniente que
a sua celebração seja pública, integrada numa celebração
litúrgica, perante o sacerdote (ou testemunha
qualificada da Igreja), as testemunhas e a assembleia
dos fiéis.
1664. A unidade, a indissolubilidade e a abertura à
fecundidade são essenciais ao Matrimónio. A poligamia é
incompatível com a unidade do Matrimónio; o divórcio
separa o que Deus uniu; a recusa da fecundidade desvia a
vida conjugal do seu «dom mais excelente», o filho
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 50: AAS 58 (1966) 1070).
1665. O novo casamento dos divorciados, em vida do
cônjuge legítimo, é contrário ao desígnio e à Lei de
Deus ensinados por Cristo. Eles não ficam separados da
Igreja, mas não têm acesso à comunhão eucarística.
Viverão a sua vida cristã sobretudo educando os filhos
na fé.
1666. O lar cristão é o lugar onde os filhos recebem
o primeiro anúncio da fé. É por isso que a casa de
família se chama, com razão, «Igreja doméstica»,
comunidade de graça e de oração, escola de virtudes
humanas e de caridade cristã. |