ARTIGO 5
«JESUS CRISTO DESCEU À MANSÃO DOS MORTOS,
AO TERCEIRO DIA RESSUSCITOU DOS MORTOS»
631. «Jesus desceu às regiões inferiores da Terra.
Aquele que desceu é precisamente o mesmo que subiu»
(Ef. 4, 9-10). O Símbolo dos Apóstolos confessa,
num mesmo artigo da fé, a descida de Cristo a mansão dos
mortos e a sua ressurreição dos mortos ao terceiro dia,
porque, na sua Páscoa, é da profundidade da morte que
Ele faz jorrar a vida:
- «Christus, Filius tuus,
qui, regressos ab inferis,
humano generi serenus illuxit,
et vivit et regnat in saecula saeculorum. Amen».
«Jesus Cristo, vosso Filho,
que, ressuscitando de entre os mortos,
iluminou o género humano com a sua luz e a sua paz
e vive glorioso pelos séculos dos séculos. Ámen»
(Vigília
Pascal, Precónio Pascal
(«Exsultet»): Missale Romanum, editio typica
(Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 273 e 275 [Missal
Romano, Gráfica de Coimbra 1992, p. 292 e 295]).
PARÁGRAFO 1
CRISTO DESCEU À MANSÃO DOS MORTOS
632. As frequentes afirmações do Novo Testamento,
segundo as quais Jesus «ressuscitou de entre os
mortos» (1ª Cor. 15, 20)
(Cf. At 3, 15; Rm 8, 11),
pressupõem que, anteriormente à ressurreição, Ele tenha
estado na mansão dos mortos
(Cf. Heb. 13, 20)
este o sentido primeiro dado pela pregação apostólica à
descida de Jesus à mansão dos mortos: Jesus conheceu a
morte, como todos os homens, e foi ter com eles à morada
dos mortos. Porém, desceu lá como salvador proclamando a
Boa-Nova aos espíritos que ali estavam prisioneiros
(Cf. 1ª Pe. 3, 18-19).
633. A morada dos mortos, a que Cristo morto desceu, é
chamada pela Escritura os infernos, Sheol ou Hades
(Cf. Fl. 2, 10; At. 2, 24: Ap. 1, 18; Ef. 4, 9),
porque aqueles que aí se encontravam estavam privados da
visão de Deus
(Cf. Sl. 6, 6; 88, 11-13).
Tal era o caso de todos os mortos, maus ou justos,
enquanto esperavam o Redentor
(Cf. Sl. 89, 49; 1º Sm. 28, 19: Ez. 32, 17-32),
o que não quer dizer que a sua sorte fosse idêntica,
como Jesus mostra na parábola do pobre Lázaro, recebido
no «seio de Abraão»
(Cf. Lc. 16, 22-26).
«Foram precisamente essas almas santas, que esperavam
o seu libertador no seio de Abraão, que Jesus Cristo
libertou quando desceu à mansão dos mortos»
(Cat Rom. 1. 6. 3. p. 71).
Jesus não desceu à mansão dos mortos para de lá libertar
os condenados
(Cf. Concílio de Roma (ano 745), De descensu Christi
ad inferos: DS 587),
nem para abolir o inferno da condenação
(Cf. Bento XII, Libellus, Cum dudum (1341).
18: DS 1011; Clemente VI, Ep. Super quibusdam
(ano 1351), c. 15, 13: DS 1077),
mas para libertar os justos que O tinham precedido
(Cf. IV Concílio de Toledo (ano 633). Capitulum,
1: DS 485; Mt 27, 52-53).
634. «A Boa-Nova foi igualmente anunciada aos
mortos...» (1ª Pe. 4, 6). A descida à
mansão dos mortos é o cumprimento, até à plenitude, do
anúncio evangélico da salvação. É a última fase da
missão messiânica de Jesus, fase condensada no tempo,
mas imensamente vasta no seu significado real de
extensão da obra redentora a todos os homens de todos os
tempos e de todos os lugares, porque todos aqueles que
se salvaram se tornaram participantes da redenção.
635. Cristo, portanto, desceu aos abismos da morte
(Cf Mt 12, 40; Rm. 10, 7; Ef 4, 9),
para que «os mortos ouvissem a voz do Filho do Homem
e os que a ouvissem, vivessem» (Jo 5, 25).
Jesus, «o Príncipe da Vida»
(Cf. At. 3, 15),
«pela sua morte, reduziu à impotência aquele que tem
o poder da morte, isto é, o Diabo, e libertou quantos,
por meio da morte, se encontravam sujeitos à servidão
durante a vida inteira» (Heb. 2, 14-15).
Desde agora, Cristo ressuscitado «detém as chaves da
morte e do Hades» (Ap 1, 18) e «ao nome de
Jesus todos se ajoelhem, no céu, na terra e nos abismos»
(Fl. 2, 10).
- «Um grande silêncio reina hoje sobre a terra; um
grande silêncio e uma grande solidão. Um grande
silêncio, porque o rei dorme. A terra estremeceu e ficou
silenciosa, porque Deus adormeceu segundo a carne e
despertou os que dormiam há séculos [...]. Vai à procura
de Adão, nosso primeiro pai, a ovelha perdida. Quer
visitar os que jazem nas trevas e nas sombras da morte.
Vai libertar Adão do cativeiro da morte. Ele que é ao
mesmo tempo seu Deus e seu filho [...] "Eu sou o teu
Deus, que por ti me fiz teu filho [...] Desperta tu que
dormes, porque Eu não te criei para que permaneças
cativo no reino dos mortos: levanta-te de entre os
mortos; Eu sou a vida dos mortos"»
(Antiga
homilia para Sábado Santo:
PG. 43. 440.452.461 [Sábado Santo, 2ª Leitura do
Ofício de Leituras: Liturgia das Horas, s. 2
(Gráfica de Coimbra 1983) p. 454-4551).
Resumindo:
636. Na expressão «Jesus desceu à mansão dos mortos»,
o Símbolo confessa que Jesus morreu realmente, e que,
por ter morrido por nós, venceu a morte e o Diabo «que
tem o poder da morte» (Heb. 2, 14).
637. Cristo morto, na sua alma unida à pessoa divina,
desceu à morada dos mortos. E abriu aos justos, que O
tinham precedido, as portas do céu.
PARÁGRAFO 2
AO TERCEIRO DIA, RESSUSCITOU DOS MORTOS
638. «Nós vos anunciamos a Boa-Nova de que a promessa
feita aos nossos pais, a cumpriu Deus para nós, seus
filhos, ao ressuscitar Jesus» (At. 13, 32-33). A
ressurreição de Jesus é a verdade culminante da
nossa fé em Cristo, acreditada e vivida como verdade
central pela primeira comunidade cristã, transmitida
como fundamental pela Tradição, estabelecida pelos
documentos do Novo Testamento, pregada como parte
essencial do mistério pascal, ao mesmo tempo que a cruz:
«Cristo ressuscitou dos mortos.
Pela Sua morte venceu a morte,
e aos mortos deu a vida»
(Liturgia
bizantina, Tropário no dia de Páscoa: «Pentêkostárion»
(Romae 1884) p.6).
I. Acontecimento histórico e transcendente
639. O mistério da ressurreição de Cristo é um
acontecimento real, com manifestações historicamente
verificadas, como atesta o Novo Testamento. Já São
Paulo, por volta do ano 56, pôde escrever aos Coríntios:
«transmiti-vos, em primeiro lugar, o mesmo que havia
recebido: Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as
Escrituras, e foi sepultado e ressuscitou ao terceiro
dia, segundo as Escrituras: a seguir, apareceu a Pedro,
depois aos Doze» (1ª Cor. 15, 3-4). O Apóstolo fala
aqui da tradição viva da ressurreição, de que
tinha tomado conhecimento após a sua conversão, às
portas de Damasco
(Cf. At. 9, 3-18).
O TÚMULO VAZIO
640. «Por que motivo procurais entre os mortos Aquele
que está vivo? Não está aqui, ressuscitou» (Lc. 24,
5-6). No quadro dos acontecimentos da Páscoa, o primeiro
elemento que se nos oferece é o sepulcro vazio. Isso não
é, em si, uma prova direta. A ausência do corpo de
Cristo do sepulcro poderia explicar-se doutro modo
(Cf. Jo. 20, l3; Mt, 28, 11-15).
Apesar disso, o sepulcro vazio constitui, para todos, um
sinal essencial. A descoberta do fato pelos discípulos
foi o primeiro passo para o reconhecimento do fato da
ressurreição. Foi, primeiro, o caso das Santas mulheres
(Cf. Lc. 24, 3. 22-23),
depois o de Pedro
(Cf. 24, 12).
«O discípulo que Jesus amava» (Jo. 20, 2) afirma
que, ao entrar no sepulcro vazio e ao descobrir «os
lençóis no chão» (Jo. 20, 6), «viu e acreditou»
(Cf. Jo. 20, 8);
o que supõe que ele terá verificado, pelo estado em que
ficou o sepulcro vazio, que a ausência do corpo de Jesus
não podia ter sido obra humana e que Jesus não tinha
simplesmente regressado a uma vida terrena, como fora o
caso de Lázaro
(Cf. Jo. 11, 44).
AS APARIÇÕES DO RESSUSCITADO
641. Maria Madalena e as santas mulheres, que vinham
para acabar de embalsamar o corpo de Jesus
(Cf. Mc. 16, l ; Lc. 24, 1),
sepultado à pressa por causa do início do «Sábado»,
no fim da tarde de Sexta-feira Santa
(Cf. Jo. 19, 31.42),
foram as primeiras pessoas a encontra-se com o
Ressuscitado
(Cf. Mt. 28, 9-10; Jo. 20, 11-18).
Assim, as mulheres foram as primeiras mensageiras da
ressurreição de Cristo para os próprios Apóstolos
(Cf. Lc. 24, 9-10).
Em seguida, foi a eles que Jesus apareceu: primeiro a
Pedro, depois aos Doze
(Cf. 1ª Cor. 15, 5).
Pedro, incumbido de consolidar a fé dos seus irmãos
(Cf. Lc. 22, 31-32),
vê, portanto, o Ressuscitado antes deles e é com base no
seu testemunho que a comunidade exclama: «realmente,
o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão» (Lc. 24,
34.36).
642. Tudo quanto aconteceu nestes dias pascais empenha
cada um dos Apóstolos - e muito particularmente Pedro -
na construção da era nova, que começa na manhã do dia de
Páscoa. Como testemunhas do Ressuscitado, eles são as
pedras do alicerce da sua Igreja. A fé da primeira
comunidade dos crentes está fundada no testemunho de
homens concretos, conhecidos dos cristãos e, a maior
parte, vivendo ainda entre eles. Estas «testemunhas
da ressurreição de Cristo»
(Cf. At. 1, 22),
são, em primeiro lugar, Pedro e os Doze. Mas há outros:
Paulo fala claramente de mais de quinhentas pessoas às
quais Jesus apareceu em conjunto, além de Tiago e de
todos os Apóstolos
(Cf. 1ª Cor 15, 4-8).
643. Perante estes testemunhos, é impossível interpretar
a ressurreição de Cristo fora da ordem física e não a
reconhecer como um fato histórico. Resulta, dos fatos,
que a fé dos discípulos foi submetida à prova radical da
paixão e morte de cruz do seu Mestre, por este de
antemão anunciada
(Cf. Lc. 22, 31-32).
O abalo provocado pela paixão foi tão forte que os
discípulos (pelo menos alguns) não acreditaram
imediatamente na notícia da ressurreição. Longe de nos
apresentar uma comunidade tomada de exaltação mística,
os evangelhos apresentam-nos os discípulos abatidos (de
«rosto sombrio»: Lc. 24, 17 e apavorados
(Cf. Jo 20, 19).
Foi por isso que não acreditaram nas santas mulheres,
regressadas da sua visita ao túmulo, e «as suas
narrativas pareceram-lhe um desvario» (Lc. 24, 11)
(Cf. Mc. 16, 11.13).
Quando Jesus apareceu aos onze, na tarde do dia de
Páscoa, «censurou-lhes a falta de fé e a teimosia em
não quererem acreditar naqueles que O tinham visto
ressuscitado» (Mc. 16, 14).
644. Mesmo confrontados com a realidade de Jesus
Ressuscitado, os discípulos ainda duvidam
(Cf. Lc. 24,38)
de tal modo isso lhes parecia impossível: julgavam ver
um fantasma
(Cf. Lc. 24, 37).
«Por causa da alegria, estavam ainda sem querer
acreditar e cheios de assombro» (Lc. 24, 41). Tomé
experimentará a mesma provação da dúvida
(Cf. Jo. 20, 24-27),
e quando da última aparição na Galileia, referida por
Mateus, «alguns ainda duvidavam» (Mt. 28,
17). É por isso que a hipótese, segundo a qual a
ressurreição teria sido um «produto» da fé (ou da
credulidade) dos Apóstolos, é inconsistente. Pelo
contrário, a sua fé na ressurreição nasceu - sob a ação
da graça divina da experiência direta da realidade de
Jesus Ressuscitado.
O ESTADO DA HUMANIDADE RESSUSCITADA DE CRISTO
645. Jesus Ressuscitado estabeleceu com os seus
discípulos relações diretas, através do contacto físico
(Cf. Lc. 24, 39; Jo. 20, 27)
e da participação na refeição
(Cf. Lc. 24, 30.41-43: Jo 21, 9.13-15).
Desse modo, convida-os a reconhecer que não é um
espírito
(Cf. Lc. 24, 39),
e sobretudo a verificar que o corpo ressuscitado, com o
qual se lhes apresenta, é o mesmo que foi torturado e
crucificado, pois traz ainda os vestígios da paixão
(Cf. Lc. 24, 40: Jo. 20, 20.27).
No entanto, este corpo autêntico e real possui, ao mesmo
tempo, as propriedades novas dum corpo glorioso: não
está situado no espaço e no tempo, mas pode, livremente,
tornar-se presente onde e quando quer
(Cf. Mt. 28, 9.16-17; Lc. 24, 15.36; Jo. 20, 14.19-26;
21, 4),
porque a sua humanidade já não pode ser retida sobre a
terra e já pertence exclusivamente ao domínio divino do
Pai
(Cf. Jo. 20, 17).
Também por este motivo, Jesus Ressuscitado é
soberanamente livre de aparecer como quer: sob a
aparência dum jardineiro
(Cf. Jo. 20, 14-15)
ou «com um aspecto diferente» (Mc. 16, 12)
daquele que era familiar aos discípulos; e isso,
precisamente, para lhes despertar a fé
(Cf. Jo. 20, 14.16; 21, 4.7).
646. A ressurreição de Cristo não foi um regresso à vida
terrena, como no caso das ressurreições que Ele tinha
realizado antes da Páscoa: a filha de Jairo, o jovem de
Naim e Lázaro. Esses fatos eram acontecimentos
milagrosos, mas as pessoas miraculadas reencontravam,
pelo poder de Jesus, uma vida terrena «normal»:
em dado momento, voltariam a morrer. A ressurreição de
Cristo é essencialmente diferente. No seu corpo
ressuscitado, Ele passa do estado de morte a uma outra
vida, para além do tempo e do espaço. O corpo de Cristo
é, na ressurreição, cheio do poder do Espírito Santo;
participa da vida divina no estado da sua glória, de tal
modo que São Paulo pode dizer de Cristo que Ele é o
«homem celeste»
(Cf. 1ª Cor. 15, 35-50).
A RESSURREIÇÃO COMO ACONTECIMENTO TRANSCENDENTE
647. «Oh noite bendita! - canta o “Exultet” pascal -
única a ter conhecimento do tempo e da hora em que
Cristo ressuscitou do sepulcro»
(Vigília
Pascal, Precónio Pascal («Exsultet»
): Missale Romanum, editio typica (Typis
Polyglottis Vaticanis 1970), p. 272 [Missal Romano,
Gráfica de Coimbra 1992, p. 290 e 294]).
Com efeito, ninguém foi testemunha ocular do
acontecimento da ressurreição propriamente dita e nenhum
evangelista o descreve. Ninguém pôde dizer como ela se
deu, fisicamente. Ainda menos a sua essência mais
íntima, a passagem a uma outra vida, foi perceptível aos
sentidos. Acontecimento histórico comprovado pelo sinal
do túmulo vazio e pela realidade dos encontros dos
Apóstolos com Cristo Ressuscitado, nem por isso a
ressurreição deixa de estar, naquilo em que transcende e
ultrapassa a história, no próprio centro do mistério da
fé. Foi por isso que Cristo Ressuscitado não Se
manifestou ao mundo
(Cf. Jo. 14, 22),
mas aos discípulos, «aos que com Ele tinham subido da
Galileia a Jerusalém» e que «são agora
testemunhas de Jesus junto do povo» (At. 13,
31).
II. A ressurreição - obra da Santíssima Trindade
648. A ressurreição de Cristo é objeto de fé, na medida
em que é uma intervenção transcendente do próprio Deus
na criação e na história. Nela, as três pessoas divinas
agem em conjunto e manifestam a sua originalidade
própria: realizou-se pelo poder do Pai, que
«ressuscitou» (At. 2, 24) Cristo seu Filho, e
assim introduziu de modo perfeito a sua humanidade - com
o seu corpo - na Trindade. Jesus foi divinamente
revelado «Filho de Deus em todo o seu poder, pela sua
ressurreição de entre os mortos» (Rm. 1, 4). São
Paulo insiste na manifestação do poder de Deus
(Cf. Rm. 6, 4; 2ª Cor. 13, 4: Fl. 3. 10; Ef. 1,
19-22; Heb. 7, 16)
por obra do Espírito, que vivificou a humanidade morta
de Jesus e a chamou ao estado glorioso de Senhor.
649. Quanto ao Filho, Ele opera a sua própria
ressurreição em virtude do seu poder divino. Jesus
anuncia que o Filho do Homem deverá sofrer muito, e
depois ressuscitar (no sentido ativo da palavra
(Cf. Mc. 8, 31; 9. 9.31; 10. 34).
Aliás, é d'Ele esta afirmação explícita: «Eu dou a
minha vida para retomá-la [...] Tenho o poder de a dar e
o poder de a retomar» (Jo. 10, 17-18). «Nós
cremos que Jesus morreu e depois ressuscitou» (1ª
Ts. 4, 14).
650. Os Santos Padres contemplam a ressurreição a partir
da pessoa divina de Cristo, que ficou unida à sua alma e
ao seu corpo, separados entre si pela morte: «pela
unidade da natureza divina, que continua presente em
cada uma das duas partes do homem, estas unem-se de
novo. Assim, a morte é produzida pela separação do
composto humano e a ressurreição pela união das duas
partes separadas»
(São Gregório de Nissa, De tridui inter mortem et
resurrectionem Domini nostri Iesu Christi spatio:
Gregorii Nysseni opera, ed. W. Jaeger - H.
Langerbeck, V. 9 (Leiden 1967) p. 293- 294 (PG 46,
417B): cf. também Statuta Ecelesiae Antigua: DS
325: Anastásio II, Ep. In prolixitate epistulae:
DS 359: Santo Hormisda. Ep. Inter ea quae:
DS 369: XI Concílio de Toledo, Symbolum: DS 539).
III. Sentido e alcance salvífico da ressurreição
651. «Se Cristo não ressuscitou, então a nossa
pregação é vã e também é vã a vossa fé» (1ª Cor. 15,
14). A ressurreição constitui, antes de mais, a
confirmação de tudo quanto Cristo em pessoa fez e
ensinou. Todas as verdades, mesmo as mais inacessíveis
ao espírito humano, encontram a sua justificação se,
ressuscitando, Cristo deu a prova definitiva, que tinha
prometido, da sua autoridade divina.
652. A ressurreição de Cristo é o cumprimento das
promessas do Antigo Testamento
(Cf. Lc. 24, 26-27. 44-48)
e do próprio Jesus, durante a sua vida terrena
(Cf. Mt. 28, 6; Mc. 16, 7; Lc. 24, 6-7).
A expressão «segundo as Escrituras»
(Cf. 1ª Cor. 15, 3-4: Símbolo
Niceno-Constantinopolitano: DS 150)
indica que a ressurreição de Cristo cumpriu essas
predições.
653. A verdade da divindade de Jesus é confirmada
pela ressurreição. Ele tinha dito: «quando elevardes
o Filho do Homem, então sabereis que "Eu Sou"» (Jo.
8, 28). A ressurreição do Crucificado demonstrou que
Ele era verdadeiramente «Eu Sou», o Filho de Deus
e Ele próprio Deus. São Paulo pôde declarar aos judeus:
«e nós vos anunciamos a Boa-Nova de que a promessa
feita aos nossos pais, cumpriu-a Deus para os filhos
deles ao ressuscitar Jesus, como justamente está escrito
no Salmo segundo: "Tu és meu Filho, Eu gerei-Te hoje"»
(At. 13, 32-33) (Cf. Sl. 2, 7).
O mistério da ressurreição de Cristo está estreitamente
ligado ao mistério da Encarnação do Filho de Deus. É
dele o cumprimento, segundo o desígnio eterno de Deus.
654. Existe um duplo aspecto no mistério pascal: pela
sua morte, Cristo liberta-nos do pecado; pela sua
ressurreição, abre-nos o acesso a uma nova vida. Esta é,
antes de mais, a justificação, que nos repõe na
graça de Deus
(Cf. Rm. 4, 25),
«para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos
[...], também nós vivamos uma vida nova» (Rm. 6, 4).
Esta consiste na vitória sobre a morte do pecado e na
nova participação na graça
(Cf. Ef. 2, 4-5; 1ª Pe. 1, 3);
realiza a adoção filial, porque os homens
tornam-se irmãos de Cristo, como o próprio Jesus chama
aos discípulos depois da ressurreição: «ide anunciar
aos meus irmãos» (Mt. 28, 10)
(Cf. Jo. 20, 17).
Irmãos, não por natureza, mas por dom da graça, porque
esta filiação adotiva proporciona uma participação real
na vida do Filho, plenamente revelada na sua
ressurreição.
655. Finalmente, a ressurreição de Cristo - e o próprio
Cristo Ressuscitado -- é princípio e fonte da nossa
ressurreição futura: «Cristo ressuscitou dos mortos como
primícias dos que morreram [...]. Do mesmo modo que em
Adão todos morreram, assim também em Cristo serão todos
restituídos à vida»
(1ª Cor. 15, 20-22).
Na expectativa de que isto se realize, Cristo
Ressuscitado vive no coração dos seus fiéis. N'Ele, os
cristãos «saboreiam as maravilhas do mundo vindouro»
(Heb. 6, 5) e a sua vida é atraída por
Cristo para o seio da vida divina
(Cf. Cl. 3, 1-3),
«para que os vivos deixem de viver para si próprios,
mas vivam para Aquele que morreu e ressuscitou por eles»
(2ª Cor. 5, 15).
Resumindo:
656. A fé na ressurreição tem por objeto um
acontecimento, ao mesmo tempo historicamente
testemunhado pelos discípulos (que realmente encontraram
o Ressuscitado) e misteriosamente transcendente,
enquanto entrada da humanidade de Cristo na glória de
Deus.
657. O sepulcro vazio e os lençóis deixados no chão
significam, por si mesmos, que o corpo de Cristo
escapou aos laços da morte e da corrupção, pelo poder de
Deus. E preparam os discípulos para o encontro com o
Ressuscitado.
658. Cristo, «primogénito de entre os mortos»
(Cl. 1, 18), é o princípio da nossa própria
ressurreição, desde agora pela justificação da nossa
alma
(Cf. Rm. 6, 4),
mais tarde pela vivificação do nosso corpo
(Cf. Rom. 8, 11).
ARTIGO 6
«JESUS SUBIU AOS CÉUS E ESTÁ SENTADO
À DIREITA DE DEUS, PAI TODO-PODEROSO»
659. «Então, o Senhor Jesus, depois de lhes ter
falado, foi elevado ao céu e sentou-se à direita de
Deus» (Mc. 16, 19). O corpo de Cristo foi
glorificado desde o momento da sua ressurreição, como o
provam as propriedades novas e sobrenaturais de que, a
partir de então, ele goza permanentemente
(Cf. Lc. 24. 31; Jo. 20, 19.26).
Mas, durante os quarenta dias em que vai comer e beber
familiarmente com os discípulos
(Cf. At. 10, 41)
e instruí-los sobre o Reino
(Cf. At. 1, 3),
a sua glória fica ainda velada sob as aparências duma
humanidade normal
(Cf. Mc. 16, 12; Lc. 24. 15; Jo. 20, 14-15; 21, 4).
A última aparição de Jesus termina com a entrada
irreversível da sua humanidade na glória divina,
simbolizada pela nuvem
(Cf. At. 1, 9; também Lc. 9. 34-35; Ex. 13, 22)
e pelo céu
(Cf. Lc. 24, 51).
onde a partir de então, está sentado à direita de Deus
(Cf. Mc. 16, 19; At. 2, 33; 7. 56: também Sl. 110, 1).
Só de modo absolutamente excepcional e único é que Se
mostrará a Paulo, «como a um aborto» (1ª Cor.
15, 8), numa última aparição que o constitui
Apóstolo
(Cf. 1ª Cor. 9, 1: Gl. 1, 16).
660. O carácter velado da glória do Ressuscitado,
durante este tempo, transparece na sua misteriosa
palavra a Maria Madalena: « [...] ainda não subi para
o Pai. Vai ter com os meus irmãos e diz-lhes que vou
subir para o meu Pai e vosso Pai, para o meu Deus e
vosso Deus» (Jo. 20, 17). Isto indica uma diferença
entre a manifestação da glória de Cristo Ressuscitado e
a de Cristo exaltado à direita do Pai. O acontecimento
da ascensão, ao mesmo tempo histórico e transcendente,
marca a transição duma para a outra.
661. Esta última etapa continua intimamente unida à
primeira, isto é, à descida do céu realizada na
Encarnação. Só Aquele que «saiu do Pai» pode
«voltar para o Pai»: Cristo
(Cf. Jo. 16, 28).
«Ninguém subiu ao céu senão Aquele que desceu do céu:
o Filho do Homem» (Jo. 3, 13)
(Cf. Ef. 4, 8-10).
Abandonada às suas forças naturais, a humanidade não tem
acesso à «Casa do Pai»
(Cf. Jo. 14, 2),
à vida e à felicidade de Deus. Só Cristo pode abrir ao
homem este acesso: «subindo aos céus, como nossa
cabeça e primogênito, deu-nos a esperança de irmos um
dia ao seu encontro, como membros do seu corpo»
(Prefácio
de Ascensão, I: Missale Romanum,
editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 410
[Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992. 474]).
662. «E Eu, uma vez elevado da terra, atrairei todos
a Mim» (Jo 12, 32). A elevação na cruz significa e
anuncia a elevação da ascensão aos céus. É o princípio
dela, Jesus Cristo, o único sacerdote da nova e eterna
Aliança, «não entrou num santuário feito por homens
[...]. Entrou no próprio céu, a fim de agora se
apresentar diante de Deus em nosso favor» (Heb. 9,
24). Nos céus, Cristo exerce permanentemente o seu
sacerdócio, «sempre vivo para interceder a favor
daqueles que, por seu intermédio, se aproximam de Deus»
(Heb. 7, 25). Como «sumo sacerdote dos bens
futuros» (Heb. 9, 11), Ele é o centro e o
ator principal da liturgia que honra o Pai que está nos
céus
(Cf. Ap. 4, 6-11).
663. Doravante, Cristo está sentado à direita do Pai:
«por direita do Pai entendemos a glória e a honra da
divindade, em cujo seio Aquele que, antes de todos os
séculos, existia como Filho de Deus, como Deus e
consubstancial ao Pai, tomou assento corporalmente desde
que encarnou e o seu corpo foi glorificado»
(São João Damasceno, Expositio fidei, 75 [De
fide Orthodoxa 4, 2]: PTS 12. 173 (PG 94, 104D)).
664. Sentar-se à direita do Pai significa a inauguração
do Reino messiânico, cumprimento da visão do profeta
Daniel a respeito do Filho do Homem: «foi-Lhe
entregue o domínio, a majestade e a realeza, e todos os
povos, nações e línguas O serviram. O seu domínio é um
domínio eterno, que não passará jamais, e a sua realeza
não será destruída» (Dn. 7, 14). A partir
deste momento, os Apóstolos tornaram-se as testemunhas
do «Reino que não terá fim»
(Cf. Símbolo Niceno-Constantinopolitano: DS 150).
Resumindo:
665. A ascensão de Cristo marca a entrada definitiva
da humanidade de Jesus no domínio celeste de Deus, de
onde há de voltar (Cf. At. 1, 11)
mas que, entretanto, O oculta aos olhos dos homens
(Cf. Cl. 3, 3).
666. Jesus Cristo, cabeça da Igreja, precede-nos no
Reino glorioso do Pai, para que nós, membros do seu
corpo, vivamos na esperança de estarmos um dia
eternamente com Ele.
667. Jesus Cristo, tendo entrado, uma vez por todas,
no santuário dos céus, intercede incessantemente por
nós, como mediador que nos garante permanentemente a
efusão do Espírito Santo.
ARTIGO 7
«DE ONDE HÁ-DE VIR A JULGAR
OS VIVOS E OS MORTOS»
I. «Voltará na sua glória»
CRISTO REINA, DESDE JÁ, PELA IGREJA...
668. «Cristo morreu e voltou à vida para ser Senhor
dos mortos e dos vivos» (Rm. 14, 9). A ascensão de
Cristo aos céus significa a sua participação, na sua
humanidade, no poder e autoridade do próprio Deus. Jesus
Cristo é Senhor: Ele possui todo o poder nos céus e na
Terra. Está «acima de todo o principado, poder,
virtude e soberania», porque o Pai «tudo submeteu
a seus pés» (Ef. 1, 20-22). Cristo é o
Senhor do cosmos
(Cf. Ef. 4, 10; 1ª Cor 15, 24. 27-28)
e da história, N'Ele, a história do homem, e até a
criação inteira, encontram a sua «recapitulação»
(Cf. Ef. 1, 10),
o seu acabamento transcendente.
669. Como Senhor, Cristo é também a cabeça da Igreja,
que é o seu corpo
(Cf. Ef. 1, 22).
Elevado ao céu e glorificado, tendo assim cumprido
plenamente a sua missão, continua na terra por meio da
Igreja. A redenção é a fonte da autoridade que Cristo,
em virtude do Espírito Santo, exerce sobre a Igreja
(Cf. Ef. 1, 22).
«O Reino de Cristo já está misteriosamente presente
na Igreja»
(Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
3: AAS 57 (1965) 6),
«gérmen e princípio deste mesmo Reino na Terra»
(Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
5: AAS 57 (1965) 8).
670. Depois da ascensão, o desígnio de Deus entrou na
sua consumação. Estamos já na «última hora» (1ª
Jo. 2, 18) (Cf. 1ª Pe. 4, 7).
«Já chegou, pois, a nós, a plenitude dos tempos, a
renovação do mundo já está irrevogavelmente adquirida e,
de certo modo, encontra-se já realmente antecipada neste
tempo: com efeito, ainda aqui na Terra, a Igreja está
aureolada de uma verdadeira, embora imperfeita,
santidade»
(Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53).
O Reino de Cristo manifesta já a sua presença pelos
sinais miraculosos
(Cf. Mc. 16, 17-18)
que acompanham o seu anúncio pela Igreja
(Cf.
Mc. 16, 20).
... À ESPERA DE QUE TUDO LHE SEJA SUBMETIDO
671. Já presente na sua Igreja, o Reino de Cristo,
contudo, ainda não está acabado «em poder e glória»
(Lc. 21, 27)
(Cf. Mt. 25, 31)
pela vinda do Rei à terra. Este Reino ainda é atacado
pelos poderes do mal
(Cf. 2ª Ts. 2, 7),
embora estes já tenham sido radicalmente vencidos pela
Páscoa de Cristo. Até que tudo Lhe tenha sido submetido
(Cf. 1ª Cor. 15, 28),
«enquanto não se estabelecem os novos céus e a nova
terra, em que habita a justiça, a Igreja peregrina, nos
seus sacramentos e nas suas instituições, que pertencem
à presente ordem temporal, leva a imagem passageira
deste mundo e vive no meio das criaturas que gemem e
sofrem as dores do parto, esperando a manifestação dos
filhos de Deus»
(Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53).
Por este motivo, os cristãos oram, sobretudo na
Eucaristia
(Cf. 1ª Cor. 11, 26),
para que se apresse o regresso de Cristo
(Cf. 2ª Pe, 3. 11-12),
dizendo-Lhe: «vem, Senhor» (Ap. 22, 20)
(Cf. 1ª Cor. 16, 22; Ap. 22, 17).
672. Cristo afirmou, antes da sua ascensão, que ainda
não era a hora do estabelecimento glorioso do Reino
messiânico esperado por Israel
(Cf. At. 1, 6-7),
o qual devia trazer a todos os homens, segundo os
profetas
(Cf. Is. 11, 1-9),
a ordem definitiva da justiça, do amor e da paz. O tempo
presente é, segundo o Senhor, o tempo do Espírito e do
testemunho
(Cf. At. 1, 8)
mas é também um tempo ainda marcado pela «desolação»
(Cf. 1ª Cor. 7, 26)
e pela provação do mal
(Cf. Ef. 5, 16),
que não poupa a Igreja
(Cf. 1ª Pe. 4, 17)
e inaugura os combates dos últimos dias
(Cf. 1ª Jo. 2, 18; 4, 3: 1ª Tm. 4, 1).
É um tempo de espera e de vigília
(Cf. Mt. 25, 1-13; Mc. 13, 33-37).
A VINDA GLORIOSA DE CRISTO, ESPERANÇA DE ISRAEL
673. A partir da ascensão, a vinda de Cristo na glória
está iminente
(Cf. Ap 22. 20)
mesmo que não nos «pertença saber os tempos ou os
momentos que o Pai determinou com a sua autoridade»
(At. 1, 7)
(Cf. Mc. 13, 32).
Este advento escatológico pode realizar-se a qualquer
momento
(Cf. Mt. 24, 44; 1ª Ts. 5, 2),
ainda que esteja «retido», ele e a provação final
que o há de preceder
(Cf. 2ª Ts. 2, 3-12).
674. A vinda do Messias glorioso está pendente, a todo o
momento da história
(Cf. Rm. 11, 31),
do seu reconhecimento por «todo o Israel»
(Cf. Rm. 11, 26; Mt. 23, 39),
do qual «uma parte se endureceu»
(Cf. Rm. 11, 25)
na «incredulidade» (Rm. 11, 20) em relação a
Jesus. E Pedro quem diz aos judeus de Jerusalém, após o
Pentecostes: «arrependei-vos, pois, e convertei-vos,
para que os pecados vos sejam perdoados. Assim, o Senhor
fará que venham os tempos de alívio e vos mandará o
Messias Jesus, que de antemão vos foi destinado. O céu
tem de O conservar até à altura da restauração
universal, que Deus anunciou pela boca dos seus santos
profetas de outrora» (At. 3, 19-21). E Paulo
faz-se eco destas palavras: «se da sua rejeição
resultou a reconciliação do mundo, o que será a sua
reintegração senão uma ressurreição de entre os mortos»?
(Rm. 11, 15). A entrada da totalidade dos judeus
(Cf. Rm. 11, 12)
na salvação messiânica, a seguir à «conversão total
dos pagãos»
(Cf. Rm. 11, 25; Lc. 21, 24),
dará ao povo de Deus ocasião de «realizar a plenitude
de Cristo» (Ef. 4, 13), na qual «Deus será
tudo em todos» (1ª Cor. 15, 2).
A ÚLTIMA PROVA DA IGREJA
675. Antes da vinda de Cristo, a Igreja deverá passar
por uma prova final, que abalará a fé de numerosos
crentes
(Cf. Lc. 18, 8; Mt. 24, 12).
A perseguição, que acompanha a sua peregrinação na Terra
(Cf. Lc. 21, 12; Jo. 15, 19-20),
porá a descoberto o «mistério da iniquidade», sob
a forma duma impostura religiosa, que trará aos homens
uma solução aparente para os seus problemas, à custa da
apostasia da verdade. A suprema impostura religiosa é a
do Anticristo, isto é, dum pseudo-messianismo em que o
homem se glorifica a si mesmo, substituindo-se a Deus e
ao Messias Encarnado
(Cf. 2ª Ts. 2, 4-12; 1ª Ts. 5. 2-3; 2 Jo. 7; 1 Jo. 2,
18.22).
676. Esta impostura anticrística já se esboça no mundo,
sempre que se pretende realizar na história a esperança
messiânica, que não pode consumar-se senão para além
dela, através do juízo escatológico. A Igreja rejeitou
esta falsificação do Reino futuro, mesmo na sua forma
mitigada, sob o nome de milenarismo
(Cf. Santo Ofício, Decretum de millenarismo (19
de julho de 1944): DS 3839),
e principalmente sob a forma política dum messianismo
secularizado, «intrinsecamente perverso»
(Cf. Pio XI, Enc. Divini Redemtptoris (19 de
março de 1937): AAS 29 (1937) 65-106, condenando o
«falso misticismo» desta «simulação da redenção dos
humildes» (p. 69); II Concílio do Vaticano,
Const. past. Gaudium et spes, 20-21: AAS 58
(1966) 1040-1042).
677. A Igreja não entrará na glória do Reino senão
através dessa última Páscoa, em que seguirá o Senhor na
sua morte e ressurreição
(Cf. Ap. 19, 1-9).
O Reino não se consumará, pois, por um triunfo histórico
da Igreja
(Cf. Ap. 13, 8)
segundo um progresso ascendente, mas por uma vitória de
Deus sobre o último desencadear do mal
(Cf. Ap. 20, 7-10),
que fará descer do céu a sua Esposa
(Cf. Ap. 21, 2-4).
O triunfo de Deus sobre a revolta do mal tomará a forma
de Juízo final
(Cf. Ap. 20, 12),
após o último abalo cósmico deste mundo passageiro
(Cf. 2ª Pe. 3. 12-13).
II. «Para julgar os vivos e os mortos»
678. Na sequência dos profetas
(Cf. Dn. 7, 10; Jl. 3-4: Ml. 3, 19)
e de João Baptista
(Cf. Mt 3, 7-12),
Jesus anunciou, na sua pregação, o Juízo do último dia.
Então será revelado o procedimento de cada um
(Cf. Mc. 12, 38-40)
e o segredo dos corações (Cf.
Lc. 12, Jo. 3, 20-21; Rm. 2, 16; 1ª Cor. 4, 5).
Então, será condenada a incredulidade culpável, que não
teve em conta a graça oferecida por Deus
(Cf. Mt. 11, 20-24: 12, 41-42).
A atitude tomada para com o próximo revelará a aceitação
ou a recusa da graça e do amor divino
(Cf. Mt. 5, 22; 7, 1-5).
No último dia, Jesus dirá: «sempre que o fizestes a
um dos meus irmãos mais pequeninos, a Mim o fizestes»
(Mt. 25, 40).
679. Cristo é Senhor da vida eterna. O pleno direito de
julgar definitivamente as obras e os corações dos homens
pertence-Lhe a Ele, enquanto redentor do mundo. Ele
«adquiriu» este direito pela sua cruz. Por isso, o
Pai entregou «ao Filho todo o poder de julgar»
(Jo. 5, 22)
(Cf. Jo. 5, 27: Mt. 25, 31: At. 10, 42: 17, 31: 2ª Tm.
4, 1).
Ora, o Filho não veio para julgar, mas para salvar
(Cf. Jo. 3, 17)
e dar a vida que tem em Si
(Cf. Jo. 5, 26).
É pela recusa da graça nesta vida que cada qual se julga
já a si próprio
(Cf. Jo. 3, 18: 12, 48),
recebe segundo as suas obras
(Cf. 1ª Cor. 3, 12-15)
e pode, mesmo, condenar-se para a eternidade, recusando
o Espírito de amor
(Cf. Mt. 12, 32; Heb. 6, 4-6; 10, 26-31).
Resumindo:
680. Cristo Senhor reina já pela Igreja, mas ainda
não Lhe estão submetidas todas as coisas deste mundo. O
triunfo do Reino de Cristo só será um fato, depois dum
último assalto das forças do mal.
681. No dia do Juízo, no fim do mundo, Cristo virá na
sua glória para completar o triunfo definitivo do bem
sobre o mal, os quais, como o trigo e o joio, terão
crescido juntos no decurso da história.
682. Quando vier; no fim dos tempos, para julgar os
vivos e os mortos, Cristo glorioso há de revelar a
disposição secreta dos corações, e dará a cada um
segundo as suas obras e segundo tiver aceite ou recusado
a graça.
CAPÍTULO TERCEIRO
CREIO NO ESPÍRITO SANTO
683. «Ninguém pode dizer "Jesus é o Senhor" a não ser
pela ação do Espírito Santo» (1ª Cor. 12, 3).
«Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu
Filho, que clama: "Abbá! Pai!'» (Gl. 4, 6).
Este conhecimento da fé só é possível no Espírito Santo.
Para estar em contato com Cristo, é preciso primeiro ter
sido tocado pelo Espírito Santo. É Ele que nos precede e
suscita em nós a fé. Em virtude do nosso Batismo,
primeiro sacramento da fé, a Vida, que tem a sua fonte
no Pai e nos é oferecida no Filho, é-nos comunicada,
íntima e pessoalmente, pelo Espírito Santo na Igreja:
- o Baptismo «dá-nos a graça do novo nascimento em
Deus Pai, por meio do Filho no Espírito Santo. Porque
aqueles que têm o Espírito de Deus são conduzidos ao
Verbo, isto é, ao Filho: mas o Filho apresenta-os ao
Pai, e o Pai dá-lhes a incorruptibilidade. Portanto, sem
o Espírito não é possível ver o Filho de Deus, e sem o
Filho ninguém tem acesso ao Pai, porque o conhecimento
do Pai é o Filho, e o conhecimento do Filho de Deus
faz-se pelo Espírito Santo»
(Santo Ireneu de Lião, Demonstratio praedicationis
apostolicae, 7: SC 62, 41-42).
684. O Espírito Santo, pela sua graça, é o primeiro no
despertar da nossa fé e na vida nova que consiste em
conhecer o Pai e Aquele que Ele enviou, Jesus Cristo
(Cf. Jo. 17, 3).
No entanto, Ele é o último na revelação das Pessoas da
Santíssima Trindade. São Gregário de Nazianzo, «o
Teólogo», explica esta progressão pela pedagogia da
«condescendência» divina:
- «o Antigo Testamento proclamava manifestamente o Pai e
mais obscuramente o Filho. O Novo manifestou o Filho e
fez entrever a divindade do Espírito. Agora, porém, o
próprio Espírito vive conosco e manifesta-se a nós mais
abertamente. Com efeito, quando ainda não se confessava
a divindade do Pai, não era prudente proclamar
abertamente o Filho: e quando a divindade do Filho ainda
não era admitida, não era prudente acrescentar o
Espírito Santo como um fardo suplementar, para empregar
uma expressão um tanto ousada [...] É por avanços e
progressões "de glória em glória " que a luz da Trindade
brilhará em mais esplendorosas claridades»
(São Gregório de Nazianzo, Oratio 31 (Theologica
5), 26: SC 250, 326 (PG 36, 161-164)).
685. Crer no Espírito é, portanto, professar que o
Espírito Santo é uma das Pessoas da Santíssima Trindade,
consubstancial ao Pai e ao Filho, «adorado e
glorificado com o Pai e o Filho»
(Símbolo Niceno-Constantinopolitano: DS 150). É por isso que tratamos do mistério
divino do Espírito Santo na «teologia»
trinitária. Portanto, aqui só trataremos do Espírito
Santo no âmbito da «economia» divina.
686. O Espírito Santo age juntamente com o Pai e o
Filho, desde o princípio até à consumação do desígnio da
nossa salvação. Mas é nestes «últimos tempos»,
inaugurados com a Encarnação redentora do Filho, que Ele
é revelado e dado, reconhecido e acolhido como Pessoa.
Então, esse desígnio divino, consumado em Cristo,
«Primogénito» e Cabeça da nova criação, poderá tomar
corpo na humanidade pelo Espírito derramado: a Igreja, a
comunhão dos santos, a remissão dos pecados, a
ressurreição da carne, a vida eterna.
ARTIGO 8
«CREIO NO ESPÍRITO SANTO»
687. «Ninguém conhece o que há em Deus, senão o
Espírito de Deus» (1ª Cor. 2, 11). Ora, o seu
Espírito, que O revela, faz-nos conhecer Cristo, seu
Verbo, sua Palavra viva; mas não se diz a Si próprio.
Aquele que «falou pelos profetas»
(Símbolo Niceno-Constantinopolitano: DS 150) faz-nos ouvir a Palavra do Pai. Mas a Ele,
nós não O ouvimos. Não O conhecemos senão no movimento
em que Ele nos revela o Verbo e nos dispõe a acolhê-Lo
na fé. O Espírito de verdade, que nos «revela»
Cristo, «não fala de Si próprio»
(Cf. Jo. 16, 13). Tal escondimento, propriamente divino,
explica porque é que «o mundo não O pode receber,
porque não O vê nem O conhece», enquanto aqueles que
creem em Cristo O conhecem, porque habita com eles e
está neles (Jo 14, 17).
688. A Igreja, comunhão viva na fé dos Apóstolos que ela
transmite, é o lugar do nosso conhecimento do Espírito
Santo:
- Nas Escrituras, que Ele inspirou:
- na Tradição, de que os Padres da Igreja são
testemunhas sempre atuais;
- no Magistério da Igreja, que Ele assiste;
- na liturgia sacramental, através das suas palavras e
dos seus símbolos, em que o Espírito Santo nos põe em
comunhão com Cristo;
- na oração, em que Ele intercede por nós;
- nos carismas e ministérios, pelos quais a Igreja é
edificada;
- nos sinais de vida apostólica e missionária;
- no testemunho dos santos, nos quais Ele manifesta a
sua santidade e continua a obra da salvação.
I. A missão conjunta do Filho e do Espírito
689. Aquele que o Pai enviou aos nossos corações, o
Espírito do seu Filho
(Cf. Gl. 4, 6),
é realmente Deus. Consubstancial ao Pai e ao Filho, é
d'Eles inseparável, tanto na vida íntima da Trindade
como no seu dom de amor pelo mundo. Mas ao adorar a
Santíssima Trindade, vivificante, consubstancial e
indivisível, a fé da Igreja professa também a distinção
das Pessoas. Quando o Pai envia o seu Verbo, envia
sempre o seu Espírito: missão conjunta na qual o Filho e
o Espírito Santo são distintos, mas inseparáveis. Sem
dúvida, é Cristo quem aparece, Ele que é a Imagem
visível de Deus invisível; mas é o Espírito Santo quem O
revela.
690. Jesus é Cristo, «ungido», porque o Espírito
é d'Ele a Unção; e tudo quanto acontece a partir da
Encarnação, decorre desta plenitude
(Cf. Jo. 3, 34).
Finalmente, quando Cristo é glorificado
(Cf. Jo. 7, 39),
pode, por sua vez, enviar de junto do Pai, o Espírito,
aos que creem n'Ele: comunica-lhes a sua glória
(Cf. Jo. 17, 22), quer dizer, o Espírito Santo que O
glorifica
(Cf. Jo. 16, 14).
A missão conjunta desenvolver-se-á, a partir desse
momento, nos filhos adotados pelo Pai no Corpo do seu
Filho: a missão do Espírito de adoção consistirá em
uni-los a Cristo e fazê-los viver n' Ele:
- «a unção sugere... que não há nenhuma distância entre
o Filho e o Espírito. Com efeito, do mesmo modo que
entre a superfície do corpo e a unção do óleo, nem a
razão nem os sentidos encontram qualquer entremeio,
assim é imediato o contacto do Filho com o Espírito, de
tal modo que aquele que vai tomar contacto com o Filho
pela fé, tem que contactar primeiro com o óleo. Com
efeito, não há pane alguma que esteja despida do
Espírito Santo. É por isso que a confissão do Senhorio
do Filho se faz no Espírito Santo para aqueles que a
recebem, pois o Espírito vem, de todos os lados, ao
encontro daqueles que se aproximam pela fé»
(São Gregório de Nissa, Adversus Macedonianos de
Spiritu Sancto, 16: Gregorii Nysseni opera,
ed. W. Jaeger-H. Langerbeck, V. 3/1 (Leiden 1958) p.
102-103 (PG 45, 1321)).
II. O nome, as designações e os símbolos do Espírito
Santo
O NOME PRÓPRIO DO ESPÍRITO SANTO
691. «Espírito Santo», tal á o nome próprio
d'Aquele que adoramos e glorificamos com o Pai e o
Filho. A Igreja recebeu este nome do Senhor e professa-o
no Batismo dos seus novos filhos
(Cf. Mt. 28, 19).
O termo «Espírito» traduz o termo hebraico
«Ruah» que, na sua primeira acepção, significa
sopro, ar, vento. Jesus utiliza precisamente a imagem
sensível do vento para sugerir a Nicodemos a novidade
transcendente d'Aquele que é pessoalmente o Sopro de
Deus, o Espírito divino
(Cf. Jo. 3, 5-8). Por outro lado, Espírito e Santo são
atributos divinos comuns às três Pessoas divinas. Mas,
juntando os dois termos, a Escritura, a Liturgia e a
linguagem teológica designam a Pessoa inefável do
Espírito Santo, sem equívoco possível com os outros
empregos dos termos «espírito» e «santo».
AS DESIGNAÇÕES DO ESPÍRITO SANTO
692. Jesus, ao anunciar e prometer a vinda do Espírito
Santo, chama-Lhe o «Paráclito», que, à letra,
quer dizer: «aquele que é chamado para junto»,
ad vocatus (Jo. 14, 16. 26; 15, 26; 16, 7).
«Paráclito» traduz-se habitualmente por
«Consolador», sendo Jesus o primeiro consolador
(Cf. 1ª Jo. 2, 1 (paráklêton)).
O próprio Senhor chama ao Espírito Santo «o Espírito
da verdade»
(Cf. Jo. 16. 13).
693. Além do seu nome próprio, que é o mais empregado
nos Atos dos Apóstolos e nas epístolas, encontramos em
S. Paulo as designações: Espírito da promessa (Gl. 3,
14; Ef. 1, 13), Espírito de adoção (Rm. 8,
15: Gl. 4, 6), Espírito de Cristo (Rm.
8, 9), Espírito do Senhor (2ª Cor. 3, 17).
Espírito de Deus (Rm. 8, 9. 14; 15, 19; 1ª Cor.
6, 11; 7, 40), e em S. Pedro, Espírito de glória
(1ª Pe. 4, 14).
OS SÍMBOLOS DO ESPÍRITO SANTO
694. A água. O simbolismo da água é significativo
da ação do Espírito Santo no Batismo, pois que, após a
invocação do Espírito Santo, ela torna-se o sinal
sacramental eficaz do novo nascimento. Do mesmo modo que
a gestação do nosso primeiro nascimento se operou na
água, assim a água batismal significa realmente que o
nosso nascimento para a vida divina nos é dado no
Espírito Santo. Mas, «batizados num só Espírito»,
«a todos nos foi dado beber de um único Espírito»
(1ª Cor. 12, 13): portanto, o Espírito é também
pessoalmente a Água viva que brota de Cristo crucificado
(Cf. Jo. 19, 34; 1ª Jo. 5, 8)
como da sua fonte, e jorra em nós para a vida eterna
(Cf. Jo. 4, 10-14; 7, 38: Ex. 17, 1-6: Is. 55, 1; Zc.
14, 8: 1ª Cor. 10, 4. Ap. 21, 6; 22, 17).
695. A unção. O simbolismo da unção com óleo é
também significativo do Espírito Santo, a ponto de se
tomar o seu sinônimo
(Cf. 1ª Jo. 2, 20. 27; 2ª Cor. 1, 21).
Na iniciação cristã, ela é o sinal sacramental da
Confirmação, que justamente nas Igrejas Orientais se
chama «Crismação». Mas, para lhe apreender toda a
força, temos de voltar à primeira unção realizada pelo
Espírito Santo: a de Jesus. Cristo («Messias» em
hebraico) significa «ungido» pelo Espírito de
Deus. Houve «ungidos» do Senhor na antiga Aliança
(Cf. Ex. 30, 22-32), sobretudo o rei David
(Cf. 1º Sm. 16, 13).
Mas Jesus é o ungido de Deus de maneira única: a
humanidade que o Filho assume é totalmente «ungida
pelo Espírito Santo». Jesus é constituído
«Cristo» pelo Espírito Santo
(Cf. Lc. 4, 18-19; Is. 61, 1).
A Virgem Maria concebe Cristo do Espírito Santo, que
pelo anjo O anuncia como Cristo aquando do seu
nascimento
(Cf. Lc. 2, 11)
e leva Simeão a ir ao templo ver o Cristo do Senhor
(Cf. Lc. 2, 26-27).
É Ele que enche Cristo
(Cf. Lc. 4, 1)
e cujo poder emana de Cristo nos seus atos de cura e
salvamento
(Cf. Lc. 6, 19; 8, 46). Finalmente, é Ele que ressuscita Jesus de
entre os mortos
(Cf. Rm. 1, 4; 8, 11).
Então, plenamente constituído «Cristo» na sua
humanidade vencedora da morte
(Cf. At. 2, 36),
Jesus difunde em profusão o Espírito Santo, até que
«os santos» constituam, na sua união à humanidade do
Filho de Deus, o «homem adulto à medida completa da
plenitude de Cristo» (Ef. 4, 13), «o Cristo
total», para empregar a expressão de Santo Agostinho
(Santo Agostinho, Sermão 341, 1, 1: PL 39, 1493:
Ibid. 9, 11: PL 39. 1499).
696. O fogo. Enquanto a água significava o
nascimento e a fecundidade da vida dada no Espírito
Santo, o fogo simboliza a energia transformadora dos
atos do Espírito Santo. O profeta Elias, que
«apareceu como um fogo e cuja palavra queimava como um
facho ardente» (Sir 48, 1), pela sua oração
faz descer o fogo do céu sobre o sacrifício do monte
Carmelo
(Cf. 1º Rs. 18, 38-39), figura do fogo do Espírito Santo, que
transforma aquilo em que toca. João Batista, que «irá
à frente do Senhor com o espírito e a força de Elias»
(Lc. 1, 17), anuncia Cristo como Aquele que
«há de batizar no Espírito Santo e no fogo» (Lc. 3,
16), aquele Espírito do qual Jesus dirá: «Eu vim
lançar fogo sobre a terra e só quero que ele se tenha
ateado»! (Lc. 12, 49). É sob a forma de
línguas, «uma espécie de línguas de fogo», que o
Espírito Santo repousa sobre os discípulos na manhã de
Pentecostes e os enche de Si
(Cf. At. 2, 3-4).
A tradição espiritual reterá este simbolismo do fogo
como um dos mais expressivos da ação do Espírito Santo
(Cf. São João da Cruz, Llama de amor viva: Biblioteca
Mística Carmelitana, v. 13 (Burgos 1931) p. 1-102;
103-213. [ID., Chama vida de amor: Obras
Completas (Paço de Arcos, Edições Carmelo 1986) p.
829-957)]).
«Não apagueis o Espírito»! (1ª Ts. 5, 19).
697. A nuvem e a luz. Estes dois símbolos são
inseparáveis nas manifestações do Espírito Santo. Desde
as teofanias do Antigo Testamento, a nuvem, umas vezes
escura, outras luminosa, revela o Deus vivo e salvador,
velando a transcendência da sua glória: a Moisés
no monte Sinai
(Cf. Ex. 24, 15-18), na tenda da reunião
(Cf. Ex. 33, 9-10)
e durante a marcha pelo deserto
(Cf. Ex. 40, 36-38; 1ª Cor. 10, 1-2);
a Salomão, aquando da dedicação do templo
(Cf. 1º Rs. 8, 10-12).
Ora estas figuras são realizadas por Cristo no Espírito
Santo. É Ele que desce sobre a Virgem Maria e a cobre
«com a sua sombra», para que conceba e dê à luz
Jesus
(Cf. Lc. 1, 35).
No monte da transfiguração, é Ele que «sobrevém na
nuvem que cobriu da sua sombra» Jesus, Moisés e
Elias, Pedro, Tiago e João, nuvem da qual se fez ouvir
uma voz que dizia: "Este é o meu Filho, o meu Eleito,
escutai-O"»! (Lc. 9, 35). E, enfim, a mesma nuvem
que «esconde Jesus aos olhos» dos discípulos no
dia da Ascensão
(Cf. At. 1, 9)
e que O revelará como Filho do Homem na sua glória, no
dia da sua vinda
(Cf. Lc. 21, 27).
698. O selo é um símbolo próximo do da unção. Com
efeito, foi a Cristo que «Deus marcou com o seu selo»
(Jo. 6, 27) e é n'Ele que o Pai «nos marca
também com o seu selo»
(Cf. 2ª Cor. 1, 22; Ef. 1, 13; 4, 30). Porque indica o efeito indelével da unção
do Espírito Santo nos sacramentos do Batismo, da
Confirmação e da Ordem, a imagem do selo («sphragis»)
foi utilizada em certas tradições teológicas para
exprimir o «caráter» indelével, impresso por
estes três sacramentos, que não podem ser repetidos.
699. A mão. É pela imposição das mãos que Jesus
cura os doentes
(Cf. Mc. 6, 5; 8, 23)
e abençoa as crianças
(Cf. Mc. 10. 16).
O mesmo fará os Apóstolos, em seu nome
(Cf. Mc. 16, 18; At. 5, 12; 14, 3).
Ainda mais: é pela imposição das mãos dos Apóstolos que
o Espírito Santo é dado
(Cf. At. 8, 17-19; 13, 3; 19, 6).
A Epístola aos Hebreus coloca a imposição das mãos no
número dos «artigos fundamentais» do seu ensino
(Cf. Heb. 6, 2).
Este sinal da efusão omnipotente do Espírito Santo,
guarda-o a Igreja nas suas epicleses sacramentais.
700. O dedo. «é pelo dedo de Deus que Jesus expulsa
os demónios»
(Cf. Lc. 11, 20).
Se a Lei de Deus foi escrita em tábuas de pedra «pelo
dedo de Deus» (Ex. 31, 18), a «carta de Cristo»,
entregue ao cuidado dos Apóstolos, «é escrita com o
Espírito de Deus vivo: não em placas de pedra, mas em
placas que são corações de carne» (2ª Cor. 3,
3). O hino «Veni Creator Spiritus» invoca o
Espírito Santo como «digitus paternae dexterae» -
«Dedo da mão direita do Pai»
(Cf. Domingo de Pentecostes, Hino das I e II
Vésperas: Liturgia Horarum, editio typica, v. 2
(Typis Polyglottis Vaticanis 1974), p. 795 e 812.
[Liturgia das Horas. vol. II p. 850 e 861. edição da
Gráfica de Coimbra, 1999]).
701. A pomba. No final do dilúvio (cujo
simbolismo tem a ver com o Batismo), a pomba solta por
Noé regressa com um ramo verde de oliveira no bico,
sinal de que a terra é outra vez habitável
(Cf. Gn. 8, 8-12).
Quando Cristo sobe das águas do seu batismo, o Espírito
Santo, sob a forma duma pomba, desce e paira sobre Ele
(Cf. Mt. 3, 16 e par). O Espírito desce e repousa no coração
purificado dos batizados. Em certas igrejas, a sagrada
Reserva eucarística é conservada num relicário metálico
em forma de pomba (o columbarium) suspenso sobre
o altar. O símbolo da pomba para significar o Espírito
Santo é tradicional na iconografia cristã.
III. O Espírito e a Palavra de Deus, no tempo das
promessas
702. Desde o princípio até à «plenitude do tempo»
(Cf. Gl. 4, 4),
a missão conjunta do Verbo e do Espírito do Pai
permanece oculta, mas está atuante. O Espírito de
Deus prepara o tempo do Messias: e um e outro, ainda não
plenamente revelados, já são prometidos com o fim de
serem esperados e acolhidos quando da sua manifestação.
É por isso que, quando a Igreja lê o Antigo Testamento
(Cf. 2ª Cor. 3, 14)
perscruta nele
(Cf. Jo. 5, 39. 46)
o que o Espírito, «que falou pelos profetas»
(Símbolo Niceno-Constantinopolitano: DS 150), nos quer dizer acerca de Cristo.
Por «profetas», a fé da Igreja entende aqui todos
aqueles que o Espírito Santo inspirou no anúncio vivo e
na redacção dos Livros santos, tanto do Antigo como do
Novo Testamento. A tradição judaica distingue a Lei (os
cinco primeiros livros ou Pentateuco), os Profetas (os
livros ditos históricos e proféticos) e os Escritos
(sobretudo sapienciais, em particular os Salmos)
(Cf. Lc. 24, 44).
NA CRIAÇÃO
703. A Palavra de Deus e o seu Espírito estão na origem
do ser e da vida de todas as criaturas
(Cf. Sl. 33, 6; 104. 30; Gn. 1, 2; 2, 7; Ecl. 3, 20-21;
Ez. 37, 10).
- é próprio do Espírito Santo reinar, santificar e
animar a criação, porque Ele é Deus consubstancial ao
Pai e ao Filho [...]. Pertence-Lhe o poder sobre a vida,
porque, sendo Deus, guarda a criação no Pai pelo Filho
(Liturgia bizantina, Ofício das Horas. Matinas dos
Domingos do segundo modo, Antífonas 1 e 2: Paraklêtikês
(Romae 1885), p. 107).
704. «Quanto ao homem, foi com as suas próprias mãos
(quer dizer, com o Filho e o Espírito Santo) que Deus o
moldou [...] e sobre a carne moldada desenhou a sua
própria forma, de modo que, mesmo o que havia de ser
visível, tivesse a forma divina»
(Santo Ireneu de Lião, Demonstratio praedicationis
apostolicae. 11: SC 62, 48-49).
O ESPÍRITO DA PROMESSA
705. Desfigurado pelo pecado e pela morte, o homem
permanece «à imagem de Deus», à imagem do Filho,
mas está «privado da glória de Deus»
(Cf. Rm. 3, 23),
privado da «semelhança». A promessa feita a
Abraão inaugura a «economia da salvação», no
termo da qual o próprio Filho assumirá «a imagem»
(Cf. Jo. 1, 14; Fl. 2, 7)
e restaurá-la-á na «semelhança» com o Pai,
voltando a dar-lhe a glória, o Espírito «que dá a
vida».
706. Contra toda a esperança humana, Deus promete a
Abraão uma descendência, como fruto da fé e do poder do
Espírito Santo
(Cf. Gn. 18, 1-15; Lc. 1, 26-38.54-55; Jo. 1, 12-13; Rm.
4, 16-21).
Nessa descendência serão abençoadas todas as nações da
terra
(Cf. Gn. 12, 3).
Essa descendência será o Cristo
(Cf. Gl. 3, 16)
no qual a efusão do Espírito Santo fará «a unidade
dos filhos de Deus dispersos»
(Cf. Jo. 11, 52).
Comprometendo-se por juramento
(Cf. Lc. 1, 73),
Deus obriga-se, desde logo, ao dom do seu Filho
muito-amado
(Cf. Gn. 22, 17-18; Rm. 8, 32; Jo. 3, 16)
e ao dom do «Espírito Santo prometido, que constitui
o título de garantia da nossa herança para a redenção do
povo que Deus adquiriu para Si mesmo»
(Cf. Ef. 1, 13-14; Gl. 3, 14).
NAS TEOFANIAS E NA LEI
707. As teofanias (manifestações de Deus) iluminam o
caminho da promessa, dos patriarcas a Moisés e de Josué
até às visões que inauguram a missão dos grandes
profetas. A Tradição cristã sempre reconheceu que,
nestas teofanias, o Verbo de Deus Se deixava ver e
ouvir, ao mesmo tempo revelado e «velado», na
nuvem do Espírito Santo.
708. Esta pedagogia de Deus manifesta-se especialmente
no dom da Lei
(Cf. Ex, 19-20; Dt, 1-11; 29-31).
A Lei foi dada como um «pedagogo» para conduzir o
povo a Cristo
(Cf. Gl. 3, 24).
Mas a sua impotência para salvar o homem, privado da
«semelhança» divina e o conhecimento acrescido que
ela dá do pecado
(Cf. Rm. 3, 20)
suscitam o desejo do Espírito Santo. Os gemidos dos
Salmos são disso testemunho.
NO REINO E NO EXÍLIO
709. A Lei, sinal da promessa e da Aliança, deveria
reger o coração e as instituições do povo nascido da fé
de Abraão. «Se ouvirdes realmente a minha voz, se
guardardes a minha Aliança [...], sereis para Mim um
reino de sacerdotes, uma nação consagrada» (Ex
19, 5-6)
(Cf. 1ª Pe. 2, 9). Mas depois de David, Israel sucumbe à
tentação de se tornar um reino como as outras nações.
Ora o Reino, objeto da promessa feita a David
(Cf. 2ª Sm. 7: Sl. 89; Lc. 1, 32-33),
será obra do Espírito Santo: pertencerá aos que são
pobres segundo o Espírito.
710. O esquecimento da Lei e a infidelidade à Aliança
levam à morte: é o Exílio, aparentemente o fracasso das
promessas, mas, na realidade, fidelidade misteriosa do
Deus salvador e o princípio duma restauração prometida,
mas segundo o Espírito. Era preciso que o povo de Deus
sofresse esta purificação
(Cf. Lc. 24, 26).
O exílio traz já a sombra da cruz no desígnio de Deus; e
o «resto» dos pobres que regressa do Exílio é uma
das figuras mais transparentes da Igreja.
A EXPECTATIVA DO MESSIAS E DO SEU ESPÍRITO
711. «Eis que vou fazer algo de novo» (Is. 43,
19): duas linhas proféticas vão ser traçadas, incidindo
uma sobre a expectativa do Messias e outra sobre o
anúncio dum Espírito novo, convergindo ambas no pequeno
«resto», o povo dos pobres
(Cf. Sf. 2, 3),
que aguarda na esperança a «consolação de Israel»
e «a libertação de Jerusalém» (Lc. 2,
25.38).
Vimos mais atrás como Jesus cumpriu as profecias que Lhe
diziam respeito. Limitamo-nos agora àquelas em que
aparece mais clara a relação entre o Messias e o seu
Espírito.
712. Os traços do rosto do Messias esperado
começam a aparecer no Livro do Emanuel
(Cf. Is. 6-12)
(quando Isaías [...] teve a visão da glória de Cristo:
Jo. 12, 41), particularmente em Is. 11, 1-2:
«Naquele dia,
sairá um ramo do tronco de Jessé
e um rebento brotará das suas raízes.
Sobre ele repousará o Espírito do Senhor:
espírito de sabedoria e de entendimento,
espírito de conselho e de fortaleza,
espírito de conhecimento e de temor do Senhor».
713. Os traços do Messias são revelados sobretudo nos
cânticos do Servo
(Cf. Is. 42, 1-9; Mt. 12, 18-21: Jo. 1, 32-34; e também
Is. 49, 1-6; Mr. 3, 17: Lc. 2, 32: e, por fim, Is. 50,
4-10 e 52, 13 - 53, 12).
Estes cânticos anunciam o sentido da paixão de Jesus,
indicando assim a maneira como Ele derramará o Espírito
Santo para dar vida à multidão: não a partir do
exterior, mas assumindo a nossa «condição de servo»
(Fl. 2, 7). Tomando sobre Si a nossa
morte, Ele pode comunicar-nos o seu próprio Espírito de
vida.
714. É por isso que Cristo inaugura o anúncio da
Boa-Nova, apropriando-se desse passo de Isaías (Lc,
4, 18-19)
(Cf. Is. 61, 1-2):
- «o Espírito do Senhor Deus está sobre Mim,
porque o Senhor Me ungiu.
Enviou-Me a anunciar a Boa-Nova aos que sofrem,
para curar os desesperados,
para anunciar a libertação aos exilados
e a liberdade aos prisioneiros,
para proclamar o ano da graça do Senhor».
715. Os textos proféticos, respeitantes diretamente ao
envio do Espírito Santo, são oráculos em que Deus fala
ao coração do seu povo na linguagem da promessa, com os
acentos do «amor e da fidelidade»
(Cf. Ez. 11, 19; 36, 25-28; 37, 1-14: Jr. 31, 31-34; Jl.
3, 1-5),
cujo cumprimento São Pedro proclamará na manhã do
Pentecostes
(Cf. At. 2, 17-21).
Segundo estas promessas, nos «últimos tempos» o
Espírito do Senhor há de renovar o coração dos homens,
gravando neles uma lei nova; reunirá e reconciliará os
povos dispersos e divididos; transformará a primeira
criação e Deus habitará nela com os homens, na paz.
716. O povo dos «pobres»
(Cf. Sf. 2, 3; Sl. 22, 27; 34, 3; Is. 49, 13; 61. 1;
etc.)
, dos humildes e dos mansos, totalmente entregues aos
desígnios misteriosos do seu Deus, o povo dos que
esperam a justiça, não dos homens mas do Messias, tal é,
afinal, a grande obra da missão oculta do Espírito
Santo, durante o tempo das promessas, para preparar a
vinda de Cristo. É a qualidade do seu coração,
purificado e iluminado pelo Espírito, que se exprime nos
salmos. Nestes pobres, o Espírito prepara para o Senhor
«um povo bem disposto»
(Cf. Lc. 1. 17).
IV. O Espírito de Cristo na plenitude do tempo
JOÃO, PRECURSOR, PROFETA E BATISTA
717. «Apareceu um homem, enviado por Deus, que tinha
o nome de João» (Jo. 1, 6). João é «cheio
do Espírito Santo já desde o seio materno» (Lc. 1,
15)
(Cf. Lc. 1, 41),
pelo próprio Cristo que a Virgem acabava de conceber por
obra e graça do Espírito Santo. A «visitação» de
Maria a Isabel tornou-se, assim, «visita de Deus ao
seu povo»
(Cf. Lc. 1, 68).
718. João é «Elias que devia vir»
(Cf. Mt. 17, 10-13).
O fogo do Espírito habita nele e fá-lo «correr à
frente» (como «precursor») do Senhor que
chega. Em João o Precursor, o Espírito Santo acaba de
«preparar para o Senhor um povo bem disposto» (Lc.
1, 17).
719. João é «mais do que um profeta»
(Cf. Lc. 7, 26).
Nele, o Espírito Santo consuma o «falar pelos
profetas». João termina o ciclo dos profetas
inaugurado por Elias
(Cf. Mt. 11, 13-14). Anuncia como iminente a consolação de
Israel; é ele a «voz» do Consolador que vai
chegar
(Cf. Jo. 1, 23; Is 40. 1-3).
Tal como fará o Espírito da verdade, «ele vem como
testemunha, para dar testemunho da Luz» (Jo. 1, 7) (Cf.
Jo. 15, 26; 5, 33).
A respeito de João, o Espírito cumpre assim as
«indagações dos profetas» e o «desejo» dos
anjos
(Cf. 1ª Pe. 1, 10-12):
«Aquele sobre Quem vires o Espírito Santo descer e
permanecer, é Ele que batiza no Espírito Santo. Ora,
eu vi e dou testemunho de que Ele é o Filho de Deus
[...] Eis o Cordeiro de Deus»! (Jo. 1, 33-36).
720. Finalmente, com João Batista, o Espírito Santo
inaugura, em prefiguração, aquilo que vai realizar com e
em Cristo: restituir ao homem «a semelhança»
divina. O batismo de João era para o arrependimento: o
Batismo na água e no Espírito será um novo nascimento
(Cf. Jo. 3, 5).
«ALEGRA-TE, Ó CHEIA DE GRAÇA»
721. Maria, a santíssima Mãe de Deus, sempre virgem, é a
obra-prima da missão do Filho e do Espírito na plenitude
do tempo. Pela primeira vez no desígnio da salvação e
porque o seu Espírito a preparou, o Pai encontra a
morada na qual o seu Filho e o seu Espírito podem
habitar entre os homens. É neste sentido que a Tradição
da Igreja muitas vezes lê, em relação a Maria, os mais
belos textos sobre a Sabedoria
(Cf. Pr. 8, 1 - 9, 6; Ecl. 24):
Maria é cantada e apresentada na Liturgia como «o
Trono da Sabedoria». Nela começam a manifestar-se as
«maravilhas de Deus», que o Espírito vai realizar
em Cristo e na Igreja:
722. O Espírito Santo preparou Maria pela sua
graça. Convinha que fosse «cheia de graça» a Mãe
d'Aquele em Quem «habita corporalmente a plenitude da
divindade» (Cl. 2, 9). Ela foi, por pura graça,
concebida sem pecado, como a mais humilde das criaturas,
a mais capaz de acolher o dom inefável do Omnipotente. É
a justo título que o anjo Gabriel a saúda como «Filha
de Sião»: «Ave» (= «Alegra-te»)
(Cf. Sf. 3, 14; Zc. 2, 14).
É a ação de graças de todo o povo de Deus, e, portanto,
da Igreja, que ela faz subir até ao Pai, no Espírito
Santo, com o seu cântico
(Cf. Lc. 1, 46-55),
quando já portadora, em si, do Filho eterno.
723. Em Maria, o Espírito Santo realiza o
desígnio benevolente do Pai. É pelo Espírito Santo que a
Virgem concebe e dá à luz o Filho de Deus. A sua
virgindade torna-se fecundidade única, pelo poder do
Espírito e da fé
(Cf. Lc. 1, 26-38; Rm. 4, 18-21; Gl. 4, 26-28).
724. Em Maria, o Espírito Santo manifesta o Filho
do Pai feito Filho da Virgem. Ela é a sarça ardente da
teofania definitiva: cheia do Espírito Santo, mostra o
Verbo na humildade da sua carne; e é aos pobres
(Cf. Lc. 2, 15-194) e às primícias das nações
(Cf. Mt. 2, 11)
que Ela O dá a conhecer.
725. Finalmente, por Maria, o Espírito começa a pôr
em comunhão com Cristo os homens que são «objeto
do amor benevolente de Deus»
(Cf. Lc. 2, 14);
e os humildes são sempre os primeiros a recebê-lo: os
pastores, os magos, Simeão e Ana, os esposos de Caná e
os primeiros discípulos.
726. No termo desta missão do Espírito, Maria torna-se a
«Mulher», a nova Eva «mãe dos vivos», Mãe
do «Cristo total»
(Cf. Jo. 19, 25-27). É como tal que Ela está presente com os
Doze, «num só coração, assíduos na oração» (At.
1, 14), no alvorecer dos «últimos tempos»,
que o Espírito vai inaugurar na manhã do Pentecostes,
com a manifestação da Igreja.
JESUS CRISTO
727. Toda a missão do Filho e do Espírito Santo,
na plenitude do tempo, está contida no fato de o Filho
ser o ungido do Espírito do Pai, desde a sua Encarnação:
Jesus é o Cristo, o Messias.
Todo o segundo capítulo do Símbolo da Fé deve ser lido a
esta luz. Toda a obra de Cristo é missão conjunta do
Filho e do Espírito Santo. Aqui mencionaremos somente o
que se refere à promessa do Espírito Santo feita por
Jesus, e à sua doação pelo Senhor glorificado.
728. Jesus não revela plenamente o Espírito Santo
enquanto Ele próprio não for glorificado pela sua morte
e ressurreição. No entanto, sugere-o pouco a pouco,
mesmo no seu ensino às multidões, quando revela que a
sua carne será alimento para a vida do mundo
(Cf. Jo. 6, 27.51.62-63).
Insinua-o também a Nicodemos
(Cf. Jo. 3, 5-8),
à samaritana
(Cf. Jo. 4, 10.14.23-24)
e aos que tomam parte na festa dos Tabernáculos
(Cf. Jo. 7, 37-39).
Aos seus discípulos, fala d'Ele abertamente a propósito
da oração
(Cf. Lc. 11, 13) e do testemunho que devem dar
(Cf. Mt. 10, 19-20).
729. Só quando chega a Hora em que vai ser glorificado,
é que Jesus promete a vinda do Espírito Santo,
pois a sua morte e ressurreição serão o cumprimento da
promessa feita aos antepassados
(Cf. Jo. 14, 16-17. 26; 15. 26; 16, 7-15; 17, 26).
O Espírito da verdade, o outro Paráclito, será dado pelo
Pai a pedido de Jesus; será enviado pelo Pai em nome de
Jesus; Jesus O enviará de junto do Pai, porque do Pai
procede. O Espírito Santo virá, nós O conheceremos, Ele
ficará conosco para sempre, habitará conosco; há de
ensinar-nos tudo, há de lembrar-nos tudo o que Cristo
nos disse e dará testemunho d'Ele; conduzir-nos-á à
verdade total e glorificará a Cristo. Quanto ao mundo,
confundi-lo-á em matéria de pecado, de justiça e de
julgamento.
730. Chega, por fim, a «Hora de Jesus»
(Cf. Jo. 13, 1; 17, 1): Jesus entrega o seu espírito nas mãos do
Pai
(Cf. Lc. 23. 46; Jo 19, 30),
no momento em que pela sua morte vence a morte, de tal
modo que, «ressuscitado dos mortos pela glória do
Pai» (Rm. 6, 4), logo dá o Espírito
Santo «soprando» sobre os discípulos
(Cf. Jo. 20, 22).
A partir dessa «Hora», a missão de Cristo e do
Espírito torna-se a missão da Igreja: «assim como o
Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós» (Jo
20, 21)
(Cf. Mt. 28, 19; Lc. 24, 47-48; At. 1, 8).
V. O Espírito e a Igreja nos últimos tempos
O PENTECOSTES
731. No dia de Pentecostes (no termo das sete semanas
pascais), a Páscoa de Cristo completou-se com a efusão
do Espírito Santo que Se manifestou, Se deu e Se
comunicou como Pessoa divina: da sua plenitude, Cristo
Senhor derrama em profusão o Espírito
(Cf. At. 2, 33-36).
732. Neste dia, revelou-se plenamente a Santíssima
Trindade. A partir deste dia, o Reino anunciado por
Cristo abre-se aos que n'Ele creem. Na humildade da
carne e na fé, eles participam já na comunhão da
Santíssima Trindade. Pela sua vinda, que não cessará
jamais, o Espírito Santo faz entrar no mundo nos
«últimos tempos», no tempo da Igreja, no Reino já
herdado, mas ainda não consumado:
- «nós vimos a verdadeira Luz, recebemos o Espírito
celeste, encontrámos a verdadeira fé: adoramos a
Trindade indivisível, porque foi Ela que nos salvou»
(Liturgia bizantina, Oficio das Horas, Vésperas de
Pentecostes, Sticherum 4: Pentekostárion (Romae
1884) p. 390).
O ESPÍRITO SANTO - DOM DE DEUS
733. «Deus é Amor» (1ª Jo. 4, 8.16) e o
Amor é o primeiro dom, que contém todos os outros. Este
amor «derramou-o Deus nos nossos corações, pelo
Espírito Santo que nos foi dado» (Rm. 5, 5).
734. Uma vez que estamos mortos, ou pelo menos feridos
pelo pecado, o primeiro efeito do dom do Amor é a
remissão dos nossos pecados. E é a comunhão do Espírito
Santo (2ª Cor. 13, 13) que, na Igreja, restitui aos
batizados a semelhança divina perdida pelo pecado.
735. Ele dá-nos então as «arras» ou as
«primícias» da nossa herança
(Cf. Rm. 8, 23; 2ª Cor. 1, 22):
a própria vida da Santíssima Trindade, que consiste em
amar «como Ele nos amou»
(Cf. 1ª Jo. 4, 11-12).
Este amor (a caridade de que se fala em 1ª Cor.
13) é o princípio da vida nova em Cristo, tornada
possível graças ao fato de termos «recebido uma força
vinda do alto, a do Espírito Santo» (At. 1, 8).
736. É graças a esta força do Espírito que os filhos de
Deus podem dar fruto. Aquele que nos enxertou na
verdadeira Vide far-nos-á dar «os frutos do Espírito:
caridade, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade,
fidelidade, mansidão, autodomínio» (Gl. 5,
22-23). «O Espírito é a nossa vida»: quanto mais
renunciarmos a nós próprios
(Cf. Mt. 16, 24-26), mais «caminharemos segundo o Espírito»
(Cf. Gl. 5, 25):
- «pela comunhão com Ele, o Espírito Santo torna-nos
espirituais, recoloca-nos no paraíso, reconduz-nos ao
Reino dos céus e à adoção filial, dá-nos a confiança de
chamar Pai a Deus e de participar na graça de Cristo, de
ser chamados filhos da luz e de tomar parte na glória
eterna»
(São Basílio Magno, Liber de Spiritu Sancto 15,
36: SC 17bis. 370 (PG 32, 132)).
O ESPÍRITO SANTO E A IGREJA
737. A missão de Cristo e do Espírito Santo completa-se
na Igreja, corpo de Cristo e templo do Espírito Santo.
Esta missão conjunta associa, doravante, os fiéis de
Cristo à sua comunhão com o Pai no Espírito Santo: o
Espírito prepara os homens e adiantasse-lhes com
a sua graça para os atrair a Cristo. Manifesta-lhes
o Senhor ressuscitado, lembra-lhes a sua Palavra e
abre-lhes o espírito à inteligência da sua morte e da
sua ressurreição. Torna-lhes presente o mistério
de Cristo, principalmente na Eucaristia, com o fim de os
reconciliar, de os pôr em comunhão com Deus, para
os fazer dar «muito fruto»
(Cf. Jo. 15, 5. 8. 16).
738. Assim, a missão da Igreja não se acrescenta à de
Cristo e do Espírito Santo, mas é o sacramento dela: por
todo o seu ser e em todos os seus membros, é enviada
para anunciar e testemunhar, atualizar e derramar o
mistério da comunhão da Santíssima Trindade (será este o
objeto do próximo artigo):
- «nós todos, que recebemos o único e mesmo Espírito,
quer dizer, o Espírito Santo, fundimo-nos entre nós e
com Deus. Porque, embora sejamos numerosos
separadamente, e Cristo faça com que o Espírito do Pai e
seu habite em cada um de nós, este Espírito único e
indivisível reconduz pessoalmente à unidade os que são
distintos entre si [...] e faz com que todos apareçam
n'Ele como sendo um só. E assim como o poder da santa
humanidade de Cristo faz com que todos aqueles em quem
ela se encontra formem um só corpo, penso que, do mesmo
modo, o Espírito de Deus, que habita em todos, único e
indivisível, os leva todos à unidade espiritual»
(São Cirilo de Alexandria, Commentarius in Iohannem
11, 11: Pg. 74. 561).
739. Uma vez que o Espírito Santo é a unção de Cristo, é
Cristo, a Cabeça do corpo, quem O derrama nos seus
membros para os alimentar, os curar, os organizar nas
suas mútuas funções, os vivificar, os enviar a dar
testemunho, os associar à sua oferta ao Pai e à sua
intercessão pelo mundo inteiro. É pelos sacramentos da
Igreja que Cristo comunica aos membros do seu corpo o
seu Espírito Santo e santificador (será este o objeto da
segunda parte do Catecismo).
740. Estas «maravilhas de Deus», oferecidas aos
crentes nos sacramentos da Igreja, dão os seus frutos na
vida nova em Cristo, segundo o Espírito (será este o
objeto da terceira parte do Catecismo).
741. «Também o Espírito Santo vem em auxílio da nossa
fraqueza, porque não sabemos o que pedir nas nossas
orações; mas o próprio Espírito intercede por nós com
gemidos inefáveis» (Rm, 8, 26). O Espírito
Santo, artífice das obras de Deus, é o Mestre da oração
(será este o objeto da quarta parte do Catecismo).
Resumindo
742. «E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos
corações o Espírito do seu Filho, que clama: "Abbá!"
Pai»! (Gl. 4, 6).
743. Desde o princípio até à consumação do tempo,
quando Deus envia o seu Filho, envia sempre o seu
Espírito: a missão dos dois é conjunta e inseparável.
744. Na plenitude dos tempos, o Espírito Santo
realiza em Maria todas as preparações para a vinda de
Cristo ao povo de Deus. Pela ação do Espírito Santo n
'Ela, o Pai dá ao mundo o Emanuel, «Deus conosco»
(Mt 1, 23).
745. O Filho de Deus é consagrado Cristo (Messias)
pela unção do Espírito Santo, na sua Encarnação
(Cf. Sl. 2, 6-7).
746. Pela sua morte e ressurreição, Jesus foi
constituído Senhor e Cristo na glória
(Cf. At. 2, 36).
Da sua plenitude, Ele derrama o Espírito Santo sobre os
Apóstolos e sobre a Igreja.
747. O Espírito Santo, que Cristo-cabeça derrama
sobre os seus membros, constrói, anima e santifica a
Igreja. Ela é o sacramento da comunhão da Santíssima
Trindade com os homens.
ARTIGO 9
«CREIO NA SANTA IGREJA CATÓLICA»
748. «A luz dos povos é Cristo: por isso, este
sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, deseja
ardentemente iluminar todos os homens com a sua luz que
resplandece no rosto da Igreja, anunciando o Evangelho a
toda a criatura»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium
1: AAS 57 (1965) 5).
É com estas palavras que começa a «Constituição
Dogmática sobre a Igreja» do II Concilio do
Vaticano. Desse modo, o Concílio mostra que o artigo de
fé sobre a Igreja depende inteiramente dos artigos
relativos a Jesus Cristo. A Igreja não tem outra luz
senão a de Cristo. Ela é, segundo uma imagem cara aos
Padres da Igreja, comparável à lua, cuja luz é toda
reflexo da do sol.
749. O artigo sobre a Igreja depende também inteiramente
do artigo sobre o Espírito Santo, que o precede. «Com
efeito, depois de ter mostrado que o Espírito Santo é a
fonte e o dador de toda a santidade, nós confessamos
agora que foi Ele quem dotou de santidade a Igreja»
(Cat Rom I, 10, 1, p. 104).
A Igreja é, segundo a expressão dos Padres, o lugar
«onde floresce o Espírito»
(Santo Hipólito Romano, Tradição Apostólica, 35:
ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 82).
750. Crer que a Igreja é «santa» e «católica»,
e que é «una» e «apostólica» (como
acrescenta o Símbolo Niceno-Constantinopolitano), é
inseparável da fé em Deus Pai, Filho e Espírito Santo.
No Símbolo dos Apóstolos fazemos profissão de crer a
Igreja santa («Credo... Ecclesiam»), e não na
Igreja, para não confundir Deus com as suas obras e
para atribuir claramente à bondade de Deus todos
os dons que Ele próprio pôs na sua Igreja
(Cat Rm. I 10, 22, p. 118).
PARÁGRAFO 1
A IGREJA NO DESÍGNIO DE DEUS
I. Os nomes e as imagens da Igreja
751. A palavra «Igreja» («ekklesía», do
verbo grego «ek-kalein» = «chamar fora»)
significa «convocação». Designa as assembleias do
povo em geral
(Cf. At. 19, 39)
de carácter religioso. É o termo frequentemente
utilizado no Antigo Testamento grego para a assembleia
do povo eleito diante de Deus, sobretudo para a
assembleia do Sinai, onde Israel recebeu a Lei e foi
constituído por Deus como seu povo santo
(Cf. Ex. 19).
Ao chamar-se «Igreja», a primeira comunidade dos
que acreditaram em Cristo reconhece-se herdeira dessa
assembleia. Nela, Deus «convoca» o seu povo de
todos os confins da terra. O termo «Kyriakê», de
onde derivaram «church», «Kirche»,
significa «aquela que pertence ao Senhor».
752. Na linguagem cristã, a palavra «Igreja»
designa a assembleia litúrgica
(Cf. 1ª Cor. 11, 18; 14, 19.28.34-35),
mas também a comunidade local
(Cf. 1ª Cor 1, 2; 16, 1)
ou toda a comunidade universal dos crentes
(Cf. 1ª Cor. 15, 9; Gl 1, 13; Fl 3, 6).
Estes três significados são, de fato, inseparáveis.
«A Igreja» é o povo que Deus reúne no mundo inteiro.
Ela existe nas comunidades locais e realiza-se como
assembleia litúrgica, sobretudo eucarística. Vive da
Palavra e do Corpo de Cristo, e é assim que ela própria
se torna Corpo de Cristo.
OS SÍMBOLOS DA IGREJA
753. Na Sagrada Escritura, encontramos grande quantidade
de imagens e figuras ligadas entre si, mediante as quais
a Revelação fala do mistério inesgotável da Igreja. As
imagens tomadas do Antigo Testamento constituem
variantes duma ideia de fundo, que é a de «povo de
Deus». No Novo Testamento
(Cf. Ef. 1, 22; Cl. 1, 18),
todas estas imagens encontram um novo centro, pelo fato
de Cristo Se tomar «a Cabeça» deste povo
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 9: AAS 57 (1965) 13)
que é, desde então, o seu corpo. A volta deste centro,
agrupam-se imagens «tiradas quer da vida pastoril ou
agrícola, quer da construção ou também da família e
matrimónio»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
6: AAS 57 (1965) 8).
754. «Assim a Igreja é o redil, cuja única e
necessária porta é Cristo
(Cf. Jo. 10, 1-10).
E também o rebanho, do qual o próprio Deus predisse que
seria o pastor
(Cf. Is. 40, 11; Ez. 34, 11-31)
e cujas ovelhas, ainda que governadas por pastores
humanos, são, contudo, guiadas e alimentadas sem cessar
pelo próprio Cristo, bom Pastor e Príncipe dos pastores
(Cf. Jo. 10, 11: Ez. 34, 11-31),
o qual deu a vida pelas suas ovelhas»
(Cf. Jo. 10, 11-15)»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
6: AAS 57 (1965) 8).
755 «A Igreja é a agricultura ou o campo de Deus
(Cf. 1ª Cor. 3, 9).
Nesse campo cresce a oliveira antiga, de que os
patriarcas foram a raiz santa e na qual se realizou e
realizará a reconciliação de judeus e gentios
(Cf. Rm. 11, 13-26).
Ela foi plantada pelo celeste Agricultor como uma vinha
eleita
(Cf. Mt. 21, 33-43 e par.: Is. 5, 1-7).
A verdadeira Videira é Cristo: é Ele que dá vida e
fecundidade aos sarmentos, isto é, a nós que, pela
Igreja, permanecemos n'Ele, e sem o Qual nada podemos
fazer»
(Cf. Jo 15, 1-5)»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
6: AAS 57 (1965) 8).
756. «A Igreja é também muitas vezes chamada
construção de Deus
(Cf. 1ª Cor. 3, 9).
O próprio Senhor se comparou à pedra que os construtores
rejeitaram e que se tornou pedra angular
(Mt. 21, 42 par.: At. 4, 11; 1ª Pe. 2, 7; Sl. 118, 22).
Sobre esse fundamento é a Igreja construída pelos
Apóstolos
(Cf. 1ª Cor 3, 11),
e dele recebe firmeza e coesão. Esta construção recebe
vários nomes: casa de Deus
(Cf. 1ª Tm 3, 15),
na qual habita a sua família; habitação de Deus no
Espírito
(Cf. Ef. 2, 19-22);
tabernáculo de Deus com os homens
(Cf. Ap. 21, 3);
e, sobretudo, templo santo, o qual, representado pelos
santuários de pedra e louvado pelos santos Padres, é com
razão comparado, na Liturgia, à cidade santa, a nova
Jerusalém. Nela, com efeito, somos edificados cá na
terra como pedras vivas
(Cf. 1ª Pe 2, 5).
Esta cidade, S. João contemplou-a "descendo do céu, da
presença de Deus, na renovação do mundo, como esposa
adornada para ir ao encontro do esposo"»
(Ap. 21, 1-2)»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
6: AAS 57 (1965) 8-9).
757. «A Igreja é também chamada "Jerusalém do Alto" e
"nossa mãe" (Gl. 4, 26)
(Cf. Ap. 12, 17); é também descrita como a Esposa imaculada
do Cordeiro sem mancha
(Cf. Ap. 19, 7; 21, 2. 9; 22, 17), a qual Cristo "amou, pela qual Se
entregou para a santificar"
(Ef. 5, 25-26), que uniu a Si por um vínculo
indissolúvel, e à qual, sem cessar, "alimenta e presta
cuidados"» (Ef. 5, 29)
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
6: AAS 57 (1965) 9).
II. Origem, fundação e missão da Igreja
758. Para perscrutar o mistério da Igreja, é conveniente
meditar primeiro sobre a sua origem no desígnio da
Santíssima Trindade e sobre a sua progressiva realização
na história.
UM DESÍGNIO NASCIDO NO CORAÇÃO DO PAI
759. «O eterno Pai, que pelo libérrimo e insondável
desígnio da sua sabedoria e bondade, criou o universo,
decidiu elevar os homens participação da vida divina»,
para a qual a todos convida em seu Filho: «e, aos que
creem em Cristo, decidiu convocá-los na Santa Igreja».
Esta «família de Deus» constituiu-se e
realizou-se gradualmente ao longo das etapas da história
humana, segundo as disposições do Pai: de fato, a Igreja
«prefigurada já desde o princípio do mundo e
admiravelmente preparada na história do povo de Israel e
na antiga Aliança, foi constituída no fim dos tempos, e
manifestada pela efusão do Espírito Santo, e será
gloriosamente consumada no fim dos séculos»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
2: AAS 57 (1965) 5-6).
A IGREJA - PREFIGURADA DESDE A ORIGEM DO MUNDO
760. «O mundo foi criado em ordem à Igreja»,
diziam os cristãos dos primeiros tempos
(Hermas, Pastor 8, 1 (Visio 2, 4, 1): SC
53, 96; cf. Aristides, Apologia 16, 7: BP 11,
125; São Justino, Apologia 2, 7: CA 216-218 (Pg.
6, 456)).
Deus criou o mundo em ordem à comunhão na sua vida
divina, comunhão que se realiza pela "convocação"
dos homens em Cristo, e está "convocação" é a
Igreja. A Igreja é o fim de todas as coisas
(Santo Epifânio, Panarion, 1, 1, 5, Haereses
2, 4: GCS 25, 174 (PG 41, 181)).
Até as próprias vicissitudes dolorosas, como a queda dos
anjos e o pecado do homem, não foram permitidas por Deus
senão como ocasião e meio de pôr em ação toda a força do
seu braço, toda a medida do amor que queria dar ao
mundo:
- «assim como a vontade de Deus é um ato e se chama
mundo, do mesmo modo a sua intenção é a salvação dos
homens e chama-se Igreja»
(Clemente de Alexandria, Paedagogus 1, 6, 27, 2:
GCS 12, 106 (PG 8, 281)).
A IGREJA - PREPARADA NA ANTIGA ALIANÇA
761. A reunião do povo de Deus começa no instante em que
o pecado destrói a comunhão dos homens com Deus e entre
si. A reunião da Igreja é, por assim dizer, a reação de
Deus ao caos provocado pelo pecado. Esta reunificação
realiza-se secretamente no seio de todos os povos:
«em qualquer nação, quem O teme e pratica a justiça, é
aceite por Ele»
(At. 10, 35) (II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 9: AAS 57 (1965) 12; Ibid.,
13: AAS 57 (1965) 17-18; Ibid., 16: AAS 57 (1965)
20).
762. A preparação remota da reunião do povo de
Deus começa com a vocação de Abraão, a quem Deus promete
que há de vir a ser o pai de um grande povo
(Cf. Gn. 12, 2; 15, 5-6).
A preparação imediata começa com a eleição de Israel
como povo de Deus
(Cf. Ex. 19, 5-6; Dt. 7, 6).
Pela sua eleição, Israel deve ser o sinal da reunião
futura de todas as nações
(Cf. Is. 2. 2-5: Mq. 4, 1-4).
Mas já os profetas acusam Israel de ter quebrado a
aliança, comportando-se como uma prostituta
(Cf. Os. l; Is. 1. 2-4; Jr. 2: etc.).
Eles anunciam uma Aliança nova e eterna
(Cf. Jr. 31, 31-34; Is. 55. 3).
«Esta Aliança nova, instituiu-a Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13).
A IGREJA - INSTITUÍDA POR JESUS CRISTO
763. Pertence ao Filho realizar, na plenitude dos
tempos, o plano de salvação do seu Pai; tal é o motivo
da sua «missão»
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6; ID., Decr. Ad
gentes, 3: AAS 58 (1966) 949).
«O Senhor Jesus deu início à sua Igreja, pregando a
boa-nova do advento do Reino de Deus prometido desde há
séculos nas Escrituras»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
5: AAS 57 (1965) 7). Para cumprir a vontade do Pai,
Cristo inaugurou na terra o Reino dos céus. A Igreja «é
o Reino de Cristo já presente em mistério» (II Concílio
do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS
57 (1965) 6).
764. «Este Reino manifesta-se aos homens na palavra,
nas obras e na presença de Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
5: AAS 57 (1965) 7),
Acolher a palavra de Jesus é «acolher o próprio
Reino»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
5: AAS 57 (1965) 7).
O germe e começo do Reino é o «pequeno rebanho»
(Lc. 12, 32) daqueles que Jesus veio congregar ao seu
redor e dos quais Ele próprio é o Pastor
(Cf. Mt. 10, 16; 26, 31; Jo. 10, 1-21).
Eles constituem a verdadeira família de Jesus
(Cf. Mt. 12, 49). Aqueles que assim juntou em redor de si,
ensinou uma nova «maneira de agir», mas também
uma oração própria
(Cf. Mt. 5-6).
765. O Senhor Jesus dotou a sua comunidade duma
estrutura que permanecerá até ao pleno acabamento do
Reino. Temos, antes de mais, a escolha dos Doze, com
Pedro como chefe
(Cf. Mc. 3, 14-15).
Representando as doze tribos de Israel
(Cf. Mt. 19, 28: Lc. 22, 30),
são as pedras do alicerce da nova Jerusalém
(Cf. Ap. 21, 12-14). Os Doze
(Cf. Mc. 6. 7) e os outros discípulos
(Cf. Lc. 10, 1-2)
participam da missão de Cristo, do seu poder, mas também
da sua sorte
(Cf. Mt. 10, 25; Jo. 15, 20).
Com todos estes atos, Cristo prepara e constrói a sua
Igreja.
766. Mas a Igreja nasceu principalmente do dom total de
Cristo pela nossa salvação, antecipado na instituição da
Eucaristia e realizado na cruz. «Tal começo e
crescimento da Igreja exprimem-nos o sangue e a água que
manaram do lado aberto de Jesus crucificado»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
3: AAS 57 (1965) 6).
Porque «foi do lado de Cristo adormecido na cruz que
nasceu o sacramento admirável de toda a Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 5: AAS 56 (1964) 99).
Assim como Eva foi formada do costado de Adão
adormecido, assim a Igreja nasceu do coração trespassado
de Cristo, morto na cruz
(Cf. Santo Ambrósio, Expositio evangelii
secundum Lucam, 2, 85-89: CCL 14, 69-72 (PL 15,
1666-1668)).
A IGREJA - MANIFESTADA PELO ESPÍRITO SANTO
767. «Consumada a obra que o Pai confiou ao Filho
para cumprir na terra, no dia de Pentecostes foi enviado
o Espírito Santo para que santificasse continuamente a
Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
4: AAS 57 (1965) 6).
Foi então que «a Igreja foi publicamente manifestada
diante duma grande multidão» e «teve o seu início
a difusão do Evangelho entre os gentios, por meio da
pregação»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 4: AAS
58 (1966) 950).
Porque é «convocação» de todos os homens à
salvação, a Igreja é, por sua própria natureza,
missionária, enviada por Cristo a todas as nações, para
de todas fazer discípulos
(Cf. Mt 28, 19-20: II Concílio do Vaticano, Decr.
Ad gentes, 2: AAS 58 (1966) 948; Ibid.,
5-6: AAS 58 (1966) 951-955).
768. Para que a Igreja possa realizar a sua missão, o
Espírito Santo «enriquece-a e guia-a com diversos
dons hierárquicos e carismáticos»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
4: AAS 57 (1965) 7).
Pelo que a Igreja, enriquecida com os dons do seu
fundador e guardando fielmente os seus preceitos de
caridade, de humildade e de abnegação, recebe a missão
de anunciar e instaurar o Reino de Cristo e de Deus em
todos os povos, e constitui o germe e o princípio deste
mesmo Reino na terra
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
5: AAS 57 (1965) 8).
A IGREJA - CONSUMADA NA GLÓRIA
769. «A Igreja [...] só na glória celeste alcançará a
sua realização acabada»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53),
aquando do regresso glorioso de Cristo. Até esse dia,
«a Igreja avança na sua peregrinação por entre as
perseguições do mundo e das consolações de Deus»
(Santo Agostinho, De Civitate Dei 18, 51 CSEL
40/2. 534 (PL 41. 614): cf. II Concílio do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 8: AAS 57 (1965) 12).
Vivendo na terra, ela tem consciência de viver no
exílio, longe do Senhor
(Cf. 2ª Cor. 5, 6; II Concílio do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 6: AAS 57 (1965) 9)
e suspira pelo advento do Reino em plenitude, pela hora
em que «espera e deseja juntar-se ao seu Rei na
glória»
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 5: AAS 57 (1965) 8).
A consumação da Igreja - e através dela, do mundo - na
glória, não se fará sem grandes provações. Só então é
que «todos os justos, desde Adão, "desde o justo Abel
até ao último eleito", se encontrarão reunidos na Igreja
universal junto do Pai»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
2: AAS 57 (1965) 6).
III. O mistério da Igreja
770. A Igreja está na história, mas, ao mesmo tempo,
transcende-a. Só «com os olhos da fé»
(Cat Rom. 1. 10. 20. p. 117)
é que se pode ver na sua realidade visível, ao mesmo
tempo, uma realidade espiritual, portadora de vida
divina.
A IGREJA - AO MESMO TEMPO VISÍVEL E ESPIRITUAL
771. «Cristo, mediador único, constitui e
continuamente sustenta sobre a terra, como um todo
visível, a sua Igreja santa, comunidade de fé, confiança
e amor, por meio da qual difunde em todos a verdade e a
graça». A Igreja é, simultaneamente:
- «sociedade dotada de órgãos hierárquicos e corpo
místico de Cristo»;
- «agrupamento visível e comunidade espiritual»;
- «Igreja terrestre e Igreja ornada com os bens
celestes».
Estas dimensões constituem, em conjunto, «uma única
realidade complexa, formada pelo duplo elemento humano e
divino»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 8:
AAS 57 (1965) 11).
- É próprio da Igreja ser «simultaneamente humana e
divina, visível e dotada de elementos invisíveis,
empenhada na ação e dada à contemplação, presente no
mundo e, todavia, peregrina; mas de tal forma que o que
nela é humano se deve ordenar e subordinar ao divino, o
visível ao invisível, a ação à contemplação, e o
presente à cidade futura que buscamos»
(Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium,
2: AAS 56 (1964) 98).
«Humildade! Sublimidade! Tenda de Cedar e santuário de
Deus; habitação terrena e palácio celeste; casa de barro
e corte real; corpo mortal e templo de luz; enfim,
objeto de desprezo para os orgulhosos e esposa de
Cristo! Ela é morena, mas bela, ó filhas de Jerusalém;
ela que, empalidecida pela fadiga e sofrimento dum longo
exílio, tem, no entanto, por ornamento a beleza celeste»
(São Bernardo de Bernardo de Claraval, In Canticum
sermo 27, 7, 14: Opera, ed. J. Leclercq-C.H.
Talbot-H. Rochais, V. I (Romae 1957) p. 191).
A IGREJA - MISTÉRIO DA UNIÃO DOS HOMENS COM DEUS
772. É na Igreja que Cristo realiza e revela o seu
próprio mistério, como a meta do desígnio de Deus:
«recapitular tudo n'Ele» (Ef. 1, 10). São
Paulo chama «grande mistério» (Ef. 5, 32)
à união esponsal de Cristo e da Igreja. Porque está
unida a Cristo como a seu esposo
(Cf. Ef. 5, 25-27), a própria Igreja, por seu turno, se torna
mistério
(Cf. Ef. 3, 9-11).
E é contemplando nela este mistério, que S. Paulo
exclama: «Cristo em vós - eis a esperança da glória»!
(Cl. 1, 27).
773. Na Igreja, esta comunhão dos homens com Deus pela
«caridade, que não passa jamais»
(1ª Cor. 13, 8),
é o fim que comanda tudo quanto nela é meio sacramental,
ligado a este mundo que passa
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 48: AAS 57 (1965) 53).
«A sua estrutura está completamente ordenada à
santidade dos membros de Cristo. E a santidade
aprecia-se em função do "grande mistério", em que a
esposa responde com a dádiva do seu amor ao dom do
Esposo»
(João Paulo II. Ep. ap. Mulieris dignitatem, 27: AAS 80
(1988) 1718).
Nesta santidade que é o mistério da Igreja, Maria
precede-nos todos como «a Esposa sem mancha nem ruga»
(Cf. Ef. 5, 27).
E é por isso que «a dimensão mariana da Igreja precede a
sua dimensão petrina»
(João Paulo II, Ep. ap. Mulieris dignitatem, 27:
AAS 80 (1988) 1718, nota 55).
A IGREJA - SACRAMENTO UNIVERSAL DA SALVAÇÃO
774. A palavra grega mysterion foi traduzida em
latim por dois termos: mysterium e sacramentum.
Na segunda interpretação, o termo sacramentum
exprime prevalentemente o sinal visível da realidade
oculta da salvação, indicada pelo termo mysterium.
Neste sentido, o próprio Cristo é o mistério da
salvação: «nem há outro mistério senão Cristo
(Santo Agostinho, Epistula 187, 11, 34: CSEL 57,
113 (PL 33, 845)).
A obra salvífica da sua humanidade santa e
santificadora é o sacramento da salvação, que se
manifesta e atua nos sacramentos da Igreja (que as
Igrejas do Oriente chamam também «os santos mistérios»).
Os sete sacramentos são os sinais e os instrumentos
pelos quais o Espírito Santo derrama a graça de Cristo,
que é a Cabeça, na Igreja que é o seu Corpo. A Igreja
possui, pois, e comunica a graça invisível que
significa: e é neste sentido analógico que é chamada
«sacramento».
775 «A Igreja em Cristo é como que o sacramento ou
sinal e instrumento da íntima união com Deus e da
unidade de todo o género humano»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
1: AAS 57 (1965) 5).
Ser sacramento da união íntima do homem com Deus,
eis a primeira finalidade da Igreja. E porque a comunhão
dos homens entre si radica na união com Deus, a Igreja
é, também, o sacramento da unidade do género humano.
Nela, esta unidade já começou, pois reúne homens
«de toda a nação, raça, povo e língua» (Ap. 7, 9). A
Igreja é, ao mesmo tempo, «sinal e instrumento»
da plena realização desta unidade, que ainda há de vir.
776. Como sacramento, a Igreja é instrumento de Cristo.
«É assumida por Ele como instrumento da redenção
universal»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13),
«o sacramento universal da salvação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53),
pelo qual o mesmo Cristo «manifesta e simultaneamente
atualiza o mistério do amor de Deus pelos homens»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 45: AAS 58 (1966) 1066).
É o «projeto visível do amor de Deus para com a
humanidade»
(Paulo VI, Allocutio ad Sacri Collegii Cardinalium
Patres (22 de Junho de 1973): AAS 65 (1973) 391),
segundo o qual Deus quer «que todo o género humano
forme um só povo de Deus, se una num só Corpo de Cristo
e se edifique num só templo do Espírito Santo»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 7: AAS
58 (1966) 956: cf. Id, Const. dogm. Lumen Gentium,
17: AAS 57 (1965) 20-21).
Resumindo:
777. A palavra «Igreja» significa «convocação».
Designa a assembleia daqueles que a Palavra de Deus
convoca para formar o seu povo, e que, alimentados pelo
Corpo de Cristo, se tornam, eles próprios, Corpo de
Cristo.
778. A Igreja é, ao mesmo tempo, caminho e meta do
desígnio de Deus: prefigurada na criação, preparada na
antiga Aliança, fundada pelas palavras e atos de Jesus
Cristo, realizada pela sua Cruz redentora e pela sua
ressurreição, manifesta-se como mistério de salvação
pela efusão do Espírito Santo. Será consumada na
glória do céu como assembleia de todos os resgatados da
terra
(Cf. Ap. 14, 4).
779. A Igreja é, ao mesmo tempo, visível e
espiritual, sociedade hierárquica e Corpo Místico de
Cristo. É una, mas formada por um duplo elemento: humano
e divino. Aí reside o seu mistério, que só a fé pode
acolher.
780. A Igreja é, neste mundo, o sacramento da
salvação, o sinal e o instrumento da comunhão de Deus e
dos homens.
PARÁGRAFO 2
A IGREJA - POVO DE DEUS,
CORPO DE CRISTO, TEMPLO DO ESPÍRITO SANTO
I. A Igreja - Povo de Deus
781. «Em todos os tempos e em todas as nações foi
agradável a Deus aquele que O teme e pratica a justiça.
No entanto, aprouve a Deus salvar e santificar os homens
não individualmente, excluída qualquer ligação entre
eles, mas constituindo-os em povo que O conhecesse na
verdade e O servisse na santidade. Foi por isso que
escolheu Israel para ser o seu povo, estabeleceu com ele
uma aliança e instruiu-o progressivamente
manifestando-se a Si mesmo e os desígnios da sua vontade
na história desse povo, e santificando-o para Si. Mas
tudo isso aconteceu como preparação da Aliança nova e
perfeita, que seria concluída em Cristo [...]. Esta nova
Aliança instituiu-a Cristo no seu Sangue, chamando um
povo, proveniente de judeus e pagãos, a juntar-se na
unidade, não segundo a carne, mas no Espírito»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 12-13).
AS CARACTERÍSTICAS DO POVO DE DEUS
782. O povo de Deus possui características que o
distinguem nitidamente de todos os agrupamentos
religiosos, étnicos, políticos ou culturais da história:
- é o povo de Deus: Deus não é propriedade de
nenhum povo; mas adquiriu para Si um povo constituído
por aqueles que outrora não eram um povo: «raça
eleita, sacerdócio real, nação santa» (1ª Pe. 2, 9);
- vem-se a ser membro deste povo, não pelo
nascimento físico, mas pelo «nascimento do Alto»,
«da água e do Espírito» (Jo. 3, 3-5), isto
é, pela fé em Cristo e pelo Batismo;
- este povo tem por Cabeça Jesus Cristo (o
Ungido, o Messias): porque a mesma unção, o Espírito
Santo, flui da Cabeça por todo o Corpo, este é o
«povo messiânico»;
- «a condição deste povo é a dignidade da liberdade
dos filhos de Deus: nos seus corações, como num templo,
reside o Espírito Santo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13);
- «a sua lei é o mandamento novo, de amar como o
próprio Cristo nos amou»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13; cf. Jo 13, 34210);
é a lei «nova» do Espírito Santo
(Cf. Rm. 8, 2; Gl. 5, 25);
- a sua missão é ser o sal da terra e a luz do
mundo
(Cf. Mt. 5, 13-16).
«Constitui para todo o género humano o mais forte
gérmen de unidade, esperança e salvação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13);
- o seu destino, finalmente, é «o Reino de
Deus, o qual, começado na terra pelo próprio Deus, se
deve dilatar cada vez mais, até ser também por Ele
consumado no fim dos séculos»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
9: AAS 57 (1965) 13).
UM POVO SACERDOTAL, PROFÉTICO E REAL
783. Jesus Cristo é Aquele que o Pai ungiu com o
Espírito Santo e constituiu «sacerdote, profeta e
rei». Todo o povo de Deus participa destas três
funções de Cristo, com as responsabilidades de missão e
de serviço que delas resultam
(Cf. João Paulo II,. Enc. Redemptor hominis,
18-21: AAS 71 (1979) 301-320).
784. Ao entrar no povo de Deus pela fé e pelo Batismo,
participa-se na vocação única deste povo: na sua vocação
sacerdotal - Cristo Senhor, sumo-sacerdote
escolhido de entre os homens, fez do povo novo «um
reino de sacerdotes para o seu Deus e Pai». Na
verdade, pela regeneração e pela unção do Espírito
Santo, os batizados são consagrados para serem
uma casa espiritual, um sacerdócio santo
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
10: AAS 57 (1965) 14).
785. «O povo santo de Deus participa também da função
profética de Cristo», sobretudo pelo sentido
sobrenatural da fé, que é o de todo o povo, leigos e
hierarquia, quando «adere indefectivelmente à fé
transmitida aos santos de uma vez por todas»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
12: AAS 57 (1965) 16),aprofunda
o conhecimento da mesma, e se torna testemunha de Cristo
no meio deste mundo.
786. Finalmente, o povo de Deus participa na função
real de Cristo. Cristo exerce a sua realeza atraindo
a Si todos os homens pela sua morte e ressurreição
(Cf. Jo. 12, 32).
Cristo, Rei e Senhor do universo, fez-se o servo de
todos, pois «não veio para ser servido, mas para
servir e dar a vida como resgate pela multidão» (Mt.
20, 28). Para o cristão, «reinar é servi-Lo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
36: AAS 57 (1965) 41),
em especial «nos pobres e nos que sofrem, nos quais a
Igreja reconhece a imagem do seu Fundador pobre e
sofredor»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12).
O povo de Deus realiza a sua «dignidade real» na
medida em que viver de acordo com esta vocação de servir
com Cristo.
«De todos os regenerados em Cristo, o sinal da cruz faz
reis, a unção do Espírito Santo consagra sacerdotes,
para que, independentemente do serviço particular do
nosso ministério, todos os cristãos espirituais no uso
da razão se reconheçam membros desta estirpe real e
participantes da função sacerdotal. De fato, que há de
tão real para uma alma como governar o seu corpo na
submissão a Deus? E que há de tão sacerdotal como
oferecer ao Senhor uma consciência pura, imolando no
altar do seu coração as vítimas sem mancha da piedade?»
(São Leão Magno, Sermão 4, 1: CCL 138. 16-17 (PL
54, 149)).
II. A Igreja - Corpo de Cristo
A IGREJA É COMUNHÃO COM JESUS
787. Desde o princípio, Jesus associou os discípulos à
sua vida
(Cf. Mc. 1, 16-20; 3, 13-19).
Revelou-lhes o mistério do Reino
(Cf. Mt. 13, 10-17):
deu-lhes parte na sua missão, na sua alegria
(Cf. Lc. 10, 17-20)
e nos seus sofrimentos
(Cf. Lc. 22. 28-30).
Jesus fala duma comunhão ainda mais íntima entre Ele e
os que O seguem: «permanecei em Mim, como Eu em vós
[...]. Eu sou a cepa, vós os ramos» (Jo. 15,
4-5). E anuncia uma comunhão misteriosa e real entre o
seu próprio Corpo e o nosso: «quem come a minha Carne
e bebe o meu Sangue permanece em Mim e Eu nele» (Jo.
6, 56).
788. Quando a sua presença visível lhes foi tirada,
Jesus não deixou órfãos os discípulos
(Cf. Jo. 14, 18).
Prometeu-lhes ficar com eles até ao fim dos tempos
(Cf. Mt. 28, 20),
e enviou-lhes o seu Espírito (Cf.
Jo. 20, 22; At. 2, 33).
A comunhão com Jesus tornou-se, de certo modo, mais
intensa: «comunicando o seu Espírito aos seus irmãos,
por Ele reunidos de todas as nações, constituiu-os seu
Corpo Místico»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 9).
789. A comparação da Igreja com um corpo lança uma luz
particular sobre a ligação íntima existente entre a
Igreja e Cristo. Ela não está somente reunida à volta
d'Ele: está unificada n'Ele, no seu Corpo. Na
Igreja, Corpo de Cristo, são de salientar mais
especificamente três aspectos: a unidade de todos os
membros entre si, pela união a Cristo; Cristo, Cabeça do
Corpo; a Igreja, Esposa de Cristo.
«UM SÓ CORPO»
790. Os crentes que respondem à Palavra de Deus e se
tornam membros do Corpo de Cristo, ficam estreitamente
unidos a Cristo: «neste Corpo, a vida de Cristo
difunde-se nos crentes, unidos pelos sacramentos, dum
modo misterioso e real, a Cristo sofredor e glorificado»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 9),
Isto verifica-se particularmente no Batismo, que nos une
à morte e ressurreição de Cristo
(Cf. Rm. 6, 4-5; 1ª Cor. 12, 13),
e na Eucaristia, pela qual, «participando realmente
no Corpo de Cristo», somos elevados à comunhão com
Ele e entre nós
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 9).
791. Mas a unidade do Corpo não anula a diversidade dos
membros: «na edificação do Corpo de Cristo existe
diversidade de membros e funções. É o mesmo Espírito que
distribui os seus vários dons, segundo a sua riqueza e
as necessidades dos ministérios para utilidade da
Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 10).
A unidade do Corpo Místico produz e estimula a caridade
entre os fiéis: «daí que, se algum membro padece,
todos os membros sofrem juntamente; e se algum membro
recebe honras, todos se alegram»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 10).
Em suma, a unidade do Corpo Místico triunfa sobre todas
as divisões humanas: «todos vós que fostes batizados
em Cristo, fostes revestidos de Cristo. Não há judeu nem
grego, não há escravo nem livre, não há homem nem
mulher; porque todos vós sois um só, em Cristo Jesus»
(Gl. 3, 27-28).
«A CABEÇA DESTE CORPO É CRISTO»
792. Cristo «é a Cabeça do Corpo que é a Igreja»
(Cl. 1, 18). Ele é o Princípio da criação e da Redenção.
Elevado à glória do Pai, «tem em tudo a primazia»
(Cl. 1, 18),
principalmente sobre a Igreja, por meio da qual estende
o seu reinado sobre tudo quanto existe.
793. Une-nos à sua Páscoa: todos os membros se
devem esforçar por se parecerem com Ele, «até que
Cristo Se forme neles» (Gl. 4, 19). «É
para isso que nós somos introduzidos nos mistérios da
sua vida [...], associados aos seus sofrimentos como o
corpo à cabeça, unidos à sua paixão para ser unidos à
sua glória»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 10).
794. Provê ao nosso crescimento
(Cf. Cl. 2, 19):
a fim de crescermos em tudo para aquele que é a
Cabeça
(Cf. Ef. 4, 11-16),
Cristo distribui no seu Corpo, a Igreja, os dons e os
serviços pelos quais mutuamente nos ajudamos no caminho
da salvação.
795. Cristo e a Igreja são, pois, o «Cristo total»
(Christus totus). A Igreja é una com Cristo. Os
santos têm desta unidade uma consciência muito viva:
«Congratulemo-nos, pois, e dêmos graças pelo fato de nos
termos tornado não apenas cristãos, mas o próprio
Cristo. Estais a compreender, irmãos, a graça que Deus
nos fez, dando-nos Cristo por Cabeça? Admirai e
alegrai-vos: nós tornámo-nos Cristo. Com efeito, uma vez
que Ele é a Cabeça e nós os membros, o homem completo é
Ele e nós [...]. A plenitude de Cristo é, portanto, a
Cabeça e os membros. Que quer dizer: a Cabeça e os
membros? Cristo e a Igreja»
(Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus
21, 8: CCL 36, 216-217 (PL 35, 1568)).
«Redemptor noster unam se personam cum sanctam
Ecelesiam, quam assumpsit, exhibuit - O nosso Redentor
apresentou-Se a Si próprio como uma única pessoa unida à
santa Igreja, que Ele assumiu»
(São Gregório Magno, Moralia in Job, Praefatio 6,
4: 14 CCL 143, 19 (PL 75, 525)).
«Caput et membra, quasi una persona mystica - Cabeça e
membros são, por assim dizer, uma só e mesma pessoa
mística»
(São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 48,
a. 2, ad 1: Ed. Leon. 11, 464).
Uma palavra de Santa Joana d'Arc aos seus juízes resume
a fé dos santos Doutores e exprime o bom-senso do
crente: «de Jesus Cristo e da Igreja eu penso que são
um só, e não há que levantar dificuldades a esse
respeito»
(Santa Joana D'Arc, Dictum: Procès de condamnation,
ed. P. Tisset (Paris 1960), p. 166 (texto em
francês)).
A IGREJA É A ESPOSA DE CRISTO
796. A unidade de Cristo e da Igreja, Cabeça e membros
do Corpo, implica também a distinção entre ambos, numa
relação pessoal. Este aspecto é, muitas vezes, expresso
pela imagem do esposo e da esposa. O tema de Cristo
Esposo da Igreja foi preparado pelos profetas e
anunciado por João Batista
(Cf. Jo. 3, 29).
O próprio Senhor Se designou como «o Esposo» (Mc.
2, 19)
(Cf. Mt. 22, 1-14; 25, 1-13).
E o Apóstolo apresenta a Igreja e cada fiel, membro do
seu Corpo, como uma esposa «desposada» com Cristo
Senhor, para formar com Ele um só Espírito
(Cf. 1ª Cor. 6, 15-17; 2ª Cor. 11, 2).
Ela é a Esposa imaculada do Cordeiro imaculado
(Cf. Ap. 22. 17; Ef. 1, 4: 5, 27)
que Cristo amou, pela qual Se entregou «para a
santificar» (Ef. 5, 26), que associou a Si
por uma aliança eterna, e à qual não cessa de prestar
cuidados como ao Seu próprio Corpo
(Cf. Ef. 5, 29).
«Eis o Cristo total, Cabeça e Corpo, um só, formado de
muitos [...]. Quer seja a Cabeça que fale, quer sejam os
membros, é Cristo que fala: fala desempenhando o papel
de Cabeça (ex persona capitis), ou, então, desempenhando
o papel do Corpo (ex persona corporis). Conforme ao que
está escrito: serão os dois uma só carne. É esse um
grande mistério; digo-o em relação a Cristo e à Igreja»
(Ef. 5, 31-32). E o próprio Senhor diz no
Evangelho: «já não são dois, mas uma só carne»
(Mt. 19, 6). Como vedes, temos, de algum modo, duas
pessoas diferentes; no entanto, tornam-se uma só na
união esponsal [...] «Diz-se "Esposo" enquanto Cabeça
e "esposa" enquanto Corpo»
(Santo Agostinho, Enarratio in Psalmum 74, 4: CCL
39, 1207 (PL 37, 948-949)).
III. A Igreja – Templo do Espírito Santo
797. «O que o nosso espírito, quer dizer, a nossa
alma, é para os nossos membros, o Espírito Santo é-o
para os membros de Cristo, para o Corpo de Cristo, que é
a Igreja»
(Santo Agostinho, Sermão 268, 2: PL 38, 1232).
«É ao Espírito de Cristo, como a um princípio oculto,
que se deve atribuir o fato de todas as partes do Corpo
estarem unidas, tanto entre si como com a Cabeça
suprema, pois Ele está todo na Cabeça, todo no Corpo,
todo em cada um dos seus membros»
(Pio XII, enc. Mystici Corporis: DS 3808).
É o Espírito Santo que faz da Igreja «o templo do
Deus vivo» (2ª Cor. 6, 16)
(Cf. 1ª Cor. 3, 16-17; Ef. 2, 21):
«de fato, foi à própria Igreja que o dom de Deus foi
confiado [...]. Nela foi depositada a comunhão com
Cristo, isto é, o Espírito Santo, arras da
incorruptibilidade, confirmação da nossa fé e escada da
nossa ascensão para Deus [...]. Porque onde está a
Igreja, aí está também o Espírito de Deus; e onde está o
Espírito de Deus, aí está a Igreja e toda a graça»
(Santo Ireneu de Lião, Adversus Haereses 3, 24,
1: SC 211. 472-474 (PG 7, 966)).
798. O Espírito Santo é «o princípio de toda a ação
vital e verdadeiramente salvífica em cada uma das
diversas partes do Corpo»
(Pio XII.enc. Mystici Corporis: DS 3808),
Ele realiza, de múltiplas maneiras, a edificação de todo
o Corpo na caridade
(Cf. Ef. 4, 16):
pela Palavra de Deus, «que tem o poder de construir o
edifício» (ct 20, 32); mediante o
Batismo, pelo qual forma o Corpo de Cristo
(Cf. 1ª Cor. 12, 13);
pelos sacramentos, que fazem crescer e curam os membros
de Cristo; pela «graça dada aos Apóstolos que ocupa o
primeiro lugar entre os seus dons»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
7: AAS 57 (1965) 10);
pelas virtudes que fazem agir segundo o bem; enfim,
pelas múltiplas graças especiais (chamadas «carismas»)
pelos quais Ele torna os fiéis «aptos e disponíveis
para assumir os diferentes cargos e ofícios proveitosos
para a renovação e cada vez mais ampla edificação da
Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
12: AAS 57 (1965) 16; cf. Id. Decr. Apostolicam
actuositatem, 3: AAS 58 (1966) 839-840).
OS CARISMAS
799. Extraordinários ou simples e humildes, os carismas
são graças do Espírito Santo que, direta ou
indiretamente, têm uma utilidade eclesial, ordenados
como são para a edificação da Igreja, o bem dos homens e
as necessidades do mundo.
800. Os carismas devem ser acolhidos com reconhecimento
por aquele que os recebe, mas também por todos os
membros da Igreja. De fato, eles são uma maravilhosa
riqueza de graças para a vitalidade apostólica e para a
santidade de todo o Corpo de Cristo; desde que se trate
de dons verdadeiramente procedentes do Espírito Santo e
exercidos de modo plenamente conforme aos impulsos
autênticos do mesmo Espírito, quer dizer, segundo a
caridade, verdadeira medida dos carismas
(Cf. 1ª Cor. 13).
801. Nesse sentido será sempre necessário o
discernimento dos carismas. Nenhum carisma dispensa a
referência e a submissão aos pastores da Igreja. «A
eles compete, de modo especial, não extinguir o
Espírito, mas tudo examinar para reter o que é bom»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
12: AAS 57 (1965) 17),
de modo que todos os carismas, na sua diversidade e
complementaridade, cooperem para o «bem comum»
(1ª Cor. 12, 7)
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium,30: AAS 57 (1965) 37; João Paulo II,
Ex. ap. Christifideles laici, 24: AAS 81 (1989)
435).
Resumindo:
802. Jesus Cristo «entregou-Se por nós, a fim de nos
resgatar de toda a iniquidade e de purificar e
constituir um povo de sua exclusiva posse» (Tt. 2,
14).
803. «Vós sois geração eleita, sacerdócio real, nação
santa, povo adquirido»
(1ª Pe. 2, 9).
804. Entra-se no povo de Deus pela fé e pelo Batismo.
«Todos os homens são chamados a fazer parte do povo de
Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
13: AAS 57 (1965) 17),
para que, em Cristo, «os homens constituam uma só
família e um único povo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 1: AAS
58 (1966) 947).
805. A Igreja é o Corpo de Cristo. Pelo Espírito e
pela sua ação nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia,
Cristo morto e ressuscitado constitui como seu Corpo a
comunidade dos crentes.
806. Na unidade deste Corpo, existe diversidade de
membros e de funções. Mas todos os membros estão unidos
uns aos outros, particularmente àqueles que sofrem, aos
pobres e aos perseguidos.
807. A Igreja é este Corpo, cuja Cabeça é Cristo: ela
vive d'Ele, n'Ele e para Ele; e Ele vive com ela e nela.
808. A Igreja é a Esposa de Cristo: Ele amou-a e
entregou-se por ela. Purificou-a pelo seu sangue. Fez
dela a mãe fecunda de todos os filhos de Deus.
809. A Igreja é o Templo do Espírito Santo. O
Espírito é como que a alma do Corpo Místico, princípio
da sua vida, da unidade na diversidade e da riqueza dos
seus dons e carismas.
810. «A Igreja universal aparece, assim, como "um
povo que vai buscar a sua unidade à unidade do Pai e do
Filho e do Espírito Santo"»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
4: AAS 57 (1965) 7; cf. São Cipriano de
Cartago, De dominica Oratione, 23: CCL 3A. 105
(PL 4, 553)).
PARÁGRAFO 3
A IGREJA É UNA, SANTA, CATÓLICA E APOSTÓLICA
811. «Esta é a única Igreja de Cristo, que no Credo
confessamos ser una, santa, católica e apostólica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 11).
Estes quatro atributos, inseparavelmente ligados entre
si
(Cf. Santo Ofício, Ep. ad Episcopos Angliae (14
de setembro de 1864): DS 2888)
indicam traços essenciais da Igreja e da sua missão. A
Igreja não os confere a si mesma; é Cristo que, pelo
Espírito Santo, concede à sua Igreja que seja una,
santa, católica e apostólica, e é ainda Ele que a chama
a realizar cada uma destas qualidades.
812. Só a fé pode reconhecer que a Igreja recebe estas
propriedades da sua fonte divina. Mas as manifestações
históricas das mesmas são sinais que também falam claro
à razão humana. «A Igreja, lembra o I Concílio do
Vaticano, em razão da sua santidade, da sua unidade
católica, da sua invicta constância, é, por si mesma, um
grande e perpétuo motivo de credibilidade e uma prova
incontestável da sua missão divina»
(I Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Filius,
c. 3: DS 3013).
I. A Igreja é una
«O SAGRADO MISTÉRIO DA UNIDADE DA IGREJA»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 2: AAS 57 (1965) 92)
813. A Igreja é una, graças à sua fonte: «o supremo
modelo e princípio deste mistério é a unidade na
Trindade das pessoas, dum só Deus, Pai e Filho no
Espírito Santo»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 2: AAS 57 (1965) 92).
A Igreja é una graças ao seu fundador: «o próprio
Filho encarnado [...] reconciliou todos os homens com
Deus pela sua Cruz, restabelecendo a unidade de todos
num só povo e num só Corpo»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 78: AAS 58 (1966) 1101).
A Igreja é una graças à sua «alma»: «o
Espírito Santo que habita nos crentes e que enche e rege
toda a Igreja, realiza esta admirável comunhão dos fiéis
e une-os todos tão intimamente em Cristo que é o
princípio da unidade da Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 2: AAS 57 (1965) 91). Pertence, pois, à própria essência da
Igreja que ela seja una:
- «que admirável mistério! Há um só Pai do universo, um
só Logos do universo e também um só Espírito Santo,
idêntico em toda a parte; e há também uma só mãe Virgem,
à qual me apraz chamar Igreja»
(Clemente de Alexandria, Paedagogus 1, 6, 42: GCS
12, 115 (PG 8, 300)).
814. Desde a origem, no entanto, esta Igreja
apresenta-se com uma grande diversidade,
proveniente ao mesmo tempo da variedade dos dons de Deus
e da multiplicidade das pessoas que os recebem. Na
unidade do povo de Deus, juntam-se as diversidades dos
povos e das culturas. Entre os membros da Igreja existe
uma diversidade de dons, de cargos, de condições e de
modos de vida. «no seio da comunhão da Igreja existem
legitimamente Igrejas particulares, que gozam das suas
tradições próprias»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
13: AAS 57 (1905) 18).
A grande riqueza desta diversidade não se opõe à unidade
da Igreja. No entanto, o pecado e o peso das suas
consequências ameaçam constantemente o dom da unidade.
Também o Apóstolo se viu na necessidade de exortar a que
se guardasse «a unidade do Espírito pelo vínculo da
paz» (Ef. 4, 3).
815. Quais são os vínculos da unidade? «Acima de
tudo, a caridade, que é o vínculo da perfeição» (Cl.
3, 14). Mas a unidade da Igreja peregrina é
assegurada também por laços visíveis de comunhão:
- a profissão duma só fé, recebida dos Apóstolos;
- a celebração comum do culto divino, sobretudo dos
sacramentos;
- a sucessão apostólica pelo sacramento da Ordem, que
mantém a concórdia fraterna da família de Deus
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 2: AAS 57 (1965) 91-92; Id, Const.
dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 18-19; CIC
cân 205).
816. «A única Igreja de Cristo [...] é aquela que o
nosso Salvador, depois da ressurreição, entregou a
Pedro, com o encargo de a apascentar, confiando também a
ele e aos outros apóstolos a sua difusão e governo
[...]. Esta Igreja, constituída e organizada neste mundo
como uma sociedade, subsiste (subsistit in) na Igreja
Católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos
Bispos em comunhão com ele»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 11-12).
O decreto do II Concílio do Vaticano sobre o Ecumenismo
explicita: «com efeito, só pela Igreja Católica de
Cristo, que é "meio geral de salvação", é que se pode
obter toda a plenitude dos meios de salvação. Na
verdade, foi apenas ao colégio apostólico, de que Pedro
é o chefe, que, segundo a nossa fé, o Senhor confiou
todas as riquezas da nova Aliança, a fim de constituir
na terra um só Corpo de Cristo, ao qual é necessário que
sejam plenamente incorporados todos os que, de certo
modo, pertencem já ao povo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 94).
817. De fato, «nesta Igreja de Deus una e única, já
desde os primórdios surgiram algumas cisões, que o
Apóstolo censura asperamente como condenáveis. Nos
séculos posteriores, porém, surgiram dissensões mais
amplas. Importantes comunidades separaram-se da plena
comunhão da Igreja Católica, às vezes por culpa dos
homens duma e doutra parte»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 92-93).
As rupturas que ferem a unidade do Corpo de Cristo (a
saber: a heresia, a apostasia e o cisma)
(Cf. CIC cân 751)
devem-se aos pecados dos homens:
- «ubi peccata, ibi est multitudo, ibi schismata, ibi
haereses, ibi discussiones. Ubi autem virtus, ibi
singularitas, ibi unio, ex quo omnium credentium erat
cor unum et anima una - Onde há pecados, aí se encontra
a multiplicidade, o cisma, a heresia, o conflito. Mas
onde há virtude, aí se encontra a unicidade e aquela
união que faz com que todos os crentes tenham um só
coração e uma só alma»
(Orígenes, In Ezechielem homilia 9, 1: SC 352,
296 (PG 13, 732)).
818. Os que hoje nascem em comunidades provenientes de
tais rupturas, «e que vivem a fé de Cristo, não podem
ser acusados do pecado da divisão. A Igreja Católica
abraça-os com respeito e caridade fraterna [...].
Justificados pela fé recebida no Batismo, incorporados
em Cristo, é a justo título que se honram com o nome de
cristãos e os filhos da Igreja Católica reconhecem-nos
legitimamente como irmãos no Senhor»
(II Concílio do Vaticano,. Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93).
819. Além disso, existem fora das fronteiras visíveis
da Igreja Católica, «muitos elementos de santificação
e de verdade»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12):
«a Palavra de Deus escrita, a vida da graça, a fé, a
confiança e a caridade, outros dons interiores do
Espírito Santo e outros elementos visíveis»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93: cf. Id. Const.
dogm. Lumen Gentium, 15: AAS 57 (1965) 19).
O Espírito de Cristo serve-se destas Igrejas e
comunidades eclesiais como meios de salvação, cuja força
vem da plenitude da graça e da verdade que Cristo
confiou à Igreja Católica. Todos estes bens provêm de
Cristo e a Ele conduzem
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93)
e por si mesmos reclamam «a unidade católica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12).
A CAMINHO DA UNIDADE
820. A unidade, «Cristo a concedeu à sua Igreja desde
o princípio. Nós cremos que ela subsiste, sem
possibilidade de ser perdida, na Igreja Católica, e
esperamos que cresça de dia para dia até à consumação
dos séculos»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 4: AAS 57 (1965) 95). Cristo dá sempre à sua Igreja o dom da
unidade. Mas a Igreja deve orar e trabalhar
constantemente para manter, reforçar e aperfeiçoar a
unidade que Cristo quer para ela. Foi por esta intenção
que Jesus orou na hora da sua paixão e não cessa de orar
ao Pai pela unidade dos seus discípulos: «...que
todos sejam um. Como Tu, ó Pai, és um em Mim e Eu em Ti,
assim também eles sejam um em Nós, para que o mundo
creia que Tu Me enviaste» (Jo. 17, 21). O
desejo de recuperar a unidade de todos os cristãos é um
dom de Cristo e um apelo do Espírito Santo
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 1: AAS 57 (1965) 90-91).
821. Para lhe corresponder de modo adequado, exige-se:
- uma renovação permanente da Igreja, numa maior
fidelidade à sua vocação. Essa renovação é a força do
movimento a favor da unidade
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio,, 6: AAS 57 (1965) 96-97);
– a conversão do coração, «com o fim levar uma vida
mais pura segundo o Evangelho»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 7: AAS 57 (1965) 97),
pois o que causa as divisões é a infidelidade dos
membros ao dom de Cristo;
- a oração em comum, porque «a conversão do
coração e a santidade de vida. unidas às orações,
públicas e privadas, pela unidade dos cristãos, devem
ser tidas como a alma de todo o movimento ecuménico, e
com razão podem chamar-se ecumenismo espiritual»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 8: AAS 57 (1965) 98);
- o mútuo conhecimento fraterno
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 9: AAS 57 (1965) 98);
- a formação ecuménica dos fiéis, e especialmente
dos sacerdotes
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 10: AAS 57 (1965) 99);
- o diálogo entre os teólogos, e os encontros
entre os cristãos das diferentes Igrejas e comunidades
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 4: AAS 57 (1965) 94; Ibid. 9:
AAS, 57 (1965) 98: Ibid. 11: AAS 57 (1965) 99);
- a colaboração entre cristãos nos diversos
domínios do serviço dos
homens (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio,12: AAS 57 (1965) 99-100).
822. A preocupação com realizar a união «diz respeito
a toda a Igreja, fiéis e pastores»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 5: AAS 57 (1965) 96). Mas também se deve «ter consciência de
que este projeto sagrado da reconciliação de todos os
cristãos na unidade duma só e única Igreja de Cristo,
ultrapassa as forças e capacidades humanas». Por
isso, pomos toda a nossa confiança «na oração de
Cristo pela Igreja, no amor do Pai para conosco e no
poder do Espírito Santo»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 24: AAS 57 (1965) 107).
II. A Igreja é santa
823. «A Igreja é [...], aos olhos da fé,
indefectivelmente santa. Com efeito, Cristo, Filho de
Deus, que é proclamado «o único Santo», com o Pai e o
Espírito, amou a Igreja como sua esposa, entregou-Se por
ela para a santificar, uniu-a a Si como seu Corpo e
cumulou-a com o dom do Espírito Santo para glória de
Deus
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
39: AAS 57 (1965) 44).
A Igreja é, pois, «o povo santo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 12: AAS 57 (1965) 16),
e os seus membros são chamados «santos»
(Cf. At. 9,13: 1ª Cor. 6, 1; 16, 1).
824. A Igreja, unida a Cristo, é santificada por Ele.
Por Ele e n'Ele toma-se também santificante. «Todas
as obras da Igreja tendem, como seu fim,
(II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum
Concilium, 10: AAS 56 (1964) 102) para a santificação dos homens em Cristo e
para a glorificação de Deus».
É na Igreja que se encontra «a plenitude dos meios de
salvação»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 94). É nela que «nós adquirimos a santidade
pela graça de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53).
825. «Na terra, a Igreja está revestida duma
verdadeira, ainda que imperfeita, santidade»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
48: AAS 57 (1965) 53).
Nos seus membros, a santidade perfeita é ainda algo a
adquirir: «munidos de tantos e tão grandes meios de
salvação, todos os fiéis, seja qual for a sua condição
ou estado, são chamados pelo Senhor à perfeição do Pai,
cada um pelo seu caminho»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
11: AAS 57 (1965) 16).
826. A caridade é a alma da santidade à qual
todos são chamados: «é ela que dirige todos os meios
de santificação, lhes dá alma e os conduz ao seu fim»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
42: AAS 57 (1965) 48):
- «compreendi que, se a Igreja tinha um corpo composto
de diferentes membros, o mais necessário, o mais nobre
de todos não lhe faltava: compreendi que a igreja tinha
um coração, e que esse coração estava ardendo de amor.
Compreendi que só o Amor fazia agir os membros da
Igreja; que se o Amor se apagasse, os apóstolos já não
anunciariam o Evangelho, os mártires recusar-se-iam a
derramar o seu sangue... Compreendi que o Amor encerra
todas as vocações, que o Amor é tudo, que abarca todos
os tempos e lugares ... numa palavra, que ele é Eterno»
(Santa Teresa do Menino Jesus, Manuscrito B. 3v:
Manuscrits autobiographiques (Paris 992) p.
299. [Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face,
Obras Completas (Paço de Arcos, Edições do Carmelo 1996)
p. 230]).
827. «Enquanto que Cristo, santo e inocente, sem
mancha, não conheceu o pecado, mas veio somente expiar
os pecados do povo, a Igreja, que no seu próprio seio
encerra pecadores, é simultaneamente santa e chamada a
purificar-se, prosseguindo constantemente no seu esforço
de penitência e renovação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12; cf. In. Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 92-94; Ibid.
6: AAS 57 (1965) 96-97).
Todos os membros da Igreja, inclusive os seus ministros,
devem reconhecer-se pecadores
(Cf. 1ª Jo. 1, 8-10). Em todos eles, o joio do pecado
encontra-se ainda misturado com a boa semente do
Evangelho até ao fim dos tempos
(Mt. 13, 24-30).
A Igreja reúne, pois, em si, pecadores abrangidos pela
salvação de Cristo, mas ainda a caminho da santificação:
- a Igreja «é santa, não obstante compreender no seu
seio pecadores, porque ela não possui em si outra vida
senão a da graça: é vivendo da sua vida que os seus
membros se santificam; e é subtraindo-se à sua vida que
eles caem em pecado e nas desordens que impedem a
irradiação da sua santidade. É por isso que ela sofre e
faz penitência por estas faltas, tendo o poder de curar
delas os seus filhos, pelo Sangue de Cristo e pelo dom
do Espírito Santo»
(Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 19: AAS 60
(1968) 440).
828. Ao canonizar certos fiéis, isto é, ao
proclamar solenemente que esses fiéis praticaram
heroicamente as virtudes e viveram na fidelidade à graça
de Deus, a Igreja reconhece o poder do Espírito de
santidade que está nela, e ampara a esperança dos fiéis,
propondo-lhes os santos como modelos e intercessores
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
40: AAS 57 (1965) 44-45: Ibid, 48-51: AAS 57
(1965) 53-58).
«Os santos e santas foram sempre fonte e origem de
renovação nos momentos mais difíceis da história da
Igreja»
(João
Paulo
II, Ex. ap. Christifideles laici 16: AAS 81
(1989) 417).
«A santidade é a fonte secreta e o padrão infalível
da sua atividade apostólica e do seu dinamismo
missionário»
(João Paulo II, Ex. ap. Christifideles laici 17:
AAS 81 (1989) 419-420).
829. «Na pessoa da Santíssima Virgem, a Igreja
alcançou já aquela perfeição, sem mancha nem ruga, que
lhe é própria. Mas os fiéis de Cristo têm ainda de
trabalhar para crescer em santidade, vencendo o pecado.
Por isso, levantam os olhos para Maria»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
65: AAS 57 (1965) 64):
nela, a Igreja é já plenamente santa.
III. A Igreja é católica
QUE QUER DIZER «CATÓLICA»?
830. A palavra «católico» significa
«universal» no sentido de «segundo a totalidade»
ou «segundo a integridade». A Igreja é católica num
duplo sentido:
- é católica porque Cristo está presente nela: «onde
está Jesus Cristo, aí está a Igreja Católica»
(Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Smyrnaeos
8, 2: SC 10bis p. 138 (Funk 1, 282)).
Nela subsiste a plenitude do Corpo de Cristo unido à sua
Cabeça
(Cf. Ef ,1, 22-23),
o que implica que ela receba d'Ele a «plenitude dos
meios de salvação»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 6: AAS
58 (1966) 953)
que Ele quis: confissão de fé reta e completa, vida
sacramental integral e ministério ordenado na sucessão
apostólica. Neste sentido fundamental, a Igreja era
católica no dia de Pentecostes
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 4: AAS
58 (1966) 950-951)
e sê-lo-á sempre até ao dia da Parusia.
831. É católica, porque Cristo a enviou em missão à
universalidade do género humano:
(Cf. Mt. 28, 19)
- «todos os homens são chamados a fazer parte do povo de
Deus. Por isso, permanecendo uno e único, este povo está
destinado a estender-se a todo o mundo e por todos os
séculos, para se cumprir o desígnio da vontade de Deus
que, no princípio, criou a natureza humana na unidade e
decidiu enfim reunir na unidade os seus filhos
dispersos»
[...]. Este carácter de universalidade que adorna o povo
de Deus é dom do próprio Senhor. Graças a tal dom, a
Igreja Católica tende a recapitular, eficaz e
perpetuamente, a humanidade inteira, com todos os bens
que ela contém, sob Cristo Cabeça, na unidade do Seu
Espírito
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
13: AAS 57 (1965) 17).
CADA UMA DAS IGREJAS PARTICULARES É «CATÓLICA»
832. «A Igreja de Cristo está verdadeiramente
presente em todas as legítimas comunidades locais de
fiéis que, unidas aos seus pastores, recebem, também
elas, no Novo Testamento, o nome de Igrejas [...].
Nelas, os fiéis são reunidos pela pregação do Evangelho
de Cristo e é celebrado o mistério da Ceia do Senhor
[...]. Nestas comunidades, ainda que muitas vezes
pequenas e pobres ou dispersas, está presente Cristo,
por cujo poder se constitui a Igreja una, santa,
católica e apostólica»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
26: AAS 57 (1965) 31).
833. Entende-se por Igreja particular, que é em primeiro
lugar a diocese (ou «eparquia»), uma comunidade
de fiéis cristãos em comunhão de fé e de sacramentos com
o seu Bispo, ordenado na sucessão apostólica
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus.
11: AAS 58 (1966) 677; CIC cân 368-369; CCEO cân 177 §
1. 178. 311, § 1. 312).
Estas Igrejas particulares «são formadas à imagem da
Igreja universal; é nelas e a partir delas que existe a
Igreja Católica una e única»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS 57 (1965) 27).
834. As Igrejas particulares são plenamente católicas
pela comunhão com uma de entre elas: a Igreja Romana,
«que preside à caridade»
(Santo Inácio de Antioquia, Ep ad Romanos,
Inscr.: SC 10bis, p. 106 (Funk 1, 252)).
«Com esta Igreja, mais excelente por causa da sua
origem, deve necessariamente estar de acordo toda a
Igreja, isto é, os fiéis de toda a parte»
(Santo Ireneu de Lião, Adversas Haereses 3, 3, 2:
SC 211, 32 (PG 7, 849); I Concílio do Vaticano, Const.
dogm. Pastor aeternus, c. 2: DS 3057).
«Desde que o Verbo Encarnado desceu até nós, todas as
Igrejas cristãs de todo o mundo tiveram e têm a grande
Igreja que vive aqui (em Roma) como única base e
fundamento, porque, segundo as próprias promessas do
Salvador, as portas do inferno nunca prevalecerão sobre
ela»
(São Máximo o Confessor, Opuscula theologica et
polemica: PG 91, 137-140).
835. «A Igreja universal não deve ser entendida como
simples somatório ou, por assim dizer, federação de
Igrejas particulares [...]. Mas é antes a Igreja,
universal por vocação e missão, que lançando raiz numa
variedade de terrenos culturais, sociais e humanos, toma
em cada parte do mundo aspectos e formas de expressão
diversos»
(Paulo VI, Ex. ap. Evangelii nuntiandi, 62: AAS
68 (1976) 52). A rica variedade de normas disciplinares,
ritos litúrgicos, patrimónios teológicos e espirituais,
próprios das Igrejas locais, «mostra da forma mais
evidente, pela sua convergência na unidade, a
catolicidade da Igreja indivisa»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS57 (1965) 29).
QUEM PERTENCE À IGREJA CATÓLICA?
836. «Todos os homens são chamados [...] à unidade
católica do povo de Deus; de vários modos a ela
pertencem, ou para ela estão ordenados, tanto os fiéis
católicos como os outros que também acreditam em Cristo
e, finalmente, todos os homens sem excepção, que a graça
de Deus chama à salvação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
13: AAS 57 (1965) 18):
837. «Estão plenamente incorporados na sociedade que
é a Igreja aqueles que, tendo o Espírito de Cristo,
aceitam toda a sua organização e todos os meios de
salvação nela instituídos, e que, além disso, pelos
laços da profissão de fé, dos sacramentos, do governo
eclesiástico e da comunhão, estão unidos no todo visível
da Igreja, com Cristo que a dirige por meio do Sumo
Pontífice e dos bispos. Mas a incorporação não garante a
salvação àquele que, por não perseverar na caridade,
está no seio da Igreja “de corpo”, mas não “de coração”»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
14: AAS 57 (1965) 18-19).
838. «Com aqueles que, tendo sido batizados, têm o
belo nome de cristãos, embora não professem
integralmente a fé ou não guardem a unidade de comunhão
com o sucessor de Pedro, a Igreja sabe-se unida por
múltiplas razões»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
15: AAS 57 (1965) 19).
«Aqueles que creem em Cristo e receberam validamente
o Batismo encontram-se numa certa comunhão, embora
imperfeita, com a Igreja Católica»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93).
Quanto às Igrejas Ortodoxas, esta comunhão é tão
profunda «que bem pouco lhes falta para atingir a
plenitude, que permita uma celebração comum da
Eucaristia do Senhor»
(Paulo VI, Allocutio in Aede Sixtina, decem exactis
annis a sublatis mutuis excomunicationibus inter Romanam
et Constantinopolitanam Ecclesias (14 de Dezembro de
1975): AAS 68 (1976) 121: cf. II Concílio do
Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 13-18:
AAS 57 (1965) 100-104).
A IGREJA E OS NÃO-CRISTÃOS
839. «Aqueles que ainda não receberam o Evangelho
estão também, de uma de ou outra forma, ordenados ao
povo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
16: AAS 57 (1965) 20):
- a relação da Igreja com o Povo Judaico.
A Igreja, povo de Deus na nova Aliança, ao perscrutar o
seu próprio mistério, descobre o laço que a une ao povo
judaico
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decl. Nostra aetate,
4: AAS 58 (1966) 742-743),
«a quem Deus falou primeiro»
(Sexta-Feira da Paixão do Senhor, Celebração da
Paixão do Senhor Oração Universal VI: Missale Romanum,
editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.
254 [Trad. oficial portuguesa: Missal Romano,
Gráfica de Coimbra 1992. p. 259.267]).
Ao invés das outras religiões não cristãs, a fé judaica
é já uma resposta à revelação de Deus na antiga Aliança.
É ao povo judaico que «pertencem a adoção filial, a
glória, as alianças, a legislação, o culto, as promessas
[...] e os patriarcas; desse povo Cristo nasceu segundo
a carne» (Rm. 9, 4-5); porque «os dons e o
chamamento de Deus são irrevogáveis» (Rm. 11, 29).
840. Aliás, quando se considera o futuro, o povo de Deus
da Antiga Aliança e o novo povo de Deus tendem para fins
análogos: a confiança da vinda (ou do regresso) do
Messias. Mas a confiança é, dum lado, a do regresso do
Messias, morto e ressuscitado, reconhecido como Senhor e
Filho de Deus: do outro, a da vinda no fim dos tempos do
Messias, cujos traços permanecem velados - expectativa
acompanhada pelo drama da ignorância ou do falso
conhecimento de Cristo Jesus.
841. Relações da Igreja com os muçulmanos. «O
desígnio de salvação envolve igualmente os que
reconhecem o Criador, entre os quais, em primeiro lugar,
os muçulmanos que declarando guardar a fé de Abraão,
conosco adoram o Deus único e misericordioso que há de
julgar os homens no último dia»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
16: AAS 57 (1965) 20; cf. Id, Decl. Nostra
aetate, 3: AAS 58 (1966) 741-742).
842. A ligação da Igreja com as religiões não cristãs
é, antes de mais, a da origem e do fim comuns do
género humano:
- «de fato, todos os povos formam uma única comunidade;
têm uma origem única, pois Deus fez que toda a raça
humana habitasse à superfície da terra; têm também um
único fim último, Deus, cuja providência, testemunhos de
bondade e desígnio de salvação se estendem a todos, até
que os eleitos sejam reunidos na cidade santa»
(II Concílio do Vaticano, Decl. Nostra aetate, 1:
AAS 58 (1966) 740).
843. A Igreja reconhece nas outras religiões a busca,
«ainda nas sombras e sob imagens», do Deus
desconhecido, mas próximo, pois é Ele quem a todos dá
vida, respiração e todas as coisas e quer que todos os
homens se salvem. Assim, a Igreja considera tudo quanto
nas outras religiões pode encontrar-se de bom e
verdadeiro, «como uma preparação evangélica e um dom
d'Aquele que ilumina todo o homem, para que, finalmente,
tenha a vida»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
16: AAS 57 (1965) 20; cf. Id, Decl. Nostra
aetate, 2: AAS 58 (1966) 740-741; Paulo VI. Ex. ap.
Evangelii nuntiandi, 53: AAS 68 (1976) 41).
844. Mas no seu comportamento religioso, os homens
revelam também limites e erros que desfiguram neles a
imagem de Deus:
- «muitas vezes, enganados pelo Maligno, transviaram-se
nos seus raciocínios, trocando a verdade de Deus pela
mentira. Preferindo o serviço da criatura ao do Criador,
ou vivendo e morrendo sem Deus neste mundo, expuseram-se
ao desespero final»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
16: AAS 57 (1965) 20).
845. Foi para reunir de novo todos os seus filhos,
desorientados e dispersos pelo pecado, que o Pai quis
reunir toda a humanidade na Igreja do seu Filho. A
Igreja é o lugar onde a humanidade deve reencontrar a
sua unidade e a salvação. Ela é «o mundo
reconciliado»
(Cf. Santo Agostinho, Sermão 96, 7, 9: PL 38,
588);
é a nau que «navega segura neste mundo, ao sopro do
Espírito Santo, sob a vela panda da Cruz do Senhor»
(Santo Ambrósio, De virginitate 18, 119:
Sancti Ambrosii Episcopi Mediolanensis opera, v.
14/2 (Milano-Roma 1989) p. 96 (PL 16, 297)).
Segundo uma outra imagem, querida aos Padres da Igreja,
ela é figurada pela arca de Noé, a única que salva do
dilúvio
(Cf. já em 1ª Pe. 3, 20-21).
«FORA DA IGREJA NÃO HÁ SALVAÇÃO»
846. Como deve entender-se esta afirmação, tantas vezes
repetida pelos Padres da Igreja? Formulada de modo
positivo, significa que toda a salvação vem de
Cristo-Cabeça pela Igreja que é o seu Corpo:
- o santo Concílio «ensina, apoiado na Sagrada
Escritura e na Tradição, que está Igreja, peregrina na
terra, é necessária à salvação. De fato, só Cristo é
mediador e caminho de salvação. Ora, Ele tornasse-nos
presente no seu Corpo, que é a Igreja. Ao afirmar-nos
expressamente a necessidade da fé e do Batismo, Cristo
confirma-nos, ao mesmo tempo, a necessidade da própria
Igreja, na qual os homens entram pela porta do Batismo.
É por isso que não se podem salvar aqueles que, não
ignorando que Deus, por Jesus Cristo, fundou a Igreja
Católica como necessária, se recusam a entrar nela ou a
nela perseverar»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
14: AAS 57 (1965) 18).
847. Esta afirmação não visa aqueles que, sem culpa da
sua parte, ignoram Cristo e a sua igreja:
- «com efeito, também podem conseguir a salvação eterna
aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo e
a sua Igreja, no entanto procuram Deus com um coração
sincero e se esforçam, sob o influxo da graça, por
cumprir a sua vontade conhecida através do que a
consciência lhes dita»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
16: AAS 57 (1965) 20; cf. Santo
Ofício, Epistula ad Archiepiscopum Bostoniensem
(8 de Agosto 1949): DS 3866-3872).
848. «Muito embora Deus possa, por caminhos só d'Ele
conhecidos, trazer à fé, sem a qual é impossível agradar
a Deus»
(Cf. Heb. 11, 6), homens que, sem culpa sua, ignoram o
Evangelho, «a Igreja tem o dever e, ao mesmo tempo, o
direito sagrado, de evangelizar»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 7: AAS
58 (1966) 955)
todos os homens.
A MISSÃO - UMA EXIGÊNCIA DA CATOLICIDADE DA IGREJA
849. O mandato missionário. «enviado por Deus às
nações, para ser o sacramento universal da salvação, a
Igreja, em virtude das exigências íntimas da sua própria
catolicidade e em obediência ao mandamento do seu
fundador, procura incansavelmente anunciar o Evangelho a
todos os homens»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 1: AAS
58 (1966) 947).
«Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito
Santo, e ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei.
E eis que Eu estou convosco todos os dias, até ao fim do
mundo» (Mt. 28, 19-20).
850. A origem e o fim da missão. O mandato
missionário do Senhor tem a sua fonte primeira no amor
eterno da Santíssima Trindade: «por sua natureza, a
Igreja peregrina é missionária, visto ter a sua origem,
segundo o desígnio de Deus Pai, na missão do Filho e do
Espírito Santo»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 2: AAS
58 (1966) 948).
E o fim último da missão consiste em fazer todos os
homens participantes na comunhão existente entre o Pai e
o Filho, no Espírito de amor
(Cf. João Paulo II. Enc. Redemptoris missio, 23:
AAS 83 (1991) 269-270).
851. O motivo da missão. É ao amor de Deus
por todos os homens que, desde sempre, a Igreja vai
buscar a obrigação e o vigor do seu ardor missionário:
«porque o amor de Cristo nos impele...» (2ª Cor.
5, 14)
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 6: AAS 58 (1966) 842-843; João Paulo
II, Enc. Redemptoris missio, 11: AAS 83 (1991)
259-260). Com efeito, «Deus quer que todos os
homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da
verdade» (1ª Tm. 2, 4). Deus quer a salvação de
todos, mediante o conhecimento da verdade. A
salvação está na verdade. Os que obedecem à moção do
Espírito da verdade estão já no caminho da salvação. Mas
a Igreja, à qual a mesma verdade foi confiada, deve ir
ao encontro dos que a procuram para lhe levar. É por
acreditar no desígnio universal da salvação que a Igreja
deve ser missionária.
852. Os caminhos da missão. «O protagonista de toda a
missão eclesial é o Espírito Santo»
(João Paulo II, Enc. Redemptoris missio, 21: AAS
83 (1991) 268).
É Ele que conduz a Igreja pelos caminhos da missão. E
esta «continua e prolonga, no decorrer da história, a
missão do próprio Cristo, que foi enviado para anunciar
a Boa-Nova aos pobres. É, portanto, pelo mesmo caminho
seguido por Cristo que, sob o impulso do Espírito Santo,
a Igreja deve seguir, ou seja, pelo caminho da pobreza,
da obediência, do serviço e da imolação de si mesma até
à morte - morte da qual Ele saiu vitorioso pela
ressurreição»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 5: AAS
58 (1966) 952).
É assim que «o sangue dos mártires se torna semente
de cristãos»
(Tertuliano, Apologeticum 50, 13: CCL 1, 171 (PL
1, 603)).
853. Porém, no seu peregrinar, a Igreja também faz a
experiência da «distância que separa a mensagem de
que é portadora, da fraqueza humana daqueles a quem este
Evangelho é confiado»
(II Concílio do Vaticano, Const.past. Gaudium et
spes, 43: AAS 58 (1966) 1064).
Só avançando pelo caminho «da penitência e da
renovação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12: cf. Ibid, 15: AAS
57 (1965) 20)
e entrando «pela porta estreita da Cruz»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 1 AAS
58 (1966) 947)
é que o povo de Deus pode expandir o Reino de Cristo
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio,
12-20: AAS 83 (1991) 260-268).
Com efeito, «assim como foi na pobreza e na
perseguição que Cristo realizou a redenção, assim também
a Igreja é chamada a seguir pelo mesmo caminho, para
comunicar aos homens os frutos da salvação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 12).
854. Pela sua própria missão, «a Igreja faz a
caminhada de toda a humanidade e partilha a sorte
terrena do mundo. Ela é como que o fermento e, por assim
dizer, a alma da sociedade humana, chamada a ser
renovada em Cristo e transformada em família de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
Spes, 40: AAS 58 (1966) 1058).
O esforço missionário exige, portanto, paciência.
Começa pelo anúncio do Evangelho aos povos e grupos que
ainda não acreditam em Cristo
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio,
42-47: AAS 83 (1991) 289-295);
prossegue no estabelecimento de comunidades cristãs, que
sejam «sinais da presença de Deus no mundo» (Cf.
II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 15: AAS
58 (1966) 964)
e na fundação de Igrejas locais
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio,
48-49: AAS 83 (1991) 295-297);
compromete-se num processo de inculturação, para
incarnar o Evangelho nas culturas dos povos
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio,
52-54: AAS 83 (1991) 299-302);
e também não deixará de conhecer alguns fracassos.
«Pelo que diz respeito aos homens, aos grupos humanos
e aos povos, a Igreja só a pouco e pouco os atinge e
penetra, assim os assumindo na plenitude católica»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 6: AAS
58 (1966) 953).
855. A missão da Igreja requer um esforço em ordem à
unidade dos cristãos
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio, 50:
AAS 83 (1991) 297-298). «De fato, as divisões entre cristãos
impedem a Igreja de realizar a plenitude da catolicidade
que lhe é própria, naqueles seus filhos que, sem dúvida,
lhe pertencem pelo Batismo, mas que se encontram
separados da plenitude da comunhão com ela. Mais ainda:
para a própria Igreja, torna-se mais difícil exprimir,
sob todos os seus aspectos, a plenitude da catolicidade
na própria realidade da sua vida»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 4: AAS 57 (1965) 96).
856. A tarefa missionária implica um diálogo
respeitoso com aqueles que ainda não aceitam o
Evangelho
(Cf. João Paulo II, Enc. Redemptoris missio, 55:
AAS 83 (1991) 302-304).
Os crentes podem tirar proveito para si mesmos deste
diálogo, aprendendo a conhecer melhor «tudo quanto de
verdade e graça se encontrava já entre os povos, como
que por uma secreta presença de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 9: AAS
58 (1966) 958).
Se anunciam a Boa-Nova aos que a ignoram, é para
consolidar, completar e elevar a verdade e o bem que
Deus espalhou entre os homens e os povos, e para os
purificar do erro e do mal, «para glória de Deus,
confusão do demónio e felicidade do homem»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 9: AAS
58 (1966) 958).
IV. A Igreja é apostólica
857. A Igreja é apostólica, porque está fundada sobre os
Apóstolos. E isso em três sentidos:
- foi e continua a ser construída sobre o «alicerce
dos Apóstolos» (Ef 2. 20)
(Cf. Ap. 21, 14),
testemunhas escolhidas e enviadas em missão pelo próprio
Cristo
(Cf. Mt. 28, 16-20; At. 1, 8; 1ª Cor. 9, 1; 15, 7-8: Gl.
1, 1: etc.);
- guarda e transmite, com a ajuda do Espírito Santo que
nela habita, a doutrina
(Cf. At. 2, 42),
o bom depósito, as sãs palavras recebidas dos Apóstolos
(Cf. 2ª Tm. 1, 13-14);
- continua a ser ensinada, santificada e dirigida pelos
Apóstolos até ao regresso de Cristo, graças àqueles que
lhes sucedem no ofício pastoral: o colégio dos bispos,
«assistido pelos presbíteros, em união com o sucessor
de Pedro, pastor supremo da Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 5: AAS 58
(1966) 952):
- «Pastor eterno, não abandonais o vosso rebanho, mas
sempre o guardais e protegeis por meio dos santos
Apóstolos, para que seja conduzido através dos tempos,
pelos mesmos chefes que pusestes à sua frente como
representantes do vosso Filho, Jesus Cristo»
(Prefácio dos Apóstolos Missale Romanum, editio
typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 426
[Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. p. 493]).
A MISSÃO DOS APÓSTOLOS
858. Jesus é o enviado do Pai. Desde o princípio do seu
ministério, «chamou para junto de Si os que Lhe
aprouve [...] e deles estabeleceu Doze, para andarem
consigo e para os enviar a pregar» (Mc. 3,
13-14). A partir de então, eles serão os seus
«enviados» (é o que significa a palavra grega
apóstolo). Neles, Jesus continua a sua própria
missão: «tal como o Pai Me enviou, assim Eu vos envio
a vós» (Jo. 20, 21)
(Cf. 1ª Jo. 13, 20; 17. 18).
O seu ministério é, pois, a continuação da própria
missão de Jesus: «quem vos acolhe, acolhe-Me a Mim»,
disse Ele aos Doze (Mt. 10, 40)
(Cf. Lc. 10, 16).
859. Jesus uniu-os à missão que Ele próprio recebera do
Pai: «assim como o Filho não pode fazer nada por Si
mesmo» (Jo. 5, 19.30), mas tudo recebe do Pai que O
enviou, assim também aqueles que Jesus envia nada podem
fazer sem Ele
(Cf. Jo. 15, 5);
d'Ele recebem o mandato da missão e o poder de o
cumprir. Os apóstolos de Cristo sabem, portanto, que são
qualificados por Deus como «ministros de uma Aliança
nova» (2ª Cor. 3, 6), «ministros de Deus» (2ª
Cor. 6, 4), «embaixadores de Cristo» (2ª Cor.
5, 20), «servidores de Cristo e administradores
dos mistérios de Deus» (1ª Cor. 4, 1).
860. No múnus dos Apóstolos há um aspecto
intransmissível: serem as testemunhas escolhidas da
ressurreição do Senhor e os alicerces da Igreja. Mas há
também um aspecto da sua missão que permanece. Cristo
prometeu estar com eles até ao fim dos tempos
(Cf. Mt. 28, 20).
«A missão divina confiada por Jesus aos Apóstolos é
destinada a durar até ao fim dos séculos, uma vez que o
Evangelho que devem transmitir é, para a Igreja,
princípio de toda a sua vida em todos os tempos. Por
isso é que os Apóstolos tiveram o cuidado de instituir
[...] sucessores»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
20: AAS 57 (1965) 23).
OS BISPOS, SUCESSORES DOS APÓSTOLOS
861. «Para que a missão que lhes fora confiada
pudesse ser continuada depois da sua morte, os
Apóstolos, como que por testamento, mandataram os seus
cooperadores imediatos para levarem a cabo a sua tarefa
e consolidarem a obra por eles começada,
encomendando-lhes a guarda do rebanho em que o Espírito
Santo os tinha instituído para apascentar a Igreja de
Deus. Assim, instituíram homens nestas condições e tudo
dispuseram para que, após a sua morte, outros homens
provados tomassem conta do seu ministério»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
20: AAS 57 (1965) 23: cf. São Clemente Romano,
Epistula ad Corinthios, 42, 4: SC 167, 168-170
(Funk, 1. 152); Ibid. 44, 2: SC 167, 172 (Funk,
1, 154-156)).
862. «Do mesmo modo que o encargo confiado pelo
Senhor singularmente a Pedro, o primeiro dos Apóstolos,
e destinado a ser transmitido aos seus sucessores, é um
múnus permanente, assim também é permanente o múnus
confiado aos Apóstolos de serem pastores da Igreja,
múnus cuja perenidade a ordem sagrada dos bispos deve
garantir». Por isso, a Igreja ensina que, «em
virtude da sua instituição divina, os bispos sucedem aos
Apóstolos como pastores da Igreja, de modo que quem os
ouve, ouve a Cristo e quem os despreza, despreza a
Cristo e Aquele que enviou Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
20: AAS 57 (1965) 24).
O APOSTOLADO
863. Toda a Igreja é apostólica, na medida em que,
através dos sucessores de Pedro e dos Apóstolos,
permanece em comunhão de fé e de vida com a sua origem.
Toda a Igreja é apostólica, na medida em que é
«enviada» a todo o mundo. Todos os membros da
Igreja, embora de modos diversos, participam deste
envio. «A vocação cristã é também, por natureza,
vocação para o apostolado». E chamamos
«apostolado» a «toda a atividade do Corpo
Místico» tendente a «alargar o Reino de Cristo à
terra inteira»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 2: AAS 58 (1966) 838).
864. «Sendo Cristo, enviado do Pai, a fonte e a
origem de todo o apostolado da Igreja», é evidente
que a fecundidade do apostolado, tanto dos ministros
ordenados como dos leigos, depende da sua união vital
com Cristo
(II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 6: AAS 58 (1966) 840; cf. Jo
15, 5).
Segundo as vocações, as exigências dos tempos e os
vários dons do Espírito Santo, o apostolado toma as
formas mais diversas. Mas é sempre a caridade, haurida
principalmente na Eucaristia, «que é como que a alma
de todo o apostolado»
(Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 3: AAS 58 (1966) 839).
865. A Igreja é una, santa, católica e apostólica
na sua identidade profunda e última, porque é nela que
existe desde já, e será consumado no fim dos tempos,
«o Reino dos céus», «o Reino de Deus»
(Cf. Ap. 19. 6),
que veio até nós na Pessoa de Cristo e que cresce
misteriosamente no coração dos que n'Ele estão
incorporados, até à sua plena manifestação escatológica.
Então, todos os homens por Ele resgatados e n'
Ele tornados «santos e imaculados na presença de Deus
no amor»
(Cf. Ef. 1. 4),
serão reunidos como o único povo de Deus, «a
Esposa do Cordeiro»
(Cf. Ap. 21, 9),
«a Cidade santa descida do céu, de junto de Deus,
trazendo em si a glória do mesmo Deus»
(Cf. Ap. 21, 10-11).
E «a muralha da cidade assenta sobre doze alicerces,
cada um dos quais tem o nome de um dos Doze apóstolos do
Cordeiro» (Ap. 21, 14).
Resumindo:
866. A Igreja é una: tem um só Senhor,
professa uma só fé, nasce dum só Batismo e forma um só
Corpo, vivificado por um só Espírito, em vista duma
única confiança
(Cf. Ef. 4, 3-5),
no termo da qual todas
as divisões serão superadas.
867. A Igreja é santa: é seu autor o Deus
santíssimo; Cristo, seu Esposo, por ela Se entregou para
a santificar; vivifica-a o Espírito de santidade. Embora
encerra pecadores no seu seio, ela é «a sem-pecado feita
de pecadores». Nos santos brilha a sua santidade; em
Maria, ela é já totalmente santa.
868. A Igreja é católica: anuncia a totalidade
da fé, tem à sua disposição e administra a plenitude dos
meios de salvação; é enviada a todos os povos; dirige-se
a todos os homens; abrange todos os tempos; «é, por sua
própria natureza, missionária»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 2: AAS
58 (1966) 948).
869. A Igreja é apostólica: está edificada
sobre alicerces duradouros, que são «os Doze apóstolos
do Cordeiro»
(Cf. Ap 21, 14);
é indestrutível
(Cf. Mt. 16, 18);
é infalivelmente mantida na verdade: Cristo é quem a
governa por meio de Pedro e dos outros apóstolos,
presentes nos seus sucessores, o Papa e o colégio dos
bispos.
870. «A única Igreja de Cristo, da qual professamos
no Credo que é una, santa, católica e apostólica, [...]
é na Igreja Católica que subsiste, governada pelo
sucessor de Pedro e pelos Bispos que estão em comunhão
com ele, embora numerosos elementos de santificação e de
verdade se encontrem fora das suas estruturas»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
8: AAS 57 (1965) 11-12).
PARÁGRAFO 4
OS FIÉIS DE CRISTO:
HIERARQUIA, LEIGOS, VIDA CONSAGRADA
871. «Fiéis são aqueles que, por terem sido
incorporados em Cristo pelo Batismo, foram constituídos
em povo de Deus e por este motivo se tornaram, a seu
modo, participantes do múnus sacerdotal, profético e
real de Cristo e, segundo a própria condição, são
chamados a exercer a missão que Deus confiou à Igreja
para esta realizar no mundo»
(CIC, cân. 204, § l; cf. II Concílio do Vaticano,
Const. dogm. Lumen Gentium, 31: AAS 57 (1965)
37-38).
872. «Devido à sua regeneração em Cristo, existe
entre todos os fiéis verdadeira igualdade no concernente
à dignidade e à atuação, pela qual todos eles cooperam
para a edificação do Corpo de Cristo, segundo a condição
e a função próprias de cada um»
(CIC, cân. 208: cf. II Concílio do Vaticano, Const.
dogm. Lumen Gentium, 32: AAS 57 (1965) 38-3).
873. As próprias diferenças que o Senhor quis que
existissem entre os membros do seu Corpo servem a sua
unidade e missão. Porque «há na Igreja diversidade de
ministérios, mas unidade de missão. Cristo confiou aos
Apóstolos e aos seus sucessores o encargo de ensinar,
santificar e governar em seu nome e pelo seu poder. Mas
os leigos, feitos participantes do múnus sacerdotal,
profético e real de Cristo, assumem na Igreja e no mundo
a parte que lhes toca naquilo que é a missão de todo o
povo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 2: AAS 58 (1966) 838-839).
Por fim, «de ambos estes grupos [hierarquia e
leigos] existem fiéis que, pela profissão dos conselhos
evangélicos [...], se consagram a Deus de modo peculiar,
e contribuem para a missão salvífica da Igreja»
(CIC cân. 207, § 2).
I. A constituição hierárquica da Igreja
PORQUÊ O MINISTÉRIO ECLESIAL?
874. A fonte do ministério na Igreja é o próprio Cristo.
Foi Ele que o instituiu e lhe deu autoridade e missão,
orientação e finalidade.
«Cristo Senhor, para apascentar e aumentar continuamente
o povo de Deus, instituía na sua Igreja vários
ministérios, para bem de todo o Corpo. Com efeito, os
ministros que estão dotados do poder sagrado estão ao
serviço dos seus irmãos, para que todos quantos
pertencem ao povo de Deus [...] alcancem a salvação»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
18: AAS 57 (1965) 21-22).
875. «Como hão de acreditar naquele de quem não
ouviram falar? E como hão de ouvir falar, sem que alguém
o anuncie? E como hão de anunciar, se não forem
enviados»? (Rm. 10, 14-15). Ninguém, nenhum
indivíduo ou comunidade, pode anunciar a si mesmo o
Evangelho. «A fé surge da pregação» (Rm. 10, 17).
Por outro lado, ninguém pode dar a si próprio o
mandato e a missão de anunciar o Evangelho. O enviado do
Senhor fala e atua, não por autoridade própria, mas em
virtude da autoridade de Cristo; não como membro da
comunidade, mas falando à comunidade em nome de Cristo.
Ninguém pode conferir a si mesmo a graça; ela deve
ser-lhe dada e oferecida. Isto supõe ministros da graça,
autorizados e habilitados em nome de Cristo. É d'Ele que
os Bispos e presbíteros recebem a missão e a faculdade
(o «poder sagrado») de agir na pessoa de
Cristo Cabeça e os diáconos a força de servir o povo
de Deus na «diaconia» da Liturgia, da Palavra e
da caridade, em comunhão com o Bispo e com o seu
presbitério. A este ministério, no qual os enviados de
Cristo fazem e dão, por graça de Deus, o que por si
mesmos não podem fazer nem dar, a tradição da Igreja
chama «sacramento». O ministério da Igreja é
conferido por um sacramento próprio.
876. Intrinsecamente ligado à natureza sacramental do
ministério eclesial está o seu carácter de serviço.
Com efeito, inteiramente dependentes de Cristo, que
lhes dá missão e autoridade, os ministros são
verdadeiramente «servos de Cristo»
(Cf. Rm. 1, 1),
à imagem do mesmo Cristo que por nós livremente tomou
«a forma de servo» (Fl. 2, 7). E uma vez que
a palavra e a graça, de que são ministros, não são
deles, mas de Cristo que lhes confiou para os outros,
eles tornar-se-ão livremente servos de todos
(Cf. 1ª Cor. 9, 19).
877. Do mesmo modo, pertence à natureza sacramental do
ministério eclesial que ele tenha um carácter
colegial. De fato, desde o princípio do seu
ministério, o Senhor Jesus instituiu os Doze,
«gérmenes do novo Israel e ao mesmo tempo origem da
hierarquia sagrada»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 5: AAS
58 (1966) 951).
Escolhidos juntamente, também juntamente foram enviados,
e a sua unidade fraterna estará ao serviço da comunhão
fraterna de todos os fiéis. Será como um reflexo e um
testemunho da comunhão das pessoas divinas
(Cf. Jo. 17, 21-23). Por isso, todo o bispo exerce o seu
ministério no seio do colégio episcopal e em comunhão
com o Bispo de Roma, sucessor de Pedro e chefe do mesmo
colégio; e todos os Presbíteros exercem o seu ministério
no seio do presbyterium da diocese, sob a direção
do seu Bispo.
878. Finalmente, pertence à natureza sacramental do
ministério eclesial que ele tenha um carácter
pessoal. Se os ministros de Cristo atuam em
comunhão, fazem-no sempre também de modo pessoal. Cada
qual é chamado pessoalmente -: «Tu, segue-Me»
(Jo. 21, 22)
(Cf. Mt. 4, 19.21; Jo. 1, 43)
- para ser, na missão comum, uma testemunha pessoal,
pessoalmente responsável perante Aquele que lhe confere
a missão, agindo «na pessoa d'Ele» e em favor das
pessoas: «Eu te batizo em nome do Pai...»; «Eu
te absolvo...».
879. O ministério sacramental na Igreja é, pois, um
serviço exercido em nome de Cristo. Tem um carácter
pessoal e uma forma colegial. Isto verifica-se nos
vínculos que ligam o colégio episcopal e o seu chefe, o
sucessor de Pedro, bem como na relação entre a
responsabilidade pastoral do Bispo pela sua Igreja
particular e a solicitude comum do colégio episcopal
pela Igreja universal.
O COLÉGIO EPISCOPAL E O SEU CHEFE, O PAPA
880. Cristo, ao instituir os Doze, «deu-lhes a forma
dum corpo colegial, quer dizer, dum grupo estável, e
colocou á sua frente Pedro, escolhido de entre eles»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
19: AAS 57 (1965) 22).
«Assim como, por instituição do Senhor, Pedro e os
outros apóstolos formam um só colégio apostólico, assim
de igual modo o pontífice romano, sucessor de Pedro, e
os Bispos, sucessores dos Apóstolos, estão unidos entre
si»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 25: cf. CIC cân 330).
881. Foi só de Simão, a quem deu o nome de Pedro, que o
Senhor fez a pedra da sua Igreja. Confiou-lhe as chaves
desta
(Cf. Mt. 16, 18-19)
e instituiu-o pastor de todo o rebanho
(Cf. Jo. 21, 15-17). «Mas o múnus de ligar e desligar, que
foi dado a Pedro, também foi dado, sem dúvida alguma, ao
colégio dos Apóstolos unidos ao seu chefe»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26).
Este múnus pastoral de Pedro e dos outros apóstolos
pertence aos fundamentos da Igreja e é continuado pelos
Bispos sob o primado do Papa.
882. O Papa, Bispo de Roma e sucessor de S.
Pedro, «é princípio perpétuo e visível, e fundamento
da unidade que liga, entre si, tanto os Bispos como a
multidão dos fiéis»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS 57 (1965) 27).
Com efeito, em virtude do seu cargo de Vigário de Cristo
e pastor de toda a Igreja, «o pontífice romano tem
sobre a mesma Igreja um poder pleno, supremo e
universal, que pode sempre livremente exercer»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26: ID).
883. «O colégio ou corpo episcopal não tem autoridade
a não ser em união com o pontífice romano [...] como sua
cabeça». Como tal, este colégio é «também sujeito
do poder supremo e pleno sobre toda a Igreja, poder que,
no entanto, só pode ser exercido com o consentimento do
pontífice romano»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26: cf. CIC cân 336).
884. «O colégio dos Bispos exerce de modo solene o
poder sobre toda a Igreja no concílio ecuménico»
(CIC cân 337 § 1).
Mas «não há concilio ecuménico se não for, como tal,
confirmado, ou pelo menos aceite, pelo sucessor de
Pedro»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 22: AAS 57 (1965) 27).
885. «Pela sua múltipla composição, este colégio
exprime a variedade e a universalidade do povo de Deus:
enquanto reunido sob uma só cabeça, revela a unidade do
rebanho de Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26).
886. «Cada Bispo, individualmente, é o princípio e o
fundamento da unidade na sua respectiva Igreja
particular»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
22: AAS 57 (1965) 26).
Como tal, «exerce a sua autoridade pastoral sobre a
porção do povo de Deus que lhe foi confiada»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 23: AAS 57 (1965) 27),
assistido pelos Presbíteros e Diáconos. Mas, como membro
do colégio episcopal, cada qual participa na solicitude
por todas as Igrejas
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus,
3: AAS 58 (1966) 674),
dever que exerce, antes de mais, «governando bem a
sua própria Igreja como porção da Igreja universal»,
contribuindo assim «para o bem de todo o Corpo
Místico, que é também o corpo das Igrejas»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS 57 (1965) 28).
Esta solicitude há de abranger, de modo particular, os
pobres
(Cf. Gl. 2, 10),
os perseguidos por causa da fé e ainda os missionários
espalhados por toda a terra.
887. As Igrejas particulares vizinhas e de cultura
homogénea formam províncias eclesiásticas ou conjuntos
mais vastos, chamados patriarcados ou regiões
(Cf. Canones Apostolorum, 34 [Constitutiones
apostolicae 8, 47, 34]: SC 336, 284 (Funk,
Didascalia et Constitutiones Apostolorum 1,
572-574)).
Os Bispos destes conjuntos podem reunir-se em sínodos ou
concílios provinciais. «Igualmente, hoje, as
conferências episcopais podem prestar uma ajuda múltipla
e fecunda, em ordem à realização concreta do espírito
colegial»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS 57 (1965) 29).
O OFÍCIO DE ENSINAR
888. Os Bispos, com os Presbíteros seus cooperadores,
«têm como primeiro dever anunciar o Evangelho de Deus a
todos os homens»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Presbiterorum
ordinis, 4: AAS 58 (1966) 995),
conforme a ordem do Senhor;
(Cf. Mc. 16, 15). Eles são «os arautos da fé», que
trazem a Cristo novos discípulos, e os «doutores
autênticos» da fé apostólica, «munidos da
autoridade de Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
25: AAS 57 (1965) 29).
889. Para manter a Igreja na pureza da fé transmitida
pelos Apóstolos, Cristo quis conferir à sua Igreja uma
participação na sua própria infalibilidade, Ele que é a
Verdade. Pelo «sentido sobrenatural da fé», o
povo de Deus «adere de modo indefectível à fé»,
sob a conduta do Magistério vivo da Igreja
(II
Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
12: AAS 57 (1965) 16: cf. Id, Const. dogm. Dei
Verbum, 10: AAS 58 (1966) 822).
890. A missão do Magistério está ligada ao carácter
definitivo da Aliança instaurada por Deus em Cristo com
o seu povo. Deve protegê-lo dos desvios e falhas, e
garantir-lhe a possibilidade objetiva de professar, sem
erro, a fé autêntica. O múnus pastoral do Magistério
está, assim, ordenado a velar por que o povo de Deus
permaneça na verdade que liberta. Para cumprir este
serviço. Cristo dotou os pastores do carisma da
infalibilidade em matéria de fé e de costumes. O
exercício de tal carisma pode revestir-se de diversas
modalidades:
891. «Desta infalibilidade goza o pontífice romano,
chefe do colégio episcopal, por força do seu ofício,
quando, na qualidade de pastor e doutor supremo de todos
os fiéis, e encarregado de confirmar na fé os seus
irmãos, proclama, por um ato definitivo, um ponto de
doutrina respeitante à fé ou aos costumes [...]. A
infalibilidade prometida à Igreja reside também no corpo
dos Bispos, quando exerce o seu Magistério supremo em
união com o sucessor de Pedro», sobretudo num
concílio ecuménico
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
25: AAS 57 (1965) 30: cf. I Concílio do Vaticano,
Const. dogm. Pastor aeternus, c. 4: DS
3074)
quando, pelo seu Magistério supremo, a Igreja propõe
alguma coisa «para crer como sendo revelada por Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 10:
AAS 58 (1966) 822)
como doutrina de Cristo, «deve-se aderir na
obediência da fé a tais definições»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
25: AAS 57 (1965) 30).
Esta infalibilidade abarca tudo quanto abarca o depósito
da Revelação divina
892. A assistência divina é também dispensada aos
sucessores dos Apóstolos, quando ensinam em comunhão com
o sucessor de Pedro, e de modo particular ao Bispo de
Roma, pastor de toda a Igreja, quando, mesmo sem
chegarem a uma definição infalível e sem se pronunciar
de «modo definitivo», no exercício do seu
Magistério ordinário, propõem uma doutrina que leva a
uma melhor inteligência da Revelação em matéria de fé e
de costumes. A este ensinamento ordinário devem os fiéis
«prestar o assentimento religioso do seu espírito»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
25: AAS 57 (1965) 29-30),
o qual, embora distinto do assentimento da fé, é, no
entanto, seu prolongamento.
O OFÍCIO DE SANTIFICAR
893. O Bispo tem igualmente «a responsabilidade de
dispensar a graça do sumo sacerdócio»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
26: AAS 57 (1965) 31),
em particular na Eucaristia, que oferece pessoalmente ou
cuja celebração pelos presbíteros seus cooperadores ele
garante. É que a Eucaristia é o centro da vida da Igreja
particular. O Bispo e os Presbíteros santificam a Igreja
com a sua oração e o seu trabalho, bem como pelo
ministério da Palavra e dos sacramentos. E também a
santificam com o seu exemplo, atuando «não com um
poder autoritário sobre a herança do Senhor, mas como
modelos do rebanho» (1ª Pe. 5, 3). Assim
«chegarão, com o rebanho que lhes está confiado, à vida
eterna»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
26: AAS 57 (1965) 32).
O OFÍCIO DE GOVERNAR
894. «Os Bispos dirigem as suas Igrejas particulares,
como vigários e legados de Cristo, mediante os seus
conselhos, incitamentos e exemplos; mas também com a sua
autoridade e com o seu poder sagrado»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
27: AAS 57 (1965) 32),
que, no entanto, devem exercer para edificação naquele
espírito de serviço que é próprio o do seu Mestre
(Cf. Lc. 22, 26-27).
895. «Este poder, que eles exercem pessoalmente em
nome de Cristo, é um poder próprio, ordinário e
imediato. O seu exercício, contudo, está regulado em
definitivo pela autoridade suprema da Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
27: AAS 57 (1965) 32).
Mas os Bispos não devem ser considerados como Vigários
do Papa; a autoridade ordinária e imediata deste sobre
toda a Igreja, não anula, pelo contrário, confirma e
defende, a daqueles. A autoridade episcopal deve
exercer-se em comunhão com toda a Igreja, sob a direção
do Papa.
896. O Bom Pastor há de ser o modelo e a «forma»
do múnus pastoral do Bispo. Consciente das suas
fraquezas, «o Bispo pode mostrar-se indulgente para
com os ignorantes e os transviados. Não se furte a
atender os que de si dependem, rodeando-os de carinho,
como a verdadeiros filhos [...]. Quanto aos fiéis, devem
viver unidos ao seu Bispo como a Igreja a Jesus Cristo e
Jesus Cristo ao Pai»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
27: AAS 57 (1965) 33).
- «Segui todos o Bispo, como Jesus Cristo o Pai; e o
presbitério como se fossem os Apóstolos; quanto aos
Diáconos, respeitai-os como à lei de Deus. Ninguém faça,
à margem do Bispo, nada do que diga respeito à Igreja»
(Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Smyrnaeos
8, 1: SC 10bis, 138 (Funk 1, 282)).
II. Os fiéis leigos
897. «Por leigos entendem-se aqui todos os cristãos
com excepção dos membros da ordem sacra ou do estado
religioso reconhecido pela Igreja, isto é, os fiéis que,
incorporados em Cristo pelo Batismo, constituídos em
povo de Deus e feitos participantes, a seu modo, da
função sacerdotal, profética e real de Cristo, exercem,
pela parte que lhes toca, na Igreja e no mundo, a missão
de todo o povo cristão»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
31: AAS 57 (1965) 37).
A VOCAÇÃO DOS LEIGOS
898. «A vocação própria dos leigos consiste
precisamente em procurar o Reino de Deus ocupando-se das
realidades temporais e ordenando-as segundo Deus [...].
Pertence-lhes, de modo particular, iluminar e orientar
todas as realidades temporais a que estão estreitamente
ligados, de tal modo que elas sejam realizadas e
prosperem constantemente segundo Cristo, para glória do
Criador e Redentor»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
31: AAS 57 (1965) 37-38).
899. A iniciativa dos cristãos leigos é particularmente
necessária quando se trata de descobrir, de inventar
meios para impregnar, com as exigências da doutrina e da
vida cristã, as realidades sociais, políticas e
económicas. Tal iniciativa é um elemento normal da vida
da Igreja:
- «os fiéis leigos estão na linha mais avançada da vida
da Igreja: por eles, a Igreja é o princípio vital da
sociedade. Por isso, eles, sobretudo, devem ter uma
consciência cada vez mais clara, não somente de que
pertencem à Igreja, mas de que são Igreja, isto é,
comunidade dos fiéis na terra sob a direção do chefe
comum, o Papa, e dos Bispos em comunhão com ele. Eles
são Igreja»
(Pio XII, Allocutio ad Patres Cardinales recenter
creatos (20 de fevereiro de 1946): AAS 38 (1946)
149; aduzido por João Paulo II, Ex. ap.
Christifideles laici, 9: AAS 81 (1989) 406).
900. Porque, como todos os fiéis, são por Deus
encarregados do apostolado, em virtude do Batismo e da
Confirmação, os leigos têm o dever e gozam do direito,
individualmente ou agrupados em associações, de
trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja
conhecida e recebida por todos os homens e por toda a
terra. Este dever é ainda mais urgente quando só por
eles podem os homens receber o Evangelho e conhecer
Cristo. Nas comunidades eclesiais, a sua ação é tão
necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não
pode, a maior parte das vezes, alcançar pleno efeito
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
33: AAS 57 (1965) 39).
A PARTICIPAÇÃO DOS LEIGOS NA FUNÇÃO SACERDOTAL DE CRISTO
901. «Em virtude da sua consagração a Cristo e da
unção do Espírito Santo, os leigos recebem a vocação
admirável e os meios que permitem ao Espírito produzir
neles frutos cada vez mais abundantes. De fato, todas as
suas atividades, orações, iniciativas apostólicas, a sua
vida conjugal e familiar, o seu trabalho de cada dia, os
seus lazeres do espírito e do corpo, se forem vividos no
Espírito de Deus, e até as provações da vida se
pacientemente suportadas, tudo se transforma em
"sacrifício espiritual, agradável a Deus por Jesus
Cristo" (1ª Pe. 2, 5). Na celebração eucarística,
todas estas oblações se unem à do Corpo de Senhor, para
serem piedosamente oferecidas ao Pai. É assim que os
leigos, como adoradores que em toda a parte se comportam
santamente, consagram a Deus o próprio mundo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
34: AAS 57 (1965) 40: cf. Ibid, 10: AAS 57
(1965) 14-15).
902. Os pais participam dum modo particular no múnus da
santificação, «vivendo em espírito cristão a vida
conjugal e cuidando da educação cristã dos filhos»
(CIC cân 835 § 4).
903. Os leigos, se têm as qualidades requeridas, podem
ser admitidos de modo estável aos ministérios de leitor
e de acólito
(Cf. CIC cân 230 § 1).
«Onde as necessidades da Igreja o aconselharem, por
falta de ministros, os leigos, mesmo que não sejam
leitores nem acólitos, podem suprir alguns ofícios
destes, como os de exercer o ministério da Palavra,
presidir às orações litúrgicas, conferir o Batismo e
distribuir a sagrada Comunhão, segundo as prescrições do
Direito»
(CIC cân 230 § 3).
A SUA PARTICIPAÇÃO NA FUNÇÃO PROFÉTICA DE CRISTO
904. «Cristo [...] realiza a sua missão profética não
só através da hierarquia [...], mas também por meio dos
leigos. Para isso os constituiu testemunhas, e lhes
concedeu o sentido da fé e a graça da Palavra»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
35: AAS 57 (1965) 40):
- «ensinar alguém, para o trazer à fé, [...] é dever de
todo o pregador e, mesmo, de todo o crente»
(São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3 q. 71,
a. 4, ad 3: Ed. Leon. 12, 124).
905. Os leigos realizam a sua missão profética também
pela evangelização, «isto é, pelo anúncio de Cristo,
concretizado no testemunho da vida e na palavra».
Para os leigos, «esta ação evangelizadora [...]
adquire um carácter específico e uma particular
eficácia, por se realizar nas condições ordinárias da
vida secular»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
35: AAS 57 (1965) 40).
- «Este apostolado não consiste só no testemunho da
vida: o verdadeiro apóstolo procura todas as ocasiões de
anunciar Cristo pela palavra, tanto aos não-crentes
[...] como aos fiéis»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 6: AAS 58 (1966) 843: cf. Id, Decr.
Ad gentes, 15: AAS 58 (1966) 965).
906. Aqueles de entre os fiéis leigos que disso forem
capazes e que para tal se formarem, podem também prestar
o seu concurso à formação catequética
(Cf. CIC cân 774.776.780),
ao ensino das ciências sagradas
(Cf. CIC cân 229)
e aos meios de comunicação social
(Cf. CIC cân. 822 § 3).
907. «Os fiéis, segundo a ciência, a competência e a
proeminência de que desfrutam, têm o direito e mesmo por
vezes o dever, de manifestar aos sagrados pastores a sua
opinião acerca das coisas atinentes ao bem da Igreja e
de a exporem aos restantes fiéis, salva a integridade da
fé e dos costumes, a reverência devida aos pastores, e
tendo em conta a utilidade comum e a dignidade das
pessoas»
(CIC cân 212 § 3).
A SUA PARTICIPAÇÃO NA FUNÇÃO REAL DE CRISTO
908. Fazendo-se obediente até à morte
(Cf. Fl. 2, 8-9),
Cristo comunicou aos seus discípulos o dom de régia
liberdade, para que «com abnegação de si mesmos e
santidade de vida, vençam em si próprios o reino do
pecado»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
36: AAS 57 (1965) 41).
- «Aquele que submete o corpo e governa a sua alma, sem
se deixar submergir pelas paixões, é senhor de si mesmo;
pode ser chamado rei, porque é capaz de reger a sua
própria pessoa: é livre e independente e não se deixa
cativar por uma escravidão culpável»
(Santo Ambrósio, Espositio psalmi CXVIII, 14, 30:
CSEL 62, 318 (PL 15, 1476)).
909. «Além disso, também pela união das suas forças,
devem os leigos sanear as instituições e as condições de
vida no mundo, quando estas tendem a levar ao pecado,
para que todas se conformem com as regras da justiça e
favoreçam a prática da virtude, em vez de a impedirem.
Agindo assim, impregnarão de valor moral a cultura e as
obras humanas»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
36: AAS 57 (1965) 42).
910. «Os leigos também podem sentir-se ou serem
chamados a colaborar com os pastores no serviço da
comunidade eclesial, trabalhando pelo crescimento e vida
da mesma, exercendo ministérios muito variados, segundo
a graça e os carismas que ao Senhor aprouver
comunicar-lhes»
(Paulo VI, Ex. ap. Evangelii nuntiandi, 73: AAS
68 (1976) 61).
911. Na Igreja, «os fiéis leigos podem cooperar no
exercício do poder de governo, segundo as normas do
direito»
(CIC cân 129 § 2).
É o caso da sua presença nos concílios particulares
(Cf. C1C cân 443 § 4)
nos sínodos diocesanos
(Cf. CIC cân. 463 § 1-2)
e nos conselhos pastorais
(Cf. CIC cân 511-512.536)
do exercício da função pastoral duma paróquia
(Cf. CIC cân 517 § 2)
da colaboração nos conselhos para os assuntos económicos
(Cf. CIC cân 492 § 1. 537);
da participação nos tribunais eclesiásticos
(Cf. CIC cân 1421 § 2);
etc.
912. Os fiéis devem «distinguir cuidadosamente os
direitos e deveres que lhes competem como membros da
Igreja, daqueles que lhes dizem respeito como membros da
sociedade humana. Procurem harmonizar uns e outros,
lembrando-se de que em todos os assuntos temporais se
devem guiar pela sua consciência cristã, pois nenhuma
atividade humana, mesmo de ordem temporal, pode
subtrair-se ao domínio de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm Lumen Gentium,
36: AAS 57 (1965) 42).
913. «Assim, todo e qualquer leigo, em virtude dos
dons que lhe foram concedidos, é ao mesmo tempo
testemunha e instrumento vivo da missão da própria
Igreja "segundo a medida do dom de Cristo"»
(Ef. 4, 7) (II Concílio do Vaticano, Const. dogm.
Lumen Gentium, 33: AAS 57 (1965) 39).
III. A vida consagrada
914. «O estado de vida constituído pela profissão dos
conselhos evangélicos, embora não pertença à estrutura
hierárquica da Igreja, está, no entanto,
incontestavelmente ligado à sua vida e santidade»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
44: AAS 57 (1965) 51).
CONSELHOS EVANGÉLICOS, VIDA CONSAGRADA
915. Os conselhos evangélicos são, na sua
multiplicidade, propostos a todos os discípulos de
Cristo. A perfeição da caridade, a que todos os fiéis
são chamados, comporta, para aqueles que livremente
assumem o chamamento à vida consagrada, a obrigação de
praticar a castidade no celibato por amor do Reino, a
pobreza e a obediência. É a profissão destes
conselhos, num estado de vida estável reconhecido pela
Igreja, que caracteriza a «vida consagrada» a
Deus
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 42-43: AAS 57 (1965) 47-50; ID.
Decr. Perfectae caritatis, l: AAS 58 (1966)
702-703).
916. A partir daí, o estado de vida consagrada aparece
como uma das maneiras de viver uma consagração «mais
íntima», radicada no Batismo e totalmente dedicada a
Deus
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Perfectae
caritatis, 5: AAS 58 (1966) 704-705).
Na vida consagrada, os fiéis propõem‑se, sob a moção do
Espírito Santo, seguir Cristo mais de perto, entregar‑se
a Deus amado acima de todas as coisas e, procurando a
perfeição da caridade ao serviço do Reino, ser na Igreja
sinal e anúncio da glória do mundo que há de vir
(Cf. CIC cân 573).
UMA GRANDE ÁRVORE, DE FRONDOSA RAMAGEM
917. «Tal como uma árvore se ramifica maravilhosa e
variadamente no campo do Senhor, a partir de uma semente
lançada por Deus, assim surgiram diversas formas de vida
solitária ou comum, e várias famílias religiosas que vêm
aumentar a riqueza espiritual, tanto em proveito dos
seus próprios membros como no de todo o Corpo de Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
43: AAS 57 (1965) 49).
918. «Desde as origens da Igreja, houve homens e
mulheres que se propuseram, pela prática dos conselhos
evangélicos, seguir mais livremente Cristo e imitá-Lo de
modo mais fiel. Cada qual a seu modo. Levaram uma vida
consagrada a Deus. Muitos de entre eles, sob o impulso
do Espírito Santo, viveram na solidão; outros fundaram
famílias religiosas que a Igreja de bom grado acolheu e
aprovou com a sua autoridade»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Perfectae caritatis,
1: AAS 58 (1966) 702).
919. Os Bispos devem esforçar-se sempre por discernir os
novos dons de vida consagrada, confiados pelo Espírito
Santo à sua Igreja. A aprovação de novas formas de vida
consagrada é reservada à Sé Apostólica
(Cf. CIC cân 605).
A VIDA EREMÍTICA
920. Os eremitas nem sempre fazem profissão pública dos
três conselhos evangélicos; mas, «por meio de um mais
estrito apartamento do mundo, do silêncio na solidão, da
oração assídua e da penitência, consagram a sua vida ao
louvor de Deus e à salvação do mundo»
(CIC cân 603 § 1).
921. Os eremitas manifestam o aspecto interior do
mistério da Igreja que é a intimidade pessoal com
Cristo. Oculta aos olhos dos homens, a vida do eremita é
pregação silenciosa d'Aquele a quem entregou a sua vida.
Cristo é tudo para ele. É uma vocação especial para
encontrar no deserto, no próprio combate espiritual, a
glória do Crucificado.
AS VIRGENS E AS VIÚVAS CONSAGRADAS
922. Já desde os tempos apostólicos, apareceram virgens
(Cf. 1ª Cor. 7, 34-36) e viúvas cristãs
(Cf. João Paulo II, Ex. ap. Vita consecrata, 7:
AAS 88 (1996) 382), chamadas pelo Senhor a unirem-se a Ele
sem partilha, numa maior liberdade de coração, de corpo
e de espírito, que tomaram a decisão, aprovada pela
Igreja, de viver, respectivamente, no estado de
virgindade ou de castidade perpétua, «por amor do
Reino dos céus» (Mt. 19, 12).
923. As virgens, «emitindo o santo propósito de
seguir mais de perto a Cristo, são consagradas a Deus
pelo Bispo diocesano segundo o rito litúrgico aprovado,
desposam-se misticamente com Cristo Filho de Deus e
dedicam-se ao serviço da Igreja»
(CIC cân. 604 § 1).
Por este ritual solene (consecratio virginum -
consagração das virgens), a «virgem é constituída
como pessoa consagrada, sinal transcendente do amor da
Igreja a Cristo, imagem escatológica da Esposa celeste e
da vida futura» (Ordo
Consecrationis virginum.
Praenotanda 1, editio typica (Typis Polyglottis
Vaticanis 1970). p. 7 [ed. oficial
portuguesa: Consagração das Virgens. Preliminares
1, edição típica. (Coimbra. Conferência Episcopal
Portuguesa - Gráfica de Coimbra 1993) p. 9]).
924. «Próxima das outras formas de vida consagrada»
(Cf. CIC cân 604 § 1),
a ordem das virgens estabelece a mulher que vive no
mundo (ou a monja) na oração, na penitência, no serviço
dos seus irmãos e no trabalho apostólico, segundo o
estado e carismas respectivos concedidos a cada uma
(Cf. Ordo Consecrationis virginum. Praenotanda 2.
editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 7
[ed. oficial portuguesa: Consagração das Virgens.
Preliminares 2, edição típica. (Coimbra, Conferência
Episcopal Portuguesa - Gráfica de Coimbra 1993)
p. 9]).
As virgens consagradas podem associar-se para observarem
mais fielmente os seus propósitos
(Cf. CIC cân 604 § 2).
A VIDA RELIGIOSA
925. Nascida no Oriente, nos primeiros séculos do
cristianismo
(Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis
redintegratio, 11: AAS 57 (1965) 102),
e vivida em institutos canonicamente eretos pela Igreja
(Cf. CIC cân 573),
a vida religiosa distingue-se das outras formas de vida
consagrada pelo aspecto cultual, pela profissão pública
dos conselhos evangélicos, pela vida fraterna em comum e
pelo testemunho dado a respeito da união de Cristo e da
Igreja
(Cf. CIC cân 607).
926. A vida religiosa faz parte do mistério da Igreja. É
um dom que a Igreja recebe do seu Senhor, e que oferece,
como um estado de vida estável, ao fiel chamado por Deus
à profissão dos conselhos. Assim, a Igreja pode, ao
mesmo tempo, manifestar Cristo e reconhecer-se como
Esposa do Salvador. A vida religiosa é convidada a
significar, nas suas variadas formas, a própria caridade
de Deus, em linguagem do nosso tempo.
927. Todos os religiosos, isentos ou não
(Cf. CIC cân 591), têm o seu lugar entre os cooperadores do
Bispo Diocesano na sua função pastoral
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus,
33-35: AAS 58 (1966) 690-692).
A implantação e a expansão missionária da Igreja
requerem a presença da vida religiosa em todas as suas
formas, desde os começos da evangelização
(II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 18:
AAS 58 (1966) 968-969; Ibid. 40: AAS 58 (1966)
987-988).
«A história confirma os grandes méritos das famílias
religiosas na propagação da fé e na formação de novas
Igrejas, desde as antigas instituições monásticas e as
Ordens medievais, até às congregações modernas»
(João Paulo II, Enc. Redemptoris missio, 69: AAS
83 (1991) 317).
OS INSTITUTOS SECULARES
928. «Instituto secular é o instituto de vida
consagrada, em que os fiéis, vivendo no século, se
esforçam por atingir a perfeição da caridade e por
contribuir, sobretudo a partir de dentro, para a
santificação do mundo»
(CIC cân. 710).
929. Os membros destes institutos, mediante uma «vida
perfeita e inteiramente consagrada [a esta]
santificação»
(Pio XII, Const. ap. Provida Mater: AAS 39 (1947)
118),
tomam parte na tarefa de evangelização da Igreja, «no
mundo e a partir do mundo»
(CIC cân 713 § 2),
onde a sua presença atua «à maneira de fermento»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Perfectae caritatis,
11: AAS 58 (1966) 707).
O seu testemunho de vida cristã visa ordenar segundo
Deus as realidades temporais e impregnar o mundo com a
força do Evangelho. Assumem, por vínculos sagrados, os
conselhos evangélicos e mantêm entre si a comunhão e
fraternidade próprias do seu teor de vida secular
(Cf. CIC cân 713).
AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA
930. Aproximam-se das diversas formas de vida
consagrada, «as sociedades de vida apostólica, cujos
membros, sem votos religiosos, prosseguem o fim
apostólico próprio da sociedade e, vivendo em comum a
vida fraterna, de acordo com a própria forma de vida,
tendem, pela observância das constituições, à perfeição
da caridade. Entre elas há sociedades, cujos membros
[...] assumem os conselhos evangélicos segundo as suas
constituições»
(CIC cân 731 § 1-2).
CONSAGRAÇÃO E MISSÃO: ANUNCIAR O REI QUE VEM
931. Entregando-se a Deus amado sobre todas as coisas,
aquele que pelo Batismo já Lhe estava devotado,
encontra-se, assim, mais intimamente consagrado ao
serviço divino e dedicado ao bem da Igreja. Pelo estado
de consagração a Deus, a Igreja manifesta Cristo e
mostra como o Espírito Santo nela atua de modo
admirável. Aqueles que professam os conselhos
evangélicos têm, pois, por missão, antes de mais, viver
a sua consagração. «Visto estarem dedicados, em
virtude da sua consagração, ao serviço da Igreja, têm
obrigação de trabalhar, de modo especial, segundo a
índole própria do instituto, na ação missionária»
(CIC cân 783: João Paulo II, Enc. Redemptoris missio,
69: AAS 83 (1991) 317-318).
932. Na Igreja, que é como o sacramento, isto é, o sinal
e o instrumento da vida de Deus, a vida consagrada surge
como um sinal particular do mistério da Redenção. Seguir
e imitar Cristo «mais de perto», manifestar
«mais claramente» o seu aniquilamento, é entrar
«mais profundamente» presente, no coração de Cristo,
aos seus contemporâneos. Quem segue este caminho
«mais estreito» estimula os seus irmãos pelo seu
exemplo e «dá este esplêndido e sublime testemunho: o
mundo não pode ser transfigurado e oferecido a Deus sem
o espírito das bem-aventuranças»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
31: AAS 57 (1965) 37).
933. Quer este testemunho seja público, como no estado
religioso, quer seja mais discreto ou mesmo secreto, a
vinda de Cristo é, para todos os consagrados, a origem e
a meta das suas vidas:
- «como o povo de Deus não tem na terra cidade
permanente [...], o estado religioso [...] manifesta a
todos os crentes a presença, já neste mundo, dos bens
celestes; dá testemunho da vida nova e eterna adquirida
pela redenção de Cristo e anuncia a ressurreição futura
e a glória celeste»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen
Gentium, 44: AAS 57 (1965) 50-51).
Resumindo:
934. «Por instituição divina, há na Igreja, entre os
fiéis, ministros sagrados, também chamados, em direito,
clérigos, sendo os outros chamados leigos». E há fiéis
que, pertencendo a uma ou a outra destas duas
categorias, se consagraram a Deus pela profissão dos
conselhos evangélicos e servem assim a missão da Igreja
(Cf. CIC cân 207 § 1-2).
935. Para anunciar a fé e implantar o seu Reino,
Cristo envia os Apóstolos e respectivos sucessores.
Fá-los participantes da sua missão. É d'Ele que uns e
outros recebem o poder de agir em seu nome.
936. 0 Senhor fez de Pedro o fundamento visível da
sua Igreja. Deu-lhe as chaves dela. O Bispo da Igreja de
Roma, sucessor de São Pedro, é «a cabeça do colégio dos
Bispos, Vigário de Cristo e pastor da Igreja universal
neste mundo»
(CIC cân 331).
937. 0 Papa «está revestido, por instituição divina,
do poder supremo, plenário, imediato e universal para o
governo das almas»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus,
2: AAS 58 (1966) 673).
938. Os Bispos, estabelecidos pelo Espírito Santo,
sucedem aos Apóstolos. São, «cada um por sua parte,
princípio visível e fundamento da unidade nas suas
Igrejas particulares»
(II
Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
23: AAS 57 (1965) 27).
939. Ajudados pelos Presbíteros seus cooperadores e
pelos Diáconos, os Bispos têm o encargo de ensinar
autenticamente a fé, celebrar o culto divino, sobretudo
a Eucaristia, e governar a sua Igreja como verdadeiros
pastores. Incumbe-lhes também o cuidado de todas as
Igrejas, com e sob a orientação do Papa.
940. «Sendo próprio do estado dos leigos viverem a
sua vida no meio do mundo e dos assuntos profanos, eles
são chamados por Deus a exercer o seu apostolado no
mundo à maneira de fermento, graças ao vigor do seu
espírito cristão»
(II Concílio do Vaticano, Decr. Apostolicam
actuositatem, 2: AAS 58 (1966) 839).
941. Os leigos participam do sacerdócio de Cristo:
cada vez mais unidos a Ele, desenvolvem a graça do
Batismo e da Confirmação em todas as dimensões da vida
pessoal, familiar, social e eclesial, e assim realizam a
vocação à santidade dirigida a todos os batizados.
942. Graças à sua missão profética, os leigos «são
também chamados a ser, em todas as circunstâncias e no
próprio coração da comunidade humana, testemunhas de
Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et
spes, 43: AAS 58 (1966) 1063).
943. Graças à sua missão real, os leigos têm o poder
de vencer em si mesmos e no mundo o império do pecado,
mediante a abnegação e a santidade de vida
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
36: AAS 57 (1965) 41).
944. A vida consagrada a Deus caracteriza-se pela
profissão pública dos conselhos evangélicos de pobreza,
castidade e obediência, num estado de vida estável
reconhecido pela Igreja.
945. Entregue a Deus, amado sobre todas as coisas,
aquele que o Batismo já a Ele tinha destinado,
encontra-se, no estado de vida consagrada, mais
intimamente votado ao serviço divino e dedicado ao bem
de toda a Igreja.
PARÁGRAFO 5
A COMUNHÃO DOS SANTOS
946. Depois de ter confessado «a Santa Igreja
Católica», o Símbolo dos Apóstolos acrescenta «a
comunhão dos Santos». Este artigo é, em certo
sentido, uma explicitação do anterior: pois «que é a
Igreja senão a assembleia de todos os santos»?
(São
Nicetas de Remesiana, Instructio ad competentes
5, 3, 23 [Explanatio Symboli, 10]: TPL 1, 119 (PL
52, 871)).
A comunhão dos Santos é precisamente a Igreja.
947. «Uma vez que todos os crentes formam um só
corpo, o bem duns é comunicado aos outros [...]. E
assim, deve-se acreditar que existe uma comunhão de bens
na Igreja. [...], Mas o membro mais importante é Cristo,
que é a Cabeça [...]. Assim, o bem de Cristo é
comunicado a todos os membros, comunicação que se faz
através dos sacramentos da Igreja»
(São Tomás de Aquino, In Symbolum Apostolorum
scilicet «Credo in Deum» espositio, 13: Opera
omnia, v. 27 (Parisiis 1875) p. 224).
«Como a Igreja é governada por um só e mesmo
Espírito, todos os bens por ela recebidos tornam-se
necessariamente um fundo comum»
(Cat. Rom. 1, 10, 24, p. 119).
948. A expressão «comunhão dos santos» tem,
portanto, dois significados estreitamente ligados:
«comunhão nas coisas santas, sancta», e «comunhão
entre as pessoas santas, sancti».
- «Sancta sanctis! (O que é santo, para aqueles que são
santos)».
Assim proclama o celebrante na maior parte das liturgias
orientais, no momento da elevação dos santos Dons
antes do serviço da comunhão. Os fiéis (sancti)
são alimentados pelo Corpo e Sangue de Cristo
(sancta), para crescerem na comunhão do Espírito
Santo (Koinônia) e a comunicarem ao mundo.
I. A comunhão dos bens espirituais
949. Na comunidade primitiva de Jerusalém, os discípulos
«eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à comunhão
fraterna, à fração do pão e às orações» (At. 2, 42).
A comunhão na fé.
A fé dos fiéis é a fé da Igreja recebida dos
Apóstolos, tesouro de vida que se enriquece na medida em
que é partilhada.
950. A comunhão nos sacramentos. «O fruto de todos os
sacramentos pertence a todos. Os sacramentos, e
sobretudo o Batismo, que é como que a porta por onde os
homens entram na Igreja, são outros tantos vínculos
sagrados que os unem todos e os ligam a Jesus Cristo. A
comunhão dos santos é a comunhão dos sacramentos [...];
o nome de comunhão pode aplicar-se a cada um deles,
porque cada um deles nos une a Deus [...]. Mas este nome
convém mais à Eucaristia do que a qualquer outro, porque
é principalmente ela que consuma esta comunhão»
(Cat Rom 1, 10, 24, p. 119).
951. A comunhão dos carismas: na comunhão da
Igreja, o Espírito Santo «distribui também graças
especiais entre os fiéis de todas as ordens» para a
edificação da Igreja
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
12: AAS 57 (1965) 16).
Ora, em cada um se manifestam os dons do Espírito, para
o bem comum (1ª Cor. 12, 7).
952. «Eles punham tudo em comum» (At. 4, 32):
«tudo o que o verdadeiro cristão possui, deve olhá-lo
como um bem que lhe é comum com os demais, e deve estar
sempre pronto e ser diligente para ir em socorro do
pobre e da miséria do próximo»
(Cat
Rom 1, 10, 27, p. 121).
O cristão é um administrador dos bens do Senhor
(Cf. Lc 16, 1-3).
953. A comunhão da caridade: na sanctorum
communio, «nenhum de nós vive para si mesmo, e nenhum de
nós morre para si mesmo» (Rm. 14, 7). «Se
um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um
membro for honrado por alguém, todos os membros se
alegram com ele. Vós sois Corpo de Cristo e seus
membros, cada um na parte que lhe diz respeito» (1ª
Cor. 12, 26-27). «A caridade não é
interesseira» (1ª Cor. 13, 5)
(Cf. 1ª Cor, 10.
24). O mais insignificante dos nossos atos,
realizado na caridade, reverte em proveito de todos,
numa solidariedade com todos os homens, vivos ou
defuntos, que se funda na comunhão dos santos. Pelo
contrário, todo o pecado prejudica esta comunhão.
II. A comunhão entre a Igreja do céu e a da terra
954. Os três estados da Igreja. «Até que o Senhor
venha na sua majestade e todos os seus anjos com Ele e,
vencida a morte, tudo Lhe seja submetido, dos seus
discípulos uns peregrinam na terra, outros, passada esta
vida, são purificados, e outros, finalmente, são
glorificados e contemplam "claramente Deus trino e uno,
como Ele é"»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
49: AAS 57 (1965) 54):
- «todos, porém, comungamos, embora de modo e grau
diversos, no mesmo amor de Deus e do próximo, e todos
entoamos ao nosso Deus o mesmo hino de glória. Com
efeito, todos os que são de Cristo e têm o seu Espírito,
formam uma só Igreja e n'Ele estão unidos uns aos
outros»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
49: AAS 57 (1965) 54-55).
955. «E assim, de modo nenhum se interrompe a união
dos que ainda caminham sobre a terra com os irmãos que
adormeceram na paz de Cristo: mas antes, segundo a
constante fé da Igreja, essa união é reforçada pela
comunicação dos bens espirituais»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
49: AAS 57 (1965) 55).
956. A intercessão dos santos. «Os bem-aventurados,
estando mais intimamente unidos com Cristo, consolidam
mais firmemente a Igreja na santidade [...]. Eles não
cessam de interceder a nosso favor, diante do Pai,
apresentando os méritos que na terra alcançaram, graças
ao Mediador único entre Deus e os homens, Jesus Cristo
[...]. A nossa fraqueza é assim grandemente ajudada pela
sua solicitude fraterna»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
49: AAS 57 (1965) 55):
- «não choreis, que eu vos serei mais útil depois da
morte e vos ajudarei mais eficazmente que durante a
vida»
(São Domingos, moribundo, aos seus irmãos: Relatio
iuridica 4 (Frater Radulphus de Faventia), 42: Acta
sanctorum, Augustus I, p. 551).
- «quero passar o meu céu a fazer o bem sobre a terra»
(Santa Teresa do Menino Jesus, Verba (17 de Julho
de 1897): Derniers Entretiens (Paris 1971) p.
270. [Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face,
Obras Completas (Paço de Arcos, Edições do Carmelo
1996) p. 1167])
957. A comunhão com os santos. «Não é só por causa do
seu exemplo que veneramos a memória dos bem-aventurados,
mas ainda mais para que a união de toda a Igreja no
Espírito aumente com o exercício da caridade fraterna.
Pois, assim como a comunhão cristã entre os cristãos
ainda peregrinos nos aproxima mais de Cristo, assim
também a comunhão com os santos nos une a Cristo, de
quem procedem, como de fonte e Cabeça, toda a graça e a
própria vida do povo de Deus»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
50: AAS 57 (1965) 56).
- «a Cristo, nós O adoramos, porque Ele é o Filho de
Deus; quanto aos mártires, nós os amamos como a
discípulos e imitadores do Senhor: e isso é justo, por
causa da sua devoção incomparável para com o seu Rei e
Mestre. Assim nós possamos também ser seus companheiros
e condiscípulos»!
(Martyrium sancti Polycarpi 17, 3: SC 10bis. 232
(Funk 1, 336)).
958. A comunhão com os defuntos. «Reconhecendo
claramente esta comunicação de todo o Corpo místico de
Cristo, a Igreja dos que ainda peregrinam venerou, com
muita piedade, desde os primeiros tempos do
cristianismo, a memória dos defuntos; e, "porque é um
pensamento santo e salutar rezar pelos mortos, para que
sejam livres de seus pecados" (2º Mac. 12, 46),
por eles ofereceu também sufrágios»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
50: AAS 57 (1965) 55).
A nossa oração por eles pode não só ajudá-los, mas
também tornar mais eficaz a sua intercessão em nosso
favor.
959. Na única família de Deus. «Todos os que somos
filhos de Deus e formamos em Cristo uma família, ao
comunicarmos uns com os outros na caridade mútua e no
comum louvor da Santíssima Trindade, correspondemos à
íntima vocação da Igreja»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
51: AAS 57 (1965) 58).
Resumindo:
960. A Igreja é «comunhão dos santos»: esta expressão
designa, em primeiro lugar, as «coisas santas»
(sancta) e, antes de mais, a Eucaristia, pela qual «é
representada e se realiza a unidade dos fiéis que
constituem um só Corpo em Cristo»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,
3: AAS 57 (1965) 6).
961. Este termo também designa a comunhão das
«pessoas santas» (sancti) em Cristo, que «morreu
por todos», de modo que o que cada um faz ou sofre por
Cristo e em Cristo reverte em proveito de todos.
962. «Nós cremos na comunhão de todos os fiéis de
Cristo: dos que peregrinam na terra, dos defuntos que
estão levando a cabo a sua purificação e dos
bem-aventurados do céu: formam todos uma só Igreja; e
cremos que, nesta comunhão, o amor misericordioso de
Deus e dos seus santos está sempre atento às nossas
orações»
(Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 30: AAS 60
(1968) 445). |